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<strong>Teoria</strong> <strong>de</strong> <strong>Nós</strong><br />
Oziri<strong>de</strong> Manzoli Neto<br />
<strong>ICMC</strong> - <strong>USP</strong><br />
2 o Colóquio da Região Su<strong>de</strong>ste<br />
Janeiro <strong>de</strong> 2013
Sumário<br />
1 História da <strong>Teoria</strong> <strong>de</strong> <strong>Nós</strong> 1<br />
2 Pré-requisitos 5<br />
2.1 Álgebra . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5<br />
2.1.1 O básico <strong>de</strong> Categorias e Funtores . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5<br />
2.1.2 O básico <strong>de</strong> Anéis <strong>de</strong> Grupos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7<br />
2.2 Topologia Algébrica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7<br />
2.2.1 O básico <strong>de</strong> Homotopia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8<br />
2.2.2 O básico <strong>de</strong> Homologia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 12<br />
2.3 O básico <strong>de</strong> Topologia Diferencial . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15<br />
3 <strong>Teoria</strong> Clássica <strong>de</strong> <strong>Nós</strong> 21<br />
3.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21<br />
3.2 Número <strong>de</strong> enlaçamentos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 24<br />
3.3 Alguns Invariantes <strong>de</strong> <strong>Nós</strong> e Enlaçamentos . . . . . . . . . . . . . . . . . 25<br />
3.4 Construindo <strong>Nós</strong> e Enlaçamentos - <strong>Nós</strong> Primos . . . . . . . . . . . . . . . 33<br />
4 Outras <strong>Teoria</strong>s <strong>de</strong> <strong>Nós</strong> 37<br />
4.1 <strong>Teoria</strong> Multidimensional <strong>de</strong> <strong>Nós</strong> . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 37<br />
4.2 O caso especial <strong>de</strong> S 2 em S 4 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38<br />
4.3 O círculo no plano, na esfera, no espaço projetivo e no toro . . . . . . . . 41<br />
4.4 O Cilindro e a Faixa <strong>de</strong> Möbius emR 3 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43<br />
4.5 Mergulhos <strong>de</strong> Superfícies emR 3 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 44<br />
5 RP 2 não mergulha emR 3 47<br />
Referências Bibliográficas 49<br />
iii
Capítulo 1<br />
História da <strong>Teoria</strong> <strong>de</strong> <strong>Nós</strong><br />
O estudo dos nós e enlaçamentos <strong>de</strong> forma razoavelmente formalizada começa com<br />
Gauss em 1833, veja [Gauss]. Ele e alguns <strong>de</strong> seus alunos começam estudar o assunto,<br />
focalizando enlaçamentos, pois o interesse era o número <strong>de</strong> enlaçamentos (linking<br />
number) <strong>de</strong> um enlaçamento (link). Seus estudos tinham como objetivo aplicações<br />
na eletrodinâmica.<br />
Lord Kelvin, como muitos <strong>de</strong> sua época, acreditava que os nós eram a chave para o<br />
entendimento das substâncias químicas, que seriam <strong>de</strong>scritas pelas "formas dos nós".<br />
Tabelando-se os nós ter-se-ia uma <strong>de</strong>scrição das substâncias químicas. Começa então<br />
uma corrida para se obter tabelas <strong>de</strong> nós, nós cada vez mais complexos, isto significava,<br />
cada vez com mais cruzamentos.<br />
A primeira tabela <strong>de</strong> nós foi feita por T. P. [Kirkman]. P. G. [Tait] também faz uma<br />
tabela dos nós alternados <strong>de</strong> até <strong>de</strong>z cruzamentos.<br />
E. Rutherford e D. Men<strong>de</strong>leev põem fim a esta animação, Rutherford cria o<br />
mo<strong>de</strong>lo dos átomos, que até hoje utilizamos e a ênfase na pesquisa dos elementos<br />
químicos muda para a Tabela Periódica organizada por Men<strong>de</strong>leev. Praticida<strong>de</strong> para os<br />
químicos, frustração para os matemáticos, que continuam os estudos <strong>de</strong> nós, sem mais<br />
a esperança <strong>de</strong> que os mesmos po<strong>de</strong>riam estar <strong>de</strong>screvendo os elementos químicos.<br />
Estudar nós torna-se então trabalho "abstrato"<strong>de</strong> matemáticos.<br />
C. N. Little pega no pesado durante seis anos e produz tabela <strong>de</strong> 43 nós <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>z cruzamentos. Sua tabela não foi contestada por muito tempo, em 1974, Perko<br />
<strong>de</strong>scobriu que dois nós da tabela <strong>de</strong> Little eram o mesmo [Perko]. Portanto na lista <strong>de</strong><br />
Little só havia 42 nós diferentes. Little também fez uma tabela <strong>de</strong> nós alternados <strong>de</strong><br />
onze cruzamentos, eventualmente se <strong>de</strong>scobriu a falta <strong>de</strong> outros onze nós. Era preciso<br />
um pouco <strong>de</strong> or<strong>de</strong>m neste trabalho!<br />
A Topologia começou a ser reconhecida como área distinta da Matemática no<br />
inicio do século vinte e seu gran<strong>de</strong> <strong>de</strong>senvolvimento começou na década <strong>de</strong> 1930.<br />
Tem sido uma área <strong>de</strong> muito <strong>de</strong>senvolvimento e tem influenciado muitas outras<br />
áreas da matemática. Ela começa em resposta a certas necessida<strong>de</strong>s <strong>de</strong>ntro da<br />
Análise. É uma espécie <strong>de</strong> "geometria rústica"cujo objetivo e salientar os aspectos<br />
qualitativos dos objetos geométricos. As idéias da Topologia tem penetrado quase<br />
todas as áreas da matemática e na maioria <strong>de</strong>ssas aplicações ela fornece ferramentas<br />
e conceitos para provar certas proposições básicas conhecidas genericamente como<br />
"teoremas <strong>de</strong> existência". Os primórdios das idéias topológicas po<strong>de</strong>m ser encontrados<br />
no trabalho <strong>de</strong> K. Weierstrass na década <strong>de</strong> 1860 no qual ele estuda o conceito<br />
1
2 Capítulo 1: História da <strong>Teoria</strong> <strong>de</strong> <strong>Nós</strong><br />
<strong>de</strong> limite <strong>de</strong> uma função. Ele <strong>de</strong>senvolve a construção do sistema <strong>de</strong> números<br />
reais e revela algumas <strong>de</strong> suas proprieda<strong>de</strong>s importantes conhecidas agora como<br />
proprieda<strong>de</strong>s topológicas. Depois vem G. Cantor (1874-1895) que <strong>de</strong>senvolveu a <strong>Teoria</strong><br />
dos Conjuntos, garantindo os fundamentos para a Topologia.<br />
Um segundo aspecto da Topologia, chamado combinatorial ou algébrico, foi<br />
iniciado nos anos 1890 por H. Poincaré estudando calculo integral em dimensões<br />
altas. O primeiro aspecto, normalmente chamado Topologia Conjuntista (point<br />
set topology), foi fundamentada por F. Hausdorff e outros no período 1900-1910.<br />
A compatibilização dos dois aspectos, conjuntista e combinatória, foi estabelecida<br />
primeiro por L. E. J. Brouwer, quando o mesmo <strong>de</strong>senvolveu o conceito <strong>de</strong> dimensão<br />
e <strong>de</strong>pois, <strong>de</strong>finitivamente, por J. W. Alexan<strong>de</strong>r, P. L. Alexandrov e S. Lefschetz no<br />
período 1915-1930. Até este período, Topologia era conhecida por "Analisys Situs".<br />
Foi S. Lefschetz quem primeiro a usar o nome Topologia.<br />
Fruto do <strong>de</strong>senvolvimento da matemática em geral e da topologia em<br />
particular, surgem os primeiros trabalhos apresentados <strong>de</strong> forma sistemático sobre<br />
<strong>Teoria</strong> dos <strong>Nós</strong>, <strong>Teoria</strong> <strong>de</strong> Enlaçamentos e sobre os Grupos <strong>de</strong> Tranças. Veja<br />
as referências [Dehn(1910)], [Dehn(1914)], [Alexan<strong>de</strong>r(1923)], [Alexan<strong>de</strong>r(1928)],<br />
[Rei<strong>de</strong>meister(1926)], [Rei<strong>de</strong>meister(1926’)] e [Artin(1926)].<br />
No inicio <strong>de</strong>sta era, M. G. Haseman, listou os nós não equivalentes aos seus<br />
espelhados (aquirais?) com doze cruzamentos [Haseman].<br />
J. Alexan<strong>de</strong>r (1927) estabelece lista dos nós até oito cruzamentos, K. Rei<strong>de</strong>meister<br />
(1932) até nove cruzamentos. J. Alexan<strong>de</strong>r e G.B. Briggs, usando uma forma <strong>de</strong><br />
apresentar os nós criada por W. Wirtinger, estabelece um procedimento muito eficiente<br />
<strong>de</strong> distinguir nós, a idéia era calcular o que ficou chamado Polinômio <strong>de</strong> Alexan<strong>de</strong>r<br />
<strong>de</strong> um nó. Polinômios diferentes, nós não equivalentes! Só em 1984 é que se criaram<br />
outros tipos <strong>de</strong> polinômios com o mesmo objetivo.<br />
C.D. Papakyriakopoulos e J. Conway <strong>de</strong>senvolvem métodos mais simplificados <strong>de</strong><br />
se calcular os Polinômios <strong>de</strong> Alexan<strong>de</strong>r.<br />
Começa também o estudo <strong>de</strong> nós em dimensão mais alta, isto é, o estudo dos<br />
mergulhos das esferas <strong>de</strong> dimensão n ≥ 2 em esferas <strong>de</strong> dimensão maior que n, veja<br />
[Artin(1926)].<br />
J. Conway [Conway] <strong>de</strong>senvolve nova notação para nós e com isso <strong>de</strong>termina os<br />
nós primos <strong>de</strong> até onze cruzamentos. A. Caudron(1978) repara alguns erros na lista <strong>de</strong><br />
Conway.<br />
C. H. Dowker inventa uma nova forma <strong>de</strong> representar nós, baseado em idéias <strong>de</strong><br />
Tait. Um algoritmo é feito e implementado em computador por M. B. Thistlethwaite.<br />
Assim obtém-se em 1981 lista <strong>de</strong> nós primos <strong>de</strong> até doze cruzamentos e em 1982 <strong>de</strong><br />
treze cruzamentos.<br />
C. Ernest e D. W. Sumners, em 1987, usando resultados <strong>de</strong> L. H. Kauffman, K.<br />
Murasugi e <strong>de</strong> Thistlethwaite avaliam que o número <strong>de</strong> nós <strong>de</strong> n cruzamentos é maior<br />
ou igual a (2n−2−1)/3. Em 1990, D. J. A. Welsh avalia que o número <strong>de</strong> nós <strong>de</strong> n<br />
cruzamentos é menor que uma certa função <strong>de</strong> n.<br />
Na década <strong>de</strong> 1980 bioquímicos <strong>de</strong>scobriram enodamentos nas moléculas <strong>de</strong> DNA!<br />
Surgem questões como: "Seria possível criar moléculas enodadas?"; "Enodamentos<br />
po<strong>de</strong>riam <strong>de</strong>terminar algumas das proprieda<strong>de</strong>s das substâncias? "Moléculas<br />
enodadas que não são topológicamente equivalentes às espelhadas dão origem à<br />
substâncias diferentes?".
Na <strong>Teoria</strong> Clássica dos <strong>Nós</strong> e Enlaçamentos surgem muitos outros invariantes com<br />
o objetivo <strong>de</strong> distinguir suas classes, particularmente vários outros polinômios como<br />
acima citado, veja [Kauffman(1988), Kauffman(1989)].<br />
Trabalhos recentes mostram que este estudo tem produzido conhecimento<br />
matemático valioso, relacionando a <strong>Teoria</strong> <strong>de</strong> <strong>Nós</strong> e Enlaçamentos com outras áreas<br />
<strong>de</strong> conhecimento como: <strong>Teoria</strong> Topológica <strong>de</strong> Campos e Mecânica Estatística na<br />
Física, o estudo do DNA na Biologia e o estudo das estruturas tridimensionais das<br />
moléculas (stereochemistry) na Química, veja muita coisa interessante sobre isto em<br />
[Flapan]. Voce po<strong>de</strong>rá ver também uma foto <strong>de</strong> uma molécula enodada <strong>de</strong> DNA em<br />
[Wasserman et al.].<br />
O estudo <strong>de</strong> mergulhos <strong>de</strong> varieda<strong>de</strong>s em varieda<strong>de</strong>s é uma generalização natural<br />
<strong>de</strong>stes estudos, assim como é o estudo <strong>de</strong> mergulhos <strong>de</strong> outros espaços, como grafos,<br />
em espaços comoR 2 ,R 3 ou em Superfícies.<br />
Para fazer justiça ao nome do mini-curso gostaria <strong>de</strong> apresentar uma boa visão<br />
sobre a <strong>Teoria</strong> dos <strong>Nós</strong> Clássica por isso a maior parte do curso será <strong>de</strong>dicada a este<br />
tópico.<br />
Veremos <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o começo que precisamos <strong>de</strong> muitas ferramentas da Topologia e da<br />
Algebra para estudar este assunto. Procuraremos portanto apresentar inicialmente,<br />
o suficiente (espero sem exagero!) <strong>de</strong>stas ferramentas para o bom entendimento do<br />
curso. Devemos lembrar que estes pré-requisitos são muito úteis também para se<br />
estudar muitos outros assuntos. O participante do curso não precisa ver os <strong>de</strong>talhes<br />
<strong>de</strong>stas ferramentas durante o curso mas é uma gran<strong>de</strong> oportunida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ter um contato<br />
com elas. Portanto, se houver tempo, não <strong>de</strong>ixe <strong>de</strong> dar uma boa olhada nos pré<br />
requisitos, e tirar dúvidas durante as aulas, esse material, também, está bem resumido<br />
e incompleto mas é muito interessante e útil.<br />
Queremos apresentar também neste mini-curso um bocadinho da correspon<strong>de</strong>nte<br />
teoria multidimensional, tudo <strong>de</strong>ntro do contexto mais geral <strong>de</strong> mergulhos <strong>de</strong><br />
varieda<strong>de</strong>s em varieda<strong>de</strong>s.<br />
A maioria dos resultados serão só enunciados ficando as <strong>de</strong>monstrações para serem<br />
vistas nas referencias. Algumas poucas provas serão apresentadas, principalmente<br />
se forem fáceis! Na maioria das referências, principalmente nos livros, po<strong>de</strong>mos<br />
encontrar quase todos os assuntos aqui abordados. A minha preferência pessoal é que<br />
<strong>de</strong>terminou o que citar em cada caso. Po<strong>de</strong> ser que a citação não seja a mais a<strong>de</strong>quada<br />
para o gosto <strong>de</strong> cada um, por isso é bom que cada um procure olhar vários textos até<br />
achar o que mais lhe agrada para estudar.<br />
O assunto <strong>Nós</strong> e Enlaçamentos esta bastante relacionado com os Grupos <strong>de</strong> Tranças.<br />
Não abordaremos este assunto aqui, sobre isto temos vários textos interessantes em<br />
particular temos disponível no site do XV Encontro Brasileiro <strong>de</strong> Topologia - Rio<br />
Claro (2006) o texto do mini-curso "The Braid Groups"ministrado naquele encontro<br />
pelo Professor Dale Rolfsen [Rolfsen(2006)]. Nas notas do mini-curso existe uma<br />
bibliografia sobre o assunto e sugestões <strong>de</strong> vários textos para leitura, em particular<br />
veja uma prova do teorema <strong>de</strong> Alexan<strong>de</strong>r/Markov em [Morton].<br />
As perguntas e os exercícios, quando sugeridos no texto, nem sempre são fáceis.<br />
Acho que alguns eu não sei respon<strong>de</strong>r ou se sei respon<strong>de</strong>r não tenho certeza se teria<br />
uma boa prova, no entanto não resisto a tentação <strong>de</strong> apresentá-los.<br />
Neste curso as questões <strong>de</strong> mergulhos <strong>de</strong> objetos mais gerais como é o caso do<br />
mergulhos <strong>de</strong> grafos emR 2 ouR 3 serão abordados apenas superficialmente. Usaremos<br />
3
4 Capítulo 1: História da <strong>Teoria</strong> <strong>de</strong> <strong>Nós</strong><br />
um resultado sobre mergulhos <strong>de</strong> grafos emR 3 para provar que o espaço projetivo não<br />
mergulha emR 3 . (se <strong>de</strong>r tempo!)<br />
Em outras áreas da matemática, questões semelhantes são estudadas, por exemplo<br />
os Teoremas <strong>de</strong> Sylow estudados em <strong>Teoria</strong> <strong>de</strong> Grupos estudam os "mergulhos"<strong>de</strong><br />
certos sub-grupos mais simples (os p-grupos), em um grupo dado.<br />
Similarmente, uma parte da <strong>Teoria</strong> <strong>de</strong> Fibrados Vetoriais consiste em estudar se<br />
certos fibrados são sub-fibrados <strong>de</strong> outros fibrados <strong>de</strong> dimensão maior.<br />
Esperamos com isso que o participante possa ter uma boa idéia <strong>de</strong>sta parte tão<br />
importante da matemática.<br />
Além <strong>de</strong>ste primeiro capítulo histórico, teremos um capitulo <strong>de</strong> pré-requisitos, um<br />
capitulo sobre a <strong>Teoria</strong> Clássica <strong>de</strong> <strong>Nós</strong>, que é o nosso objetivo maior, um capitulo<br />
que chamei "Outras <strong>Teoria</strong>s <strong>de</strong> <strong>Nós</strong>"on<strong>de</strong> abordaremos intuitiva e superficialmente<br />
alguns casos mais gerais <strong>de</strong>sta teoria e um ultimo capítulo "O Espaço Projetivo RP 2<br />
não mergulha emR 3 ".
Capítulo 2<br />
Pré-requisitos<br />
2.1 Álgebra<br />
Espero que os leitores tenham um conhecimento básico <strong>de</strong> <strong>Teoria</strong> <strong>de</strong> Grupos, Anéis,<br />
Corpos e Módulos, que são normalmente apresentados nos cursos <strong>de</strong> graduação em<br />
Matemática. Existem três tópicos <strong>de</strong> Algebra que são muito usados nas Topologias<br />
Algébrica e Geométrica (da qual faz parte a <strong>Teoria</strong> <strong>de</strong> <strong>Nós</strong>), que são Algebra<br />
Homológica, Grupos Livres e Anéis <strong>de</strong> Grupos e que em geral não são abordados<br />
nos cursos <strong>de</strong> graduação. Não vou me aventurar em resumir Algebra Homológica<br />
aqui mas vou tentar resumir os outros dois tópicos, Grupos Livres e Anéis <strong>de</strong> Grupos.<br />
Sugiro que os interessados procurem na bibliografia e <strong>de</strong>em uma boa olhada nos três<br />
tópicos que são muito importantes para a formação geral <strong>de</strong> um matemático.<br />
2.1.1 O básico <strong>de</strong> Categorias e Funtores<br />
Uma linguagem que facilita muito a apresentação <strong>de</strong> muitas partes da matemática<br />
é a linguagem <strong>de</strong> categorias e funtores, portanto aqui vai um resumo <strong>de</strong>ste assunto que<br />
espero facilite a apresentação do curso.<br />
Definição 2.1 Uma categoria C é constituída <strong>de</strong> uma classe <strong>de</strong> objetos A, B, C... e <strong>de</strong> uma<br />
família <strong>de</strong> conjuntos disjuntos hom(A, B) que po<strong>de</strong> ser in<strong>de</strong>xada por C ×C, isto é, para cada<br />
par (A, B) <strong>de</strong> elementos <strong>de</strong> C ×C um conjunto hom(A, B), satisfazendo as condições:<br />
(i) Para cada terna <strong>de</strong> objetos A, B, C, existe uma função c, que associa cada elemento <strong>de</strong><br />
hom(A, B)×hom(B, C) um elemento <strong>de</strong> hom(A, C).<br />
(ii) Existe uma função "1", <strong>de</strong> C na reunião dos conjuntos disjuntos <br />
A hom(A, A) que<br />
associa a cada A <strong>de</strong> C um elemento ”1A” da reunião com ”1A” ∈ hom(A, A).<br />
Além disso <strong>de</strong>vemos ter satisfeitas as duas exigências abaixo para as funções consi<strong>de</strong>radas:<br />
i. Associativida<strong>de</strong> da função c (<strong>de</strong>nominada composição), isto é, seja α ∈ hom(A, B),<br />
β ∈ hom(B, C) e γ ∈ hom(C, D), então, c(c(α, β), γ) = c(α, c(B, γ))<br />
ii. I<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> das funções ”1”, isto é, se α ∈ hom(A, B) então c(α, ”1B”) = α = c(”1A”, α)<br />
Escreveremos por simplicida<strong>de</strong>:<br />
5
6 Capítulo 2: Pré-requisitos<br />
(a) α : A → B para α ∈ hom(A, B); α será <strong>de</strong>nominado "morfismo <strong>de</strong>C"com "domínio A"<br />
e "contradomínio B".<br />
(b) c(α, β) será indicado β◦α que pelas condições apresentadas só terá sentido se o domínio<br />
<strong>de</strong> β for o contradomínio <strong>de</strong> α.<br />
(c) É claro que a tripla composição γ ◦ β ◦ α tem significado quando os domínios e<br />
contradomínios forem compatíveis.<br />
Um elemento θ ∈ hom(A, B) será chamado uma equivalência em C se existir<br />
ψ ∈ hom(B, A) tal que ψ◦θ = 1 A e θ ◦ ψ = 1B (É claro que neste caso, ψ também<br />
será uma equivalência).<br />
Se um elemento θ ∈ hom(A, B) é uma equivalência, então o elemento ψ tal que<br />
ψ◦θ = 1 A e θ◦ ψ = 1B é único.<br />
Vejamos: seja ¯ψ outro elemento <strong>de</strong> hom(B, A) | ¯ψ◦θ = 1 A e θ ◦ ¯ψ = 1B, então<br />
teremos ψ = 1A◦ ψ = ¯ψ◦θ◦ ψ = ¯ψ◦1B = ¯ψ<br />
O elemento ψ nas condições acima, fica bem <strong>de</strong>finido pela θ (quando existir) e será<br />
<strong>de</strong>nominado inverso <strong>de</strong> θ sendo indicado θ −1 .<br />
Exemplos <strong>de</strong> Categorias:<br />
1. A classe constituída <strong>de</strong> um único grupo G, isto é, a categoria terá apenas um<br />
elemento; hom(G, G) será consi<strong>de</strong>rado como sendo o próprio G.<br />
A aplicação c será <strong>de</strong>finida por c(a, b) = a•b on<strong>de</strong> • é a operação existente em<br />
G. A aplicação "1"será a aplicação que à g ∈ G associa o elemento neutro. É fácil<br />
verificar as condições.<br />
2. R M constituída <strong>de</strong> todos os módulos a esquerda <strong>de</strong> um anel R. Os objetos<br />
são os R-módulos, isto é, A, B, C... são os R-módulos. hom(A, B) será o<br />
conjunto HomR(A, B) <strong>de</strong> todos os homomorfismos <strong>de</strong> R-módulos <strong>de</strong> A em B.<br />
A composição (c) é a usual. É fácil verificar as condições.<br />
3. A classe <strong>de</strong> todos os conjuntos tomando como morfismos as funções entre os<br />
conjuntos.<br />
4. A classe <strong>de</strong> todos os grupos tomando-se como morfismos os homomorfismos<br />
entre elas.<br />
5. A classe dos grupos abelianos também como morfismos os homomorfismos.<br />
6. A classe dos espaços topológicos com os morfismos as aplicações contínuas entre<br />
eles.<br />
Dadas duas categorias C e D um Funtor Covariante T está <strong>de</strong>finido <strong>de</strong> C para D<br />
quando tivermos:<br />
(a) A cada objeto A <strong>de</strong> C fica associado um único objeto T(A) <strong>de</strong> D.<br />
(b) A cada morfismo α <strong>de</strong> C fica associado um único morfismo T(α) <strong>de</strong> D, on<strong>de</strong> estas<br />
associações respeitam as condições:
2.2: Topologia Algébrica 7<br />
(1) T(1 A) = 1 T(A)<br />
(2) Se α : A → B ∈ hom(A, B) então T(α) : T(A) → T(B)<br />
(3) T(α◦β) = T(α)◦T(β)<br />
Um Funtor Contravariante é <strong>de</strong>finido da mesma forma, mas com as condições (1)<br />
e:<br />
(2’) Se α : A → B então T(α) : T(B) → T(A).<br />
(3’) T(α◦β) = T(β)◦T(α).<br />
Dados os funtores T : C → D e S : D → E <strong>de</strong>finimos o funtor composto<br />
T◦S : C → E por: (T◦ S)(A) = T(S(A)) e T◦S(α) = T(S(α))).<br />
É fácil verificar que T ◦ S é um funtor da categoria C na categoria E e que o<br />
composto <strong>de</strong> dois funtores é covariante se ambos forem covariantes ou ambos forem<br />
contravariantes e o composto é contravariante se eles não forem ao mesmo tempo<br />
covariantes ou contravariantes.<br />
Exemplos <strong>de</strong> funtores:<br />
1. πi é um funtor da categoria dos espaços topológicos pontuados na categoria dos<br />
grupos.<br />
2. Hq é um funtor da categoria dos pares <strong>de</strong> espaços topológicos na categoria dos<br />
grupos abelianos.<br />
2.1.2 O básico <strong>de</strong> Anéis <strong>de</strong> Grupos<br />
Um bom texto em português para ver este assunto é o livro do Polcino [Polcino]<br />
Fixemos um grupo G e um anel A com unida<strong>de</strong>.<br />
Uma combinação linear formal, finita <strong>de</strong> elementos <strong>de</strong> G e A e é uma "soma"da<br />
forma r = ∑g r(g).g on<strong>de</strong> g ∈ G e r(g) ∈ A é tal que apenas uma quantida<strong>de</strong> finita<br />
dos r(g), g ∈ G é diferente <strong>de</strong> 0 ∈ A. O conjunto <strong>de</strong> todas estas somas formais vão<br />
constituir um conjunto que chamaremos um anel <strong>de</strong> grupo e que <strong>de</strong>notaremos A[G].<br />
Precisamos em A[G] <strong>de</strong> uma soma e <strong>de</strong> um produto.<br />
A soma é dada por r1+ r2 = ∑g r1(g).g+∑g r2(g).g = ∑g(r1(g)+r2(g)).g<br />
O produto é dado por r1· r2 = ∑g r3(g).g on<strong>de</strong> r3(g) = ∑g 1.g2=g r1(g1)·r2(g2)<br />
É fácil verificar que com estas <strong>de</strong>finições <strong>de</strong> soma e produto, A[G] se torna um anel,<br />
chamado Anel <strong>de</strong> Grupo <strong>de</strong> G sobre A.<br />
O exemplo que estaremos usando é Z[Z], isto é, o grupo G = Z e o anel A = Z,<br />
neste caso o Anel <strong>de</strong> Grupo se i<strong>de</strong>ntifica com o Anel dos polinômios nas variáveis t, t −1<br />
sobre Z.<br />
Como nem sempre os ingredientes envolvidos são comutativos, po<strong>de</strong>mos ter anéis<br />
bastante complicados neste familia <strong>de</strong> Anéis <strong>de</strong> Grupos.<br />
2.2 Topologia Algébrica<br />
Estamos supondo que o leitor esteja acostumado com as notações da Topologia<br />
Geral ou <strong>de</strong> Espaços Métricos.
8 Capítulo 2: Pré-requisitos<br />
2.2.1 O básico <strong>de</strong> Homotopia<br />
Uma boa sugestão para leitura é o livro do Elon, [Elon1].<br />
Nesta seção estamos trabalhando com a categoria dos espaços topológicos e<br />
aplicações contínuas ou na correspon<strong>de</strong>nte categoria <strong>de</strong> pares.<br />
Consi<strong>de</strong>re as aplicações f : Z → X e g : Z → X, dizemos que f e g são homotópicas<br />
se existir aplicação, <strong>de</strong>nominada homotopia, H : Z×[0, 1] → X tal que H(z, 0) = f(z)<br />
e H(z, 1) = g(z), notação f H ∼ g, f ∼ g ou H : f ∼ g.<br />
Muitas vezes, nesta situação dizemos que temos uma familia continua <strong>de</strong> aplicações<br />
ht : Z → X com h0 = f e h1 = g.<br />
Se A ⊂ Z temos a noção <strong>de</strong> homotopia relativa ao subconjunto A, neste caso pe<strong>de</strong>se<br />
que f |A = g |A e que H satisfaça a condição H(a, t) = f(a) = g(a), ∀ a ∈ A e<br />
∀ t ∈ [0, 1].<br />
Na categoria dos pares <strong>de</strong> espaços topológicos e aplicações contínuas <strong>de</strong> pares,<br />
<strong>de</strong>finimos (X, A)× I = (X×I, A× I) e temos a noção correspon<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> homotopia.<br />
Sejam f0, f1 : (X, A) → (Y, B) aplicações contínuas. Uma homotopia <strong>de</strong> pares<br />
entre f0 e f1 é uma aplicação contínua <strong>de</strong> pares H : (X, A)× I → (Y, B) tal que<br />
H(x, 0) = f0(x) e H(x, 1) = f1(x).<br />
Observe que se H é uma homotopia entre aplicações <strong>de</strong> pares então H(A× I) ⊂ B.<br />
Diz-se que (X, A) e (Y, B) tem o mesmo tipo <strong>de</strong> homotopia <strong>de</strong> pares se existem<br />
aplicações contínuas ϕ : (X, A) −→ (Y, B) e ψ : (Y, B) −→ (X, A) tais que<br />
ϕ◦ψ ∼ Id (Y,B) e ϕ◦ψ ∼ Id (X,A), (homotopia <strong>de</strong> pares). Nestas condições ϕ e ψ<br />
são <strong>de</strong>nominadas equivalências <strong>de</strong> homotopia, a versão não relativa é clara.<br />
Se A = ∅ = B temos a versão usual <strong>de</strong> homotopia e se A = um ponto e B = um<br />
ponto temos a homotopia pontuada.<br />
Verifica-se facilmente que homotopia é uma relação <strong>de</strong> equivalência. Em qualquer<br />
das situações acima, <strong>de</strong>notamos a classe <strong>de</strong> alguma f : Z → X por[ f] ainda <strong>de</strong>notamos<br />
o conjunto das classes <strong>de</strong> homotopia por {Z,X}, embora em muitos livros a notação seja<br />
[Z, X].<br />
Seja h : X → Y, então para toda f : Z → X e familia contínua ft : Z → X po<strong>de</strong>mos<br />
então fazer as aplicações compostas h◦ f : Z → Y ou h◦ ft : Z → Y, vemos então que<br />
h induz uma aplicação h∗ : {Z, X} → {Z, Y}, <strong>de</strong>finida por h∗([ f]) = h◦ f .<br />
Uma <strong>de</strong>formação <strong>de</strong> X é uma homotopia ft : X → X on<strong>de</strong> f0 = IdX e para todo t, ft<br />
é um homeomorfismo.<br />
Dado par (X, A) dizemos que uma homotopia ft : X → X é uma <strong>de</strong>formação <strong>de</strong><br />
X em A se f0 = IdX, f1(X) ⊂ A e ft | A = IdA ∀ t ∈ [0, 1]. Note que neste caso a
2.2: Topologia Algébrica 9<br />
homotopia faz os pontos <strong>de</strong> X − A "fluírem"para <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> A, enquanto os pontos <strong>de</strong><br />
A ficam "parados com o tempo t ∈ [0, 1]".<br />
Vejam exemplos <strong>de</strong> <strong>de</strong>formações, muito interessantes, no capítulo 1 <strong>de</strong> [Prasolov].<br />
Dado A um subespaço <strong>de</strong> X. Diz-se que A é um retrato <strong>de</strong> X se existe uma<br />
aplicação contínua r : X → A tal que r(a) = a, ∀ a ∈ A, r é chamada uma retração <strong>de</strong><br />
X sobre A. Vê-se facilmente que A é um retrato <strong>de</strong> X se e somente se Id A : A → A<br />
po<strong>de</strong> ser prolongada a uma aplicação contínua <strong>de</strong> X em A. Se iA : A → X é a<br />
inclusão, e r : X → A uma retração, então temos r◦ i A = Id A<br />
Exemplos<br />
1. Seja Z = S 1 = X, Y = D 2 e fn : S 1 → S 1 dada por fn(e i.Θ ) = e i.n.Θ , n ∈ Z. Sabemos<br />
que se m = n em Z então { fn} = { fm}, sabemos também que toda f : S 1 → S 1 é<br />
homotópica a alguma das fn isto é temos um bijeção {S 1 , S 1 } ↔ Z. Por outro lado, á<br />
fácil ver que todas as aplicações g : S 1 → D 2 são homotópicas entre si e homotópicas<br />
a qualquer aplicação constante, isto é {S 1 , D 2 } é um conjunto unitário. Se <strong>de</strong>notamos<br />
a inclusão i : S 1 ֒→ D 2 então i∗ é constante, isto é, duas aplicações quaisquer <strong>de</strong> S 1 em<br />
S 1 quando consi<strong>de</strong>radas como aplicação <strong>de</strong> S 1 em D 2 são sempre homotópicas.<br />
2. Seja o par (X, A) = (D 2 ,[−1, 1]), então ht(x, y) = (x,(1−t)y) é <strong>de</strong>formação <strong>de</strong> D 2<br />
em [−1, 1].<br />
3. Seja o par (X, A) = (D 2 − {(0, 0)}, S 1 ), note que S 1 é o bordo <strong>de</strong> D 2 então<br />
ht(x, y) = (1−t)(x, y)+t.{(x, y)/[(x 2 + y 2 )] 1/2 } é uma <strong>de</strong>formação <strong>de</strong> D 2 −{(0, 0)}<br />
em S 1 .<br />
Lema 2.1 Se existe uma <strong>de</strong>formação <strong>de</strong> X em A então para todo espaço topológico Z, temos que<br />
i∗ : {Z, A} → {Z, X} é uma bijeção, on<strong>de</strong> i∗ é a induzida da inclusão i : A ֒→ X.<br />
Prova: Seja ht : X → X uma <strong>de</strong>formação <strong>de</strong> X em A, vejamos que i∗ é sobrejetiva.<br />
Seja [ f] ∈ {Z, X} então f : Z → X, consi<strong>de</strong>remos então ht ◦ f que é uma homotopia<br />
entre f e g = h1 ◦ f note que g(Z) ⊂ A logo g po<strong>de</strong> ser consi<strong>de</strong>rada como uma<br />
aplicação <strong>de</strong> Z em A, isto é[g] ∈ {Z, A} e é claro que i∗[g] = [ f].<br />
Vejamos agora que i∗ é injetiva. Sejam [ f0] e [ f1] em {Z, A} tal que i∗[ f0] = i∗[ f1]<br />
Note que f0(Z) ⊂ A e f1(Z) ⊂ A, além disso existe homotopia entre f0 e f1 quando<br />
tomadas com aplicações <strong>de</strong> Z em X, seja ft : Z → X esta homotopia. Temos que<br />
h1◦ ft : Z → X também é uma homotopia, como f0(Z) ⊂ A segue também que∀z ∈ Z<br />
temos h1( f0(z)) = f0(z) e da mesma forma ∀z ∈ Z temos h1( f1(z)) = f1(z) então<br />
h1◦ ft é uma homotopia entre f0 e f1. Mas h1(Z) ⊂ A então h1◦ ft(Z) ⊂ A ∀t ∈ [0, 1]<br />
logo h1◦ ft é uma homotopia em A entre f0 e f1, isto é [ f0] = [ f1] em {Z, A}, portanto<br />
i∗ é injetiva.<br />
Dizemos que um espaço topológico X é contraível se a aplicação i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> IdX :<br />
X → X é homotópica à uma aplicação constante <strong>de</strong> X em X. Isto é equivalente a dizer<br />
que X se <strong>de</strong>forma em algum <strong>de</strong> seus pontos.
10 Capítulo 2: Pré-requisitos<br />
Consi<strong>de</strong>remos agora o caso <strong>de</strong> "espaços topológicos pontuados" e "aplicações<br />
(contínuas!) pontuadas", isto é estaremos consi<strong>de</strong>rando pares (Z, z0) on<strong>de</strong> Z é espaço<br />
topológico e z0 ∈ Z um ponto base. As aplicações consi<strong>de</strong>radas f : (Z, z0) → (Y, y0)<br />
levam ponto base em ponto base. Nesta "categoria" uma homotopia H <strong>de</strong>ve satisfazer<br />
a condição H(z0, t) = y0 ∀t ∈ [0, 1]. As classes <strong>de</strong> homotopias são ditas com ponto<br />
base (ou "baseadas"!). A notação, para diferenciar da não baseada é [(Z, z0),(Y, y0)]<br />
mas se não há dúvidas sobre quem são os pontos bases, usamos a notação [X, Y]. A<br />
notação para a classe <strong>de</strong> alguma f será a mesma que a não pontuada[ f] pois o contexto<br />
em geral <strong>de</strong>ixa claro em que categoria estamos. Existe uma aplicação (esquecimento)<br />
entre [Z, Y] e {Z, Y}, que leva [ f] em [ f], sendo esta ultima a classe <strong>de</strong> homotopia<br />
consi<strong>de</strong>rada sem ponto base. Esta aplicação em geral não é uma bijeção. Outro fator<br />
importante a ser consi<strong>de</strong>rado é quando os espaços não são conexos por caminho. Neste<br />
caso os conjuntos po<strong>de</strong>m mudar muito se mudamos as escolhas dos pontos bases<br />
em componentes conexas por caminho diferentes, por isto, estaremos consi<strong>de</strong>rando<br />
em geral espaços conexos por caminho quando estivermos trabalhando na categoria<br />
pontuada. Nestas condições, para uma boa quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> tipos <strong>de</strong> espaços topológicos<br />
(conexos) a mudança do ponto base vem acompanhada com uma bijeção natural entre<br />
o conjunto das classes correspon<strong>de</strong>ntes, por isso a notação simplificada não atrapalha.<br />
Neste contexto temos <strong>de</strong>formações pontuadas e vale o lema abaixo.<br />
Lema 2.2 Se existe uma <strong>de</strong>formação <strong>de</strong> X em A (ponto base em A) então i∗ : [Z, A] → [Z, X]<br />
é uma bijeção on<strong>de</strong> i é a inclusão <strong>de</strong> A em X.<br />
O Grupo Fundamental <strong>de</strong> um espaço topológico<br />
Seja X um espaço topológico conexo por caminhos e p um ponto em X , temos então<br />
o par (X, p), vamos <strong>de</strong>finir o grupo fundamental <strong>de</strong>ste espaço topológico pontuado,<br />
que será <strong>de</strong>notado π1(X, p) ou mais abreviadamente π1(X).<br />
Uma aplicação f : [0, 1] → X é um caminho em X ligando f(a) a f(b), se temos<br />
outro caminho g tal que g(0) = f(1), po<strong>de</strong>mos fazer a concatenação <strong>de</strong>stes caminhos,<br />
<strong>de</strong>finindo um caminho ( f ⊙ g) : [0, 1] → X por ( f ⊙ g)(t) = f(2t) se 0 ≤ t ≤ 1/2 e<br />
( f ⊙ g)(t) = g(2t−1) se 1/2 ≤ t ≤ 1, que percorrerá, no mesmo "tempo" [0, 1], os<br />
dois caminhos dados na or<strong>de</strong>m pré estabelecida. Po<strong>de</strong>mos também <strong>de</strong>finir o caminho<br />
inverso <strong>de</strong> f , isto é, ele percorre o mesmo caminho que faz f , porem no sentido<br />
contrário, <strong>de</strong>notemos por f − este caminho que é <strong>de</strong>finido por f − (t) = f(1−t), t ∈<br />
[0, 1].<br />
É fácil ver que a concatenação <strong>de</strong> caminhos não é associativa, isto é, ( f ⊙ g)⊙h é<br />
em geral diferente <strong>de</strong> f ⊙(g⊙h).<br />
Seja (S 1 , q) o circulo pontuado, conforme a conveniência da notação, o circulo<br />
será visto como subespaço <strong>de</strong> R 2 ou dos complexos C ou como quociente <strong>de</strong> [0, 1]<br />
ou [0, 2π] ou [a, b], pelos seus pontos extremos, neste caso o ponto base será o ponto<br />
correspon<strong>de</strong>nte aos i<strong>de</strong>ntificados.<br />
Note que se X não for conexo por caminhos, o que estaremos fazendo nesta seção<br />
é <strong>de</strong>finir o grupo fundamental da componente conexa por caminhos do ponto base p,<br />
por isso, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o começo, tomamos por facilida<strong>de</strong>, X conexo por caminhos.
2.2: Topologia Algébrica 11<br />
Dada aplicação <strong>de</strong> f : (S 1 , q) → (X, p) obtém-se <strong>de</strong> forma natural aplicação<br />
correspon<strong>de</strong>nte f ′ : ([a, b],{a, b}) → (X, p) e vice-versa, além disso, f ∼ g se e somente<br />
se f ′ ∼ g ′ .<br />
Estas aplicações são chamadas laços em X com ponto base p.<br />
Notemos que uma homotopia <strong>de</strong> laços, é uma homotopia fs tal que ∀s ∈ [0, 1] fs é<br />
um laço em (X, p).<br />
Como um laço é um caso especial <strong>de</strong> caminho, po<strong>de</strong>mos fazer a concatenação<br />
<strong>de</strong> laços. Como foi observado anteriormente, a concatenação <strong>de</strong> caminhos, ou<br />
particularmente <strong>de</strong> laços, não é associativa porém se consi<strong>de</strong>rarmos as classes <strong>de</strong><br />
homotopia <strong>de</strong> laços vemos que os dois laços( f ⊙ g)⊙h e f ⊙(g⊙h) são homotópicos,<br />
logo em [([0, 1],{0, 1}),(X, p)] , [( f ⊙ g)⊙h] e [ f ⊙(g ⊙ h)] são o mesmo elemento.<br />
Temos portanto uma boa <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> um produto no conjunto [([0, 1],{0, 1}),(X, p)]<br />
dado por[ f].[g] = [ f ⊙ g].<br />
Definição 2.2 O grupo fundamental <strong>de</strong> X em p, <strong>de</strong>notado π1(X, p), é o conjunto das<br />
classes <strong>de</strong> homotopia baseada <strong>de</strong> laços em X com ponto base p, ou seja, o conjunto<br />
[([0, 1],{0, 1}),(X, p)] (ou [(S 1 , q),(X, p)]) com o produto [ f].[g] = [ f ⊙ g], elemento<br />
inverso[ f] −1 = [ f − ] e elemento neutro dado pela classe do caminho constante em p.<br />
A prova <strong>de</strong> que a operação acima é bem <strong>de</strong>finida e que realmente dá ao conjunto<br />
um estrutura <strong>de</strong> grupo, é extensa, omitiremos.<br />
Definição 2.3 Homomorfismo induzido por aplicação contínua Dada uma aplicação F :<br />
(X, x0) → (Y, y0), <strong>de</strong>fine-se um homomorfismo F∗ : π1(X, x0) → π1(Y, y0), por F∗([ f]) =<br />
[F◦ f].<br />
É fácil verificar que F∗ é um homomorfismo <strong>de</strong> grupos, que Id (X,x0)∗ = Id π1(X,x0)<br />
e que (G ◦ F)∗ = G∗ ◦ F∗, em outras palavras se <strong>de</strong>notássemos F∗ por π1(F) então<br />
π1 é um funtor covariante da categoria dos espaços topológicos baseados e aplicações<br />
contínuas baseadas na categoria dos grupos e homomorfismos <strong>de</strong> grupos.<br />
Não é difícil ver que no caso <strong>de</strong> o espaço ser conexo por caminhos e mudarmos<br />
o ponto base, obtemos grupos fundamentais isomorfos, por isso às vezes omitimos o<br />
ponto base.<br />
Exemplos<br />
1. É fácil mostrar que se X for convexo ou contraível então π1(X) = (0).<br />
2. Seja (X, p) = (S 1 , 1) e usemos por conveniência o intervalo [0, 2π] como domínio<br />
dos laços para π1(S 1 , 1). É possível provar que todo laço f : ([0, 2π],{0, 2π}) → (S 1 , 1)<br />
é homotópico à um dos laços fn(θ) = e i.n.θ , n ∈ Z e que ( f i ⊙ f j) ∼ f i+j, concluímos<br />
que π1(S 1 , 1) ≈ Z.<br />
3. Sejam (X, p) e (Y, q) espaços topológicos pontuados, é fácil verificar que π1(X ×<br />
Y,(p, q)) ≈ π1(X, p)× π1(Y, q).
12 Capítulo 2: Pré-requisitos<br />
Para a <strong>de</strong>monstração do proximo teorema, veja por exemplo [Armstrong] pagina<br />
138.<br />
Teorema 2.1 (Teorema <strong>de</strong> Seifert-van Kampen)<br />
Sejam X = A∪B espaços topológicos, i : A ֒→ X e j : B ֒→ X as inclusões, on<strong>de</strong> A, B e<br />
A∩Bsão subespaços conexos <strong>de</strong> X e consi<strong>de</strong>re o ponto base <strong>de</strong>stes espaços x0 ∈ A∩ B.<br />
Suponha que os grupos fundamentais <strong>de</strong> A, B e A ∩ B sejam dados pelas apresentações:<br />
π1(A, x0) =< a1, a2, .... | r1, r2, ..... >, π1(B, x0) =< b1, b2, .... | s1, s2, ..... ><br />
e π1(A∩B, x0) =< c1, c2, .... | t1, t2, ..... >, então:<br />
π1(X, x0) =< a1, a2, ...., b1, b2, .... | r1, r2, ....., s1, s2, ....., i∗(c1) = j∗(c1), i∗(c2) =<br />
j∗(c2), ... >.<br />
A <strong>de</strong>finição dos grupos <strong>de</strong> homotopia <strong>de</strong> dimensão maior cabe (sem as<br />
<strong>de</strong>monstrações, é claro!) neste cantinho, vejamos:<br />
πq(X, x0) é o conjunto das classes <strong>de</strong> homotopia relativa <strong>de</strong> aplicações <strong>de</strong> pares<br />
f : (I q , ∂I q ) → (X, x0).<br />
Dadas duas <strong>de</strong>stas aplicações po<strong>de</strong>mos concentrar cada uma <strong>de</strong>las em uma<br />
"meta<strong>de</strong>"do q-cubo I q , <strong>de</strong>finindo assim, a soma <strong>de</strong> duas <strong>de</strong>stas funções que, em nível<br />
<strong>de</strong> homotopia, fica bem <strong>de</strong>finida.<br />
Desta forma o conjunto ganha uma operação tornando-se um grupo abeliano pois<br />
em dimensão≥ 2 é possível concentrar um pouco mais as funções <strong>de</strong>ntro dos q-cubos<br />
e "rodar"os domínios <strong>de</strong>stas funções concentradas, trocando-as <strong>de</strong> posição <strong>de</strong>ntro do qcubo<br />
inicial. O elemento neutro e os inversos são <strong>de</strong>finidos <strong>de</strong> forma natural, trocandose<br />
as orientações do cubo em que estão <strong>de</strong>finidas.<br />
Da mesma forma que no grupo fundamental, dada aplicação contínua F :<br />
(X, x0) → (Y, y0) <strong>de</strong>fine-se F∗q : πq(X, x0) → πq(Y, y0) por F∗q([ f]) = [F ◦ f] e<br />
verifica-se facilmente que F∗q é um homomorfismo, que se chamado π∗q(F), mostranos<br />
que π∗q é um funtor covariante da categoria dos espaços topológicos pontuados<br />
na categoria dos grupos abelianos.<br />
2.2.2 O básico <strong>de</strong> Homologia<br />
Uma boa sugestão para leitura é o novo livro do Elon, [Elon2].<br />
Os axiomas <strong>de</strong> Eilenberg-Steenrod<br />
A <strong>Teoria</strong> <strong>de</strong> Homologia é importante instrumento da Topologia Algébrica. É usada<br />
em diversas outras áreas da matemática. Foi sistematizada através dos Axiomas <strong>de</strong><br />
Eilenberg-Steenrod o que facilita muito a sua utilização. Estaremos focalizando a<br />
categoria dos pares <strong>de</strong> espaços topológicos e aplicações contínuas entre estes pares.<br />
Consi<strong>de</strong>ramos a i<strong>de</strong>ntificação X = (X, ∅), bem como as inclusões naturais <strong>de</strong>rivadas<br />
do par <strong>de</strong> espaços(X, A), que são:
2.2: Topologia Algébrica 13<br />
(A, A)<br />
ր ց<br />
(∅, ∅) → (A, ∅) (X, A) → (X, X)<br />
ց ր<br />
(X, ∅)<br />
São os seguintes os dados para uma teoria <strong>de</strong> homologia.<br />
A cada par <strong>de</strong> espaços (X, A) e para cada inteiro q, po<strong>de</strong>-se associar, <strong>de</strong> maneira<br />
bem <strong>de</strong>finida, grupos abelianos Hq(X, A) e homomorfismos <strong>de</strong>nominados operadores<br />
bordo<br />
∂q = ∂ (X,A,q) : Hq(X, A) → Hq−1(A),<br />
Além disso, para toda f : (X, A) → (Y, B) e para todo q inteiro po<strong>de</strong>-se associar<br />
homomorfismos <strong>de</strong> grupos:<br />
ou, abreviadamente:<br />
fq = (Hq( f)) : Hq(X, A) → Hq(Y, B),<br />
f∗ : H∗(X, A) → H∗(Y, B) e ∂∗ : H∗(X, A) → H∗−1(A) e ∂∗ : H∗(Y, B) → H∗−1(B).<br />
Para cada q, Hq é um funtor covariante.<br />
Eilenberg e Steenrod <strong>de</strong>ram, em 1945, uma <strong>de</strong>scrição axiomática da <strong>Teoria</strong> da<br />
Homologia Relativa, estabelecendo os seguintes axiomas.<br />
Axioma 2.1 (I<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>) Se Id : (X, A) → (X, A) é a função i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>, então Idq :<br />
Hq(X, A) → Hq(X, A) é a i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Hq(X, A) para todo inteiro q.<br />
Axioma 2.2 (Composição) Se f : (X, A) → (Y, B) e g : (Y, B) → (Z, C) são aplicações <strong>de</strong><br />
pares, então (g◦ f)q = gq◦ fq para todo inteiro q.<br />
Axioma 2.3 Se f : (X, A) → (Y, B) e f ′ : A → B é <strong>de</strong>finida por restrição <strong>de</strong> f então, o<br />
diagrama abaixo é comutativo para todo inteiro q.<br />
Hq(X, A)<br />
↓ fq<br />
Hq(Y, B)<br />
∂∗<br />
−→ Hq−1(A)<br />
↓ f ′ q−1<br />
∂∗<br />
−→ Hq−1(B)<br />
Axioma 2.4 (Seqüência Exata) Para todo par (X, A) fica associada uma seqüência exata <strong>de</strong><br />
grupos, <strong>de</strong>nominada seqüência <strong>de</strong> homologia do par(X, A);<br />
... → Hq(A)<br />
iq<br />
−→ Hq(X)<br />
jq<br />
−→ Hq(X, A)<br />
∂q<br />
−→ Hq−1(A) i q−1<br />
−→ Hq−1(X) → ...<br />
Axioma 2.5 (Homotopia) Se as aplicações f e g : (X, A) → (Y, B) são homotópicas, então,<br />
fq = gq para todo inteiro q.
14 Capítulo 2: Pré-requisitos<br />
Axioma 2.6 (Excisão) Se U é um aberto <strong>de</strong> X tal que o fecho <strong>de</strong> U, esta contido no interior<br />
<strong>de</strong> A, então, a aplicação inclusão e : (X − U, A − U) → (X, A) induz isomorfismos<br />
eq : Hq(X − U, A− U) ≈<br />
−→ Hq(X, A), para todo inteiro q.<br />
Axioma 2.7 (Coeficiente) Se P é um espaço topológico unitário, então, Hq(P) = 0 se q = 0.<br />
Se P é espaço topológico unitário e fixamos H0(P) = G então G é chamado grupo dos<br />
coeficientes da teoria <strong>de</strong> homologia em questão.<br />
Daremos adiante um pouco do que é preciso para se construir uma teoria <strong>de</strong> homologia<br />
na qual fixaremos Z como grupo dos coeficientes (po<strong>de</strong> ser qualquer anel comutativo<br />
com unida<strong>de</strong>).<br />
Alguns Resultados que se obtém diretamente dos axiomas<br />
Proposição 2.1 Os grupos <strong>de</strong> homologia são invariantes do tipo <strong>de</strong> homotopia, isto é, se<br />
f : (X, A) → (Y, B) é uma equivalência <strong>de</strong> homotopia, então f∗ : H∗(X, A) ≈ → H∗(Y, B).<br />
Demonstração: Sejam (X, A), (Y, B) pares <strong>de</strong> espaços que tem o mesmo tipo <strong>de</strong><br />
homotopia, isto é, existem f : (X, A) → (Y, B) e g : (Y, B) → (X, A) tal que ( f ◦ g) e<br />
(g◦ f) são homotópicas a i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>.<br />
Então, os axiomas 2 e 5 fornecem: (g◦ f)∗ = g∗ ◦ f∗ = Id e ( f ◦ g)∗ = f∗ ◦ g∗ = Id ,<br />
logo f∗ : H∗(X, A) ≈ → H∗(Y, B) e g∗ : H∗(Y, B) ≈ → H∗(X, A), são isomorfismos.<br />
Como já vimos As aplicações f e g acima <strong>de</strong>nominam-se equivalências <strong>de</strong> homotopia<br />
e os pares <strong>de</strong> espaços são chamados equivalentes homotópicos.<br />
Proposição 2.2 Para todo espaço topológico X temos H∗(X, X) = 0.<br />
Demonstração: Pelo axioma 4 temos a seqüência exata <strong>de</strong> homologia do par(X, X):<br />
... → Hq(X) iq<br />
→ Hq(X) jq<br />
→ Hq(X, X) ∂q<br />
→ Hq−1(X) i q−1<br />
→ Hq−1(X) → ...<br />
Logo, para todo q, iq é o isomorfismo i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> e, portanto, ker iq = 0 e Im iq =<br />
Hq(X).<br />
Como a seqüência é exata, temos que ker jq = Im iq = Hq(X).<br />
Temos então que Im jq = 0 (*).<br />
Como Im ∂q = ker iq−1 = 0 temos que ker ∂q = Hq(X, X) (**).<br />
Mas, Im jq = ker ∂q logo (*) e (**) fornecem Hq(X, X) = 0 para todo inteiro q.<br />
Proposição 2.3 Se A ⊂ X é um retrato <strong>de</strong> X, então, H∗(X) ≈ H∗(A)⊕ H∗(X, A).<br />
Demonstração: Como A i<br />
−→ X r<br />
−→ A, é tal que, r ◦ i = Id A e, portanto, rq ◦ iq =<br />
id. Temos que iq é injetora e rq é sobrejetora. Consi<strong>de</strong>remos a seqüência exata <strong>de</strong><br />
homologia do par(X, A): ... → Hq+1(X, A) ∂q+1 iq<br />
−→ Hq(A) −→ Hq(X) → ...<br />
Como i∗ é injetora, ∂∗ = 0. Obtemos então uma família <strong>de</strong> seqüências exatas curtas:<br />
0 → Hq(A)<br />
iq<br />
jq<br />
−→ Hq(X) −→ Hq(X, A) → 0.
2.3: O básico <strong>de</strong> Topologia Diferencial 15<br />
Consi<strong>de</strong>remos a aplicação contínua π = i◦r : X → X.<br />
Verifica-se que πq = iq ◦ rq : Hq(X) → Hq(X) é um projetor do grupo abeliano Hq(X),<br />
isto é:<br />
πq◦ πq = (iq◦ rq)◦(iq◦ rq) = iq◦(rq◦ iq)◦rq = iq◦ rq = πq, logo Hq(X) ≈ Imπq⊕ kerπq<br />
Como rq é sobrejetora e iq é injetora, vem que Imπq = Imiq = iq(Hq(A)) ≈ Hq(A).<br />
Então, Hq(X) ∼ = iq(Hq(A))⊕ ker πq e, portanto, ker πq ≈ Hq(X)/iq(Hq(A)).<br />
Das seqüências exatas curtas acima <strong>de</strong>corre que Hq(X)/iq(Hq(A)) ∼ = Hq(X, A) e daí<br />
Hq(X) ≈ iq(Hq(A))⊕Hq(X, A) ≈ Hq(A)⊕ Hq(X, A) para todo inteiro q.<br />
Observação Seja {x0} sub espaço constituído <strong>de</strong> um único ponto <strong>de</strong> X, {x0} ⊂ X,<br />
então:<br />
Hq(X) ≈ Hq({x0})⊕ Hq(X,{x0}) logo,<br />
Hq(X) ≈ Hq(X,{x0}) para todo q = 0 e H0(X) ≈ Z⊕H0(X,{x0})<br />
2.3 O básico <strong>de</strong> Topologia Diferencial<br />
Acredito que todos saibam o que é uma curva ou uma superfície, no plano ou no<br />
espaço, como dar uma parametrização, achar vetor tangente ou plano tangente, etc.<br />
Curvas, surgem por exemplo como gráfico <strong>de</strong> aplicações <strong>de</strong>RemResuperfícies como<br />
gráficos <strong>de</strong> aplicações <strong>de</strong>R 2 emR. Se estas aplicações são contínuas, diferenciáveis <strong>de</strong><br />
várias or<strong>de</strong>ns, etc., as respectivas curvas e superfícies terão proprieda<strong>de</strong>s específicas.<br />
Consi<strong>de</strong>rando estes objetos, mergulhados nos respectivos ambientes R 2 ou R 3<br />
eles herdam <strong>de</strong>stes espaços uma topologia, até mesmo uma métrica. Se os objetos<br />
forem dados por aplicações diferenciáveis eles também herdam uma "estrutura<br />
diferenciável"do ambiente, isto é, se temos dois <strong>de</strong>stes objetos po<strong>de</strong>mos falar <strong>de</strong><br />
aplicações diferenciáveis entre eles. Se os objetos tem apenas uma estrutura topológica<br />
então temos que nos restringir a aplicações contínuas entres eles, ou seja, utilizamos a<br />
categoria que seja possível em cada caso.<br />
Objetos <strong>de</strong> maiores dimensões surgem naturalmente, porem temos mais<br />
dificulda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> "visualizá-los". Utilizamos para isso nosso treinamento e nossa<br />
confiança em manipular dados algébricos e analíticos para se ter uma visão geométrica<br />
"multidimensional"<strong>de</strong>stes objetos. Muitas vezes utilizamos visões projetadas em<br />
espaços <strong>de</strong> dimensões menores, dos objetos em estudo, como fazemos com o estudo<br />
da Geometria Espacial através da Geometria Descritiva.<br />
Gráficos <strong>de</strong> funções <strong>de</strong> R k em R são objetos <strong>de</strong> dimensão k em R k+1 . Po<strong>de</strong>mos<br />
também parametrizar objetos <strong>de</strong> dimensão k em algum R k+i , i ≥ 2, etc. Se algum<br />
<strong>de</strong>stes objetos tem a proprieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> que todos os seus pontos possuem vizinhanças<br />
homeomorfas (difeomorfas) a um R n , com n fixo, dizemos que este objeto é uma<br />
varieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> dimensão n. As curvas são varieda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> dimensão 1, as superfícies<br />
são varieda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> dimensão 2, etc.<br />
Quando selecionamos as varieda<strong>de</strong>s que possuem estrutura diferenciável e<br />
portanto po<strong>de</strong>mos falar das aplicações entre elas que são diferenciáveis, estamos<br />
falando da categoria que normalmente é chamada categoria das varieda<strong>de</strong>s<br />
diferenciáveis, abreviadamente DIFF.
16 Capítulo 2: Pré-requisitos<br />
É importante salientar que é possível <strong>de</strong>screver esta categoria sem fazer nenhuma<br />
alusão aos mergulhos <strong>de</strong>stes objetos no R n . Quando adotamos esta forma fica claro<br />
que po<strong>de</strong>mos falar em varieda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> classe C k , quando as varieda<strong>de</strong>s possuem<br />
parametrizações <strong>de</strong> classe C k e as aplicações entre elas também são <strong>de</strong> classe C k .<br />
Outra categoria importante são as varieda<strong>de</strong>s topológicas, classe C 0 , com as<br />
aplicações contínuas entre elas.<br />
Quando estamos trabalhando com objetos que po<strong>de</strong>m ser triangularizáveis, isto é,<br />
po<strong>de</strong>mos achar um poliedro homeomorfo ao dito objeto, e consi<strong>de</strong>ramos as aplicações<br />
(contínuas) entre estes objetos que correspon<strong>de</strong>m a aplicações lineares afins entre os<br />
poliedros correspon<strong>de</strong>ntes, dizemos que estamos na categoria PL.<br />
Todas são sub categorias da categoria dos espaços topológicos e aplicações<br />
contínuas (TOP).<br />
Definição 2.4 Uma varieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> dimensão n, W n é um espaço topológico que po<strong>de</strong> se coberto<br />
por imagens bijetivas <strong>de</strong> aplicações contínuas (cartas ou parametrizações) x : U → W n on<strong>de</strong><br />
U é um aberto <strong>de</strong> R n , x(U) é aberto <strong>de</strong> W n e cada x : U → x(U) é um homeomorfismo.<br />
Se para duas quaisquer cartas, x1 e x2 cujas imagens se interceptam, tivermos que a aplicação<br />
composta (mudanças <strong>de</strong> coor<strong>de</strong>nadas!) x −1<br />
2 ◦ x1 : x −1<br />
1 (U1 ∩ U2) → x2(U1 ∩ U2) for PL<br />
ou diferenciável (digamos <strong>de</strong> classe C k ), dizemos que W n é uma varieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> classe C k , se as<br />
mudanças <strong>de</strong> coor<strong>de</strong>nadas só forem PL ou contínuas dizemos que W n é uma varieda<strong>de</strong> PL ou<br />
topológica.<br />
Como vimos antes, muitas vezes já supomos que o espaço W n , ao qual se quer dar<br />
uma estrutura <strong>de</strong> varieda<strong>de</strong>, já se situa em algum R N e as cartas são parametrizações<br />
que generalizam os conceitos clássicos <strong>de</strong> curvas e superfícies parametrizadas. Esta<br />
forma <strong>de</strong> <strong>de</strong>finir varieda<strong>de</strong>s é mais prática e é aceitável já que existem teoremas que<br />
provam que, uma gran<strong>de</strong> parte das varieda<strong>de</strong>s no sentido geral da <strong>de</strong>finição acima,<br />
sempre mergulha <strong>de</strong> forma a<strong>de</strong>quada em algumR N com N não tão gran<strong>de</strong>.<br />
Uma aplicação entre duas varieda<strong>de</strong>s N n e M m é dita PL ou diferenciável <strong>de</strong><br />
classe C k , se quando escrita em coor<strong>de</strong>nadas (compondo com cartas locais no domínio<br />
e no contra-domínio) forem PL ou <strong>de</strong> classe C k como aplicações entre os abertos<br />
correspon<strong>de</strong>ntes <strong>de</strong> R n e R m . Se k = 0 dizemos que a aplicação é continua e o<br />
caso C 0 corespon<strong>de</strong> à categoria topológica.<br />
Exemplos <strong>de</strong> Varieda<strong>de</strong>s:<br />
1. R n ou qualquer <strong>de</strong> seus abertos são varieda<strong>de</strong>s <strong>de</strong> dimensão n.<br />
2. S n = {(x1, x2, .., xn+1) ∈ R n+1 com (x1, x2, .., xn+1) = 1} a esfera unitária <strong>de</strong> R n+1<br />
é uma varieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> dimensão n.<br />
3. O produto cartesiano <strong>de</strong> duas varieda<strong>de</strong>s é uma varieda<strong>de</strong>.<br />
Uma varieda<strong>de</strong> com bordo se <strong>de</strong>fine como acima só que pedimos que os domínios<br />
U são abertos <strong>de</strong> H n = {(x1, x2, .., xn) ∈ R n , com xn ≥ 0}. Observe então que po<strong>de</strong>mos<br />
ter pontos <strong>de</strong> dois tipos, um tipo on<strong>de</strong> sua vizinhança são os abertos U que se situam
2.3: O básico <strong>de</strong> Topologia Diferencial 17<br />
em {(x1, x2, .., xn) ∈ R n , com xn > 0} que são abertos usuais <strong>de</strong> R n e outros pontos<br />
cuja vizinhança tem a forma <strong>de</strong> H n , estes serão os pontos do bordo da varieda<strong>de</strong><br />
consi<strong>de</strong>rada.<br />
Exemplos <strong>de</strong> Varieda<strong>de</strong>s com bordo:<br />
1. H n é uma varieda<strong>de</strong> com bordo, seu bordo é ∂H n = {(x1, x2, .., xn) ∈ R n , com xn =<br />
0} = R n−1 e o seu interior é int(H n ) = {(x1, x2, .., xn) ∈ R n , com xn > 0}.<br />
2. D n = {(x1, x2, .., xn) ∈ R n com (x1, x2, .., xn) ≤ 1} o disco unitário <strong>de</strong> R n é uma<br />
varieda<strong>de</strong> com bordo, seu bordo é a esfera S n−1 . O interior <strong>de</strong> D n é uma varieda<strong>de</strong><br />
aberta. Usa-se a terminologia varieda<strong>de</strong> fechada para uma varieda<strong>de</strong> compacta e sem<br />
bordo, como S n .<br />
3. I n = [0, 1] n o n-cubo <strong>de</strong> R n é uma varieda<strong>de</strong> com bordo <strong>de</strong> dimensão n, seu bordo<br />
é homeomorfa à esfera S n−1 , um caso particular é I = [0, 1] o intervalo da reta que é<br />
uma varieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> dimensão 1 e seu bordo é {0, 1} (compare com o exemplo anterior).<br />
Exercício: Encontre todas as varieda<strong>de</strong>s conexas <strong>de</strong> dimensão 1, com ou sem bordo, a<br />
menos <strong>de</strong> homeomorfismo.<br />
Uma superfície bastante popular, a faixa <strong>de</strong> Möbius, é obtida do quadrado I 2 =<br />
{(x, y) ∈ R 2 tal que 0 ≤ x ≤ 1 e 0 ≤ y ≤ 1} i<strong>de</strong>ntificando-se os pontos do<br />
segmento à esquerda(0, y) ∈ I 2 com os pontos correspon<strong>de</strong>ntes aos segmento à direita<br />
(1, 1− y) ∈ I 2 , on<strong>de</strong> 0 ≤ y ≤ 1. Vamos <strong>de</strong>notar a Faixa <strong>de</strong> Möbius porM 2 . Note que o<br />
seu interior, isto é M 2 menos o seu bordo ∂M 2 (que é homeomorfo à um circulo S 1 !)(é<br />
também chamada faixa <strong>de</strong> Möbius). M 2 é o protótipo da superfície não orientável, isto<br />
é, ela só tem um lado!!<br />
Qualquer superfície será dita não orientável se contiver uma sub-superfície<br />
homeomorfa aM 2 , caso contrario será dita orientável.<br />
Po<strong>de</strong>mos criar um protótipo para uma varieda<strong>de</strong> não orientada <strong>de</strong> dimensão n,<br />
basta consi<strong>de</strong>rar o n-cubo I n = {(x1, x2, ....., xn) on<strong>de</strong> 0 ≤ x i ≤ 1 ∀ i = 1, 2, ..., n}<br />
e i<strong>de</strong>ntificar os pontos do (n-1)-cubo "à esquerda"{(0, x2, x3..., xn) ∈ I n on<strong>de</strong> 0 ≤<br />
x i ≤ 1 ∀i = 2, ..., n} com os pontos correspon<strong>de</strong>ntes ao (n-1)-cubo "à direita"<br />
{(0, 1− x2, x3..., xn) ∈ I n , on<strong>de</strong> 0 ≤ x i ≤ 1 ∀i = 2, ..., n}, assim obtemos a varieda<strong>de</strong><br />
compacta com bordo que <strong>de</strong>notaremosM n .<br />
Uma varieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> dimensão n será não orientável se contiver uma sub-varieda<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> dimensão n homeomorfa aM n , caso contrário será dita orientável.<br />
Para uma varieda<strong>de</strong> orientável é possível escolher duas orientações, quando feita<br />
esta escolha dizemos que temos uma varieda<strong>de</strong> orientada.<br />
Construindo varieda<strong>de</strong>s
18 Capítulo 2: Pré-requisitos<br />
Já observamos que o produto cartesiano <strong>de</strong> duas varieda<strong>de</strong>s é uma varieda<strong>de</strong>.<br />
Po<strong>de</strong>mos construir com isso muitas varieda<strong>de</strong>s, usando algumas que já conhecemos.<br />
Uma outra forma <strong>de</strong> construir varieda<strong>de</strong>s e tomar duas varieda<strong>de</strong>s com bordos<br />
homeomorfos (difeomorfos) e colá-las através do bordo usando um homeomorfismo<br />
(difeomorfismo).<br />
Uma operação bastante importante na categoria das varieda<strong>de</strong>s é a soma conexa<br />
<strong>de</strong> duas varieda<strong>de</strong>s.<br />
Definição 2.5 Dadas duas varieda<strong>de</strong>s M1 e M2 <strong>de</strong> mesma dimensão n a soma conexa<br />
M1♯M2 é <strong>de</strong>finida da seguinte forma: escolha discos D n 1 ⊂ M1 e D n 2 ⊂ M2 remova os interiores<br />
1 = ∂Dn 1 e Sn−1<br />
2 = ∂Dn 2 ,<br />
"colamos" estas esferas através <strong>de</strong> um homeomorfismo (ou um homeomorfismo PL se estamos<br />
nesta categoria ou um difeomorfismo se as varieda<strong>de</strong>s forem diferenciáveis) ϕ : Sn 1 Sn 2<br />
obtemos a soma conexa M1♯M2.<br />
<strong>de</strong>stes discos. Nas varieda<strong>de</strong>s surgem as componentes <strong>de</strong> bordo S n−1<br />
Teorema 2.2 Classificação <strong>de</strong> Superfícies As superfícies, conexas, compactas e sem bordo<br />
são classificadas, a menos <strong>de</strong> homeomorfismo, segundo a lista:<br />
1. Orientáveis: a esfera S2 , o toro T2 = (S1 × S1 ) e as somas conexas <strong>de</strong> toros, ♯ g<br />
i=1 (T2 )<br />
on<strong>de</strong> g = 1, 2, 3, .... é chamado genus da superfície orientável correspon<strong>de</strong>nte. Diz-se que S2 tem genus 0.<br />
2. Não orientáveis: o espaço projetivo RRP 2 e somas conexas <strong>de</strong> espaços projetivos,<br />
♯ g<br />
i=1 (RRP2 ) on<strong>de</strong> g = 1, 2, 3, .... é chamado genus da superfície não orientável correspon<strong>de</strong>nte.<br />
Detalhes e <strong>de</strong>monstrações po<strong>de</strong>m ser vistas em [Moise] ou [Massey].<br />
A classificação das superfícies compactas e conexas com bordo é feita da<br />
seguinte forma: Verifique se as duas superfícies dadas tem a mesma quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
componentes <strong>de</strong> bordo (que necessariamente são um número finito <strong>de</strong> círculos S 1 ), se<br />
estas quantida<strong>de</strong>s forem diferentes então as superfícies são diferentes, se forem iguais,<br />
então cole um disco D 2 em cada componente <strong>de</strong> bordo <strong>de</strong> cada superfície, fazendo com<br />
que as mesmas se tornem superfícies sem bordo. Use o teorema acima para verificar<br />
se as duas superfícies, conexas, compactas e sem bordo obtidas são homeomorfas, se<br />
forem, então as iniciais também serão.<br />
As superfícies são espaços topológicos triangularizáveis, isto é, são homeomorfas<br />
a poliedros montados (<strong>de</strong> forma regulamentada) com vértices, arestas e faces<br />
triangulares. As superfícies compactas terão um número finito <strong>de</strong>stes ingredientes.<br />
Defini-se a Característica <strong>de</strong> Euler <strong>de</strong> uma superfície compacta M por χ(M) =<br />
número <strong>de</strong> vértices - número <strong>de</strong> arestas + número <strong>de</strong> faces, obtidos <strong>de</strong> qualquer<br />
triangulação <strong>de</strong> M. Prova-se que este número χ(M) não <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da triangulação (só<br />
<strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da classe <strong>de</strong> homeomorfismo da superfície), isto é, χ(M) é um invariante<br />
topológico e é usado para distinguir as superfícies acima <strong>de</strong>scritas.<br />
É fácil obter o seguinte resultado:
2.3: O básico <strong>de</strong> Topologia Diferencial 19<br />
Proposição 2.4 Se M é orientável então seu genus g = [2−χ(M)]/2 e se M é não orientável<br />
então g = [2− χ(M)].<br />
Definição 2.6 Dada varieda<strong>de</strong>s M m e N n , n ≤ m se diz que N n é sub-varieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> M m<br />
se N n ⊂ M m e se for possível parametrizar os pontos <strong>de</strong> N n , vistos como pontos <strong>de</strong> M m , por<br />
cartas x : R m → M m tal que x |R n: Rn → N n sejam cartas para N n .<br />
Definição 2.7 Seja f : N n → M m uma aplicação contínua (PL, diferenciável, etc.) entre duas<br />
varieda<strong>de</strong>s, isto é, um morfismo na categoria correspon<strong>de</strong>nte. Se f : N n → f(N n ) = imagem<br />
<strong>de</strong> f em M m for um homeomorfismo (PL, difeomorfismo, etc.), então dizemos que f é um<br />
mergulho <strong>de</strong> N n em M m .<br />
Dizemos que N ⊂ M tem colarinho duplo se existe mergulho i : N×[−1, 1] ֒→ M<br />
tal que i(x, 0) = x, ∀ x ∈ N, nesta situação N n é dita mansa em M m .<br />
Definição 2.8 Seja N n uma subvarieda<strong>de</strong> compacta topológica <strong>de</strong> uma varieda<strong>de</strong> PL, M m .<br />
Dizemos que N n é uma subvarieda<strong>de</strong> mansa em M m se existir um homeomorfismo PL h :<br />
M m M m tal que h(N n ) é uma subvarieda<strong>de</strong> PL <strong>de</strong> M m .<br />
A existência <strong>de</strong>stes mergulhos e, caso existam, a sua classificação são objetivos <strong>de</strong><br />
estudo da <strong>Teoria</strong> <strong>de</strong> Mergulhos entre varieda<strong>de</strong>s, da qual a <strong>Teoria</strong> <strong>de</strong> <strong>Nós</strong> é um caso<br />
particular.
20 Capítulo 2: Pré-requisitos
Capítulo 3<br />
<strong>Teoria</strong> Clássica <strong>de</strong> <strong>Nós</strong><br />
3.1 Introdução<br />
Sobre a <strong>Teoria</strong> Clássica dos <strong>Nós</strong>, temos, em português, o livro do Derek [Hacon].<br />
apresentado no XV Colóquio Brasileiro <strong>de</strong> Matemática, que é muito gostoso <strong>de</strong> ler e<br />
estudar, por isso sempre que possível estaremos fazendo referência a ele.<br />
Estudamos neste capítulo a classificação <strong>de</strong> certos mergulhos do círculo S 1 (nós), ou<br />
reunião disjunta <strong>de</strong> vários círculos (enlaçamentos) emR 3 ou S 3 . Não é preciso discutir<br />
sobre a existência <strong>de</strong>stes mergulhos pois existe pelo menos o mergulho padrão, dado<br />
por S 1 = {(cos(θ), sen(θ), 0) ∈ R 3 , com θ ∈ [0, 2π)} ou se preten<strong>de</strong>mos ver o mergulho<br />
como uma função, <strong>de</strong>finimos f : S 1 ֒→ R 3 por f(θ) = (cos(θ), sen(θ), 0). Neste caso<br />
estamos olhando S 1 com o intervalo[0, 2π] on<strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntificamos os seus extremos, outras<br />
vezes olharemos S 1 como o circulo unitário nos complexos, isto é um ponto será da<br />
forma e i.θ . Estaremos também olhando S 3 como a compactificação <strong>de</strong> R 3 e é fácil ver<br />
que existe uma bijeção natural entre os mergulhos ("mansos") do círculo em S 3 e emR 3 ,<br />
por isso, vamos abusar ainda mais da notação, usaremos algumas vezes a notação M 3<br />
para <strong>de</strong>signar indistintamente S 3 ou R 3 . Gostaríamos <strong>de</strong> dizer também que estamos<br />
trabalhando na categoria dos espaços topológicos e aplicações contínuas mas temos<br />
um problema sério aí, a existência <strong>de</strong> nós selvagens. Vejam abaixo um exemplar <strong>de</strong>sta<br />
espécie não tão rara!!.<br />
Figura 3.1: Nó Selvagem<br />
Se voce gosta <strong>de</strong> emoção forte e esta interessado em nós selvagens veja [Milnor] e<br />
[Bro<strong>de</strong>].<br />
21
22 Capítulo 3: <strong>Teoria</strong> Clássica <strong>de</strong> <strong>Nós</strong><br />
Aqui estamos interessados em nós e enlaçamentos mansos ("não selvagens"), que<br />
incluem os diferenciáveis, os diferenciáveis por partes, os lineares por partes (PL), os<br />
<strong>de</strong> colarinho duplo, etc. Estaremos portanto nos restringindo à nós e enlaçamentos<br />
nestas categorias.<br />
Em geral os nós e enlaçamentos são colocados em classes <strong>de</strong> equivalência e se<br />
estuda estas classes. Quando nada se explicitar, estaremos consi<strong>de</strong>rando a relação <strong>de</strong><br />
equivalência dada por isotopia ambiental, isto é:<br />
Definição 3.1 Sejam i0, i1 : S 1 ֒→ M 3 dois nós, dizemos que i0 é ambientalmente isotópico a<br />
i1, se existe uma PL-<strong>de</strong>formação (isotopia que se inicia na i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>), H : M 3 × I → M 3 × I,<br />
dada por H(y, t) = (ht(y), t), on<strong>de</strong> h0 = id M 3 e i1 = h1◦ i0.<br />
A <strong>de</strong>finição <strong>de</strong>sta equivalência para enlaçamentos é similar à acima, por isso não a<br />
apresentamos.<br />
Intuitivamente o que a isotopia ambiental faz é criar um movimento no ambiente<br />
(M 3 ) <strong>de</strong> tal forma que o primeiro nó "K0 = i0(S 1 )" se <strong>de</strong>sloca continuamente<br />
conforme passa o tempo t ∈ [0, 1] até que no final do movimento (t = 1) se situa<br />
exatamente em K1 = i1(S 1 ). Usamos a notação K0 ∼ K1 para indicar que os nós<br />
são equivalentes e K0 ≁ K1 caso contrário. Note que se i k for <strong>de</strong>finida a menos <strong>de</strong><br />
homeomorfismo <strong>de</strong>finido no domínio (neste caso S 1 ) é porque estamos interpretando<br />
os nós essencialmente como suas imagens K0 e K1, e neste caso, a notação acima é bem<br />
mais significativa.<br />
<strong>Nós</strong> e enlaçamentos mansos são aqueles que são isotópicos a nós e enlaçamentos<br />
poligonais, isto é, aqueles que são constituídos por uma seqüencia <strong>de</strong> segmentos <strong>de</strong><br />
reta (PL). Daqui para frente nós e enlaçamentos serão sinônimos <strong>de</strong> nós e enlaçamentos<br />
mansos. Quando não houver perigo <strong>de</strong> confusão i<strong>de</strong>ntificamos um nó ou um<br />
enlaçamentos com sua classe.<br />
Quando fixamos orientação ao (s) círculo (s) e ou a M 3 e exigimos que a relação<br />
<strong>de</strong> equivalência preserve as orientações estaremos falando <strong>de</strong> nós ou enlaçamentos<br />
orientados. Em geral o contexto <strong>de</strong>ixa claro o que se estuda.<br />
Dado um nó ou enlaçamento poligonal emR 3 é sempre possível escolher um plano<br />
<strong>de</strong> tal forma que a projeção do nó sobre este plano tenha características convenientes<br />
quais sejam: ter no máximo pontos duplos e os pontos duplos só ocorrem nos interiores<br />
dos segmentos que constituem o nó. Uma projeção <strong>de</strong>sta forma é chamada projeção<br />
regular do nó.<br />
É claro que a projeção regular <strong>de</strong> um nó não <strong>de</strong>termina sua classe mas se em cada<br />
ponto duplo <strong>de</strong> uma <strong>de</strong>stas projeções <strong>de</strong>signarmos qual o segmento que esta "por<br />
baixo", então a classe do nó fica <strong>de</strong>terminada por esta projeção regular "qualificada".<br />
Uma projeção regular qualificada <strong>de</strong> um nó é chamado um diagrama do nó e as vezes<br />
apenas por projeção regular do nó. Note que em geral apresenta-se um <strong>de</strong>senho do<br />
nó no plano on<strong>de</strong> o trecho que esta por baixo fica interrompido e o nó se apresenta<br />
como uma seqüencia <strong>de</strong> segmentos <strong>de</strong> reta.<br />
Dois diagramas <strong>de</strong> nós ou enlaçamentos são ditos equivalentes se um po<strong>de</strong> ser<br />
transformado no outro por seqüencias <strong>de</strong> movimentos chamados <strong>de</strong> "Rei<strong>de</strong>meister"<br />
que são seis e estão <strong>de</strong>scritos abaixo (em cada <strong>de</strong>senho temos um movimento e seu<br />
correspon<strong>de</strong>nte inverso).<br />
Observe que nos <strong>de</strong>senhos <strong>de</strong>veríamos estar apresentando as projeções dos nós com<br />
linhas poligonais, isto é, por segmentos <strong>de</strong> retas, no entanto, abusaremos novamente
3.1: Introdução 23<br />
Figura 3.2: Movimentos <strong>de</strong> Rei<strong>de</strong>meister<br />
da notação, apresentando os diagramas com seqüencia <strong>de</strong> arcos curvilíneos, pois<br />
facilitam o <strong>de</strong>senho.<br />
Definição 3.2 Um enlaçamento <strong>de</strong> duas componentes L = K1⊔ K2 é dito separável (splittable)<br />
se cada K i esta <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> uma bola D 3 i ⊂ R3 , i = 1, 2 com D 3 1 disjunta <strong>de</strong> D3 2 .<br />
A generalização para enlaçamentos <strong>de</strong> mais componentes e <strong>de</strong> dimensões maiores<br />
é obvia.<br />
Definição 3.3 Dado um enlaçamento <strong>de</strong> duas componentes L = K1 ⊔ K2, dizemos que K1<br />
é homotopicamente não enlaçada à K2 se o mergulho f : S 1 ֒→ R 3 − K2 que <strong>de</strong>fine K1 é<br />
homotópica à uma aplicação constante emR 3 − K2.<br />
Similarmente para K2 homotopicamente não enlaçada a K1.<br />
A generalização para mais componentes e maiores dimensões é obvia.<br />
Daqui para frente estaremos focalizando os nós mas a maioria dos argumentos vale<br />
para enlaçamentos.<br />
Existe um resultado muito importante que remete o estudo dos nós e enlaçamentos<br />
clássicos ao estudo <strong>de</strong> seus diagramas. É um teorema cuja prova não será apresentada<br />
aqui, para isso veja [Bur<strong>de</strong>/Zieschang], pagina 9.<br />
Teorema 3.1 Dois nós clássicos K e L são equivalentes por isotopia ambiental se e somente se<br />
algum diagrama <strong>de</strong> K for equivalente (por movimentos <strong>de</strong> Rei<strong>de</strong>meister) a algum diagrama <strong>de</strong><br />
L.<br />
Uma classificação dos nós por isotopia ambiental seria uma forma <strong>de</strong> discernir<br />
exatamente cada uma das classes, listando-as. O que não temos. Veja na figura<br />
3.3 alguns nós equivalentes (o que é fácil comprovar, nestes casos) e outros não<br />
equivalentes o que já não é tão fácil comprovar, mesmo nestes casos.<br />
Na figura 3.4 abaixo (que eu não me lembro <strong>de</strong> on<strong>de</strong> tirei!) vemos uma seqüencia<br />
<strong>de</strong> movimentos <strong>de</strong> Rei<strong>de</strong>meister levando o nó Figura Oito na sua imagem refletida,<br />
comprovando que este nó é aquiral.
24 Capítulo 3: <strong>Teoria</strong> Clássica <strong>de</strong> <strong>Nós</strong><br />
Figura 3.3: <strong>Nós</strong> equivalentes e não equivalentes<br />
Figura 3.4: O nó Figura 8 é aquiral<br />
3.2 Número <strong>de</strong> enlaçamentos<br />
Quando estudamos enlaçamentos é muito importante o conceito <strong>de</strong> número <strong>de</strong><br />
enlaçamento (linking number). Em [Rolfsen(1976)], pagina 132 po<strong>de</strong>mos encontrar<br />
oito formas diferentes <strong>de</strong> se <strong>de</strong>finir o número <strong>de</strong> enlaçamentos entre dois nós disjuntos<br />
(enlaçamento <strong>de</strong> duas componentes), vamos colocar aqui apenas três <strong>de</strong>las. Na figura<br />
abaixo vemos o número <strong>de</strong> enlaçamento <strong>de</strong> alguns enlaçamentos.<br />
Figura 3.5: Número <strong>de</strong> enlaçamento<br />
Sejam C e D dois nós disjuntos e orientados emR 3 . Consi<strong>de</strong>re uma projeção regular<br />
<strong>de</strong>ste enlaçamento e os pontos <strong>de</strong> cruzamentos on<strong>de</strong> C atravessa por baixo <strong>de</strong> D. Se o
3.3: Alguns Invariantes <strong>de</strong> <strong>Nós</strong> e Enlaçamentos 25<br />
cruzamento se dá da direita para a esquerda do sentido da orientação <strong>de</strong> D, rotulamos<br />
este cruzamento +1, caso contrário −1. O número <strong>de</strong> enlaçamento L(C, D) será a<br />
soma <strong>de</strong>stes rótulos. Similarmente se <strong>de</strong>fine L(D, C). Se temos um enlaçamento <strong>de</strong><br />
três (ou mais) componentes, C1, C2 e D todos orientados, consi<strong>de</strong>rando-se C1 + C2 o<br />
enlaçamento <strong>de</strong> duas componentes correspon<strong>de</strong>nte, po<strong>de</strong>mos <strong>de</strong>finir da mesma forma<br />
L(C1+ C2, D) e obtemos que L(C1 + C2, D) = L(C1, D)+ L(C2, D).<br />
Uma outra forma <strong>de</strong> se <strong>de</strong>finir o numero <strong>de</strong> enlaçamento é a seguinte: Sabemos que<br />
H1(R 3 − D;Z) ≃ Z, gerado por δ e on<strong>de</strong> o isomorfismo é <strong>de</strong>finido pelas orientações<br />
<strong>de</strong> todos os espaços envolvidos. Como C é um ciclo orientado emR 3 − D temos que a<br />
classe <strong>de</strong> C, [C] = n.δ, para algum inteiro n, <strong>de</strong>finimos L(C, D) = n.<br />
É possível provar que as <strong>de</strong>finições são equivalentes. Além disso, se Ct e Dt é<br />
familia <strong>de</strong> nós disjuntos em R 3 , para cada t ∈ [0, 1] então L(C0, D0) = L(C1, D1) e<br />
que L(C, D) = L(D, C).<br />
Esta <strong>de</strong>finição se generaliza da seguinte forma:<br />
Sejam X e Y subespaços topológicos disjuntos <strong>de</strong>R 3 e x ∈ H1(X;Z) e y ∈ H1(Y;Z).<br />
Seja x representada por alguma curva C e y representada por alguma curva D,<br />
<strong>de</strong>finimos L : H1(X;Z) × H1(Y;Z) → Z por L(x, y) = L(C, D). É possível provar<br />
que L é uma forma bilinear simétrica.<br />
Existem versões em dimensões mais alta <strong>de</strong>sta forma bilinear que me<strong>de</strong> se os<br />
conjuntos X e Y estão enlaçados <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> algum R n ou <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> algum espaço Z<br />
on<strong>de</strong> ambos estão mergulhados. Em particular po<strong>de</strong>mos encontrar invariantes para o<br />
mergulho <strong>de</strong> superfícies orientáveis em M 3 olhando para o mergulho e um transladado<br />
<strong>de</strong>le numa direção normal. Veja mais <strong>de</strong>talhes em [Hacon] capitulo VI.<br />
Uma terceira forma <strong>de</strong> se <strong>de</strong>finir o número <strong>de</strong> enlaçamento entre C e D é consi<strong>de</strong>rar<br />
uma superfície orientável W 2 tal que ∂W 2 = D (chamada superfície <strong>de</strong> Seifert para<br />
D) e calcular o número <strong>de</strong> intersecção W 2 .C e colocar este número igual à L(C, D).<br />
Este numero <strong>de</strong> intercessão é calculado da seguinte forma: Por uma homotopia faça<br />
com que C e W 2 fiquem transversais, isto significa que teremos um número finito<br />
<strong>de</strong> cruzamentos transversais entre C e W e estes pontos <strong>de</strong> cruzamento po<strong>de</strong>rão<br />
ser rotulados +1 se a orientação local <strong>de</strong> W seguida da orientação <strong>de</strong> C for igual a<br />
orientação do ambiente e rotulado −1 caso contrário. Então, W 2 .C será a soma <strong>de</strong>stes<br />
rótulos.<br />
3.3 Alguns Invariantes <strong>de</strong> <strong>Nós</strong> e Enlaçamentos<br />
Temos muitos mecanismos que conseguem diferenciar algumas e às vezes muitas<br />
classes <strong>de</strong> nós mas ainda não todas. Estes mecanismos são chamados genericamente <strong>de</strong><br />
invariantes. São como o genus e a característica <strong>de</strong> Euler que usamos na classificação<br />
<strong>de</strong> superfícies.<br />
O que é um invariante no estudo dos nós?<br />
Suponha que possamos associar a cada nó K um valor IK em algum conjunto <strong>de</strong> tal<br />
forma que se K ∼ L então IK = IL, isto é, I (.) é constante nas classes <strong>de</strong> equivalências<br />
(para alguma equivalência pré estabelecida). Então temos que se IJ = IN então J ≁ N<br />
e neste caso a associação I distingue a classe <strong>de</strong> J e <strong>de</strong> N, usamos I para provar que<br />
a classe do nó J, <strong>de</strong>notada [J] = [N], a classe do nó N. Então I (.) é um invariante útil<br />
para distinguir estas classes.
26 Capítulo 3: <strong>Teoria</strong> Clássica <strong>de</strong> <strong>Nós</strong><br />
Vamos ver agora alguns invariantes da teoria clássica <strong>de</strong> nós. Notemos que<br />
alguns invariantes (nem todos) po<strong>de</strong>m ser usados também para o caso da teoria<br />
multidimensional <strong>de</strong> nós e alguns que po<strong>de</strong>m ser usados também para o caso mais<br />
geral que é o estudo da classificação <strong>de</strong> mergulhos <strong>de</strong> varieda<strong>de</strong>s em varieda<strong>de</strong>s.<br />
Devido ao teorema 3.1 acima muitos invariantes dos nós clássicos são <strong>de</strong>finidos em<br />
função <strong>de</strong> seus diagramas.<br />
Tricoloração<br />
Seja o conjunto{a, b, c} <strong>de</strong> cores, vamos colorir o diagrama <strong>de</strong> um nó (este processo<br />
po<strong>de</strong> ser pensado como uma função sobrejetiva do conjunto dos arcos do diagrama no<br />
conjunto {a, b, c}.<br />
Temos que respeitar as seguintes regras:<br />
1. Cada arco do diagrama terá uma única cor.<br />
2. Em cada cruzamento ou teremos uma única cor nos três arcos que ali chegam ou<br />
teremos todas as três cores, uma em cada arco.<br />
3. Não po<strong>de</strong> sobrar cor, isto é, todas têm que ser usadas.<br />
A figura abaixo mostra que o processo <strong>de</strong> colorir um diagrama é compatível com os<br />
movimentos <strong>de</strong> Rei<strong>de</strong>meister o que nos diz que se um diagrama qualquer <strong>de</strong> um nó for<br />
colorizável então qualquer diagrama daquele nó será. Portanto dado um nó qualquer<br />
ou ele é colorizável (se algum <strong>de</strong> seus diagramas for) ou não é (se algum, e portanto<br />
todos os seus diagramas, não for).<br />
Figura 3.6: Tricoloração é compatível com Movimentos <strong>de</strong> Rei<strong>de</strong>meister<br />
Portanto a função que leva um nó no conjunto {colorizável, não colorizável} é um<br />
invariante. Vejamos alguns casos.<br />
a) O nó trivial não é colorizável (fácil <strong>de</strong> provar).<br />
b) Qualquer dos nós trevos são colorizáveis, (fácil pois basta colorizá-los).<br />
c) Tente colorizar o enlaçamento e o nó da figura 3.7 abaixo.<br />
d) Será que o nó do <strong>ICMC</strong>-<strong>USP</strong> (923) é colorizável?<br />
Este invariante mostra que os nós trevos não são triviais porém não consegue<br />
mostrar que os nós trevos estão em classes <strong>de</strong> isotopia ambiental diferentes. Este
3.3: Alguns Invariantes <strong>de</strong> <strong>Nós</strong> e Enlaçamentos 27<br />
Figura 3.7: Será que este enlaçamento e este nó são colorizáveis?<br />
invariant é muito ligado à existência <strong>de</strong> epimorfismos do grupo fundamental do nó<br />
em grupos finitos. Este invariante po<strong>de</strong> ser refinado, por exemplo, no caso do nó ser<br />
colorizável, então quantas colorizações ele tem? Temos também p-colorização para<br />
p = 3. Para maiores <strong>de</strong>talhes sobre este invariante veja [Aneziris], paginas 37 e 61.<br />
Número mínimo <strong>de</strong> cruzamentos nos diagramas<br />
Dado um diagrama <strong>de</strong> um nó, é possível aumentar artificialmente o seu número<br />
<strong>de</strong> cruzamentos, basta ver o primeiro movimento <strong>de</strong> Rei<strong>de</strong>meister. Isto significa que<br />
o número <strong>de</strong> cruzamentos não é um invariante do nó (não é constante em todos os<br />
representantes <strong>de</strong> sua classe), no entanto o número mínimo <strong>de</strong> cruzamentos é um<br />
invariante.<br />
È fácil ver que o nó trivial tem número <strong>de</strong> cruzamentos zero e que qualquer outro<br />
nó tem numero <strong>de</strong> cruzamentos ≥ 3, logo é fácil <strong>de</strong> distinguir o nó trivial dos outros<br />
nós. Na história dos nós vimos como foi difícil encontrar os nós diferentes com um<br />
certo número <strong>de</strong> cruzamentos. Continua sendo difícil, embora tenhamos muitos outros<br />
invariantes à disposição.<br />
Número <strong>de</strong> <strong>de</strong>semaranhadamento<br />
No dicionário, não encontrei a palavra <strong>de</strong>senodamento mas encontrei emaranhado<br />
e <strong>de</strong>semaranhado, por isso usei estas palavras para criar <strong>de</strong>s+emaranhado+mento!<br />
Dado um diagrama <strong>de</strong> nó, temos um certo número <strong>de</strong> pontos duplos on<strong>de</strong> dizemos<br />
que um dado arco passa acima <strong>de</strong> outro. Se trocamos esta condição, isto é, se<br />
fizermos com que o arco que passava por cima fique por baixo, o novo nó estará<br />
muito provavelmente em outra classe <strong>de</strong> equivalência. Um procedimento bastante<br />
simples <strong>de</strong> escolha on<strong>de</strong> fazer a troca e on<strong>de</strong> não, nos leva ao nó trivial. Este<br />
processo <strong>de</strong> trivialização exige portanto um certo número <strong>de</strong> trocas, menor que o<br />
número <strong>de</strong> cruzamentos, é claro. Novamente este número po<strong>de</strong> variar muito com<br />
os procedimentos mas o número mínimo <strong>de</strong> trocas para se chegar ao nó trivial é um<br />
invariante do nó. É claro que para o nó trivial este numero é zero e para os nós trevos
28 Capítulo 3: <strong>Teoria</strong> Clássica <strong>de</strong> <strong>Nós</strong><br />
este número é um. É fácil ver também que se o nó tem n cruzamentos então este<br />
numero é ≤ (n− 1).<br />
O Gênero<br />
Dada uma superfície orientável com bordo dizemos que seu gênero é o gênero da<br />
superfície sem bordo obtida <strong>de</strong>la colando-se um disco em cada componente <strong>de</strong> bordo.<br />
É possível provar que todo nó é bordo <strong>de</strong> uma superfície orientável e conexa<br />
mergulhada em M 3 . Este resultado po<strong>de</strong> ser provado usando um diagrama do nó.<br />
Se o nó for o trivial é claro que um disco D 2 ⊂ M 3 borda o nó, mas para nós mais<br />
complicados a superfície po<strong>de</strong> ter gênero muito gran<strong>de</strong>. Novamente observamos que<br />
dada uma <strong>de</strong>stas superfícies é possível através <strong>de</strong> "somas conexas ambientais" com<br />
"pequenos toros" aumentar o genus <strong>de</strong>stas superfícies. Novamente o gênero mínimo<br />
<strong>de</strong> tais superfícies é um invariante da classe <strong>de</strong> isotopia ambiental dos nós. O nó trivial<br />
tem gênero zero, os nós trevos têm gênero um. Este invariante po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong>terminado<br />
através do grupo do nó (<strong>de</strong>finição abaixo), veja [Neuwirth].<br />
O <strong>de</strong>terminante<br />
Este invariante tem este nome porque será o <strong>de</strong>terminante <strong>de</strong> um sistema <strong>de</strong><br />
equações lineares, com coeficientes nos inteiros obtido <strong>de</strong> equações da forma r+s =<br />
2w que surgem dos cruzamentos <strong>de</strong> um diagrama do nó. Os procedimentos são os<br />
seguintes:<br />
Consi<strong>de</strong>re um diagrama <strong>de</strong> um nó K, suponha que o mesmo tenha n cruzamentos:<br />
1. Associe a cada arco uma variável, digamos, x1, x2, ...., xn.<br />
2. Em cada cruzamento escreva uma equação da forma r+s = 2w substituindo w pela<br />
variável associada ao arco que no cruzamento passa por cima e substituindo r e s pelas<br />
outras variáveis dos arcos que no cruzamento passam por baixo. Com isto temos n<br />
equações e n variáveis.<br />
3. Coloque qualquer uma da variáveis= 0.<br />
4. Descarte uma equação qualquer.<br />
5. No sistema (n − 1) × (n − 1) obtido, calcule o módulo do <strong>de</strong>terminante dos<br />
coeficientes, este valor inteiro, chamado <strong>de</strong>terminante do nó, será <strong>de</strong>notado D(K).<br />
Prova-se que D(K) é um invariante <strong>de</strong> nós, veja [Hacon] para mais <strong>de</strong>talhes e vários<br />
exemplos. Na figura 3.8 veja o calculo do <strong>de</strong>terminante <strong>de</strong> três nós.<br />
Vemos então que o nó trivial, o nó trevo e o nó K da figura são todos não<br />
equivalentes. Veremos mais adiante que é possível obter este invariante <strong>de</strong> outro<br />
invariante, o Polinômio <strong>de</strong> Alexan<strong>de</strong>r, que é portanto um invariante mais "po<strong>de</strong>roso"<br />
que o <strong>de</strong>terminante.<br />
Observações 3.1 Observemos que os grupos <strong>de</strong> homologia do complementar dos nós e dos<br />
enlaçamentos, H i(X;Z), não distinguem os nós ou os enlaçamentos,isto é, para cada i, estes<br />
grupos são sempre os mesmos, pouco importa os nós ou os enlaçamentos que consi<strong>de</strong>remos,<br />
logo não servem com invariantes para diferenciar entre os nós ou entre os enlaçamentos, em<br />
particular para qualquer nó H1(X;Z) ≃ Z veja [Hacon], pagina 75 para uma prova disto.<br />
Esta observação vale para as dimensões mais altas também.
3.3: Alguns Invariantes <strong>de</strong> <strong>Nós</strong> e Enlaçamentos 29<br />
O grupo fundamental <strong>de</strong> um nó<br />
Figura 3.8: Cálculo <strong>de</strong> <strong>de</strong>terminantes <strong>de</strong> alguns nós<br />
É fácil <strong>de</strong> provar que se dois nós K1 e K2 são equivalentes então seus complementos<br />
M 3 − K1 e M 3 − K2 são homeomorfos, o que implica que qualquer invariante<br />
topológico <strong>de</strong>finido no complementar <strong>de</strong> um nó será um invariante das classes dos<br />
nós. O grupo fundamental é um <strong>de</strong>stes invariantes e é chamado grupo do nó.<br />
É fácil ver que se o nó for trivial com complementar X então π1(X) ≈ Z. É<br />
possível provar que vale também a recíproca, isto é, se temos um nó tal que o grupo<br />
fundamental <strong>de</strong> seu complementar for isomorfo à Z, então o nó é trivial (isto é, esta<br />
na classe do nó trivial). Na verda<strong>de</strong> o único grupo abeliano que surge como grupo <strong>de</strong><br />
nó é o grupo do nó trivial, que é Z, todos os outros não são abelianos.<br />
O grupo do nó é <strong>de</strong> gran<strong>de</strong> importância também porque <strong>de</strong>le são <strong>de</strong>finidos<br />
muitos outros invariantes, por exemplo po<strong>de</strong>-se <strong>de</strong>finir através <strong>de</strong>le os Polinômios <strong>de</strong><br />
Alexan<strong>de</strong>r e o Determinante. O grupo do nó é portanto um invariante mais po<strong>de</strong>roso<br />
que estes dois.<br />
A tricoloração tem a ver com existência <strong>de</strong> homomorfismos sobrejetivos do grupo<br />
do nó em certos grupos finitos.<br />
O grupo do nó é também um invariante que se generaliza para dimensões mais<br />
altas.<br />
Existe um procedimento para encontrar uma apresentação do grupo fundamental<br />
<strong>de</strong> um nó através <strong>de</strong> seus diagramas (apresentação <strong>de</strong> Wirtinger). Voce po<strong>de</strong> ver<br />
com <strong>de</strong>talhes este procedimento em [Rolfsen(1976)], ag. 56. Abreviadamente, o<br />
procedimento é o seguinte:<br />
1. Escolha uma orientação para K.<br />
2. Tome um diagrama <strong>de</strong> K e or<strong>de</strong>ne os seus arcos (orientados), α1, α2, ...αn, usando a<br />
orientação escolhida para K.<br />
3. É fácil ver (<strong>de</strong>morado <strong>de</strong> formalizar!) que é possível modificar o nó por uma<br />
isotopia ambiental <strong>de</strong> tal forma que todos os arcos fiquem em plano horizontal <strong>de</strong><br />
R 3 , digamos z = 1, além disso as passagens inferiores se <strong>de</strong>em <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> pequenos
30 Capítulo 3: <strong>Teoria</strong> Clássica <strong>de</strong> <strong>Nós</strong><br />
cilindros Ci, i = 1, 2, ..., n (com eixos verticais e disjuntos dois a dois) localizados na<br />
região 0 ≤ z ≤ 1 e <strong>de</strong> tal forma que os eixos <strong>de</strong> cada cilindro passe pelo ponto <strong>de</strong><br />
cruzamento correspon<strong>de</strong>nte, Pi, veja figura 3.9 abaixo.<br />
4. Escolha ponto base em p = (0, 0, 3) e para cada arco αi escolha laço simples xi<br />
com ponto base p e enroscando-se ao arco αi <strong>de</strong> tal forma que para um observador<br />
localizado bem no alto, digamos em (0, 0, 50), xi atravesse por baixo (uma única vez)<br />
αi <strong>de</strong> tal forma que em projeção isto ocorra da direta para a esquerda da direção do<br />
arco. A intenção é provar que as classes <strong>de</strong> homotopia <strong>de</strong> xi geram o grupo do nó K,<br />
isto é, o grupo fundamental <strong>de</strong> X = R3− K.<br />
5. Prolongue os cilindros Ci acima <strong>de</strong>scritos para a região−1 ≤ z ≤ 0, chamando estes<br />
novos cilindros por Ei, i = 1, 2, ..., n e ajuste também cada passagem inferior do nó, no<br />
trecho entre αi e αi+1, <strong>de</strong> tal forma que o mesmo intercepte o disco D2 i , base do cilindro<br />
Ci e tampa do cilindro Ei (e que esta contido no plano z = 0), em um segmento <strong>de</strong> reta,<br />
também orientado, contido no interior daquele disco e que <strong>de</strong>notamos βi, veja figura<br />
3.9 abaixo.<br />
Figura 3.9: Ponto <strong>de</strong> cruzamento do diagrama do nó<br />
6. Em cada ponto <strong>de</strong> cruzamento P i chamemos por α k o arco orientado que passa<br />
superiormente ao arco β i. Existem duas possibilida<strong>de</strong>s que são: Na projeção a<br />
seqüencia αi, βi, αi+1 cruza (por baixo!) α k da esquerda para a direita ou da direita para<br />
a esquerda, novamente <strong>de</strong> quem olha do ponto lá do alto. É fácil ver que no primeiro<br />
caso vamos ter a relação x kx i = x i+1x k e no segundo caso a relação x ix k = x kx i+1 entre<br />
os laços acima <strong>de</strong>scritos. Denotemos por r i a relação que ocorrer no cruzamento i veja<br />
figura 3.10, abaixo.<br />
7. Denotemos por A = {(x, y, z) ∈ R 3 | z ≥ 0} − K, B i = E i − K, i = 1, 2, ..., n e
3.3: Alguns Invariantes <strong>de</strong> <strong>Nós</strong> e Enlaçamentos 31<br />
Figura 3.10: Relações possíveis em cada cruzamento<br />
por F = fecho <strong>de</strong> (R3 − A)−(∪ n 1 Bi). Para cada i, escolhemos um caminho simples<br />
σi, disjuntos entre si e disjuntos <strong>de</strong> K, ligando um ponto do conjunto D2 i − βi ao ponto<br />
base p e para o conjunto F também escolhemos um caminho simples, σF, disjunto dos<br />
σi’s e <strong>de</strong> K, ligando um ponto <strong>de</strong> seu bordo, com coor<strong>de</strong>nada z = 0 e bem longe do nó<br />
K, ao ponto base p. Definimos os conjuntos ¯B i = Bi ∪ σi e ¯F = F∪σF.<br />
8. Decomponha agora X = R3− K nos conjuntos: A, ¯B i, i = 1, 2, ..., n e ¯F. Usando o fato<br />
<strong>de</strong> que π1(A, p) é um grupo livre nos geradores xi, i = 1, 2, ..., n e que agregando à A os<br />
conjuntos ¯B i, um <strong>de</strong> cada vez, obtemos pelo teorema <strong>de</strong> Seifert-van Kampen as relações<br />
ri, i = 1, 2, ..., n, isto é, π1(A ∪(∪ j<br />
1Bi), p) = |x1, x2, ..., xn : r1, r2, ..., rn|, e observando<br />
que o espaço ¯F e seu bordo são simplesmente conexos, temos que ao agregarmos este<br />
ultimo espaço a A ∪ (∪n 1 Bi), para obtermos o espaço X, o grupo fundamental não<br />
muda, ficando portanto π1(X) = |x1, x2, ..., xn : r1, r2, ..., rn|.<br />
9. É possível <strong>de</strong>scartar uma das relações, digamos a ultima rn. O argumento é o<br />
seguinte: Trabalhemos em S3 = R3 ∪ ∞, já que π1(X) ≃ π1(Y). Então ∞ <strong>de</strong>ve<br />
ser pensado como parte <strong>de</strong> todos os conjuntos não limitados usados anteriormente,<br />
portanto ∞ <strong>de</strong>verá ser agregado à A, <strong>de</strong>notemos A ′ = A∪∞, ∞ <strong>de</strong>verá ser agregado ao<br />
plano z = 0, transformando-o numa esfera S 2 e à ¯F, <strong>de</strong>notemos ¯F ′ = ¯F∪ ¯Bn∪ ∞. É claro<br />
que A ′ ∪(∪ n−1<br />
1 Bi)∪ ¯F ′ é uma <strong>de</strong>composição <strong>de</strong> Y = S3− K e que π1(A ′ , p) = π(A, p)<br />
e que juntando-se, como anteriormente, Bi, i = 1, 2, ....,(n − 1) obtemos o mesmo<br />
resultado anterior, mas neste caso teremos no final ¯F ′ ∩(A ′ ∪(∪ n−1<br />
1 Bi)) ≃ S2− βn que<br />
é simplesmente conexo. Note que ¯F ′ também é simplesmente conexo, logo agregar<br />
¯F ′ não muda o grupo fundamental que nesta <strong>de</strong>composição é π1(Y) = |x1, x2, ..., xn :<br />
r1, r2, ..., rn−1|, fica verificado que uma relação po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong>scartada.<br />
O Polinômio <strong>de</strong> Alexan<strong>de</strong>r<br />
O procedimento para se obter o polinômio <strong>de</strong> Alexan<strong>de</strong>r segue mais ou menos o<br />
do <strong>de</strong>terminante, é o seguinte:<br />
1. Dado um diagrama para o nó K fixe uma orientação para K.<br />
2. Associe a cada arco que forma o diagrama uma variável, digamos x1, x3, ....., xn,<br />
on<strong>de</strong> n é o número <strong>de</strong> cruzamentos (e <strong>de</strong> arcos!) do diagrama, reserve (não use aqui!)<br />
a variável t que será utilizada numa situação especial.<br />
3. Associe à cada cruzamento uma equação da forma r−ts = (1−t)w ou (t− 1)w−
32 Capítulo 3: <strong>Teoria</strong> Clássica <strong>de</strong> <strong>Nós</strong><br />
ts + r = 0 on<strong>de</strong> w <strong>de</strong>ve ser i<strong>de</strong>ntificado com a variável que passa superiormente<br />
na região do cruzamento e <strong>de</strong>ve ser orientada <strong>de</strong> acordo com a orientação dado ao<br />
nó inicialmente, r e s serão substituídos pelas variáveis associadas aos arcos que se<br />
aproximam do cruzamento inferiormente. Como escolher a posição <strong>de</strong> r e s na equação,<br />
já que estas posições não são simétricas(r não tem coeficiente mas s tem coeficiente t);<br />
a forma <strong>de</strong> <strong>de</strong>cidir é usando a orientação fixada para o nó e em particular a orientação<br />
no trecho do cruzamento, a escolha é assim: usando somente a orientação do trecho<br />
superior do nó, no cruzamento, r da equação <strong>de</strong>ve ser i<strong>de</strong>ntificado com a variável<br />
associada à esquerda <strong>de</strong> w e conseqüentemente s será i<strong>de</strong>ntificado com a variável que<br />
esta à direita <strong>de</strong> w.<br />
4. Coloque agora alguma das variáveis igual à zero.<br />
5. Descarte qualquer uma das equações.<br />
6. Escreva o sistema (n − 1)×(n − 1) <strong>de</strong> equações acima com coeficientes no anel<br />
Λ = Z[t, t −1 ].<br />
7. Encontre o <strong>de</strong>terminante δ(t) <strong>de</strong>ste sistema. Será um elemento do anel Λ.<br />
8. Multiplique δ(t) por ±t j (inversíveis em Λ!!), para obter △K(t) com △K(t) =<br />
△K(t −1 ) e △K(1) = 1, este é o Polinômio <strong>de</strong> Alexan<strong>de</strong>r do nó K.<br />
Veja um exemplo <strong>de</strong> cálculo do polinômio <strong>de</strong> Alexan<strong>de</strong>r na figura 3.11.<br />
Figura 3.11: Calculo do Polinômio <strong>de</strong> Alexan<strong>de</strong>r do nó do <strong>ICMC</strong>-<strong>USP</strong> (923)<br />
No livro do Derek [Hacon] voce encontrará muita coisa interessante sobre os<br />
polinômios <strong>de</strong> Alexan<strong>de</strong>r. Em particular o calculo <strong>de</strong>ste polinômio para os nós torais e<br />
para os nós iterados. Voce também encontrará lá, como calcular o polinômio <strong>de</strong> Jones,
3.4: Construindo <strong>Nós</strong> e Enlaçamentos - <strong>Nós</strong> Primos 33<br />
outro invariante polinomial muito importante.<br />
Salientamos os seguintes resultados:<br />
1. O polinômio <strong>de</strong> Alexan<strong>de</strong>r não <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> da orientação escolhida para o nó.<br />
2. O polinômio <strong>de</strong> Alexan<strong>de</strong>r <strong>de</strong> um nó K e <strong>de</strong> seu refletido (em algum espelho) ¯K é o<br />
mesmo.<br />
3. Todo polinômio △(t) ∈ Z[t, t −1 ] e satisfazendo as condições: △(t) = △(t −1 ) e<br />
△(1) = 1 é o polinômio <strong>de</strong> Alexan<strong>de</strong>r <strong>de</strong> um nó (como temos uma gran<strong>de</strong> quantida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>stes polinômios, teremos uma gran<strong>de</strong> quantida<strong>de</strong> <strong>de</strong> nós não equivalentes!).<br />
3.4 Construindo <strong>Nós</strong> e Enlaçamentos - <strong>Nós</strong> Primos<br />
A primeira construção básica para se construir nós, a partir <strong>de</strong> outros nós Ki, i = 1, 2<br />
em S3 , é a soma dos dois <strong>de</strong>notada K1♯K2. Vejamos a construção: consi<strong>de</strong>re os pares<br />
(S3 , Ki), pontos Pi ∈ Ki e remova pequenas vizinhanças regulares <strong>de</strong>stes pontos, que<br />
são pares(B 3 i , B1 i ) não enodados. Os pares reminiscences <strong>de</strong> cada remoção são pares <strong>de</strong><br />
discos enodados(B 3 i , Ki) com bordos(S 2 i , S0 i ). Colamos B3 1 a B3 2 pelos bordos através <strong>de</strong><br />
um homeomorfismo <strong>de</strong> pares que inverte orientação ϕ : (S 2 1 , S0 1 ) → (S2 2 , S0 2<br />
), obtendo<br />
o par (S 3 , K1♯K2) on<strong>de</strong> K1♯K2 é chamado soma <strong>de</strong> K1 e K2. A figura 3.12 ilustra a<br />
construção acima.<br />
Figura 3.12: Soma <strong>de</strong> dois nós<br />
A figura 3.13 mostra uma construção equivalente. Nesta figura colocamos os dois<br />
nós <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> S 3 , mas <strong>de</strong>vemos consi<strong>de</strong>rar cada nó no interior <strong>de</strong> uma bola tal que os<br />
seus interiores sejam disjuntos e que elas se tocam ao longo <strong>de</strong> um segmento <strong>de</strong> seus<br />
bordos e é importante que a faixa (retângulo) que realiza a conexão dos dois nós cruze<br />
as fronteiras das bolas ao longo <strong>de</strong>ste segmento. Note que a construção não <strong>de</strong>pen<strong>de</strong><br />
dos pontos escolhidos para se colar a faixa em cada um dos nós, não <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> também<br />
se cada pedaço da faixa esta torcida ou enodada nos trechos em que a<strong>de</strong>ntram o interior<br />
<strong>de</strong> cada bola.<br />
Um nó é dito primo se não for a soma <strong>de</strong> dois outros nós não triviais.<br />
Também po<strong>de</strong>mos <strong>de</strong>finir soma conexa <strong>de</strong> enlaçamentos e <strong>de</strong>finir Enlaçamentos<br />
Primos, veja [Kawauchi] capítulo 3.
34 Capítulo 3: <strong>Teoria</strong> Clássica <strong>de</strong> <strong>Nós</strong><br />
Figura 3.13: Soma conexa (ambiental?)<br />
Uma outra construção parecida com esta, porem, mais geral, é a soma ao longo <strong>de</strong><br />
uma faixa f , on<strong>de</strong> é permitido que a faixa se enlace com os nós (que estão em bolas<br />
distintas <strong>de</strong> S 3 ) <strong>de</strong> forma arbitrária, veja figura 3.14. A notação neste caso é K♯ f L.<br />
Figura 3.14: Soma conexa ao longo <strong>de</strong> faixa f<br />
Na <strong>de</strong>finição <strong>de</strong> K1♯K2 a soma é <strong>de</strong>terminada apenas pelos dois nós, já K1♯ f K2 vai<br />
<strong>de</strong>pen<strong>de</strong>r também da faixa f .<br />
Voce saberia dar condições sobre como a faixa f <strong>de</strong>ve estar emR 3 −(K1∪ K2) para<br />
que a segunda operação coincida com a primeira?<br />
Temos o seguinte resultado:<br />
O polinômio <strong>de</strong> Alexan<strong>de</strong>r da "soma" H♯K, é o produto dos polinômios <strong>de</strong><br />
Alexan<strong>de</strong>r da cada um <strong>de</strong>les, isto é △ K♯L(t) = △K(t).△L (t).<br />
Outra forma <strong>de</strong> se construir nós é colocar um nó numa vizinhança tubular <strong>de</strong> outro<br />
nó, neste processo obtemos nós chamados <strong>de</strong> nós satélites ou iterados.
3.4: Construindo <strong>Nós</strong> e Enlaçamentos - <strong>Nós</strong> Primos 35<br />
Figura 3.15: Nó satélite ou iterado<br />
Seja H um nó em S 3 sabemos que existem homeomorfismos ϕ : (S 1 × D 2 )0 → N(H)<br />
on<strong>de</strong>(S 1 × D 2 )0 é o toro sólido mergulhado <strong>de</strong> forma trivial em S 3 e N(H) ⊂ S 3 é uma<br />
vizinhança tubular fechada <strong>de</strong> H em S 3 , temos ainda que H = ϕ(S 1 ×{(0, 0)})<br />
Seja L um nó contido no toro (S 1 × D 2 )0 e <strong>de</strong> tal forma que não exista nenhuma<br />
bola B 3 tal que K ⊂ B 3 ⊂ (S 1 × D 2 )0.<br />
A imagem <strong>de</strong> L pelo homeomorfismo ϕ será um novo nó, que <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> <strong>de</strong> H <strong>de</strong> L<br />
e do homeomorfismo ϕ, po<strong>de</strong>mos <strong>de</strong>notar este novo nó por H∗ϕ L.<br />
Po<strong>de</strong>mos escolher um homeomorfismo especial ϕ0 que é aquele que manda o<br />
sistema meridiano-longitu<strong>de</strong> do toro sólido padrão no sistema meridiano-longitu<strong>de</strong><br />
da vizinhança tubular N(H), neste caso a notação que po<strong>de</strong>mos usar para o nó satélite<br />
é H∗L.<br />
Dizemos que H é um acompanhante (companion) do nó satélite H∗L.<br />
Aqui também é possível tomar o segundo nó L e trocá-lo por um Enlaçamento,<br />
obtemos um enlaçamento satélite K ∗ L que tem o nó H como acompanhante. Veja<br />
mais <strong>de</strong>talhes em [Kawauchi], capitulo 3.<br />
Caso o segundo nó L se situe no bordo <strong>de</strong> (S 1 × D 2 )0, isto é se for um nó toral do<br />
tipo (p,q) então H∗Léchamado um nó cabo, mais especificamente um nó cabo-(p,q).<br />
Veja a notação nó toral-(p,q) na seção 4.2 on<strong>de</strong> temos a classificação dos nós no toro.<br />
Temos o seguinte resultado: O polinômio <strong>de</strong> Alexan<strong>de</strong>r do iterado <strong>de</strong> H∗ K, é dado<br />
por△H∗K(t) = △H(t q ).△K (t)<br />
Temos uma <strong>de</strong>scrição dos Polinômios <strong>de</strong> Alexan<strong>de</strong>r usando espaço <strong>de</strong> recobrimento<br />
e o Teorema <strong>de</strong> Mayer-Vietoris. Esta forma <strong>de</strong> <strong>de</strong>finir este invariante permite a sua<br />
generalização para nós <strong>de</strong> dimensões mais altas. Em [Rolfsen(1976)], capitulo 7 e<br />
em [Hacon], capitulo 6 temos ótimas apresentações <strong>de</strong>sta forma <strong>de</strong> se calcular ente<br />
invariante.
36 Capítulo 3: <strong>Teoria</strong> Clássica <strong>de</strong> <strong>Nós</strong>
Capítulo 4<br />
Outras <strong>Teoria</strong>s <strong>de</strong> <strong>Nós</strong><br />
4.1 <strong>Teoria</strong> Multidimensional <strong>de</strong> <strong>Nós</strong><br />
Nesta seção vamos mostrar um pouquinho do problema <strong>de</strong> existência e<br />
classificação dos mergulhos das esferas S n , n ≥ 2 nas esferas S m com m > n,<br />
usualmente chamada <strong>Teoria</strong> Multidimensional <strong>de</strong> <strong>Nós</strong>.<br />
Como no caso clássico às vezes é conveniente ver as esferas como compactificação<br />
dos espaços euclidianos correspon<strong>de</strong>ntes. É claro também que é <strong>de</strong>snecessário se<br />
preocupar com a existência pois nestes casos temos mergulhos padrões, a questão<br />
que se coloca então neste caso é verificar se é possível criar mergulhos que não sejam<br />
equivalentes ao padrão e classificá-los.<br />
Como no caso clássico nos mantemos estudando os mergulhos mansos, por<br />
exemplo os que possuem colarinho duplo, os que são ambientalmente PL-isotópicos<br />
a PL-mergulhos, isto é, damos às esferas triangulações e pedimos que nas classes <strong>de</strong><br />
equivalência dos mergulhos tenhamos representantes lineares por parte. Recor<strong>de</strong>mos<br />
que N ⊂ M tem colarinho duplo se existe mergulho i : N × [−1, 1] ֒→ M tal que<br />
i(x, 0) = x, ∀ x ∈ N<br />
É bastante conhecido no caso <strong>de</strong> n = 2 e m = 3 o mergulho topológico <strong>de</strong> S 2<br />
em R 3 conhecido como "Esfera com Chifres", on<strong>de</strong> um dos lados do mergulho não é<br />
homeomorfo ao disco D 3 veja pg. 79 <strong>de</strong> [Rolfsen(1976)] e a figura 4.1.<br />
Evitando estes mergulhos selvagens, temos em codimensão um o teorema <strong>de</strong><br />
Schönflies:<br />
Teorema 4.1 (Teorema <strong>de</strong> Schönflies) Seja S n mergulhada em S n+1 , com colarinho duplo,<br />
então o fecho <strong>de</strong> cada uma das componentes do complementar do mergulho é homeomorfo ao<br />
disco D n+1 .<br />
Note que os mergulhos diferenciáveis e os PL satisfazem as condições do teorema<br />
acima.<br />
Em codimensão (m−n) maior que dois, o complementar S m − S n é simplesmente<br />
conexo e muitos dos invariantes, particularmente aqueles oriundos dos grupos dos nós<br />
não existem. Na verda<strong>de</strong> neste caso se consi<strong>de</strong>ramos apenas aspectos topológicos dos<br />
mergulhos mansos, temos que todos são equivalentes aos mergulhos triviais (padrões).<br />
Não trivialida<strong>de</strong> surge apenas se consi<strong>de</strong>rarmos questões <strong>de</strong> diferenciabilida<strong>de</strong>, isto é,<br />
se trabalharmos na categoria diferencial, alguns resultados sobre esta questão foram<br />
estudados por Haefliger, veja [Haefliger].<br />
37
38 Capítulo 4: Outras <strong>Teoria</strong>s <strong>de</strong> <strong>Nós</strong><br />
Figura 4.1: Esfera com Chifres<br />
Vejam as <strong>de</strong>monstrações dos teoremas a seguir em [Greenberg/Harper].<br />
Teorema 4.2 (Da separação <strong>de</strong> Jordan-Brouwer) Se D r é um disco fechado <strong>de</strong> dimensão r<br />
mergulhado na esfera S n on<strong>de</strong> r ≤ n então H0(S n − D r ;Z) ≃ Z e Hq(S n − D r ;Z) = 0 para<br />
q ≥ 1.<br />
Corolário 4.1 S n não po<strong>de</strong> ser <strong>de</strong>sconectada pela remoção <strong>de</strong> um disco fechado D r .<br />
Teorema 4.3 Seja S r mergulhada em S n , então r ≤ n e se r = n S r = S n , além disso, no caso<br />
r < n temos que H0(S n − S r ;Z) ≃ Z ≃ Hn−r−1(S n − S r ;Z) e Hq(S n − S r ; Z) = 0 nos<br />
outros casos.<br />
Uma conclusão importante <strong>de</strong>stes resultados é que os grupos <strong>de</strong> homologia do<br />
complementar dos mergulhos não distinguem os enodamentos <strong>de</strong> esferas em esferas.<br />
4.2 O caso especial <strong>de</strong> S 2 em S 4<br />
Comecemos pelo caso <strong>de</strong> S 2 em R 4 ou S 4 que, como já observamos, são<br />
essencialmente a mesma coisa.<br />
Consi<strong>de</strong>remos o conjunto {(x, y, z, 0) ∈ R 4 |x 2 + y 2 + z 2 = 1} este conjunto é<br />
uma esfera que <strong>de</strong>notaremos S 2 0 . É a representante do nó padrão ou trivial em R4 .<br />
Através da compactificação <strong>de</strong> R 4 po<strong>de</strong>mos consi<strong>de</strong>rar S 2 0 ⊂ S4 . Po<strong>de</strong>ríamos também<br />
consi<strong>de</strong>rar {(x, y, z, 0, 0) ∈ S 4 ⊂ R 5 | x 2 + y 2 + z 2 = 1} e já teríamos S 2 0 ⊂ S4 .<br />
É possível verificar que o complementar <strong>de</strong>ste nó tem o tipo <strong>de</strong> homotopia <strong>de</strong> S 1 .<br />
Logo o grupo (fundamental) <strong>de</strong>ste nó éZ.<br />
A questão que se coloca inicialmente é se existe nós (mergulhos <strong>de</strong> S 2 em R 4 ) não<br />
triviais, por exemplo com grupos diferentes <strong>de</strong>Z. Vejamos uma construção que mostra<br />
que para cada nó (manso) clássico K existe um nó S 2 K ⊂ R4 , o "rodado <strong>de</strong> K"(outra<br />
notação é K ∗ ) cujo complemento tem grupo igual ao grupo <strong>de</strong> K. A construção é <strong>de</strong>vida<br />
à Emil Artin, veja [Artin(1926)] ou [Andrews/Curtis].
4.2: O caso especial <strong>de</strong> S 2 em S 4 39<br />
Inicialmente <strong>de</strong>compomos R 4 =< e1, e2, e3, e4 > usando o plano P = R 2 3,4 =<<br />
e3, e4 > como eixo <strong>de</strong> rotação, isto é, consi<strong>de</strong>remos para cada θ ∈ [0, 2π) (ou (0, 2π]<br />
conforme a conveniência) E(θ) = (cos(θ), sen(θ)) ∈ S 1 ⊂ R 2 1,2 =< e1, e2 > e o semi<br />
3-espaço R 3 (θ) = {(ρcos(θ), ρsen(θ), c, d) ∈ R 4 , ρ ∈ [0, ∞), c, d ∈ R}. Em especial a<br />
folha R 3 (0) é o semi 3-espaço on<strong>de</strong> vamos colocar o nó K para ser "rodado".<br />
Figura 4.2: Rotação emR 4<br />
Dado ponto (a, b, c, d) ∈ R 4 <strong>de</strong>finimos como o seu rodado o conjunto<br />
Rot((a, b, c, d)) = {(cos(θ)a − sen(θ)b, sen(θ)a + cos(θ)b, c, d) ∈ R 4 on<strong>de</strong> θ ∈ [0, 2π)}.<br />
Observe que se a = 0 = b então o ponto (0, 0, c, d) pertence ao eixoP, seu rodado é ele<br />
próprio, caso contrário, isto é a 2 + b 2 > 0 então o rodado do ponto será um círculo cujo<br />
plano é ortogonal ao eixoP.<br />
Denotemos i : R 3 (0) ֒→ R 4 a inclusão. Po<strong>de</strong>mos <strong>de</strong>finir uma aplicação contínua H :<br />
R 4 → R 3 (0) por H((x, y, z, w)) = Rot((x, y, z, w)) ∩R 3 (0), note que H| R 3 (0) = Id R 3 (0) .<br />
É fácil ver que H ◦ i = Id R 3 (0) . Chamemos Θ : S 1 → [0, 2π) (ou (0, 2π] conforme<br />
a conveniência) a função inversa <strong>de</strong> E, dada acima, que é contínua em S 1 −{(1, 0)}.<br />
Temos que Θ((cos(ϕ), sen(ϕ)) = ϕ.<br />
Definamos, para uso posterior, a aplicação θ : R 4 − P → [0, 2π) (ou (0, 2π]<br />
conforme a conveniência), por θ(x, y, z, w) = Θ(z/(z 2 + w 2 ) 1/2 , w/(z 2 + w 2 ) 1/2 ) e a<br />
aplicação rotação <strong>de</strong> um ângulo θ em torno do eixo P por Rot θ P : R4 → R 4 , dada<br />
por Rotθ P (a, b, c, d) = (a.cos(θ) − b.sen(θ), a.sen(θ) + b.cos(θ), c, d). Devemos notar que<br />
tanto Rotθ P como a aplicação θ → Rotθ P são aplicações contínuas.<br />
Seja K o nó (manso) dado inicialmente emR 3 , suponhamos que o mesmo seja dado<br />
por uma seqüencia <strong>de</strong> segmentos <strong>de</strong> reta e que o espaço ambiente seja o R 3 1,3,4 =<br />
R 3 < e1, e3, e4 >, isto é R 3 (0)∪R 3 (π). Através <strong>de</strong> translação e rotação (e talvez uma
40 Capítulo 4: Outras <strong>Teoria</strong>s <strong>de</strong> <strong>Nós</strong><br />
pequena <strong>de</strong>formação) neste R3 po<strong>de</strong>mos supor que o nosso nó K esteja totalmente<br />
contido em R3 (0) e que apenas um <strong>de</strong> seus segmentos, que chamaremos β0, esteja no<br />
eixo P. Denotemos β = K−interior <strong>de</strong> β0, isto é, β é a reunião <strong>de</strong> todos os outros<br />
segmentos do nó, excluído (o interior <strong>de</strong>) β0, β é homeomorfo à um segmento e o nó<br />
K = β ∪ β0. Usando-se o teorema <strong>de</strong> Seifert-van Kampen é possível mostrar que a<br />
inclusão jK : R3 (0)−K → R3 1,3,4− K induz um isomorfismo nos grupos fundamentais<br />
− K).<br />
jK∗ : π1(R 3 (0)−K) → π1(R 3 1,3,4<br />
Denotemos S2 K = Rot(β), e é fácil ver que S2 K ≃ S2 é uma 2-esfera mergulhada em<br />
R4 .<br />
Observemos que se tivéssemos colocado o nó K no interior <strong>de</strong> R3 (0) obteríamos<br />
pela rotação um toro enodado emR 4 .<br />
Estu<strong>de</strong>mos o grupo do nó S2 K .<br />
Temos a inclusão iK : R3 (0)−K ֒→ R4 −(S 2 K ∪ β0) e a retração HK : R4 −(S 2 K ∪<br />
β0) → R3 (0)−K <strong>de</strong>finidas por restrição <strong>de</strong> i e H, então HK ◦ iK = IdR3 (0)−K . Logo as<br />
induzidas nos grupos fundamentais nos dá HK∗◦ iK∗ = Id π1(R 3 (0)−K)<br />
o que nos permite<br />
concluir que iK∗ é injetiva. Isto já seria suficiente para garantir que o mergulho não é<br />
trivial.<br />
Usando-se o Teorema <strong>de</strong> Seifert-van Kampen é possível mostrar que a inclusão<br />
jS2 : R<br />
K 4 − (S2 K ∪ β0) → R4 − S2 K induz um isomorfismo nos grupos fundamentais<br />
jS2 K∗ : π1(R4 −(S 2 K ∪ β0)) → π1(R4 − S2 K ).<br />
O próximo passo é provar que iK∗ : π1(R 3 (0) − K) → π1(R 4 − (S 2 K ∪ β0)) é<br />
sobrejetiva. Para isto consi<strong>de</strong>remos [s] ∈ π1(R 4 − (S 2 K ∪ β0)) on<strong>de</strong> s : [0, 1] →<br />
R 4 −(S 2 K ∪ β0), s(0) = q = s(1), s constituído por uma seqüencia <strong>de</strong> segmentos <strong>de</strong><br />
retas s1.s2......sm com vértices q = q0, q1, ...., q j, ..., qm = q, on<strong>de</strong> q ∈ P − K ponto<br />
base <strong>de</strong> todos os espaços envolvidos. Os segmentos que porventura cruzem R 3 (0)<br />
são divididos inserindo-se na seqüencia <strong>de</strong> vertices <strong>de</strong> s estes pontos <strong>de</strong> intersecção.<br />
Manteremos a notação supondo na notação inicial que nenhum dos segmentos cruzem<br />
R 3 (0).<br />
Para cada q j ∈ P− K, q j = q, escolha caminho v j em P− K ligando q j à q, para<br />
os outros q k’s, isto é, para aqueles que estão em folhas (abertas) do tipo R 3 (θ k)−P,<br />
escolhemos caminhos vk emR 3 (θk) ligando qk à q.<br />
Substituímos s por s1.v1.v −1 −1 −1<br />
1 .s2.v2.v2 .s3.v3.v3 ....sj.v j.v −1<br />
j ....sm−1.vm−1.v −1<br />
m−1 .sm que<br />
é homotópico a s e que é constituídos por caminhos fechados com ponto base q que, ou<br />
já estão emR3 (0)−K ou estão entre duas folhasR 3 (θr) e R3 (θs) com 0 ≤ θr ≤ θs ≤ 2π.<br />
Mostremos que os caminhos que estão entre as duas folhas são homotópicos em<br />
R4 − (S2 K ∪ β0) a caminhos em R3 (0) − K, mais precisamente, provemos que se λ é<br />
um caminho fechado com ponto base q cuja imagem fica entre duas folhas R3 (θr) e<br />
R3 (θs) com 0 ≤ θr ≤ θs < 2π ( ou 0 < θr ≤ θs ≤ 2π conforme a conveniência)<br />
então λ ≃ HK ◦ λ, este ultimo caminho fechado esta em R3 (0)−K. É fácil ver que a<br />
aplicação W : [0, 1]×[0, 1] → R4 −(S 2 K ∪ β0), dada por W(s, t) = Rot −t.θ(λ(s))<br />
P (λ(s))<br />
é uma homotopia entre λ e HK ◦ λ. A conclusão é que s po<strong>de</strong> ser escrito como uma<br />
composição <strong>de</strong> outros caminhos, todos, na imagem <strong>de</strong> iK∗ e portanto [s] esta nesta<br />
imagem, ou seja iK∗ é sobrejetiva e logo o grupo do nó S2 K em R4 é isomorfo ao grupo<br />
do nó K emR 3 .<br />
O processo acima, que chamaremos "rodar"(spinning) tem uma generalização que
4.3: O círculo no plano, na esfera, no espaço projetivo e no toro 41<br />
chamaremos "torcendo ao rodar"(twist spinning) que é quase igual ao anterior, só que<br />
escolhemos algum trecho pequeno do nó K contido no interior <strong>de</strong> R3 (0) e que ainda é<br />
enodado, colocamos este trecho <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> um pequeno cilindro[0, 1]× D2 <strong>de</strong> tal forma<br />
que o nó cruze transversalmente o bordo do cilindro nos pontos (0,(0, 0)) e (1,(0, 0)),<br />
veja figura 4.3. Agora, ao rodar o nó K, como no processo anterior, fazemos o pequeno<br />
cilindro também rodar mas com velocida<strong>de</strong> um múltiplo (k) inteiro da velocida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> rotação do processo anterior. O mergulho <strong>de</strong> S2 agora obtido <strong>de</strong>pen<strong>de</strong> como<br />
anteriormente do nó K, mas também do inteiro k e do "sub-nó"S que escolhemos para<br />
fazer o spinning. Note que temos então K = T♯S, para algum sub-nó complementar T<br />
<strong>de</strong> S em K. Uma notação para este novo mergulho <strong>de</strong> S2 em R4 (S4 ) po<strong>de</strong>ria ser algo<br />
como S 2<br />
(po<strong>de</strong> ser que já se tenha uma notação para isso, que <strong>de</strong>sconheço!). Na<br />
T♯S(k)<br />
verda<strong>de</strong> se o nó K for a soma <strong>de</strong> vários outros nós po<strong>de</strong>r-se-ia torcer cada uma das<br />
várias componentes por um k diferente, teríamos algo como S2 T♯S1(k 1)♯S2(k2)♯.....♯Sq(kq) ,<br />
on<strong>de</strong> K = T♯S1♯S2♯...Sq.<br />
Figura 4.3: Torcendo ao rodar emR 4<br />
Este mesmo processo po<strong>de</strong> ser feito para enlaçamentos <strong>de</strong> várias componentes<br />
fazendo ou não com que alguma aresta <strong>de</strong> algumas das várias componentes estejam na<br />
fronteira <strong>de</strong>R 3 (0). Os nós que estejam totalmente no interior <strong>de</strong>R 3 (0) se transformam<br />
em toros S 1 × S 1 mergulhados <strong>de</strong> forma enodada emR 4 (S 4 ).<br />
4.3 O círculo no plano, na esfera, no espaço projetivo e<br />
no toro<br />
Teorema 4.4 (Da curva <strong>de</strong> Jordan) Se L é uma curva simples e fechada (portanto<br />
homeomorfa a S 1 ) em R 2 ou S 2 , então R 2 − L ou S 2 − L tem duas componentes e L é o bordo
42 Capítulo 4: Outras <strong>Teoria</strong>s <strong>de</strong> <strong>Nós</strong><br />
<strong>de</strong> ambas.<br />
Exercícios<br />
Tente respon<strong>de</strong>r a questão acima no caso <strong>de</strong>:<br />
1. L ser a reunião disjunta <strong>de</strong> 2 curvas simples.<br />
2. L ser a reunião em um ponto <strong>de</strong> duas curvas simples (figura 8).<br />
3. L ser a reunião disjunta <strong>de</strong> n curvas simples.<br />
Teorema 4.5 (De Schönflies) Nas hipóteses do teorema anterior, uma das componentes <strong>de</strong><br />
R 2 − L ou as duas componentes <strong>de</strong> S 2 − L são homeomorfas ao disco D 2 .<br />
Corolário 4.2 Quaisquer dois nós <strong>de</strong> S 1 em S 2 ou emR 2 são equivalentes por homeomorfismo<br />
no contradomínio.<br />
O corolário acima também é válido para a equivalência por isotopia ambiental. Veja<br />
prova em [Rolfsen(1976)], pagina 11.<br />
Exercícios<br />
1. O que se po<strong>de</strong> dizer <strong>de</strong> enlaçamentos <strong>de</strong> vários círculos disjuntos em S 2 ou emR 2 .<br />
2. O que se po<strong>de</strong> dizer da classificação <strong>de</strong> mergulhos da reunião em um ponto <strong>de</strong> dois<br />
círculos (figura 8) em S 2 ou emR 2 .<br />
Vamos apresentar <strong>de</strong> forma muito resumida o estudo dos mergulhos do círculo<br />
S 1 no toro T 2 = S 1 × S 1 . Neste caso temos resultados completos e não triviais e a<br />
referência é [Rolfsen(1976)]<br />
O grupo fundamental do toro é abeliano logo isomorfo ao seu primeiro grupo<br />
<strong>de</strong> homologia, isto é, π1(T 2 ) ≃ Z ⊕ Z ≃ H1(T 2 ;Z) e as classes <strong>de</strong> homotopia<br />
representáveis por mergulhos são da forma (a, b) ∈ Z⊕Z tal que: ou a = 0 = b<br />
ou m.d.c.(a,b)=1.<br />
Um nó que borda um disco D 2 é chamado trivial ou não essencial, correspon<strong>de</strong> à<br />
classe (0, 0) no grupo fundamental, caso contrário é chamado não trivial ou essencial.<br />
Um nó correspon<strong>de</strong>nte à (±1, 0) é chamado nó longitudinal e um correspon<strong>de</strong>nte à<br />
(0,±1) é chamado nó meridional.<br />
É fácil ver que todos os nós triviais são equivalentes por isotopia ambiental (e como<br />
conseqüência são equivalentes por homeomorfismo na imagem). É fácil também ver<br />
nós meridionais e longitudinais são equivalentes por homeomorfismo na imagem.<br />
A <strong>de</strong>monstração dos resultados abaixo po<strong>de</strong>m ser vistos em [Rolfsen(1976)].<br />
Proposição 4.1 Para todo nó K essencial em T 2 , isto é, [K] não correspon<strong>de</strong>nte à (0, 0) no<br />
grupo fundamental, existe um homeomorfismo h : T 2 → T 2 tal que a imagem <strong>de</strong> K é um nó<br />
meridional.<br />
Observe que esta proposição nos diz que todo nó que não seja o trivial é equivalente<br />
por um homeomorfismo em T 2 ao nó meridional, ou seja, temos o seguinte teorema <strong>de</strong><br />
classificação <strong>de</strong> nós no toro, por homeomorfismo na imagem:<br />
Teorema 4.6 (Classificação dos nós no toro T 2 por homeomorfismo na imagem)<br />
Existem apenas dois tipos <strong>de</strong> nós no toro por homeomorfismos na imagem, os equivalentes ao<br />
trivial (não essenciais) e os equivalentes a um nó meridional (os essenciais).<br />
A classificação por isotopia ambiental é dada por:
4.4: O Cilindro e a Faixa <strong>de</strong> Möbius emR 3 43<br />
Teorema 4.7 (Classificação dos mergulhos <strong>de</strong> S 1 no toro T 2 por isotopia ambiental)<br />
Dois nós, K e L no toro, são equivalentes por isotopia ambiental se e somente se[K] = ±[L] no<br />
grupo fundamental.<br />
4.4 O Cilindro e a Faixa <strong>de</strong> Möbius emR 3<br />
Na figura 4.4 abaixo vemos um cilindro e uma faixa <strong>de</strong> Möbius mergulhadas emR 3 ,<br />
acho que estes mergulhos po<strong>de</strong>m ser consi<strong>de</strong>rados como os mergulhos "padrões"<strong>de</strong>stes<br />
espaços emR 3 .<br />
Figura 4.4: Cilindro e Faixa <strong>de</strong> Möbius - I<br />
Que tal estes outros mergulhos da figura 4.5. Se observarmos direito veremos que<br />
temos ainda o cilindro e a faixa <strong>de</strong> Möbius, porem agora estão mergulhados <strong>de</strong> forma<br />
diferente.<br />
Figura 4.5: Cilindro e Faixa <strong>de</strong> Möbius - II<br />
Qual é o numero <strong>de</strong> enlaçamento L(C1, C2) entre as duas componentes <strong>de</strong> bordo C1<br />
e C2 do cilindro?<br />
Qual é o número <strong>de</strong> enlaçamento L(C, M) entre o bordo da faixa <strong>de</strong> Möbius C e o<br />
seu Meridiano M?<br />
Será que po<strong>de</strong>mos complicar ainda mais os mergulhos <strong>de</strong>stes espaços? Vejamos a<br />
proxima figura 4.6.<br />
Novamente temos o cilindro e a faixa <strong>de</strong> Möbius mergulhados <strong>de</strong> forma que os seus<br />
meridianos M coinci<strong>de</strong>m com nós <strong>de</strong>R 3 .
44 Capítulo 4: Outras <strong>Teoria</strong>s <strong>de</strong> <strong>Nós</strong><br />
Figura 4.6: Cilindro e Faixa <strong>de</strong> Möbius-III<br />
Exercício 1 Será que todo mergulho <strong>de</strong>stes espaços em R 3 são como acima? Como<br />
provar ou reprovar esta afirmação?<br />
Exercício 2 Como são os mergulhos do cilindro e da faixa <strong>de</strong> Möbius emR 4 ?<br />
4.5 Mergulhos <strong>de</strong> Superfícies emR 3<br />
Normalmente temos as superfícies, orientáveis, mergulhadas emR 3 como na figura<br />
4.7 abaixo.<br />
Observe que o "lado <strong>de</strong> <strong>de</strong>ntro"das superfícies são discos com alças (handlebodies).<br />
Mas que tal o mergulho do bi-toro em R 3 , mostrado na figura 4.8 abaixo. Este<br />
mergulho é um exemplo <strong>de</strong> um mergulho no bi-toro, pensado em S 3 , em que, ambos<br />
os "lados"em que o S 3 ficou dividido, não é um "handlebody"(como seria possível<br />
provar isto?), o que mostra claramente que po<strong>de</strong>mos ter muitas classes diferentes <strong>de</strong><br />
mergulhos das superfícies emR 3 ou em S 3 .<br />
Quando a superfície tiver bordo, o seu bordo será um nó (caso tiver apenas uma<br />
componente conexa) ou um enlaçamento (se o bordo tiver várias componentes).<br />
Como no caso da teoria <strong>de</strong> nós, existem invariantes para <strong>de</strong>tectar diferentes classes<br />
<strong>de</strong> mergulhos <strong>de</strong> superfícies. Alguns <strong>de</strong>stes invariantes já servem para <strong>de</strong>tectar<br />
diferenças entre os nós ou enlaçamentos que constituem o bordo <strong>de</strong>stas superfícies,<br />
caso sejam superfícies com bordo. Derek [Hacon] aborda esta questão no capítulo VI.<br />
Consi<strong>de</strong>re um nó K em S 3 , é possível provar que sua vizinhança tubular fechada<br />
é homeomorfa à S 1 × D 2 , isto é, existe mergulho K : S 1 × D 2 ֒→ S 3 , tal que<br />
K(S 1 ×(0, 0)) = K. Se consi<strong>de</strong>ramos T 2 K = K(S1 × ∂(D 2 )) on<strong>de</strong> ∂(D 2 ) ≈ S 1 , obtemos<br />
um mergulho do toro T 2 em S 3 . Se K é complicado o mergulho do toro correspon<strong>de</strong>nte
4.5: Mergulhos <strong>de</strong> Superfícies emR 3 45<br />
Figura 4.7: Superficies emR 3<br />
T 2 K é complicado porem uma das componentes em que S3 fica dividida pela imagem<br />
<strong>de</strong> T 2 , é um toro sólido, isto é, é um espaço homeomorfo à S 1 × D 2 . Note que o outro<br />
"lado"do mergulho é um espaço <strong>de</strong>finido pelo nó clássico K, chamado exterior do nó K<br />
e se este nó não for o trivial este espaço é muito diferente <strong>de</strong> S 1 × D 2 .<br />
Uma questão então é: É possível mergulhar o toro em S 3 <strong>de</strong> tal forma que os dois<br />
"lados"do mergulho sejam diferentes <strong>de</strong> S 1 × D 2 . A resposta é não e este é o resultado<br />
do teorema abaixo, veja <strong>de</strong>monstração em [Rolfsen(1976)], pagina 107.<br />
Teorema 4.8 (Teorema do toro <strong>de</strong> Alexan<strong>de</strong>r) Um toro T 2 mergulhado (PL) em S 3 divi<strong>de</strong><br />
este espaço em duas partes sendo pelo menos uma <strong>de</strong>las homeomorfa ao toro sólido S 1 × D 2 .<br />
Veja generalizações <strong>de</strong>stes resultados em [Laércio/Saeki (2002)],<br />
[Laércio/Saeki (2005)] e [Laércio/Oziri<strong>de</strong>/Saeki], em particular vejam abaixo um<br />
resultado <strong>de</strong> [Laércio/Saeki (2002)] muito interessante.<br />
Teorema 4.9 Se p, q ≥ 1 e p+q = r com r ímpar, então existem para cada n, inteiro não<br />
nulo, mergulhos distintos fn : S p × S q × S r ֒→ S p+q+r+1 tal que o fecho <strong>de</strong> nenhuma das<br />
duas componentes <strong>de</strong> S p+q+r − imagem fn é homologicamente equivalente ao produto <strong>de</strong> duas<br />
esferas e um disco.<br />
Uma pergunta que se coloca imediatamente é se um bi-toro mergulhado em S 3<br />
sempre bordará em pelo menos um dos lados o correspon<strong>de</strong>nte "handlebody". A<br />
resposta é negativa, veja exemplo na figura 4.8 acima, on<strong>de</strong> ambos os lados do<br />
mergulho em S 3 possui um pedaço homeomorfo ao complementar <strong>de</strong> um nó não<br />
trivial.<br />
Exercício: Calcular o grupo fundamental <strong>de</strong> cada um dos lados do mergulho da figura<br />
4.8.
46 Capítulo 4: Outras <strong>Teoria</strong>s <strong>de</strong> <strong>Nós</strong><br />
Figura 4.8: Bitoro em S 3
Capítulo 5<br />
RP 2 não mergulha emR 3<br />
Po<strong>de</strong>mos encontrar provas <strong>de</strong>ste fato usando Cohomologia e em particular<br />
Dualida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Alexan<strong>de</strong>r, vejam em [Greenberg/Harper] pg. 235 ou [Spanier] pg. 356.<br />
Vejamos uma prova, dada por Hiroshi, veja [Maehara], mais elementar, que usa<br />
apenas um resultado básico <strong>de</strong> <strong>Teoria</strong> <strong>de</strong> Grafos.<br />
O resultado abaixo po<strong>de</strong> ser encontrado em [Conway/Gordon] ou em [Sachs].<br />
Proposição 5.1 (Teorema do Enlaçamento) Todo mergulho do 6-grafo-completo, K6 emR 3<br />
contem um par <strong>de</strong> ciclos disjuntos constituindo um enlaçamento não trivial.<br />
Usando o resultado acima obtemos:<br />
Lema 5.1 Para qualquer mergulho da Faixa <strong>de</strong> Möbius M 2 emR 3 o par (∂M 2 , C), on<strong>de</strong> ∂M 2<br />
é o bordo da Faixa <strong>de</strong> Möbius e C é o seu meridiano, formam um enlaçamento não trivial.<br />
Prova: Consi<strong>de</strong>re K6 na Faixa <strong>de</strong> Möbius M 2 como representado no retângulo abaixo,<br />
on<strong>de</strong> cada par dos seis pontos P1, P2, P3, P4, P5, P6 são conectados por uma curva<br />
simples em M 2 . Este grafo K6 contem exatamente <strong>de</strong>z pares <strong>de</strong> ciclos disjuntos, que<br />
são:<br />
a<br />
b<br />
c<br />
P2<br />
P1<br />
P6<br />
d ❍❍<br />
b<br />
❍<br />
❍<br />
❍<br />
❍<br />
e ❍<br />
a<br />
P3<br />
P4<br />
(P1P2P3, P4P5P6),(P1P2P4, P3P5P6),(P1P2P5, P3P4P6),(P1P2P6, P3P4P5),(P1P3P4, P2P5P6)<br />
47<br />
P5<br />
e<br />
d<br />
c
48 Capítulo 5: RP 2 não mergulha emR 3<br />
(P1P3P5, P2P4P6),(P1P3P6, P2P4P5),(P1P4P5, P2P3P6),(P1P4P6, P2P3P5),(P1P5P6, P2P3P4)<br />
Cada um dos nove ciclos sublinhados borda uma 2-célula em M 2 disjunta do ciclo<br />
correspon<strong>de</strong>nte no par, logo em qualquer mergulho <strong>de</strong>M 2 emR 3 , nove pares <strong>de</strong> ciclos<br />
do K6 acima construído são enlaçamentos triviais. Pelo Teorema do Enlaçamento acima<br />
concluímos que o par(P1P3P4, P2P5P6) tem que ser um enlaçamento não trivial.<br />
Como o ciclo(P2P5P6) é o meridiano C <strong>de</strong>M 2 e o ciclo(P1P3P4) é o ∂M 2 o lema esta<br />
<strong>de</strong>monstrado.<br />
Teorema 5.1 O Espaço Projetivo 2-dimensionalRP 2 não mergulha emR 3 .<br />
Prova: Suponha RP 2 mergulhado em R 3 . Removendo-se uma célula aberta D <strong>de</strong><br />
RP 2 obtemos um mergulho <strong>de</strong> M 2 em R 3 . Então o bordo <strong>de</strong> M 2 e o meridiano C <strong>de</strong><br />
M 2 formam um enlaçamento não trivial, isto é, C intercepta D, isto é, não tínhamos<br />
inicialmente um mergulho, uma contradição.<br />
Exercício: Prove que as outras superfícies sem bordo, não orientáveis, também não<br />
mergulham emR 3 .
Referências Bibliográficas<br />
[ ] Abaixo uma bibliografia longa (mas não muito!!). Se voce precisa uma bibliografia<br />
mais completa consulte a bibliografia do [Kawauchi]<br />
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