INTRODUÇÃO Prof. Dr. Roberto Elísio dos Santos ... - USCS
INTRODUÇÃO Prof. Dr. Roberto Elísio dos Santos ... - USCS
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evista Vol. 8 - N o 14 - 1 o Semestre 2006 Caderno de Gestão e Regionalidade<br />
<strong>INTRODUÇÃO</strong><br />
<strong>Prof</strong>. <strong>Dr</strong>. <strong>Roberto</strong> <strong>Elísio</strong> <strong>dos</strong> <strong>Santos</strong><br />
ENTREvISTa<br />
<strong>Prof</strong>a. Sonia Maria Franco Xavier<br />
O PROCESSO DA LIDERANÇA E O PROCESSO DE MUDANÇA –<br />
UM ESTUDO Na FORD DO BRaSIL<br />
valter Mazini e <strong>Prof</strong>. <strong>Dr</strong>. Eduardo de Camargo Oliva<br />
OS BENEFÍCIOS DO SISTEMa COOPERaTIvO PaRa OS PEQUENOS EMPREENDEDORES<br />
Elcio Piazzi Carvalho vanderlei e <strong>Prof</strong>. <strong>Dr</strong>. antonio Carlos Gil<br />
INvESTIGaÇÃO SOBRE aS vaNTaGENS E DESvaNTaGENS DO vaLOR<br />
LIBERDaDE aPLICaDO EM SaLa DE aULa<br />
Silvestre Braguini FIlho, Marcel Cortez alvez, Rosana aparecida Pivatto e<br />
<strong>Prof</strong>. <strong>Dr</strong>. René Henrique Götz Licht<br />
REFLETINDO SOBRE aS POSSIBILIDaDES DE NEGóCIO a PaRTIR Da<br />
COMUNIDaDE PORTUáRIa SaNTISTa<br />
Rodrigo Nunes de Oliveira e <strong>Prof</strong>a. Maria Cidália Ferreira<br />
SEMINáRIO aBERTO<br />
Produção cultural do aBC e identidade regional<br />
PaLESTRa<br />
<strong>Prof</strong>. Moises ari Zilber<br />
RESENHa:<br />
LICHT, René Henrique G. ÉTICa ORGaNIZaCIONaL: BUSCa DE UM MODELO<br />
COMPREENSIvO PaRa COMPORTaMENTOS MORaIS MODaL NaS EMPRESaS.<br />
São Caetano do Sul: IMES [dissertação de doutorado], 1996<br />
Paulette alberis a. Mello<br />
Gestão & Regionalidade - Vol. 8 - N o 14 - 1 o Semestre 2006 - ISSN 1809-1644
<strong>INTRODUÇÃO</strong><br />
<strong>Prof</strong>. <strong>Dr</strong>. <strong>Roberto</strong> <strong>Elísio</strong> <strong>dos</strong> <strong>Santos</strong><br />
eNTRevIsTa<br />
<strong>Prof</strong>a. Célia Maria Haas<br />
eNsINO FUNDaMeNTaL: DO FUNDeF aO FUNDeb<br />
<strong>Prof</strong>. Expedito Nunes e <strong>Prof</strong>. <strong>Dr</strong>. Antonio Carlos Gil<br />
as OPeRÁRIas DO abC: ReesTRUTURaÇÃO PRODUTIva, ReLaÇÕes De<br />
GÊNeRO e PaRTICIPaÇÃO sINDICaL<br />
Ivete Garcia e <strong>Prof</strong>. <strong>Dr</strong>. Luis Paulo Bresciani<br />
as MULHeRes Da seGURaNÇa URbaNa: a GUaRDa CIvIL MUNICIPaL<br />
FeMININa De saNTO aNDRÉ<br />
Heleni B. F. de Paiva Lino; <strong>Prof</strong>a. <strong>Dr</strong>a. Carla Cristina Garcia e<br />
<strong>Prof</strong>a. <strong>Dr</strong>a. Priscila Ferreira Perazzo<br />
IMPORTÂNCIa CResCeNTe Das aLIaNÇas esTRaTÉGICas NO aMbIeNTe<br />
COMPETITIVO ATUAL – CASO: JOINT VENTURE LG.PHILIPS DISPLAYS<br />
Cynthia Hisako Sakaguchi Ito e <strong>Prof</strong>. <strong>Dr</strong>. Sérgio Crispim<br />
seMINÁRIO abeRTO<br />
Municipalização do Ensino Fundamental: Desafios e Perspectivas<br />
resenha:<br />
DI AGUSTINI, Anapatrícia Morales Vilha. O UsO Da INTeRNeT COMO<br />
INSTRUMENTO DO COMPOSTO DE MARKETING – UM ESTUDO EXPLORATÓRIO<br />
NAS INDÚSTRIAS PRODUTORAS DE AUTOMÓVEIS DA REGIÃO DO ABC<br />
São Caetano do Sul: IMES [dissertação de mestrado em Administração], 2001<br />
Esmeralda Vicente<br />
Gestão & Regionalidade - N o 13 - 2 o Semestre 2005<br />
4<br />
5<br />
7<br />
16<br />
24<br />
2<br />
49<br />
67
Ao ultrapassar o sexto ano de publicação ininterrupta, este caderno de pesquisa<br />
se renova, tanto no que concerne ao nome – que passa a ser Caderno de Gestão & regionalidade<br />
PMa-IMes, em consonância com a linha que norteia o Programa de Mestrado em<br />
Administração da Universidade IMES – quanto ao formato, que deixa de ser revista e tornase<br />
caderno.<br />
No entanto, a missão deste caderno segue inalterada: é o espaço para os textos acadêmicos<br />
produzi<strong>dos</strong> por alunos e professores do Programa de Mestrado em Administração<br />
da Universidade IMES. As pesquisas realizadas e as reflexões teóricas (sejam voltadas para as<br />
questões da inovação, da gestão ou <strong>dos</strong> fenômenos da regionalidade), assim como as transcrições<br />
de seminários e debates – feitas com auxílio de alunos de graduação que participam<br />
<strong>dos</strong> projetos de pesquisa de Iniciação Científica – ocorri<strong>dos</strong> na instituição são registradas e<br />
divulgadas nas páginas desta publicação.<br />
Esta edição destaca o processo de municipalização do ensino fundamental, tema do<br />
Seminário Aberto realizado em 17 de maio deste ano, no Campus II da Universidade IMES, o<br />
artigo escrito pelos professores Antonio Carlos Gil e Expedito Nunes e a entrevista concedida<br />
pela professora Célia Maria Haas, que também fala sobre os novos cursos da Universidade<br />
IMES na área de Educação.<br />
Duas pesquisas que têm como objeto de estudo mulheres que exercem atividades<br />
profissionais resultaram em artigos publica<strong>dos</strong> neste número. A primeira, elaborada pela<br />
mestranda Ivete Garcia e pelo professor Luis Paulo Bresciani, aborda as operárias da Região<br />
do Grande ABC, no contexto da reestruturação produtiva. Já a Guarda Civil Municipal Feminina<br />
de Santo André foi o foco do trabalho desenvolvido pela aluna do PMA, Heleni de<br />
Paiva Lino e pelas professoras Priscila Ferreira Perazzo e Carla Cristina Garcia.<br />
Completam a edição, o artigo sobre a importância das alianças estratégicas – desenvolvido<br />
pela aluna Cynthia Hisako Sakaguchi Ito e pelo professor Sérgio Crispim –, que<br />
trata da joint venture Phillips LG.Displays, e a resenha escrita pela mestranda Esmeralda<br />
Vicente sobre a dissertação de mestrado de Anapatrícia Di Agustini a respeito do uso da internet<br />
como instrumento do composto de Marketing, apresentada ao PMA da Universidade<br />
IMES, em 2001.<br />
<strong>Prof</strong>. <strong>Dr</strong>. rOBerTO eLÍsIO DOs sanTOs<br />
<strong>Prof</strong>essor do Programa de Mestrado em Administração,<br />
editor do Caderno de Gestão & regionalidade PMa-IMes e<br />
coordenador operacional das publicações acadêmicas da Universidade IMES<br />
4 <strong>INTRODUÇÃO</strong>
PersPeCTIVas Para a eDUCaÇÃO<br />
a coordenadora <strong>dos</strong> cursos de educação da<br />
Universidade IMes, professora Célia Maria<br />
haas tem formação na área de Pedagogia,<br />
com licenciatura plena em Docência das Matérias<br />
Pedagógicas do ensino Médio e com<br />
habilitação em Orientação escolar. após<br />
alguns anos atuando na educação básica,<br />
na modalidade de ensino supletivo e com<br />
uma longa experiência em trabalhos comunitários,<br />
na educação de jovens e adultos<br />
e na Febem, fez mestrado em educação na<br />
área de história e Filosofia da educação, na<br />
PUC-sP e, na seqüência, doutorou-se também<br />
em educação, mas na área de supervisão<br />
e Currículo, também na PUC-sP. na<br />
entrevista concedida ao Caderno de Gestão<br />
& Regionalidade 1 , a professora fala sobre a<br />
municipalização do ensino fundamental, a<br />
diferença entre o ensino público e o privado<br />
e sobre os novos cursos ofereci<strong>dos</strong> pela<br />
Universidade IMes.<br />
P – O que vem a ser a municipalização do<br />
ensino fundamental?<br />
<strong>Prof</strong>a. Célia - A municipalização do ensino<br />
fundamental faz parte das reformas do Estado<br />
e está justificada pelo movimento em<br />
direção à descentralização da Educação.<br />
As justificativas para a formulação da política<br />
descentralizadora são as necessidades<br />
de superação das seqüelas decorrentes do<br />
longo período de regime autoritário, a falta<br />
de investimentos em educação básica e<br />
os alarmantes altos índices negativos educacionais.<br />
A Constituição Federal de 1988<br />
possibilitou aos municípios criarem seus<br />
próprios sistemas de ensino, atribuindo a<br />
eles autonomia relativa na formulação de<br />
políticas educacionais para a educação infantil<br />
e para o ensino fundamental.<br />
Tornar o ensino fundamental uma<br />
responsabilidade das prefeituras, e não<br />
mais do governo estadual, tem como objetivo<br />
aumentar a participação <strong>dos</strong> cidadãos<br />
na elaboração, implementação e avaliação<br />
do processo de ensino-aprendizagem.<br />
P – Para que serve?<br />
<strong>Prof</strong>a. Célia - Para assegurar a universalização<br />
do acesso ao ensino fundamental e gratuito<br />
em qualquer idade e sua progressiva extensão<br />
aos demais níveis da educação básica.<br />
1 Entrevista realizada pelo aluno de Iniciação Científica, Eduardo Veríssimo Chaves.<br />
Gestão & Regionalidade - N o 13 - 2 o Semestre 2005<br />
Tem também como objetivo aumentar<br />
a participação <strong>dos</strong> cidadãos na elaboração,<br />
implementação e avaliação do processo<br />
ensino-aprendizagem. Outro, é o de aproximar<br />
diretores, professores, pais e alunos da<br />
administração do sistema de ensino.<br />
P – Quais os pontos positivos e negativos<br />
desta iniciativa?<br />
<strong>Prof</strong>a. Célia - De modo geral, podemos<br />
apontar como aspectos positivos a descentralização<br />
da gestão da educação e,<br />
principalmente, do ensino fundamental,<br />
aproximando pais, professores e alunos, a<br />
possibilidade de um acompanhamento e<br />
avaliação mais próximos e reais, impondo<br />
às instituições um diálogo com os maiores<br />
interessa<strong>dos</strong>: pais e alunos.<br />
Os aspectos negativos dizem respeito<br />
a uma adequada forma de investimento<br />
e controle destes recursos. A decisão<br />
do município em investir na educação<br />
e, sem dúvida, a dificuldade de municípios<br />
sem recursos.<br />
O processo de municipalização do<br />
ensino fundamental ganhou maior velocidade<br />
com o advento do Fundef – Fundo de<br />
Manutenção e Desenvolvimento do Ensino<br />
Fundamental e Valorização do Magistério.<br />
O objetivo que se buscou alcançar<br />
com o Fundef foi o de tornar mais efetiva<br />
a cooperação entre diferentes níveis de<br />
governo, no provimento de recursos e nas<br />
responsabilidades assumidas, em relação à<br />
universalização e à qualidade desse nível<br />
de ensino obrigatório.<br />
P – Existe diferença entre o ensino público<br />
e o ensino privado? se sim, quais?<br />
<strong>Prof</strong>a. Célia - Os dois segmentos, público<br />
e privado, apresentam diferenças e semelhanças.<br />
Ambos devem cumprir a responsabilidade<br />
social, formando o cidadão. Ambos<br />
seguem a legislação, que disciplina cada<br />
grau de ensino. Ambos devem submeter-se<br />
ao controle e avaliação regular do Estado e<br />
ambos são avalia<strong>dos</strong> pela sociedade.<br />
A diferença está nos modelos de<br />
gestão de cada segmento. O sistema público<br />
é regido e administrado pelo Estado e/<br />
ou município. O ensino privado é administrado<br />
pela instituição mantenedora, uma<br />
administração presente, que depende de<br />
resulta<strong>dos</strong> positivos para sua manutenção.<br />
5
Estes resulta<strong>dos</strong> dizem respeito aos resulta<strong>dos</strong><br />
econômico-financeiros e à satisfação<br />
<strong>dos</strong> alunos e pais.<br />
P – Um aluno da rede pública está melhor<br />
qualificado que um aluno da rede particular?<br />
Como?<br />
<strong>Prof</strong>a. Célia - Os alunos podem e devem ser<br />
muito bem qualifica<strong>dos</strong> em qualquer <strong>dos</strong><br />
segmentos. É responsabilidade das instituições<br />
escolares garantirem a adequada formação<br />
de seus alunos. A opção por um ou<br />
outro segmento é de responsabilidade <strong>dos</strong><br />
pais e feita conforme suas possibilidades e<br />
seus objetivos.<br />
P – Como se poderia melhorar o ensino no<br />
país - nas organizações públicas e privadas?<br />
<strong>Prof</strong>a. Célia - Entre inúmeras outras possibilidades,<br />
destaco o investimento responsável<br />
<strong>dos</strong> recursos já defini<strong>dos</strong> pelas legislações<br />
específicas. A qualificação continuada<br />
<strong>dos</strong> professores e, sem dúvida, uma cobrança<br />
<strong>dos</strong> pais e alunos.<br />
P – Comente sobre a iniciativa da Universidade<br />
em promover cursos de Letras.<br />
<strong>Prof</strong>a. Célia - A formação de professores<br />
sempre será uma necessidade. E formações<br />
feitas com qualidade são muito bemvindas.<br />
O IMES não oferecia, até agora,<br />
cursos na área de formação de professores.<br />
Como uma instituição vinculada ao<br />
município de São Caetano e com uma longa<br />
história de bons serviços educacionais,<br />
era hora de ampliar sua atenção, cuidando<br />
de um aspecto importante, a formação<br />
de docentes. E é necessário destacar que<br />
a formação continuada <strong>dos</strong> professores é<br />
uma exigência constante e imposta pela<br />
velocidade da sociedade moderna. Caberá<br />
ao IMES fazer a sua parte, participando<br />
na formação e qualificação <strong>dos</strong> professores<br />
que querem iniciar na carreira ou<br />
querem buscar novos conhecimentos. E<br />
a Licenciatura em Letras traz ainda a formação<br />
em língua estrangeira, oferecendo<br />
a opção entre Língua Inglesa e Língua<br />
Espanhola. O projeto pedagógico do curso<br />
propõe também preparar o professor<br />
para as novas linguagens, enfatizando a<br />
área de educação e comunicação. É sempre<br />
importante lembrar que vivemos o<br />
tempo da internet, da televisão e, portanto,<br />
do ensino a distância.<br />
6 ENTREVISTA<br />
P – Quais os cursos que a universidade irá<br />
criar na área de Letras?<br />
<strong>Prof</strong>a. Célia - O IMES oferece os cursos de<br />
graduação em Letras, modalidade licenciatura,<br />
com habilitações em Língua Portuguesa<br />
e Língua Inglesa e respectivas Literaturas,<br />
e em Língua Portuguesa e Língua<br />
espanhola e respectivas Literaturas.<br />
P – Qual é sua expectativa, como coordenadora<br />
do curso?<br />
<strong>Prof</strong>a. Célia - A nossa expectativa é fazer<br />
um curso de sucesso. Formar professores<br />
com características inovadoras, professores<br />
empreendedores e, assim, contribuir para<br />
fazer da educação municipalizada espaços<br />
de formação de cidadãos felizes.<br />
P – Qual o objetivo <strong>dos</strong> cursos?<br />
<strong>Prof</strong>a. Célia - O curso de Letras deve ser um<br />
centro de qualidade, associando docência,<br />
pesquisa e extensão, contribuindo para o<br />
desenvolvimento da educação e da ciência.<br />
Portanto, visa à formação lingüística, literária,<br />
semiótica, humanística e pedagógica de<br />
futuros professores, pesquisadores, tradutores,<br />
críticos literários, revisores de textos, roteiristas,<br />
assessores e secretários de empresas,<br />
entre outras atividades, os quais se habilitarão<br />
em Português, Inglês e Espanhol.<br />
São objetivos: enfatizar a competência<br />
comunicativa e as habilidades lingüísticas<br />
tanto em língua materna quanto<br />
em língua estrangeira, em termos de recepção,<br />
produção, tradução e interpretação<br />
de texto; desenvolver a percepção das<br />
várias linguagens que, em interação com<br />
a linguagem verbal, apresentam-se constantemente<br />
como informações a serem decodificadas<br />
na realidade em que vivemos;<br />
construir uma compreensão sociocultural e<br />
uma postura crítico-reflexiva em relação às<br />
linguagens estudadas e às línguas e suas<br />
respectivas literaturas; despertar interesse<br />
pela pesquisa científica nas áreas correspondentes<br />
às disciplinas focalizadas no<br />
curso e nas suas interfaces com áreas do conhecimento<br />
afins; capacitar futuros professores<br />
a atuar no ensino fundamental (5 a à<br />
8 a séries) e médio, e no ensino instrumental<br />
de língua, garantindo-lhes o detalhamento<br />
de conteú<strong>dos</strong> específicos atualiza<strong>dos</strong> e de<br />
técnica de ensino compatíveis com a realidade<br />
multissígnica que o mercado de trabalho<br />
oferece.
ensInO FUnDaMenTaL: DO FUnDeF aO FUnDeB<br />
<strong>Prof</strong>. Expedito Nunes* e <strong>Prof</strong>. <strong>Dr</strong>. Antonio Carlos Gil**<br />
resUMO aBsTraCT<br />
Neste ensaio, o autor analisa<br />
a municipalização do ensino fundamental<br />
no Brasil. Este processo foi iniciado<br />
em 1996, com a constituição do<br />
Fundef - Fundo de Manutenção e Desenvolvimento<br />
do Ensino Fundamental<br />
e pode ser avaliado como positivo,<br />
sobretudo porque um grande número<br />
de municípios obteve ganhos financeiros,<br />
num processo crescente de<br />
distribuição. Mas muitos problemas<br />
não puderam ser soluciona<strong>dos</strong>. Tanto<br />
é que o governo federal já propôs a<br />
criação de um novo fundo, o Fundo<br />
de Manutenção e Desenvolvimento<br />
do Ensino Básico (Fundeb).<br />
PaLaVras-ChaVe: ensino fundamental,<br />
municipalização, Fundef.<br />
Gestão & Regionalidade - N o 13 - 2 o Semestre 2005<br />
In this essay, the author analyses<br />
the municipalization of elementary<br />
school in Brazil. This process has begun<br />
in 1996, with the creation of Elementary<br />
School Development and Maintenance<br />
Found (Fundef), and it can be<br />
evaluated as being positive, mainly<br />
because a great number of cities have<br />
got financial gains on an increasing<br />
redistribution process. But many problems<br />
couldn’t be solved. That’s why the<br />
federal government has already proposed<br />
the creation of a new Found,<br />
the Primary School Development and<br />
Maintenance Found (Fundeb).<br />
KeYWOrDs: elementary school,<br />
municipalization, Fundef.<br />
* Mestre em Administração pela Universidade IMES.<br />
** Docente do Programa de Mestrado em Administração da Universidade IMES.<br />
7
1. InTrODUÇÃO<br />
Os problemas sociais decorrentes<br />
do déficit educacional verificado no Brasil<br />
nas últimas décadas têm levado inúmeros<br />
atores educacionais a se manifestar cobrando<br />
das autoridades públicas soluções<br />
para esses problemas. Em resposta a essa<br />
demanda, o governo federal constituiu<br />
pela Emenda Constitucional n o 14/96, e<br />
regulamentou pela Lei n o 9.424/97 o Fundo<br />
de Manutenção e Desenvolvimento do<br />
Ensino Fundamental e de Valorização do<br />
Magistério (Fundef), efetivamente implantado<br />
em 1 o de janeiro de 1998.<br />
A principal inovação do Fundef<br />
consistiu na mudança da estrutura de financiamento<br />
do ensino fundamental no<br />
país, ao vincular a esse nível de ensino uma<br />
parcela <strong>dos</strong> recursos constitucionalmente<br />
destina<strong>dos</strong> à Educação. A Constituição de<br />
1988 vincula 25% das receitas <strong>dos</strong> esta<strong>dos</strong><br />
e municípios à Educação. Com a Emenda<br />
Constitucional n o 14/96, 60% desses recursos<br />
– que representam 15% da arrecadação<br />
global de esta<strong>dos</strong> e municípios – ficam<br />
reserva<strong>dos</strong> ao ensino fundamental. Além<br />
disso, o Fundef introduz novos critérios de<br />
distribuição e utilização de 15% <strong>dos</strong> principais<br />
impostos de esta<strong>dos</strong> e municípios, promovendo<br />
a sua partilha de recursos entre<br />
o governo estadual e seus municípios, de<br />
acordo com o número de alunos atendi<strong>dos</strong><br />
em cada rede de ensino.<br />
Instituído para durar dez anos,<br />
o Fundef contabiliza muitos ganhos, inclusive<br />
um prêmio conferido pela Unesco,<br />
em 2000. Em menos de oito anos, muitos<br />
municípios ajustaram-se a ele com sucesso<br />
apreciável. Há consenso entre os analistas<br />
que o Fundef representou algum progresso<br />
em todas as regiões do país, já que contribuiu<br />
para a redução de desigualdades nos<br />
municípios mais pobres e nas regiões mais<br />
atrasadas. De fato, o Fundef incentivou o<br />
aumento do número de matrículas no ensino<br />
fundamental, melhorou os salários <strong>dos</strong><br />
professores, favoreceu a implantação de<br />
planos de carreira municipais, estimulou a<br />
oferta de vagas e permitiu a capacitação<br />
de professores leigos.<br />
Mas seu sucesso não tem sido igual<br />
em to<strong>dos</strong> os municípios. Além <strong>dos</strong> prejuízos<br />
decorrentes de fraudes e de má gestão<br />
<strong>dos</strong> recursos, as peculiaridades de muitos<br />
municípios e regiões não têm contribuído<br />
para o seu pleno sucesso. Alguns estu<strong>dos</strong><br />
mostram como a descentralização determinada<br />
pelo Fundef, na verdade, distribuiu<br />
encargos aos municípios, sem a garantia<br />
de uma correspondente fonte estável de<br />
financiamento (MARTINS, OLIVEIRA, BUE-<br />
NO, 2004). Tanto é que antes mesmo de<br />
completar o decênio, o governo federal já<br />
elaborou projeto de criação de novo fundo<br />
de financiamento, que abarca agora toda a<br />
educação básica: o Fundo de Manutenção e<br />
Desenvolvimento da Educação Básica e de<br />
Valorização <strong>dos</strong> <strong>Prof</strong>issionais da Educação<br />
(Fundeb). Esse projeto, apresentado como<br />
uma Proposta de Emenda Constitucional,<br />
foi debatido por entidades representativas<br />
em nível estadual e municipal e enviado ao<br />
Congresso Nacional para apreciação.<br />
2. a MUnICIPaLIZaÇÃO DO ensInO nO<br />
BrasIL<br />
A discussão a respeito da municipalização<br />
do ensino não é nova. Já esteve<br />
presente em debates ocorri<strong>dos</strong> logo após<br />
o Ato Adicional de 1834, que delegou às<br />
províncias a prerrogativa de legislar sobre<br />
a educação primária (SUCUPIRA, 1996), em<br />
reformas verificadas em vários esta<strong>dos</strong> ainda<br />
na Primeira República (NAGLE, 1974) e<br />
no Manifesto <strong>dos</strong> Pioneiros, de 1932. Foi,<br />
porém, com a proposta de Anísio Teixeira<br />
(1957), que o tema da municipalização do<br />
ensino passou a ser mais intensamente debatido.<br />
Segundo esse educador, a educação,<br />
por sua natureza, é um processo que<br />
envolve grande autonomia <strong>dos</strong> seus participantes<br />
e quanto menor for a unidade de<br />
serviços a administrar, tanto melhor será a<br />
administração e mais se evitarão os males<br />
irremediáveis do processo de mecanização<br />
das macroorganizações. Assim, enquanto<br />
não se puder estabelecer a unidade distrital,<br />
a unidade municipal constituirá a<br />
melhor unidade administrativa do sistema<br />
escolar brasileiro. Admitia ainda Teixeira<br />
que a escola estava sendo concebida<br />
como uma comunidade integrada dentro<br />
da comunidade maior da cidade, da vila<br />
ou do povoado. Assim, a administração<br />
local concorreria para tornar possível essa<br />
integração, tornando a escola a instituição<br />
fundamental da comunidade, servindo-a<br />
e dela se servindo para a vitalidade<br />
e riqueza <strong>dos</strong> seus processos educativos. O<br />
professor, de nomeação local e lealdade<br />
ARTIGO
local, deixaria, portanto, de ser “o estranho,<br />
a autoridade consular e passageira,<br />
um quase hóspede da comunidade, para<br />
se sentir responsável e integrante dessa<br />
comunidade”.<br />
Na década de 1980, houve o incentivo<br />
de participação <strong>dos</strong> municípios, em<br />
programas de parcerias. Multiplicaram-se os<br />
convênios entre esta<strong>dos</strong> e municípios, com<br />
vistas ao transporte de alunos, à merenda<br />
escolar, às construções escolares. Iniciou-se,<br />
assim, o processo de municipalização do ensino<br />
pré-escolar.<br />
A Constituição de 1988, promulgada<br />
após a redemocratização do país,<br />
deu destaque à universalização do ensino<br />
fundamental e à erradicação do analfabetismo.<br />
Em seu artigo 211, parágrafo 2 o , a<br />
Constituição propõe que os “municípios<br />
atuem prioritariamente no ensino fundamental<br />
e pré-escola”.<br />
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação<br />
Nacional, aprovada em 1996, por sua<br />
vez, firmou em seu artigo 11 as incumbências<br />
<strong>dos</strong> municípios em relação aos seus<br />
sistemas de ensino. Num parágrafo único,<br />
mantém a possibilidade da integração do<br />
município ao sistema estadual ou de compor<br />
com o estado um sistema único de<br />
educação básica. Dessa forma, a responsabilidade<br />
do município passou a ser a de<br />
oferecer a educação infantil em creches e<br />
pré-escolas e, prioritariamente, o ensino<br />
fundamental, permitindo a atuação em<br />
outros níveis somente quando estiverem<br />
atendidas plenamente as necessidades de<br />
sua área de competência e com recursos<br />
acima <strong>dos</strong> percentuais mínimos, vincula<strong>dos</strong><br />
pela Constituição Federal à manutenção e<br />
desenvolvimento do ensino.<br />
Foi, porém, com a aprovação da<br />
Emenda Constitucional n o 14, em 12 de<br />
setembro de 1996, que foi dado o passo<br />
inicial para a implantação de um novo<br />
sistema regimental sobre o ensino fundamental<br />
no país.<br />
. a eMenDa COnsTITUCIOnaL n o 14 e O<br />
Fundef<br />
A Emenda Constitucional n o 14 alterou<br />
os parágrafos do artigo 211, que passaram<br />
a ter a seguinte redação:<br />
“Art. 211 – A União, os esta<strong>dos</strong>, o Distrito<br />
Federal e os municípios organi-<br />
Gestão & Regionalidade - N o 13 - 2 o Semestre 2005<br />
zarão em regime de colaboração seus<br />
sistemas de ensino.<br />
Parágrafo 1 o – A União organizará o sistema<br />
federal de ensino e o <strong>dos</strong> Territórios,<br />
financiará as instituições de ensino públicas<br />
federais e exercerá, em matéria educacional,<br />
função redistributiva e supletiva,<br />
de forma a garantir equalização de oportunidades<br />
educacionais e padrão mínimo<br />
de qualidade do ensino mediante assistência<br />
técnica e financeira aos esta<strong>dos</strong>, ao<br />
Distrito Federal e aos municípios.<br />
Parágrafo 2 o – Os municípios atuarão<br />
prioritariamente no ensino fundamental<br />
e na educação infantil.<br />
Parágrafo 3 o – Os esta<strong>dos</strong> e o Distrito Federal<br />
atuarão prioritariamente no ensino<br />
fundamental e médio.<br />
Parágrafo 4 o – Na organização de seus<br />
sistemas de ensino, os esta<strong>dos</strong> e os municípios<br />
definirão formas de colaboração,<br />
de modo a assegurar a universalização do<br />
ensino obrigatório”.<br />
Esta emenda também incluiu uma<br />
alínea, no inciso VII do artigo 34 da Constituição,<br />
que trata das situações excepcionais<br />
de intervenção da União nos esta<strong>dos</strong>, ou<br />
<strong>dos</strong> esta<strong>dos</strong> nos municípios, que passou a<br />
vigorar nos seguintes termos:<br />
“Art. 34 – A União não intervirá nos esta<strong>dos</strong><br />
nem no Distrito Federal, exceto para:<br />
(...)<br />
VII – Assegurar a observância <strong>dos</strong> seguintes<br />
princípios constitucionais:<br />
(...)<br />
e) Aplicação do mínimo exigido da receita<br />
resultante de impostos estaduais,<br />
compreendida a proveniente de transferências,<br />
na manutenção e desenvolvimento<br />
do ensino”.<br />
Definiu-se, assim, o poder da<br />
União em intervir nos esta<strong>dos</strong> e Distrito<br />
Federal, caso não fosse cumprida a obrigatoriedade<br />
de aplicar o mínimo exigido de<br />
receita na manutenção e desenvolvimento<br />
do ensino. Além disso, a Emenda criou,<br />
como fonte adicional de financiamento do<br />
ensino fundamental público, a contribuição<br />
social do salário-educação, a ser recolhida<br />
pelas empresas, na forma em que dispor a<br />
lei. E, mediante alterações no artigo 60 do<br />
Ato das Disposições Constitucionais Transitórias,<br />
instalou o Fundo de Manutenção e<br />
9
Desenvolvimento do Ensino Fundamental e<br />
de Valorização do Magistério ou Fundef.<br />
A Emenda Constitucional n o 14<br />
foi regulamentada pela Lei 9.424, de 24<br />
de dezembro de 1996, que, por sua vez,<br />
teve como regulamento o Decreto 2.264,<br />
de 1997.<br />
O Fundef, que começou a funcionar<br />
em janeiro de 1998, é um fundo instituído<br />
em cada estado da Federação e no<br />
Distrito Federal, cujos recursos devem ser<br />
aplica<strong>dos</strong> exclusivamente na manutenção<br />
e desenvolvimento do ensino fundamental<br />
público e na valorização de seu magistério.<br />
Em cada estado, o Fundef é composto<br />
por recursos do próprio estado e<br />
de seus municípios, sendo constituído por<br />
15% do:<br />
·<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
Fundo de Participação do Estado<br />
(FPE);<br />
Fundo de Participação <strong>dos</strong> municípios<br />
(FPM);<br />
Imposto sobre Circulação de Mercadorias<br />
e Serviços (ICMS);<br />
Recursos relativos à desoneração de<br />
exportações, de que trata a Lei Complementar<br />
n o 87/96;<br />
Imposto sobre Produtos Industrializa<strong>dos</strong>,<br />
proporcional às exportações<br />
(IPI-exp).<br />
Os recursos do Fundef, constituí<strong>dos</strong><br />
na forma acima, são redistribuí<strong>dos</strong><br />
automaticamente aos esta<strong>dos</strong> e seus municípios,<br />
proporcionalmente ao número<br />
de matrículas no ensino fundamental das<br />
respectivas redes de ensino, constantes do<br />
Censo MEC do ano anterior.<br />
Para consecução de seus objetivos,<br />
a Lei 9.424/96 determinou a criação <strong>dos</strong><br />
Conselhos de Acompanhamento e Controle<br />
Social do Fundef, instituí<strong>dos</strong> em cada esfera<br />
de governo, tendo por atribuição acompanhar<br />
e controlar a repartição, a transferência<br />
e a aplicação <strong>dos</strong> recursos do Fundo.<br />
Esses Conselhos são compostos de pelo<br />
menos quatro membros, representando a<br />
Secretaria Municipal de Educação ou órgão<br />
equivalente, os professores e diretores das<br />
escolas públicas de ensino fundamental, os<br />
pais de alunos, os servidores das escolas e,<br />
se houver no município, um representante<br />
do Conselho Municipal de Educação.<br />
A Lei estabelece também que os<br />
municípios devem dispor de um Plano de<br />
10 ARTIGO<br />
Carreira e Remuneração do Magistério, com<br />
o objetivo de regulamentar as condições de<br />
carreira, estabelecendo a evolução funcional<br />
e respectivos critérios de promoções.<br />
4. aVaLIaÇÃO DO Fundef<br />
Segundo avaliação do Ministério<br />
da Educação (1998-2000), o Fundef representou<br />
uma autêntica revolução no atendimento<br />
ao ensino fundamental nas redes<br />
públicas do país, especialmente pelo seu<br />
critério redistributivo de recursos. De acordo<br />
com seus relatórios, o modelo tornou<br />
possível direcionar os recursos reserva<strong>dos</strong><br />
à Educação para onde, de fato, estavam os<br />
alunos. A partir da instituição do Fundo, movimentaram-se<br />
recursos <strong>dos</strong> governos com<br />
maior capacidade financeira e/ou com um<br />
baixo nível de participação no atendimento<br />
escolar para os municípios em situação inversa.<br />
No primeiro ano de funcionamento<br />
do Fundef, em 1998, 2.703 municípios obtiveram<br />
ganhos financeiros, em um processo<br />
crescente de redistribuição. Em 2001, 3.404<br />
municípios foram beneficia<strong>dos</strong>, obtendo<br />
uma receita adicional de R$ 2,9 bilhões. A<br />
reserva de 60% <strong>dos</strong> recursos do Fundo para<br />
a remuneração do Magistério representou<br />
aumentos significativos nos salários <strong>dos</strong><br />
professores em efetivo exercício da docência<br />
no ensino fundamental. Entre dezembro<br />
de 1997 e junho de 2000, o aumento médio<br />
na remuneração <strong>dos</strong> professores foi de<br />
29,6%, com destaque para algumas regiões,<br />
como o Nordeste, onde os docentes do ensino<br />
fundamental foram beneficia<strong>dos</strong> com<br />
um aumento médio de 59,6%, aí incluídas<br />
as redes municipais e estaduais. Com o crescimento<br />
de suas receitas, os municípios nordestinos<br />
se destacaram no aumento concedido<br />
aos professores, atingindo uma média<br />
de 70,2%, no mesmo período. Aliado ao aumento<br />
no número de alunos matricula<strong>dos</strong><br />
nas redes públicas do país – de 30,5 milhões<br />
de alunos em 1997, para 32,5 milhões em<br />
2000 – cresceu o número de professores atuando<br />
neste nível de ensino, com um aumento<br />
de 10%, representando 127 mil novos<br />
postos de trabalho para o Magistério.<br />
A despeito, porém, <strong>dos</strong> reconheci<strong>dos</strong><br />
méritos da proposta de municipalização<br />
do ensino fundamental, constata-se que a<br />
implantação do Fundef tem trazido problemas<br />
para muitos municípios. Tais problemas<br />
colocam em risco a própria aplicação da lei
e o seu propósito, que é o de estabelecer a<br />
eqüidade na aplicação <strong>dos</strong> recursos públicos<br />
destina<strong>dos</strong> ao financiamento da educação<br />
municipal. Em alguns municípios, a municipalização<br />
ocorreu em ritmo acelerado a<br />
partir de 1997. Esses municípios assim procederam<br />
porque tinham a expectativa de<br />
que passariam a ter mais recursos para desenvolver<br />
suas políticas sociais. Mas isto não<br />
está acontecendo em muitos desses municípios.<br />
O que vem ocorrendo, de fato, é a<br />
transferência de encargos do estado para os<br />
municípios, que passam, conseqüentemente,<br />
a ter maiores dificuldades em relação<br />
ao financiamento e ao gerenciamento da<br />
educação fundamental, comprometendo a<br />
qualidade do ensino.<br />
Outro problema que se tornou<br />
evidente com a municipalização foi a saída<br />
abrupta do governo do estado na oferta da<br />
educação infantil e de classes de suplência<br />
da 1 a à 4 a séries, muitas vezes, com o simples<br />
fechamento de turmas no final do ano<br />
letivo, deixando a população sem a oferta<br />
de educação para esses segmentos. Essa situação,<br />
por sua vez, vem gerando pressões<br />
sobre as prefeituras, para a oferta desse serviço.<br />
Dessa forma, as prefeituras, que foram<br />
obrigadas a assumir o ensino fundamental<br />
para não perder recursos, são agora obrigadas<br />
a assumir, também, a oferta da educação<br />
infantil e das turmas de suplência da 1 a<br />
à 4 a série, acarretando, com isso, a elevação<br />
de suas despesas com educação. Essa elevação<br />
tem levado ao comprometimento de<br />
outros itens orçamentários, gerando novos<br />
problemas de investimento em outras áreas<br />
sociais, levando a um círculo vicioso de causa<br />
e efeito.<br />
Ainda um outro problema decorrente<br />
do processo de municipalização a que<br />
os municípios estão sujeitos é o aumento expressivo<br />
de novos funcionários municipais.<br />
Problema que se torna mais complexo quando<br />
se considera que a maioria <strong>dos</strong> servidores<br />
traz do estado o seu tempo de serviço e que<br />
muitos trabalharão no município não mais<br />
que cinco ou dez anos e, em seguida, serão<br />
aposenta<strong>dos</strong> pelo Tesouro municipal, o que<br />
poderá tornar inviável a administração a<br />
médio ou longo prazo.<br />
Pode-se perceber, claramente, que,<br />
por trás da idéia de se estabelecer uma eqüidade<br />
na distribuição <strong>dos</strong> recursos públicos<br />
– que é muito nobre – assiste-se a uma transferência<br />
de obrigações de outras esferas da<br />
Gestão & Regionalidade - N o 13 - 2 o Semestre 2005<br />
Federação para os municípios, sem a devida<br />
transferência de recursos. Dessa maneira, os<br />
municípios, que são os entes públicos mais<br />
suscetíveis às pressões populares por mais<br />
serviços, além de terem escassas possibilidades<br />
de alterar sua política de arrecadação,<br />
tornam-se ainda mais penaliza<strong>dos</strong>.<br />
A maior virtude da municipalização<br />
está em seu caráter local e comunitário. No<br />
entanto, para que ela se torne eficaz, é necessário<br />
que a sociedade local seja capaz de<br />
exercer seu direito à informação e à participação.<br />
Que ela possa participar do processo<br />
de formulação e avaliação das políticas educacionais<br />
e da fiscalização de sua execução.<br />
Esta presença da sociedade exige, portanto,<br />
a incorporação de categorias e grupos sociais<br />
envolvi<strong>dos</strong> direta ou indiretamente no<br />
processo educativo, e que, freqüentemente,<br />
têm sido excluí<strong>dos</strong> das decisões, tais como<br />
os funcionários e professores, os pais e os<br />
próprios alunos. Isto implica, de certa forma,<br />
tirar <strong>dos</strong> governantes e <strong>dos</strong> técnicos da<br />
área o monopólio de determinar os rumos<br />
da educação no município. Quanto mais<br />
representatividade houver, maior será a capacidade<br />
de intervenção e fiscalização da<br />
sociedade civil.<br />
Esta participação da sociedade local<br />
nem sempre ocorre, o que torna difícil o<br />
êxito da municipalização. Somando-se a isso<br />
o fato de o processo vir penalizando muitos<br />
municípios, é natural que alguns deles estejam<br />
inclina<strong>dos</strong> a rejeitar a municipalização.<br />
A opção de integração ao sistema estadual,<br />
no entanto, não significa para o município<br />
abrir mão de seus deveres em relação à educação<br />
e às escolas, mas sim à perda parcial<br />
de sua autonomia nesse setor. O município<br />
não pode, sob qualquer pretexto, eximir-se<br />
das responsabilidades relativas ao ensino<br />
fundamental, até mesmo porque, de qualquer<br />
maneira, a manutenção das instituições<br />
de educação infantil continuará a cargo<br />
da esfera municipal. Com efeito, deixar<br />
simplesmente que o governo estadual ou<br />
federal assuma ou realize atividades de âmbito<br />
local ou regional, significa, na realidade,<br />
uma renúncia à autonomia municipal.<br />
Ou, em outras palavras: retirar <strong>dos</strong> cidadãos<br />
a possibilidade de intervir diretamente nas<br />
ações públicas que lhes dizem respeito.<br />
Para Ângela Maria Martins (2002),<br />
pesquisadora da Fundação Carlos Chagas,<br />
a municipalização do ensino, permitiu a<br />
relocação do centro de poder e tornou as<br />
11
secretarias municipais mais visíveis. Uma<br />
das principais justificativas para a municipalização<br />
foi a de que tanto professores e<br />
diretores como os próprios pais <strong>dos</strong> alunos<br />
tinham uma relação distante com o governo<br />
estadual e, ao tornar o município responsável<br />
pela educação, eles estariam mais<br />
próximos da administração. Com o Fundef,<br />
as negociações passaram a ocorrer diretamente,<br />
pois os integrantes do processo estão<br />
mais próximos.<br />
Ainda, de acordo com a pesquisadora,<br />
um <strong>dos</strong> principais benefícios do Fundef<br />
é que os professores se sentem mais<br />
cuida<strong>dos</strong> e seguros, com maior suporte para<br />
aplicar o seu trabalho. Mas, por outro lado,<br />
a municipalização criou uma instabilidade<br />
profissional para os professores. Aqueles<br />
que reivindicam melhores salários correm o<br />
risco de serem transferi<strong>dos</strong> para escolas distantes<br />
de suas residências ou de serem demiti<strong>dos</strong>.<br />
Assim, à medida em que se encurtou<br />
a proximidade com o poder, aumentou<br />
a vulnerabilidade do profissional.<br />
Arelaro (1999) constata que o Estado<br />
de São Paulo, apesar do alto nível de<br />
escolarização é o Estado com menor índice<br />
de municipalização. Nesse sentido, formula<br />
a hipótese de que os municípios encontram-se<br />
num estado de desconfiança e que,<br />
sem terem alguma segurança quanto à<br />
concretização das propostas atuais do governo<br />
federal para a reforma tributária e<br />
o compromisso efetivo das três esferas, em<br />
relação ao ensino fundamental e ao analfabetismo,<br />
não estarão dispostos a avançar<br />
nessa questão.<br />
Rosar e Sousa (1999), após analisarem<br />
a política de municipalização no Estado<br />
do Maranhão, admitem que a concretização<br />
dessa política tenha produzido mais efeitos<br />
publicitários do que melhoras significativas<br />
na qualidade <strong>dos</strong> serviços educacionais ofereci<strong>dos</strong><br />
à população. A ações mais visíveis,<br />
como melhoria na infra-estrutura de algumas<br />
escolas, a distribuição de livros didáticos<br />
e ações de capacitação, encobrem a ausência<br />
de preocupação com os aspectos mais<br />
especificamente pedagógicos, como o currículo,<br />
o perfil do profissional da educação,<br />
sua qualificação, remuneração e carreira.<br />
Veiga e Costa (2000), analisando<br />
o processo de municipalização do ensino<br />
fundamental em Minas Gerais, reconhecem<br />
que o impacto do Fundef sobre a reconfiguração<br />
da oferta da rede pública de ensino é<br />
12 ARTIGO<br />
impressionante. No entanto, atentam para<br />
possíveis riscos, decorrentes principalmente<br />
do caráter um tanto abrupto do processo<br />
de municipalização. Dadas as diferentes<br />
capacidades <strong>dos</strong> municípios, um processo<br />
pouco cuida<strong>dos</strong>o pode resultar em soluções<br />
de continuidade ou perda de qualidade no<br />
atendimento, principalmente no caso <strong>dos</strong><br />
municípios mais frágeis economicamente,<br />
nos quais há maior concentração de pobreza<br />
e baixa concentração de recursos humanos<br />
qualifica<strong>dos</strong> na rede. Assim, a ausência<br />
de um planejamento adequado para estabelecer<br />
o ritmo do envolvimento da rede<br />
municipal na oferta e do tipo de apoio demandado<br />
por municípios específicos para<br />
enfrentar os desafios da universalização da<br />
oferta pode ter resulta<strong>dos</strong> perversos, inclusive<br />
o de se traduzir em aumento de disparidades<br />
entre os municípios, em lugar de sua<br />
redução, como seria desejável.<br />
Fica claro, portanto, que o processo<br />
de municipalização não se faz sem problemas.<br />
Lima (1994) lembra que, nas duas<br />
últimas décadas do século XX, a descentralização,<br />
a autonomia e a participação foram<br />
utilizadas como estratégia política para<br />
transferir a responsabilidade pela Educação<br />
para instituições não-estatais. Para ele:<br />
“a autonomia (mitigada) é um instrumento<br />
fundamental de construção de um espírito<br />
e de uma cultura de organização-empresa;<br />
a descentralização é congruente com a «ordem<br />
espontânea» do mercado, respeitadora<br />
da liberdade individual e garante a eficiência<br />
econômica: a participação é essencialmente<br />
uma técnica de gestão, um fator de<br />
coesão e de consenso” (p. 22).<br />
Anísio Teixeira (1959) já acentuava<br />
que sem raízes locais, sem individualidade,<br />
as escolas se fazem o joguete <strong>dos</strong> interesses<br />
do professorado, já que ele próprio também<br />
é desenraizado e sem lealdades locais.<br />
Oliveira (1999) considera que não<br />
perder os recursos do Fundef é algo desejável<br />
e que vem dando oportunidade para<br />
se criar artifícios para burlar a lei, como a<br />
criação de alunos e funcionários fantasmas.<br />
Ressalta, ainda, que a indução à municipalização<br />
não considera a questão <strong>dos</strong> recursos<br />
humanos em condições de gerir, com sucesso,<br />
um sistema de ensino e teme que parte<br />
dessa gestão possa cair nas mãos de escritórios<br />
de assessoria, nas mãos de editoras, nas<br />
mãos de sistemas de comunicação, nas mãos<br />
de empresas particulares.
Para Mendes (2001), o Fundef parece<br />
ter atingido seus principais objetivos, ao<br />
exercer importante impacto sobre o ensino<br />
fundamental, principalmente por meio da<br />
elevação do grau de escolaridade <strong>dos</strong> professores,<br />
do aumento da duração <strong>dos</strong> turnos<br />
de aula, do total de alunos matricula<strong>dos</strong>,<br />
do número de professores em atividade,<br />
bem como da redução do atraso escolar ao<br />
substituir prioridades, além de estimular a<br />
municipalização do ensino. Além de ter havido<br />
progresso <strong>dos</strong> indicadores em todas as<br />
regiões do país, houve também uma nítida<br />
minimização das desigualdades nacionais,<br />
com os municípios de regiões atrasadas e de<br />
baixo ICV tendo uma melhor performance<br />
relativa. Mas, para esse autor, também há<br />
evidências de que é justamente nesses municípios,<br />
em especial naqueles que recebem<br />
recursos complementares da União, que se<br />
concentram as fraudes e a má gestão <strong>dos</strong> recursos<br />
do Fundef, o que constitui indicação<br />
para que haja um maior direcionamento<br />
<strong>dos</strong> sistemas de fiscalização, <strong>dos</strong> programas<br />
de treinamento e da gestão municipal patrocina<strong>dos</strong><br />
pelo governo federal.<br />
Convêm ressaltar também que<br />
indícios de fraude no uso <strong>dos</strong> recursos do<br />
Fundef geraram preocupação no meio político,<br />
a ponto de a Comissão de Educação da<br />
Câmara <strong>dos</strong> Deputa<strong>dos</strong> instalar uma subcomissão<br />
para estudar o assunto. O relatório<br />
produzido listou irregularidades, como desconsideração<br />
de orientações do Tribunal de<br />
Contas; desconhecimento de princípios básicos<br />
de gestão financeira e de técnica orçamentária;<br />
desvio de finalidade <strong>dos</strong> recursos,<br />
sem que se caracterize apropriação indébita;<br />
atraso no pagamento de professores; prestação<br />
de serviço de qualidade inadequada,<br />
como, por exemplo, transportar alunos em<br />
carrocerias de caminhão; aplicação de menos<br />
de 60% <strong>dos</strong> recursos do Fundef em salários<br />
de professores e na formação de professores<br />
leigos; pagamentos de multa, de taxas<br />
e de juros, provenientes de movimentação<br />
da conta bancária, com recursos do Fundef;<br />
inexistência ou não aplicação de plano de<br />
cargos e carreira de professores e de funcionários;<br />
inexistência, falta de condições de<br />
trabalho ou irregularidades na nomeação<br />
<strong>dos</strong> membros do Conselho do Fundef; licitação<br />
viciada ou fraudada; emissão de notas<br />
fiscais frias; superfaturamento de obras e de<br />
serviços; obras ou serviços fantasmas; cadastros<br />
fictícios de alunos, de professores e de<br />
Gestão & Regionalidade - N o 13 - 2 o Semestre 2005<br />
escolas; apropriação indébita de recursos do<br />
Fundef (MENDES, 2000).<br />
5. a CrIaÇÃO DO Fundeb<br />
O Poder Executivo encaminhou ao<br />
Congresso Nacional Proposta de Emenda<br />
Constitucional (PEC) que cria o Fundo de<br />
Manutenção e Desenvolvimento da Educação<br />
Básica (Fundeb). Este fundo prevê o<br />
aumento <strong>dos</strong> recursos aplica<strong>dos</strong> pela União,<br />
esta<strong>dos</strong> e municípios na educação básica pública<br />
e melhorarias na formação e no salário<br />
<strong>dos</strong> profissionais da educação (MINISTÉRIO<br />
DA EDUCAÇÃO, 2005).<br />
Com duração de 14 anos (2006-<br />
2019), o Fundeb atenderá os alunos da educação<br />
infantil, do ensino fundamental e médio<br />
e da educação de jovens e adultos e será<br />
implantado de forma gradativa nos quatro<br />
primeiros anos. O objetivo é atender, no<br />
quarto ano de vigência, 47,2 milhões de<br />
alunos, com investimentos públicos anuais<br />
de R$ 50,4 bilhões, <strong>dos</strong> quais R$ 4,3 bilhões,<br />
provenientes da União.<br />
De acordo com a proposta, a União<br />
complementará os recursos quando, nos esta<strong>dos</strong><br />
e no Distrito Federal, o valor anual por<br />
aluno não alcançar o mínimo definido nacionalmente.<br />
No atual Fundef, o Ministério<br />
da Educação investe, em média, R$ 570 milhões/ano<br />
para a complementação do fundo.<br />
Com o Fundeb, haverá muito mais recursos<br />
da União para a educação básica. Em quatro<br />
anos, o investimento federal será crescente,<br />
até chegar a R$ 4,3 bilhões anuais em 2009.<br />
Do montante do Fundeb, inclusive<br />
da complementação da União, pelo menos<br />
60% <strong>dos</strong> recursos são para o pagamento <strong>dos</strong><br />
salários <strong>dos</strong> profissionais do Magistério, em<br />
exercício. Assim, além de garantir mais recursos<br />
para a remuneração <strong>dos</strong> professores,<br />
o Fundeb também se propõe a melhorar a<br />
infra-estrutura das escolas e a abrir mais vagas<br />
para crianças e jovens na sala de aula.<br />
Segundo justificativa do Ministério<br />
da Educação, o Fundeb lança um novo olhar<br />
sobre a escola pública. Diferentemente do<br />
Fundef, que destina recursos somente para<br />
o ensino fundamental, o Fundo da Educação<br />
Básica, além do fundamental, também<br />
investirá na educação infantil, no ensino<br />
médio e na educação de jovens e adultos. O<br />
novo fundo atenderá, em suas necessidades<br />
específicas, diversas realidades <strong>dos</strong> alunos,<br />
por série, idade e locais onde estudam.<br />
1
O atual Fundef trabalha com quatro<br />
faixas de valores por aluno/ano. O Fundeb<br />
terá 11 faixas: educação infantil, 1 a à 4 a<br />
série urbana, 1 a à 4 a série rural, 5 a à 8 a série<br />
urbana, 5 a à 8 a série rural, ensino médio<br />
urbano, ensino médio rural, ensino médio<br />
profissionalizante, educação de jovens e<br />
adultos e educação especial, além de educação<br />
indígena e de quilombolas.<br />
A cesta de impostos <strong>dos</strong> esta<strong>dos</strong>,<br />
do Distrito Federal e <strong>dos</strong> municípios que vão<br />
financiar o Fundeb é composta por 20% de<br />
vários tributos: Fundo de Participação <strong>dos</strong><br />
esta<strong>dos</strong> (FPE), Fundo de Participação <strong>dos</strong> municípios<br />
(FPM), Imposto sobre Circulação de<br />
Mercadorias e Serviços (ICMS), Imposto sobre<br />
Produtos Industrializa<strong>dos</strong> proporcional às<br />
exportações (IPI-exp), Imposto sobre Transmissão<br />
Causa Mortis (ITCMD), Imposto sobre<br />
Propriedade de Veículos Automotores (IPVA),<br />
Imposto sobre Renda e Proventos incidentes<br />
sobre rendimentos pagos pelos municípios,<br />
Imposto sobre Renda e Proventos incidentes<br />
sobre rendimentos pagos pelos esta<strong>dos</strong>,<br />
cota-parte de 50% do Imposto Territorial<br />
Rural (ITR) devida aos municípios. A União<br />
complementará os recursos nos esta<strong>dos</strong> que<br />
não alcançarem o valor mínimo nacional por<br />
aluno/ano, fixado para cada exercício.<br />
A Proposta de Emenda Constitucional<br />
que cria o Fundeb foi debatida com<br />
os esta<strong>dos</strong> e municípios, por meio das suas<br />
entidades representativas como o Consed<br />
(Conselho Nacional <strong>dos</strong> Secretários Estaduais<br />
de Educação) e a União Nacional <strong>dos</strong><br />
Dirigentes Municipais de Educação (Undime)<br />
e com outras entidades que congregam<br />
profissionais de educação, e foi enviada<br />
ao Congresso Nacional, em 14 de junho<br />
de 2005.<br />
A proposta de criação do Fundeb<br />
já recebeu diversas críticas. Uma delas é a<br />
de que o projeto que prevê a criação do<br />
fundo deixou de fora as creches públicas,<br />
que atendem crianças de até três anos. O<br />
trabalho dessas instituições é considerado<br />
imprescindível pela própria Lei de Diretrizes<br />
e Bases da Educação, formulada pelo<br />
MEC. É na creche – através de brincadeiras<br />
e de contato com colegas – que uma criança<br />
se prepara para a alfabetização e o ensino<br />
formal. Dessa forma, o Fundeb, como<br />
já fez o Fundef, continuaria excluindo 11,3<br />
milhões de crianças menores de 3 anos. Isso<br />
é crítico porque o atendimento em creches<br />
é considerada a etapa mais precária<br />
14 ARTIGO<br />
do ensino público. Segundo o Movimento<br />
Interfóruns de Educação Infantil do Brasil<br />
(Mieib), só uma em cada nove crianças com<br />
menos de três anos está matriculada em<br />
creches. E o público mais carente fica de<br />
fora. Apenas 8% das crianças nas creches<br />
vêm de famílias pobres, com renda inferior<br />
a meio salário-mínimo (COTES, 2005).<br />
A Conferência Nacional de municípios<br />
(2005) também já apresentou críticas<br />
à Proposta de Emenda Constitucional.<br />
Segundo documento elaborado por essa<br />
instituição, por não estarem claramente<br />
defini<strong>dos</strong> os pesos atribuí<strong>dos</strong> a cada etapa<br />
da educação básica, o processo de fixação<br />
de valores por aluno diferenciado, para a<br />
redistribuição desses recursos, poderá implicar<br />
conflitos federativos nos quais os<br />
municípios historicamente têm sido prejudica<strong>dos</strong>.<br />
Essa proposta de fundo único<br />
representará repasse de recursos do ensino<br />
fundamental que são de responsabilidade<br />
<strong>dos</strong> municípios para financiar o ensino médio,<br />
de responsabilidade <strong>dos</strong> esta<strong>dos</strong>. Pelas<br />
simulações realizadas pela CNM, quase metade<br />
<strong>dos</strong> municípios terá prejuízo, em favor<br />
<strong>dos</strong> governos estaduais.<br />
A Campanha Nacional pelo Direito<br />
à Educação, que representa cerca de 120<br />
instituições, também já encaminhou críticas<br />
ao Fundeb. Em nota, as entidades afirmam<br />
que o texto a ser encaminhado ao Congresso<br />
“não responde aos desafios coloca<strong>dos</strong> na implementação<br />
do Plano Nacional de Educação<br />
(PNE)”. O documento enumera quatro pontos<br />
em que considera a proposta do governo<br />
limitada: a) a exclusão das creches (para<br />
crianças de zero a três anos) na distribuição<br />
da verba do Fundeb; b) a falta de definição<br />
de um custo-aluno baseado na qualidade; c)<br />
a retirada do percentual fixo de 10% de participação<br />
da União para complementar os recursos;<br />
d) a ausência de um piso salarial para<br />
os professores (ENTIDADE, 2005).<br />
6. COnsIDeraÇÕes FInaIs<br />
Não há como subestimar o Fundef,<br />
sobretudo porque constitui a efetivação de<br />
uma das mais significativas propostas no<br />
campo da educação fundamental. Também<br />
não há como deixar de apoiar a criação do<br />
Fundeb, proposta que se originou da análise<br />
<strong>dos</strong> erros e acertos do Fundef. Mas para que<br />
essa iniciativa possa ter sucesso, é imperioso<br />
que seja debatida não apenas por organis-
mos oficiais e entidades representativas de<br />
professores, como também por outras organizações<br />
e movimentos da sociedade civil.<br />
Mais do que em qualquer outro<br />
momento de nossa história, a sociedade civil<br />
vem se organizando, não apenas com o objetivo<br />
de reivindicar, mas também de mostrar<br />
sua indignação com o comportamento<br />
de políticos que se valem da máquina pública<br />
com propósitos que não têm a coragem<br />
reFerÊnCIas BIBLIOGrÁFICas<br />
ARELARO, Lisete Regina Gomes. A municipalização<br />
do ensino no Estado de São Paulo:<br />
antecedentes históricos e tendências. In:<br />
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(Fundef). Deputado Gilmar Machado.<br />
Brasília, 2001 (mimeo).<br />
Entidade entregará ao governo documento<br />
com críticas ao novo fundo. Folha online-educação.<br />
14 jun. 2005. Disponível em:<br />
.<br />
Acesso em: 26 ago. 2005.<br />
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CNM e Famurs apresentarão proposta alternativa<br />
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LIMA, Licínio C. Modernização, racionalização<br />
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BUENO, Maria Sylvia Simões (orgs.). Descentralização<br />
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ensino: problemas e perspectivas. Rio de<br />
Janeiro: DP&A, 2004.<br />
Gestão & Regionalidade - N o 13 - 2 o Semestre 2005<br />
de confessar. Considerando, pois, que a efetivação<br />
do Fundeb implica o uso de vultosos<br />
recursos, é imperioso que se criem mecanismos<br />
que possibilitem a maior transparência<br />
possível na sua utilização. E esta tarefa não<br />
pode ser confiada exclusivamente a órgãos<br />
atrela<strong>dos</strong> ao aparelho de Estado. É imperioso<br />
que a sociedade civil possa não apenas<br />
acompanhar, mas efetivamente controlar o<br />
uso desses recursos.<br />
MARTINS, A. M. (coord.) O Processo de municipalização<br />
no estado de são Paulo: mudanças<br />
institucionais e atores escolares. São<br />
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MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Secretaria da<br />
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financiamento que alcança toda a educação<br />
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no Estado do Maranhão: alguns aspectos<br />
contraditórios. In: OLIVEIRA, Cleiton de<br />
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15
as OPerÁrIas DO aBC: reesTrUTUraÇÃO PrODUTIVa,<br />
reLaÇÕes De GÊnerO e ParTICIPaÇÃO sInDICaL<br />
Ivete Garcia* e <strong>Prof</strong>. <strong>Dr</strong>. Luis Paulo Bresciani**<br />
resUMO aBsTraCT<br />
As décadas de 1980 e 1990<br />
significaram um período de grandes<br />
mudanças políticas e sociais, com o<br />
surgimento do “novo sindicalismo”.<br />
No Grande ABC, havia intensa mobilização<br />
da classe trabalhadora, segmentos<br />
da Igreja Católica, movimentos<br />
populares e sociais. Nosso objetivo é<br />
destacar a participação das mulheres<br />
operárias nesse período. Tal resgate<br />
contribui para desvendar sua atuação<br />
como protagonistas nesse processo,<br />
discutindo-se a relação entre o processo<br />
de trabalho industrial e a baixa<br />
participação das operárias no movimento<br />
sindical.<br />
O método passa por referencial<br />
que discute as inovações tecnológicas,<br />
os processos industriais e a participação<br />
das mulheres enquanto força<br />
de trabalho no movimento operário.<br />
Passa também pelo diálogo com as<br />
comissões de mulheres <strong>dos</strong> principais<br />
sindicatos do Grande ABC (Químicos,<br />
Metalúrgicos e Costureiras), compondo<br />
uma reflexão exploratória sobre a<br />
organização e a gestão das relações<br />
de trabalho das mulheres, analisando<br />
as dificuldades, limites e avanços nos<br />
acor<strong>dos</strong> coletivos.<br />
PaLaVras-ChaVe: relações de gênero,<br />
reestruturação produtiva, trabalho<br />
feminino.<br />
16 ARTIGO<br />
The 80’s and 90’s meant a<br />
great political and social changes<br />
period, with the rise of “New Syndicalism”.<br />
In Grande ABC region, there<br />
was intense worker’s class mobilization,<br />
social and popular movements<br />
and segments of Catholic Church. Our<br />
goal presenting this research is to<br />
highlight the participation of female<br />
workers during this period. This recovery<br />
contributes to show women’s<br />
participation on this process, discussing<br />
the relation between the process<br />
of industrial work and the low participation<br />
of female workers in the labor<br />
union movement.<br />
The method acts as a referential<br />
to discuss technological innovation,<br />
industrial processes and women participation<br />
as workforce on labor union<br />
movement. It also includes conversations<br />
to women boards of the main<br />
labor unions in Grande ABC region<br />
(chemical, metallurgical and textile),<br />
taking us to an explorative thought<br />
about organization and management<br />
of women work relations, analyzing<br />
the difficulties, limits and advances in<br />
collective agreements.<br />
KeYWOrDs: gender relations, productive<br />
restructuring, women work.<br />
* Socióloga, mestranda em Administração pela Universidade IMES; presidente da Câmara Municipal de<br />
Santo André (2003/2004) e vice-prefeita de Santo André (2005-2008).<br />
** Engenheiro de produção, doutor em Política Científica e Tecnológica, professor do Programa de Mestrado<br />
em Administração da Universidade Municipal de São Caetano do Sul (IMES); diretor adjunto de<br />
Desenvolvimento Industrial da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI).
1. reesTrUTUraÇÃO PrODUTIVa e reLa-<br />
ÇÕes De GÊnerO<br />
Reestruturação produtiva pode<br />
ser definida como um processo de mudanças<br />
tecnológicas (automação, informática,<br />
microeletrônica, novos modelos de gerenciamento)<br />
para atingir maior flexibilidade<br />
e integração do sistema produtivo, visando<br />
aumentos de produtividade e/ou competitividade.<br />
De acordo com Almeida Neto (2003,<br />
p. 60-61), são características das indústrias<br />
que adotaram tal processo:<br />
a)<br />
b)<br />
c)<br />
d)<br />
e)<br />
f)<br />
g)<br />
h)<br />
Integração de fluxos produtivos (internos<br />
e externos), utilizando-se de méto<strong>dos</strong><br />
específicos (just-in-time, kanban) e<br />
também da informática e telemática<br />
para a gestão de informações;<br />
Elevado grau de automação flexível,<br />
utilizando-se de equipamentos CNC,<br />
controladores lógico-programáveis, sistemas<br />
CAD/CAM e robôs, entre outros;<br />
Terceirização das atividades de apoio<br />
à produção;<br />
Redução <strong>dos</strong> níveis hierárquicos;<br />
Intensificação de programas de treinamento<br />
(operacional e comportamental)<br />
para seus funcionários;<br />
Implantação de grupos de trabalho e/<br />
ou células de produção que exploram<br />
atividades polivalentes com (ou sem)<br />
determinado grau de autonomia na<br />
condução <strong>dos</strong> processos produtivos;<br />
Em determina<strong>dos</strong> casos, a reaproximação<br />
entre concepção e execução<br />
do trabalho;<br />
Atenção à qualidade tanto do produto<br />
quanto do processo de trabalho,<br />
com base em sistemas e normas de<br />
qualidade (ISO 9.000 e ISO 14.000).<br />
Tais modelos de organização do trabalho<br />
visam, evidentemente, à melhoria do<br />
desempenho do sistema produtivo. Muitas<br />
das empresas que aderem aos novos méto<strong>dos</strong><br />
de produção parecem somente buscar uma<br />
expressiva redução de custos sem considerar<br />
a necessidade de tornarem-se competitivas<br />
mediante inovações tecnológicas. Nesta linha<br />
de raciocínio, ressaltamos ser fundamental a<br />
implantação de mudanças também nas práticas<br />
de organização e gestão do trabalho, de<br />
maneira a garantir a integração <strong>dos</strong> trabalhadores<br />
nos grupos de qualidade, valorizando e<br />
considerando suas sugestões. Destaca-se tam-<br />
Gestão & Regionalidade - N o 13 - 2 o Semestre 2005<br />
bém o investimento em qualificação, observando<br />
inclusive a necessidade do ensino básico,<br />
na busca de uma estabilização da força<br />
de trabalho, uma atenção, portanto, maior<br />
aos trabalhadores, os grandes conhecedores<br />
de cada detalhe do processo de produção, e<br />
podem dar uma grande contribuição ao processo<br />
de inovação no interior da empresa.<br />
Com o advento <strong>dos</strong> novos modelos<br />
produtivos percebemos também a proliferação<br />
de estu<strong>dos</strong> acadêmicos, publicações e<br />
pesquisas produzidas por uma gama diversificada<br />
de autores, que, na sua grande maioria,<br />
ignoram as relações de gênero na esfera<br />
do trabalho. Conforme Helena Hirata (1998),<br />
os impactos da reestruturação produtiva ganham<br />
dimensões diferenciadas para homens<br />
e mulheres: para as mulheres, a existência de<br />
postos de trabalho qualifica<strong>dos</strong> está diretamente<br />
associada à precarização do conjunto<br />
da força de trabalho feminina. A introdução<br />
de novas tecnologias tanto pode incorporar<br />
parte do trabalho feminino como também<br />
pode reforçar a marginalização das mulheres<br />
não-qualificadas, dificultando ainda mais<br />
sua entrada no mercado de trabalho formal.<br />
Em contrapartida, os postos de trabalho mais<br />
complexos são em número bastante limitado<br />
e preenchi<strong>dos</strong> majoritariamente por homens;<br />
muitas vezes o seu aperfeiçoamento não se<br />
traduz em mudanças significativas para as<br />
mulheres, particularmente no que diz respeito<br />
a uma maior ênfase na qualificação. Nesse<br />
sentido, muitas vezes, os sistemas produtivos<br />
mais automatiza<strong>dos</strong> e integra<strong>dos</strong> não se diferenciam<br />
do modelo taylorista-fordista, pois as<br />
práticas de organização e gestão continuam<br />
conduzindo trabalhadores e trabalhadoras a<br />
uma maior intensificação do trabalho, com<br />
conseqüências prejudiciais à saúde.<br />
No que se refere às mulheres,<br />
nota-se que, em muitas situações de trabalho,<br />
as mesmas estão mais sujeitas às cadências<br />
e ritmos que os homens; nesse sentido,<br />
as mulheres continuam exercendo tarefas<br />
monótonas e repetitivas, sob o rigor, cada<br />
vez mais intenso, do controle de tempo e<br />
da implantação de normas disciplinares nas<br />
linhas de montagem.<br />
Também as políticas de recursos<br />
humanos das empresas são voltadas exclusivamente<br />
para o aumento de produtividade,<br />
não considerando as mulheres tanto no<br />
planejamento como no desenvolvimento de<br />
políticas de valorização e profissionalização,<br />
como destaca Abramo (1997). Para as em-<br />
17
presas as mulheres sempre “estão de passagem”,<br />
meramente rotuladas como “reprodutoras”.<br />
Por tal motivo, muitas mulheres<br />
na década de 1980 omitiam seu estado civil<br />
e/ou condição de maternidade para adentrar<br />
ou permanecer no mercado de trabalho,<br />
perdendo os benefícios a que teriam<br />
direito seus filhos e filhas.<br />
A referida pesquisa de Abramo<br />
(1997) sobre estratégias gerenciais dirigidas<br />
ao trabalho feminino (em indústrias metalúrgicas<br />
e alimentícias) constata que as políticas<br />
são limitadas e, quando existem, estão<br />
focadas na diminuição <strong>dos</strong> problemas entre<br />
a articulação da vida doméstica e o trabalho<br />
remunerado, focalizando creches, licenças<br />
maternidade e paternidade, ou doença <strong>dos</strong><br />
filhos. De acordo com a autora, a maioria<br />
das indústrias limitava-se então, a cumprir<br />
minimamente a legislação existente sobre o<br />
tema, sem preocupar-se com o debate ou a<br />
implantação de novos benefícios.<br />
As iniciativas de programas dirigi<strong>dos</strong><br />
à incorporação da mulher aos novos<br />
modelos produtivos e a conseqüente<br />
promoção do seu desenvolvimento profissional<br />
são ainda raras. Neste contexto,<br />
consolida-se uma divisão sexual de papéis,<br />
configurando-se uma situação de desigualdade<br />
em relação aos homens, no mercado<br />
de trabalho, além de maior vulnerabilidade<br />
ao desemprego, instabilidade, menores salários,<br />
e dupla jornada com a sobreposição<br />
de atividades domésticas e profissionais.<br />
1 ARTIGO<br />
A compreensão sobre a divisão sexual<br />
de trabalho ultrapassa os muros das fábricas<br />
e exige explicação mais ampla, pois as<br />
relações de poder que ocorrem dentro das<br />
indústrias são realidade também no interior<br />
da família, bem como nas relações sociais e<br />
políticas. Por um lado, o aprendizado através<br />
do trabalho doméstico não é considerado<br />
para a participação mais efetiva da mulher<br />
no mercado de trabalho. Por outro, o trabalho<br />
feminino é preferido nas fábricas para o<br />
cumprimento de afazeres que, supostamente,<br />
demandam destreza, disciplina, rapidez,<br />
esforço, atenção, paciência e minúcia.<br />
No que diz respeito ao trabalho<br />
feminino ainda, retomando-se o foco do<br />
trabalho desenvolvido por Quadros (1995)<br />
sobre a capacitação tecnológica limitada da<br />
indústria brasileira, lembramos o argumento<br />
do autor sobre a cristalização de práticas<br />
empresariais convencionais de organização<br />
e gestão do trabalho, que restringem a integração<br />
<strong>dos</strong> trabalhadores no processo de<br />
aprendizagem tecnológica e inovação.<br />
No caso das mulheres, o vínculo<br />
entre tecnologia, estratégias de acumulação,<br />
e a exigência de determina<strong>dos</strong> níveis<br />
de qualificação em boa medida dificultam<br />
sua permanência no mercado de trabalho.<br />
Outro aspecto a ser ressaltado é a desigualdade<br />
salarial existente entre homens e<br />
mulheres exercendo a mesma função, desigualdade<br />
intensificada no decorrer do tempo,<br />
e comprovada pelo quadro abaixo, com<br />
da<strong>dos</strong> recentes do Censo 2000.<br />
Valor do rendimento médio e mediano <strong>dos</strong> responsáveis pelos domícilios<br />
particulares permanentes, por sexo do responsável - Censo 2000<br />
municípios<br />
Valor do rendimento mensal do responsável pelos<br />
domicílios, por sexo, do responsável (em R$)<br />
Médio Mediano<br />
Masculino Feminino Diferença<br />
(em %)<br />
Masculino Feminino<br />
Diferença<br />
(em %)<br />
Estado de São Paulo 1.167 784 32,8 600 400 33,3<br />
região do Grande aBC 1.12 64 42,6 720 400 44,4<br />
Santo André 1.340 747 44,3 800 423 47,1<br />
São Bernardo do Campo 1.389 829 40,3 800 476 40,5<br />
São Caetano do Sul 1.997 977 51,1 1.100 570 48,2<br />
Diadema 783 492 37,2 560 350 37,5<br />
Mauá 785 482 38,6 600 320 46,7<br />
Ribeirão Pires 968 589 39,2 675 370 45,2<br />
Rio Grande da Serra<br />
Fonte:IBGE/Censo 2000.<br />
637 420 34,1 500 300 40,0
2. sInDICaTO e reLaÇÕes De GÊnerO<br />
Hirata (1998) destaca ainda que a<br />
problemática envolvendo mulher e trabalho<br />
aparece timidamente no Brasil, no final<br />
da década de 1970, com destaque para um<br />
campo restrito em alguns sindicatos de São<br />
Paulo, articulando três fatores centrais:<br />
a.<br />
b.<br />
c.<br />
A mudança na composição da força<br />
de trabalho;<br />
Desenvolvimento de novas práticas<br />
nos movimentos operário e sindical;<br />
A emergência <strong>dos</strong> movimentos populares<br />
de mulheres e de uma corrente<br />
feminista de influência no país.<br />
Neste período, o trabalho industrial<br />
é marcado por dupla mudança: o aumento<br />
global da porcentagem de operárias<br />
e a modificação na distribuição das mulheres<br />
nos diversos ramos industriais, conforme os<br />
da<strong>dos</strong> nacionais relativos à Pesquisa Nacional<br />
por Amostra de Domicílios PNAD (IBGE),<br />
de 1999.<br />
Paticipação da mão-de-obra feminina no setor<br />
industrial em são Paulo.<br />
1980<br />
1970<br />
24,5%<br />
18,8%<br />
Segundo os indicadores sistematiza<strong>dos</strong><br />
pelo Dieese (2001) na publicação intitulada<br />
“A situação do trabalho no Brasil”,<br />
verifica-se o crescimento da participação feminina<br />
na PEA brasileira. De 30,9% em 1973<br />
(cerca de 11 milhões de mulheres), o percentual<br />
eleva-se para 41% em 1999, correspondendo<br />
a 32,8 milhões de trabalhadoras<br />
(DIEESE, 2001:104-5). Em seis regiões metropolitanas<br />
(Belo Horizonte, Distrito Federal,<br />
Porto Alegre, Recife, Salvador e São Paulo),<br />
cujos indicadores de desemprego são levanta<strong>dos</strong><br />
pela entidade, encontrava-se praticamente<br />
a metade dessa população (16,2<br />
milhões de trabalhadoras), representando<br />
44,6% da PEA (DIEESE, 2001:107).<br />
Gestão & Regionalidade - N o 13 - 2 o Semestre 2005<br />
Todavia, os da<strong>dos</strong> relativos às pesquisas<br />
de emprego e desemprego do Dieese<br />
nessas regiões metropolitanas apontavam<br />
uma situação mais crítica sob a perspectiva<br />
feminina. As mulheres representavam<br />
43,2% (5,6 milhões) do contingente de trabalhadores<br />
ocupa<strong>dos</strong> em 1999, e 50,5% <strong>dos</strong><br />
desemprega<strong>dos</strong> (1,65 milhão de trabalhadoras),<br />
com taxas de desemprego situadas<br />
entre 20% e 30%, superando em cerca de 5<br />
pontos percentuais as taxas masculinas nas<br />
respectivas regiões metropolitanas, e em 3<br />
pontos percentuais as taxas médias (DIEESE,<br />
2001:109-11).<br />
De acordo com a entidade, essas<br />
“altas taxas de desemprego feminino resultam,<br />
em grande parte, da dificuldade imposta<br />
pelas empresas para contratá-las. Os<br />
empresários, com freqüência, alegam altos<br />
custos relaciona<strong>dos</strong> à manutenção de mulheres<br />
no emprego devido ao risco de engravidarem...<br />
Colocam obstáculos também<br />
frente à obrigatoriedade de concederem<br />
alguma flexibilidade nos horários da mãe<br />
para que possam amamentar seus filhos nos<br />
seis primeiros meses de vida, e (...) arcar com<br />
os custos de manutenção de creche onde as<br />
crianças fiquem no horário de trabalho da<br />
mãe” (DIEESE, 2001:111).<br />
O levantamento da situação das<br />
mulheres no mercado de trabalho – condições<br />
de trabalho e salários, principalmente<br />
– ficou relegado a um plano secundário,<br />
diante das principais reivindicações daquele<br />
momento, o que pode ter contribuído para<br />
o aprofundamento da invisibilidade do trabalho<br />
feminino. Do mesmo modo, a organização<br />
tradicional do processo de trabalho,<br />
combinada com a exclusão das mulheres do<br />
mercado formal, pode ter sido reforçada<br />
pelas diretorias sindicais, majoritariamente<br />
masculinas, e sem uma política claramente<br />
elaborada que incorporasse as mulheres no<br />
cotidiano sindical. Se não havia incentivo<br />
ou suporte para o envolvimento de mulheres<br />
nas atividades sindicais dentro das fábricas<br />
(através das CIPAs e das comissões de<br />
fábricas), ainda mais restrito se mostrava o<br />
acesso aos cargos de direção <strong>dos</strong> sindicatos,<br />
reforçando-se a divisão sexual do trabalho,<br />
e mitigando a luta pela igualdade de oportunidades<br />
entre homens e mulheres.<br />
As limitadas participação e intervenção<br />
das mulheres no movimento sindical,<br />
inclusive nas mesas de negociação coletiva,<br />
podem ter concorrido para relegar a<br />
19
um plano inferior a discussão sobre as condições<br />
do trabalho feminino, que poderia<br />
possibilitar mudanças tanto nos processos<br />
de trabalho como no conjunto de direitos.<br />
Portanto, é importante destacar<br />
que as mulheres carregam consigo uma história<br />
de exclusão e de restrito acesso à vida<br />
pública. Um aspecto dessa exclusão é a invisibilidade<br />
de sua história de vida, das relações<br />
de poder que as envolvem, e do próprio<br />
trabalho feminino. Maria Valeria Pena<br />
(1981, p. ) mostra que essa dificuldade de se<br />
reconhecer as mulheres como atrizes políticas<br />
é histórica, lembrando que a dominação<br />
masculina na família e a limitação da participação<br />
feminina foram asseguradas pelo<br />
Estado, através da instituição do Código Civil,<br />
em 1915, e pela Consolidação das Leis<br />
do Trabalho, em 1943. O Estado brasileiro<br />
agiu para regular e disciplinar as relações de<br />
produção e organizou o seu discurso sobre<br />
a mulher através da legislação, delimitando<br />
sua participação nas organizações sindicais<br />
e partidárias, bem como situando, naquele<br />
momento, o trabalho doméstico e a reprodução<br />
como principais funções da mulher<br />
na sociedade fabril.<br />
O destaque de Elizabeth Lobo<br />
(1991, p.) ao episódio da discussão sobre<br />
a revogação do trabalho noturno das<br />
mulheres na década de 1970, no Sindicato<br />
<strong>dos</strong> Metalúrgicos de São Bernardo do<br />
Campo e Diadema, também demonstra a<br />
grande distância entre os discursos e as<br />
práticas sindicais. Através da sua imprensa<br />
sindical, o Sindicato <strong>dos</strong> Metalúrgicos<br />
de São Bernardo e Diadema, afirma que<br />
”não vê nenhuma razão que justifique a<br />
intensificação da exploração da mulher<br />
pelo aumento de sua jornada de trabalho<br />
e colocando-a no exercício de atividades<br />
inadaptadas à sua constituição física, num<br />
momento em que homens lutam para melhorar<br />
suas condições de emprego e seus<br />
salários. É como se enviassem as mulheres<br />
à fábrica e os mari<strong>dos</strong> ficassem em casa.<br />
Uma estúpida inversão de papéis” (Tribuna<br />
Metalúrgica, abril de 1977).<br />
Daí nossa preocupação em voltar<br />
os olhos ao trabalho feminino e às trabalhadoras<br />
operárias, destacando algumas experiências.<br />
Dentre essas, vale nos determos no<br />
processo de trabalho da empresa Valisère<br />
na sua relação com o Sindicato das Costureiras<br />
do ABC, cuja diretoria é composta por 16<br />
pessoas – das quais 14 são mulheres e dois<br />
20 ARTIGO<br />
homens, e onde as mulheres ocupam os cargos<br />
de maior destaque.<br />
Quanto ao processo de trabalho na<br />
referida empresa, a partir de entrevista com<br />
a Diretoria do Sindicato, verifica-se que, a<br />
partir de 1989, passou do sistema individual<br />
para células de produção. No processo individual,<br />
cada trabalhadora controlava a sua<br />
produção, isto é, cada uma fazia uma parte<br />
do trabalho, já no sistema atual, o trabalho<br />
é realizado por um grupo (em média de<br />
dez mulheres), que num trabalho coletivo,<br />
concluem todas as etapas de produção, cuja<br />
produtividade é mensurada por grupo e não<br />
individualmente. O salário é composto de<br />
duas variáveis: uma remuneração fixa igual<br />
(piso salarial) para todas as trabalhadoras e<br />
um prêmio de produção (com base nas metas<br />
de produção alcançadas pelo grupo).<br />
Na opinião da diretora do sindicato,<br />
tal sistema de produção gera conflitos<br />
internos no grupo, pois as trabalhadoras<br />
assumem simultaneamente o trabalho e<br />
o gerenciamento da célula de produção,<br />
fiscalizando inclusive umas às outras. Por<br />
exemplo, quando uma trabalhadora precisa<br />
faltar para levar o filho ao médico, sua ausência<br />
é cobrada pelas demais, pois o grupo<br />
acaba perdendo.<br />
Já na opinião de uma operária da<br />
fábrica, o sistema de produção em células é<br />
positivo, uma vez que possibilita que algumas<br />
trabalhadoras, que teriam dificuldades<br />
em atingir a meta no sistema individual,<br />
possam, assim, melhorar sua remuneração:<br />
“...a gente, pegando com garra, consegue<br />
tirar mais” (sic). Por outro lado, ela também<br />
menciona que tem mulheres que são “moles<br />
e atrapalham o grupo” (sic).<br />
A representante do sindicato destacou<br />
o fato da empresa já ter definido<br />
previamente suas metas de produção mensal,<br />
quando esta meta está próxima de ser<br />
alcançada, diminui-se o ritmo para que os<br />
grupos não ultrapassem o limite idealizado.<br />
Ressaltamos nesse fato, que o poder de decisão<br />
quanto à produtividade – ao contrário<br />
do que parece – não está sob o controle das<br />
trabalhadoras.<br />
A posição do Sindicato, quanto<br />
à remuneração por prêmios de produção,<br />
sempre foi contrária (tanto no sistema individual,<br />
como no sistema de células de<br />
produção), por entender que ambos exigem<br />
um ritmo muito intenso de trabalho<br />
que resulta em doenças ocupacionais (es-
tresse, LER, varizes, problemas na coluna,<br />
entre outras). Essa questão foi objeto de<br />
muitas manifestações do Sindicato, inclusive<br />
com propostas de inclusão de cláusulas<br />
nos Acor<strong>dos</strong> Coletivos – sem muitos avanços<br />
até o momento.<br />
Outro fato, levantado pela diretora<br />
do Sindicato, são as denúncias de assédio<br />
moral:<br />
“A humilhação que as trabalhadoras<br />
passam é muito grande, muitas vezes,<br />
elas têm dores, mas não revelam, com<br />
medo de perder o emprego. Porque,<br />
logo que a empresa percebe que está<br />
ficando com problemas de saúde, ela<br />
demite, antes que o diagnóstico seja<br />
doença ocupacional e entrem em processo<br />
de tratamento”.<br />
Destaca ainda que as encarregadas<br />
amedrontam as operárias, colocando<br />
sempre a possibilidade de uma substituição<br />
imediata, quando adoecerem – uma constante<br />
pressão psicológica:<br />
“A Valisère é uma fábrica de lesionadas,<br />
as pessoas saem daqui, muitas<br />
vezes, doentes e não arrumam outro<br />
emprego”.<br />
Uma iniciativa importante, mencionada<br />
pela diretora, foi um estudo realizado<br />
pelo Dieese (década de 1990) para detectar<br />
os problemas decorrentes desse sistema de<br />
produção na Valisère, e subsidiar as intervenções<br />
do Sindicato 1 . Além <strong>dos</strong> fatos expostos,<br />
convém acrescentar o exemplo da Linha<br />
Marítima (roupas de praia da Valisère), que<br />
utiliza o mesmo processo de células de produção,<br />
adicionando um outro incentivo que<br />
é o sistema da bandeira, pelo qual a célula<br />
que atinge a meta de produção levanta uma<br />
bandeira, visível por toda a fábrica, provocando<br />
disputa e concorrência entre as trabalhadoras,<br />
e agravando ainda mais os problemas<br />
anteriormente aponta<strong>dos</strong>.<br />
Dos 186 cargos de direção do Sindicato<br />
<strong>dos</strong> Metalúrgicos do Grande ABC, apenas<br />
oito são ocupa<strong>dos</strong> por mulheres. Considerando<br />
que, na categoria, o percentual<br />
de mulheres é de 10%, uma representação<br />
claramente insuficiente. A diretora deste<br />
Gestão & Regionalidade - N o 13 - 2 o Semestre 2005<br />
sindicato mostrou-se otimista quanto ao aumento<br />
da participação feminina na próxima<br />
direção do sindicato, que tem trabalhado na<br />
implantação de uma política sindical específica<br />
para incentivo ao envolvimento das mulheres<br />
nas várias instâncias sindicais (CIPA,<br />
Comissão de Fábrica, Sindicato), destaca ainda<br />
que tem percebido resulta<strong>dos</strong> positivos, e<br />
que “...pela experiência aprendemos que é<br />
importante envolver os companheiros, que<br />
não podem ficar alheios ao movimento”.<br />
Quanto aos problemas específicos<br />
das mulheres metalúrgicas, destacou: dupla<br />
jornada de trabalho, responsabilidade<br />
com o cuidado <strong>dos</strong> filhos e filhas, precárias<br />
condições de trabalho, doença ocupacional<br />
(LER), ritmo acelerado de trabalho e falta<br />
de investimento das empresas na qualificação<br />
das trabalhadoras. No que se refere<br />
aos avanços conquista<strong>dos</strong>, estão restritos ao<br />
auxílio creche (para crianças de até um ano<br />
de idade) e um dia remunerado para exame<br />
médico preventivo (câncer ginecológico).<br />
Em conversa com as dirigentes<br />
do Sindicato <strong>dos</strong> Químicos do ABC, percebe-se<br />
que a participação das mulheres na<br />
direção do sindicato também é pequena;<br />
eis que, <strong>dos</strong> 47 diretores, apenas cinco são<br />
mulheres. A situação das trabalhadoras<br />
da categoria química não é diferente das<br />
demais: pouca participação feminina nos<br />
cargos de direção, o trabalho das mulheres<br />
nas empresas é marcado por atividades<br />
repetitivas (baixos salários e pouca qualificação),<br />
incidência considerável de doenças<br />
profissionais (LER) e poucos avanços<br />
nos Acor<strong>dos</strong> Coletivos – no que se refere<br />
às cláusulas específicas do trabalho feminino.<br />
Vale destacar uma ação eficaz que<br />
garantiu a manutenção do emprego das<br />
trabalhadoras da Kolynos – num momento<br />
de inovação tecnológica, onde a intenção<br />
da empresa era substituir o trabalho feminino<br />
pelo masculino, a partir da chegada<br />
de novas máquinas.<br />
Os registros acima vão, deste<br />
modo, ao encontro das análises de Bresciani<br />
e Tadashi Oda (2003) sobre a categoria<br />
metalúrgica, e de Schutte e Coelho (2003),<br />
a respeito da categoria química no ABC, no<br />
que concerne à existência de cláusulas relacionadas<br />
ao trabalho feminino nas pautas e<br />
acor<strong>dos</strong> coletivos nos referi<strong>dos</strong> segmentos.<br />
1 Esse processo está documentado no artigo Vestuário: uma luta contra o tempo, publicado pelo<br />
Dieese.<br />
21
Schutte e Coelho (2003:52-3)<br />
concluem:<br />
“No que diz respeito às questões de<br />
raça e gênero, (...) que esses temas<br />
não foram trata<strong>dos</strong> como questões<br />
prioritárias. (...) Na questão da mulher<br />
trabalhadora, faltou uma presença de<br />
mulheres líderes na diretoria na militância<br />
[sic] que pudessem insistir nesse<br />
ponto. Não obstante, a realidade em<br />
várias empresas, como a questão das<br />
LER/Dort entre as mulheres da Kolynos,<br />
suscitou respostas específicas.<br />
Contudo, nos acor<strong>dos</strong> por empresa<br />
não houve nenhuma atenção para<br />
essa questão, embora nas negociações<br />
da convenção coletiva se tenha avançado<br />
bem além <strong>dos</strong> direitos garanti<strong>dos</strong><br />
na lei, como comprovam as conquistas<br />
relativas à extensão do direito ao auxílio-creche<br />
– que é uma grande preocupação<br />
das mulheres trabalhadoras<br />
jovens com filhos recém-nasci<strong>dos</strong> –, à<br />
licença para empregada adotante, à<br />
garantia de emprego após aborto e à<br />
proibição de discriminação salarial em<br />
razão de raça e sexo”.<br />
Apesar dessa consideração, os autores<br />
notam que “a ênfase na saúde e na<br />
organização do tempo de trabalho permitiu<br />
ao Sindicato contrapor-se à ideologia<br />
com a qual as empresas querem impor<br />
sua reestruturação, classificando qualquer<br />
oposição por parte <strong>dos</strong> sindicatos como<br />
conservadora e retrógrada”, apontando<br />
a resistência das empresas para negociar<br />
mudanças orientadas à geração de empregos<br />
e à melhoria das condições de trabalho<br />
(Schutte e Coelho, 2003:53).<br />
Em relação aos metalúrgicos, Bresciani<br />
e Oda (2003:58-9) registram as cláusulas<br />
mais relevantes inscritas no acordo das<br />
montadoras e relacionadas à questão de<br />
gênero: auxílio-creche, licença para mulheres<br />
adotantes, e recomendação de maiores<br />
oportunidades para garotas aprendizes nos<br />
cursos do Senai realiza<strong>dos</strong> junto às empresas;<br />
além disso, a convenção reproduz itens<br />
constitucionais como a licença-maternidade<br />
e garantia de emprego à gestante. Uma<br />
22 ARTIGO<br />
série de outros itens incluí<strong>dos</strong> na pauta de<br />
2001 da Federação <strong>dos</strong> Metalúrgicos cutista<br />
em São Paulo, todavia, segue ausente das<br />
convenções coletivas 2 .<br />
. COnsIDeraÇÕes FInaIs<br />
O Grande ABC é considerado<br />
como a principal região industrial do país,<br />
e também uma referência de luta e resistência<br />
de trabalhadores e trabalhadoras na<br />
conquista de direitos. Com muita luta, as<br />
mulheres têm ampliado seu espaço de participação<br />
na sociedade.<br />
No entanto, esse avanço não foi<br />
significativo no movimento sindical do Grande<br />
ABC, que ainda convive com uma parcela<br />
muito pequena de mulheres nas suas direções.<br />
Essa participação acanhada se reflete<br />
nos Acor<strong>dos</strong> Coletivos, onde as principais<br />
reivindicações das mulheres são pouco consideradas,<br />
ou sequer citadas, comprovando<br />
a invisibilidade do trabalho e da presença<br />
das mulheres. As exigências, o rigor na avaliação<br />
das mulheres que poderiam compor<br />
instâncias de direção e responsabilidade é<br />
sempre muito maior que aqueles destina<strong>dos</strong><br />
aos homens. Nos sindicatos em que tradicionalmente<br />
os homens compõem a maioria<br />
das instâncias de direção, as mulheres sempre<br />
são avaliadas na sua competência para<br />
tarefas sindicais.<br />
Essa realidade se traduz dentro das<br />
fábricas, onde as mudanças na organização<br />
do trabalho e os impactos da reestruturação<br />
produtiva têm sido acompanha<strong>dos</strong> de uma<br />
precarização da força de trabalho feminino.<br />
Nesse sentido, a automação e o sistema justin-time<br />
se aproximam da organização taylorista/fordista,<br />
pois continuam conduzindo<br />
trabalhadores e trabalhadoras a uma maior<br />
intensificação do trabalho com conseqüência<br />
inclusive para a saúde das mulheres que<br />
estão mais sujeitas que os homens a cadências<br />
e ritmos.<br />
Em especial, a introdução de novas<br />
tecnologias tanto tem incorporado parte<br />
do trabalho feminino como reforçado a<br />
marginalização das mulheres não-qualificadas.<br />
As eventuais estratégias gerenciais de<br />
valorização e profissionalização voltadas à<br />
mulher são limitadas e, quando existem,<br />
2 Dentre outras, o conjunto inclui a igualdade de oportunidades, a equivalência salarial para a<br />
mesma função, o impedimento ao controle de fertilidade por parte da empresa, a extensão para<br />
os homens da licença para adotantes.
estão focadas na diminuição <strong>dos</strong> problemas<br />
entre a articulação da vida doméstica<br />
e o trabalho remunerado.<br />
Considerando o avanço das inovações<br />
tecnológicas, acompanhadas por uma<br />
mudança na organização e nos processos de<br />
reFerÊnCIas BIBLIOGrÁFICas<br />
ABRAMO, Laís. Imagens de Gênero e Políticas<br />
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Gestão & Regionalidade - N o 13 - 2 o Semestre 2005<br />
trabalho, é fundamental reavaliar-se as políticas<br />
existentes e propor alternativas que<br />
promovam a igualdade de oportunidade,<br />
entre homens e mulheres, numa responsabilidade<br />
partilhada entre sindicatos, empresários<br />
e poder público.<br />
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São Paulo: Dieese, 1994.<br />
2
as MULheres Da seGUranÇa UrBana: a GUarDa<br />
CIVIL MUnICIPaL FeMInIna De sanTO an<strong>Dr</strong>É<br />
Heleni B. F. de Paiva Lino*; <strong>Prof</strong>a. <strong>Dr</strong>a. Carla Cristina Garcia** e<br />
<strong>Prof</strong>a. <strong>Dr</strong>a. Priscila Ferreira Perazzo***<br />
resUMO aBsTraCT<br />
A presença feminina nas polícias<br />
brasileiras teve início no Brasil em<br />
1955, quando foi instituído um corpo<br />
de guardas civis, incorporado em 1970<br />
à Polícia Militar do Estado de São Paulo.<br />
Com objetivo de cobrirem áreas de<br />
atuação em que o policiamento repressivo<br />
encontrava dificuldades, como<br />
crianças e i<strong>dos</strong>os abandona<strong>dos</strong> ou, mulheres<br />
e adolescentes autores de infrações.<br />
Foram incorporadas à instituição<br />
por serem dóceis, versáteis e de melhor<br />
trato com a população. Seguindo a<br />
mesma concepção da Polícia Militar,<br />
a Guarda Civil Municipal de Santo André,<br />
em 1989, incorporou ao seu efetivo<br />
a presença feminina. Examinar o seu<br />
cotidiano, as relações de gênero, a sua<br />
percepção acerca da discriminação é o<br />
escopo do texto apresentado.<br />
PaLaVras-ChaVe: polícia, relações de<br />
gênero, gestão de segurança pública.<br />
24 ARTIGO<br />
Women presence in Brazilian<br />
police has begun in 1955, when<br />
a group of civil guards was incorporated,<br />
in 1970, to the Military Police<br />
of São Paulo. Aiming to cover areas of<br />
performance where the repressive police<br />
met difficulties, as aged and children<br />
abandoned, women and adolescents<br />
authors of infractions, women<br />
were incorporated to the institution<br />
once they were docile, versatile and<br />
of better treatment with the population.<br />
Following the same thought<br />
of the Military Policy, the Municipal<br />
Civil Guard of Santo André, in 1989,<br />
incorporated its cash to the women<br />
presence. Examining their daily routine,<br />
gender relations and perception<br />
about discrimination is the target of<br />
this present paper.<br />
KeYWOrDs: police, gender relations,<br />
public security management.<br />
*Mestranda em Administração da Universidade IMES e professora de Direito Constitucional e Direito do<br />
Trabalho da UNIA.<br />
**Doutora em Ciências Sociais, com pós-doutorado em Sociologia Política no Instituto Mora/México;<br />
professora da Universidade IMES e da PUC-SP.<br />
***Doutora em História e professora do PMA da Universidade IMES.
1. InTrODUÇÃO<br />
A presença feminina nas policias<br />
brasileiras não é recente. Em 1955, o Estado<br />
de São Paulo instituiu um corpo feminino<br />
de guardas civis que, em 1970, foi incorporado<br />
à Policia Militar do Estado. Embora<br />
a base legal para a admissão de mulheres<br />
tenha sido estabelecida ainda no período<br />
autoritário, por meio de portarias do Estado-Maior<br />
do Exército, a criação efetiva<br />
<strong>dos</strong> corpos femininos quase sempre ocorreu<br />
durante a fase de abertura política ou<br />
mesmo após a redemocratização do país.<br />
Desse modo, somente nos anos 1980, com<br />
o fim da ditadura militar, houve a efetiva<br />
incorporação de mulheres nas polícias de<br />
diversos esta<strong>dos</strong> da nação, “visando originalmente<br />
cobrir certas áreas de atuação<br />
em que o policiamento essencialmente repressivo,<br />
estaria encontrando dificuldades<br />
no trato com crianças abandonadas, ou<br />
com mulheres e adolescentes autores de<br />
infrações” (Soares, 2004, p.1).<br />
Deve-se ressaltar, no entanto, que<br />
sua participação no contingente total das<br />
PMs é de apenas 6%, enquanto, na Polícia<br />
Federal, é de 10% e, nas guardas municipais,<br />
é de 11%, alcançando 19% nas Polícias Civis.<br />
Alguns estudiosos apontam o<br />
fato de que tal incorporação não respondeu<br />
a uma demanda da sociedade, como<br />
no caso das Delegacias Especiais da Mulher<br />
ou na Polícia Civil, resultado de iniciativas<br />
e cobranças do movimento feminista, que<br />
tinha como finalidade dar atendimento<br />
especializado, prestado, sobretudo, por<br />
policiais civis femininas, às mulheres vítimas<br />
de violência:<br />
“Não há registro de mobilização social<br />
equivalente, no que se referem as<br />
PMs: nem demanda de serviços específicos<br />
que seriam mais bem desempenha<strong>dos</strong><br />
por mulheres, nem pressões<br />
para a democratização de um espaço<br />
profissional até então exclusivamente<br />
masculino. Tudo indica que a inclusão<br />
do contingente feminino teve origem<br />
em motivações internas nas próprias<br />
policias militares e/ou nos respectivos<br />
governos estaduais, antes, que em<br />
apelos diretos da sociedade civil ou<br />
da chamada opinião pública” (Soares<br />
e Musumeci, 2005, p.16).<br />
Gestão & Regionalidade - N o 13 - 2 o Semestre 2005<br />
Para Soares e Musumeci (2005),<br />
havia, aparentemente, um desejo de “humanizar”<br />
a imagem da polícia, fortemente<br />
associada à ditadura – desejo que teria levado,<br />
por exemplo, à introdução de disciplinas<br />
de direitos humanos nos currículos<br />
policiais. Por outro lado, mesmo com a<br />
redemocratização política do país, o aparelho<br />
de segurança pública não passava (e<br />
não passou até hoje) por nenhuma mudança<br />
paradigmática em sua estrutura, que associasse<br />
a incorporação de mulheres a um<br />
processo mais amplo de reformas. Apesar<br />
<strong>dos</strong> intensos debates, não houve ainda projetos<br />
que consiguissem adequar as polícias<br />
à democracia que, segundo Luiz Eduardo<br />
Soares (2000), foi a única das instituições<br />
nacionais que não foi reformada após o<br />
fim da ditadura.<br />
De acordo com Soares e Musumeci<br />
(2005), na falta de uma elaboração explícita,<br />
pode-se inferir algumas motivações<br />
subjacentes, examinando-se as listagens<br />
das atividades previstas para os efetivos<br />
femininos das polícias da maioria <strong>dos</strong> esta<strong>dos</strong>.<br />
Não se trata necessariamente das tarefas<br />
de fato desempenhadas pelas mulheres,<br />
mas sim do que se idealizou para elas<br />
como possível e desejável:<br />
“Trabalho preventivo e assistencial<br />
junto a crianças e adolescentes, mulheres<br />
e i<strong>dos</strong>os; atendimento e condução<br />
de alcoólatras, droga<strong>dos</strong> e<br />
mendigos; policiamento ostensivo em<br />
portos, aeroportos e terminais rodoviários;<br />
policiamento de trânsito; policiamento<br />
de áreas comerciais e turísticas;<br />
patrulha de grandes eventos;<br />
trabalhos comunitários e assistenciais<br />
em geral; revista de mulheres detentas<br />
ou suspeitas e de visitantes do<br />
sexo feminino em estabelecimentos<br />
penais; serviços internos de secretaria,<br />
telefonia, arquivo, recepção etc.<br />
(Soares e Musumeci, 2005, p.17).<br />
Segundo as pesquisadoras, a missão<br />
das mulheres policiais seria, assim,<br />
funcionar como uma espécie de cartão de<br />
visita, que, sem alterar paradigmas, sinalizasse<br />
mudanças e modernização. A autora<br />
ressalta ainda, na lista de atividades acima,<br />
o trabalho assistencial junto a comunidades,<br />
a crianças e adolescentes, a mulheres e<br />
i<strong>dos</strong>os, a mendigos e bêba<strong>dos</strong> etc.<br />
25
“Por reafirmar estereótipos de gênero<br />
– vocação assistencialista das mulheres;<br />
associação entre ‘sexo frágil’<br />
e atendimento aos fragiliza<strong>dos</strong>, esse<br />
tipo de trabalho talvez tenha sido<br />
percebido como um outro campo<br />
estratégico de relações públicas, de<br />
‘suavização’ ou humanização da imagem<br />
da polícia, sem que para tanto<br />
fosse necessário alterar a cultura institucional<br />
hegemônica ou as práticas<br />
tradicionais de policiamento” (Soares<br />
e Musumeci, 2005, p.19).<br />
Diante do quadro exposto, cabe<br />
perguntar que papel as mulheres policiais<br />
realmente vêm desempenhando nestes<br />
últimos anos? Sua presença provocou<br />
mudanças significativas na estrutura da<br />
corporação? As resistências internas vêm<br />
sendo superadas? Que balanço, em suma,<br />
pode-se fazer da participação feminina<br />
nessas instituições?<br />
Nesse sentido, propõe-se nesse artigo<br />
apontar o cotidiano de trabalho das<br />
guardas civis femininas na cidade de Santo<br />
André, identificar as relações de gêneros<br />
entre os guardas e anunciar, mais que concluir<br />
ou solucionar, os problemas existentes<br />
no interior da corporação e que se refletem<br />
nas posições de gestores e sociedade<br />
civil sobre a segurança pública na cidade e<br />
sua descentralização do poder do Estado.<br />
2. a GUarDa CIVIL MUnICIPaL (GCM) e a<br />
QUESTÃO DA SEGURANÇA PÚBLICA<br />
A primeira polícia municipal no<br />
Brasil surgiu em 1842, no antigo município<br />
neutro da corte – cidade do Rio de Janeiro<br />
– com a denominação de Corpo das<br />
Guardas Municipais Permanentes. Em São<br />
Paulo, com a finalidade de garantir a segurança<br />
pública, Joaquim Floriano de Toledo,<br />
presidente da Província, criou as guardas<br />
municipais em março de 1866. No século<br />
XX, com o aumento da violência na cidade<br />
de São Paulo, o governo de Carlos de Campos<br />
editou a Lei n o 2.142, de 22 de outubro<br />
de 1926, criando a Guarda Civil nos moldes<br />
da polícia de Londres, uniformizada e hierarquizada,<br />
mas tipicamente civil, voltada<br />
para o patrulhamento das ruas e para o<br />
trato com o público.<br />
Aprovada na capital paulista, passou<br />
a ser padrão para outras cidades bra-<br />
26 ARTIGO<br />
sileiras. Garantida por lei, perdurou até<br />
a década de 1960, sendo posteriormente<br />
extinta pelo Decreto Lei n o 1.072, de 30<br />
de dezembro de 1969, durante o governo<br />
militar. No Estado de São Paulo, a Guarda<br />
Civil foi, então, em 1970, unificada à Força<br />
Pública, dando origem à Polícia Militar do<br />
Estado de São Paulo. Com o fim da ditadura<br />
militar, em 1986, a cidade de São Paulo<br />
criou a Guarda Civil Metropolitana nos moldes<br />
da antiga Guarda Civil (Braga,1999).<br />
De toda forma, as municipalidades<br />
buscaram, por muito tempo, absterem-se<br />
da gestão da segurança pública, atribuindo<br />
esta função aos governos <strong>dos</strong> esta<strong>dos</strong>. No<br />
entanto, o recrudescimento da violência e<br />
da criminalidade no espaço urbano, seja<br />
nas metrópoles ou nas cidades de pequeno<br />
e médio porte, provocou a discussão da<br />
segurança pública na agenda <strong>dos</strong> governos<br />
municipais. Os gestores locais, premi<strong>dos</strong><br />
pelas comunidades, passaram a constituir<br />
e fortalecer as guardas municipais, bem<br />
como reivindicar mudanças constitucionais,<br />
com o objetivo de estender prerrogativas<br />
das polícias do Estado para as guardas <strong>dos</strong><br />
municípios, qual seja, o poder de polícia.<br />
Segundo da<strong>dos</strong> da Fundação Seade<br />
e Assembléia Legislativa de São Paulo<br />
(1999), só o Estado de São Paulo, em 1997,<br />
já possuía 176 municípios com guardas municipais.<br />
A Região Metropolitana de São<br />
Paulo, em 2001, de seus 39 municípios,<br />
23 já tinham guarda municipal, segundo<br />
da<strong>dos</strong> do Fórum Metropolitano de Segurança<br />
Pública, estes, avalia<strong>dos</strong> pelo Plano<br />
Nacional de Segurança Pública (2004), sem<br />
metas, identidade institucional, relacionamentos<br />
sistêmicos com as forças estaduais<br />
da segurança pública e sem uma política<br />
que as constitua como protagonistas da segurança<br />
municipal.<br />
Com limitações constitucionais<br />
para atribuições de polícia preventiva e ostensiva,<br />
em função do inciso 8 o do artigo<br />
144 da Constituição Federal, a prática das<br />
corporações vem demonstrando o contrário:<br />
esta corporação encontra-se na condição<br />
de integrar o sistema de segurança pública,<br />
se aprovada pelo Congresso Nacional<br />
a Emenda Constitucional n o 534/2002, já<br />
aprovada em primeiro turno pelo Senado<br />
Federal.<br />
Nos últimos anos, as cidades brasileiras<br />
vêm aumentando seu contingente civil<br />
de segurança pública. O país conta hoje
com mais de 300 guardas civis municipais,<br />
alocando cerca de 60 mil guardas.<br />
Ora considerada como servidora<br />
pública na proteção e bens de serviços do<br />
município, ora como a verdadeira polícia<br />
municipal, a instituição têm se defrontando<br />
com uma real crise de identidade e de<br />
natureza gerencial. A presença feminina,<br />
gradualmente inserida na instituição, demonstrou<br />
que também não foram superadas<br />
na corporação as desigualdades nas<br />
relações de gênero.<br />
. a GUarDa CIVIL MUnICIPaL eM sanTO<br />
an<strong>Dr</strong>É e a InCOrPOraÇÃO Das MULheres<br />
Em Santo André, a Guarda Civil<br />
Municipal foi criada pela Lei n o 6.125, em<br />
31 de maio de 1985, com o objetivo de<br />
praticar a vigilância noturna e diurna <strong>dos</strong><br />
logradouros públicos e suas repartições, subordinando-se<br />
ao Departamento de Trânsito<br />
da cidade. Por sua vez, adquiriu organização<br />
administrativa própria somente em<br />
1991. Mesmo assim, desde 1989, a GCM de<br />
Santo André contou com efetivo trabalho<br />
de segurança e colocou a primeira mulher<br />
no comando das guardas da cidade.<br />
A ascensão feminina na Guarda<br />
Civil Municipal firmou-se a partir de 1998,<br />
quando o número de mulheres contratadas<br />
passou para 30 guardas femininas, chegando<br />
a 96, em 2004, em um universo masculino<br />
de 341 guardas.<br />
A região do Grande ABC, englobando<br />
as sete cidades de Santo André, São<br />
Bernardo do Campo, São Caetano do Sul,<br />
Diadema, Mauá, Rio Grande da Serra e Ribeirão<br />
Pires, contava no início da década<br />
de 2000 com 1.754 guardas municipais,<br />
dentre eles, 300 mulheres.<br />
A entrada das mulheres na GCM de<br />
Santo André acompanhou as propostas das<br />
policias militares de humanizar o tratamento<br />
com seu público, acreditando que, por suas<br />
características dóceis e versáteis, as mulheres<br />
poderiam lidar melhor com os munícipes.<br />
4. A PESQUISA<br />
Foram entrevistadas 12 guardas<br />
femininas da corporação andreense, que<br />
responderam cada uma, a um questionário<br />
de 11 perguntas acerca de temas, como<br />
tempo de serviço, as condições das mulheres<br />
na corporação e o tratamento recebido<br />
Gestão & Regionalidade - N o 13 - 2 o Semestre 2005<br />
em função do gênero e, ainda, sobre direitos<br />
femininos e ampliação <strong>dos</strong> poderes das<br />
guardas civis municipais. As entrevistadas<br />
foram selecionadas por José Renato da<br />
Silva, comandante da Guarda Civil Municipal<br />
e responderam ao questionário em 15<br />
de abril de 2004, comparecendo à Câmara<br />
Municipal de Santo André. Por terem sido<br />
encaminhadas para tal finalidade, apresentaram-se<br />
fardadas e desarmadas.<br />
Da tabulação desse levantamento,<br />
pode-se apreender que as mulheres entrevistadas<br />
estavam com entre 30 e 39 anos de<br />
idade, a maioria casada e com filhos, cujo<br />
tempo de serviço nessa corporação variava<br />
de 3,5 a 13 anos. O principal motivo relatado<br />
que as levara a ingressar na GCM foi<br />
a busca de emprego estável, pois encontravam-se<br />
desempregadas à época em que<br />
prestaram concurso.<br />
Ao serem questionadas sobre a<br />
forma como a população andreense as recebe<br />
nas ruas, foram unânimes em afirmar<br />
que os munícipes consideram as guardas<br />
femininas como um “avanço” ou “evolução”<br />
da corporação. Também recebem<br />
sempre, o que chamam de elogios à mulher,<br />
ao sexo ou ao corpo, não tendo caráter<br />
erótico, sensual ou libidinoso, mas<br />
sempre relaciona<strong>dos</strong> à atuação profissional,<br />
salientando objetivos, como “mais<br />
educadas, dedicadas, delicadas e pacientes<br />
no serviço”, em relação ao tratamento <strong>dos</strong><br />
guardas homens com a população.<br />
Por nossa indagação, foi unanimemente<br />
rechaçado pelas guardas femininas<br />
o fato de as mulheres prestarem serviço<br />
diferenciado <strong>dos</strong> homens na Guarda Civil.<br />
Consideram-se aptas ao mesmo serviço, recebendo<br />
o mesmo treinamento, que lhes<br />
permite a mesma competência e eficiência<br />
na prestação. Consideram-se, também,<br />
“mais preparadas” para o trabalho, pois:<br />
“Na cidade de São Paulo, foi feita uma<br />
pesquisa que comprova que as mulheres<br />
são mais eficazes, mais solidárias<br />
e, no horário de alto risco, são mais<br />
ágeis, embora menos precipitadas e<br />
quase nunca efetuam disparos acidentais,<br />
isso é coisa de homem” (Rosseti,<br />
25 anos, três anos de corporação).<br />
A associação da mulher ao papel<br />
de mãe de família, de dona de casa,<br />
tem sido entrave aos direitos da mulher<br />
27
no mercado de trabalho. A dupla jornada<br />
diária dedicando-se aos serviços domésticos<br />
de sua casa e aos serviços profissionais<br />
da corporação – objeto de enfrentamento<br />
do Plano Nacional de Políticas para as<br />
Mulheres, lançado em 2004, pela Secretaria<br />
Especial de Políticas para as Mulheres,<br />
do Governo Federal do presidente Luiz<br />
Inácio Lula da Silva – é anunciada pelas<br />
guardas, ao terem sido questionadas sobre<br />
como conciliam a vida profissional<br />
de agente de segurança e a condição de<br />
mulher e mãe. Identificam as dificuldades<br />
de conciliação desses papéis, mas se<br />
atribuem o rótulo de “supermulheres”,<br />
por conseguirem suprir as necessidades<br />
profissionais e familiares, gerando-lhes<br />
internamente uma sensação de vitória e<br />
importância, permitindo-lhes sentimentos<br />
de orgulho pessoal.<br />
Outro fator de indagação de nossa<br />
pesquisa diz respeito a aparência física<br />
e à questão estética. Desde os gregos, a<br />
estética passou a fazer parte das idéias delimitadoras<br />
de um espaço ideal de atuação<br />
social, levando a mulher a adotar e aceitar<br />
no seu corpo “os critérios de comportamento<br />
cultural chama<strong>dos</strong> estéticos, ensinando,<br />
que é preciso obedecer” (Chaves,<br />
1986, p. 276).<br />
Entre as mulheres da Guarda Civil<br />
Municipal, a aparência também representa<br />
um importante elemento nas suas<br />
relações cotidianas. Os padrões de beleza<br />
vigentes parecem interferir nas condições<br />
de trabalho, quando aquelas consideradas<br />
as mais bonitas são convidadas a<br />
participar de eventos publicitários da corporação,<br />
obtendo também privilégios na<br />
escala de serviço:<br />
“Em toda área, a beleza conta. Se<br />
um chefe precisa de uma secretária e<br />
aparece uma gordinha com experiência<br />
e uma morena com curvas salientes,<br />
saradona, de quem será o cargo?<br />
Óbvio, será da saradona” (sic) (Paula,<br />
32 anos, três anos de corporação).<br />
Dentre as várias condições<br />
de trabalho das mulheres na<br />
corporação de vigilância, a que<br />
imediatamente salta aos olhos, diz<br />
respeito à discriminação de gênero<br />
sofrida por suas profissionais.<br />
2 ARTIGO<br />
As condições de trabalho, do ponto<br />
de vista feminino são muito difíceis, a começar<br />
pela carga horária para um trabalho realizado<br />
em pé, sob sol forte, particularmente<br />
nos perío<strong>dos</strong> menstruais, isso, aliado a outros<br />
problemas, como a dificuldade de encontrar<br />
nas ruas banheiros minimamente decentes.<br />
As inovações nos uniformes de<br />
segurança não respeitam o corpo feminino,<br />
mesmo com o incentivo de ingresso<br />
de mulheres na corporação. Os coletes à<br />
prova de bala normalmente apertam os<br />
seios. Em perío<strong>dos</strong> de menstruação, em<br />
que o corpo da mulher sofre um inchaço,<br />
ficando também mais sensível à dor, esses<br />
coletes, por serem muito justos e costura<strong>dos</strong><br />
no mesmo formato para o corpo masculino,<br />
acabam por machucar as guardas.<br />
O tamanho desproporcional do coldre, associado<br />
ao peso da arma, também causa<br />
dores na bexiga, rins e útero. As calças <strong>dos</strong><br />
uniformes não possuem bolsos para carregarem<br />
absorventes higiênicos. Para as<br />
mulheres grávidas, não existe fardamento<br />
diferenciado. Em relação à fisiologia<br />
feminina, esta é levada em consideração,<br />
dependendo da sensibilidade do superior<br />
hierárquico. Alguns deles, consideram a<br />
tensão pré-menstrual, o período menstrual<br />
e as decorrências da gravidez como empecilho<br />
à execução do trabalho.<br />
Das 12 respostas obtidas à verificação<br />
desse fator cotidiano, pôde-se apurar<br />
quatro comportamentos existentes no<br />
relacionamento entre guardas homens e<br />
mulheres. Alegaram serem tratadas com<br />
indiferença, com rispidez, com discriminação<br />
ou de forma “boa” (expressão que foi<br />
interpretada como cordial). No entanto,<br />
pode-se perceber que a pesquisa indicou,<br />
conforme aponta o gráfico abaixo, a percepção<br />
de que o relacionamento entre sexo<br />
na Guarda Civil Municipal de Santo André<br />
é profundamente marcado pela forma de<br />
discriminação de gênero.<br />
relacionamento com o sexo masculino<br />
A - Indiferença<br />
B - Discriminação<br />
C - Com Rapidez<br />
D - Boa
No questionário, fora relatado<br />
que, com a chegada de um maior número<br />
de mulheres na corporação, desencadeouse<br />
ali um ambiente de certa hostilidade<br />
entre os guardas de sexos diferentes, revelando-se<br />
ora de forma velada, ora explicitamente,<br />
mas sempre demonstrando que o<br />
relacionamento entre mulheres e homens<br />
nesse tipo de organização é permeado de<br />
ações discriminatórias, conforme descreve<br />
uma das guardas entrevistadas:<br />
“Fomos recebidas com discriminação,<br />
pois os guardas masculinos achavam<br />
e diziam que lugar de mulher era no<br />
tanque e no fogão, que não tínhamos<br />
capacidade e nem competência<br />
para fazer o mesmo serviço que<br />
eles” (s/nome, 28 anos, quatro anos<br />
de corporação).<br />
Apesar de formalmente assentada<br />
na missão de “proteger e servir”, o que se<br />
privilegia na identidade policial militar são,<br />
sobretudo, as virtudes “másculas” e “guerreiras”:<br />
“bravura”, “heroísmo”, força física,<br />
aptidão para o risco, virtudes de que as<br />
mulheres estariam, por hipótese, desprovidas.<br />
Como indica Jacqueline Muniz:<br />
“Idealizado pelos PMs da ponta da<br />
linha como uma espécie de ‘terra de<br />
machos’, o mundo das ruas é descrito<br />
como um tipo de realidade que não<br />
se deixa comover pelas virtudes culturais<br />
atribuídas ao signo feminino.<br />
Nesse território simbólico interpretado<br />
como sórdido, violento, insensível<br />
e, por tudo isso, masculino, parece só<br />
haver lugar para a disputa entre os<br />
destemi<strong>dos</strong> ‘mocinhos’, que integram<br />
o ‘bonde do bem’ e os ‘bandi<strong>dos</strong>’ e<br />
desregra<strong>dos</strong>, que compõem o ‘bonde<br />
do mal’. Esse tipo de gramática<br />
<strong>dos</strong> papéis de gênero, em boa medida<br />
conservadora e estereotipada,<br />
encontra-se disseminada no interior<br />
da tropa. Dela resulta o discurso que<br />
pressupõe a inadequação das mulheres<br />
para as tarefas de policiamento<br />
e prescreve para elas outros tipos de<br />
serviços, quase sempre burocráticos<br />
e muito distantes das atividades de<br />
rua” (Muniz, apud Soares e Musumeci,<br />
2005, p. 87).<br />
Gestão & Regionalidade - N o 13 - 2 o Semestre 2005<br />
Para esta autora, essa ideologia<br />
estabelece um enfraquecimento da qualidade<br />
de “ser policial” entre os que estão<br />
aptos ao confronto e os que se dedicam a<br />
prevenir, proteger e mediar, quer sejam<br />
mulheres ou homens. O policiamento comunitário,<br />
por exemplo, é visto, muitas vezes,<br />
como espúria “feminização” do trabalho,<br />
como atividade cosmética, despida da<br />
virilidade própria da profissão, não raro os<br />
estereótipos de gênero são explicitamente<br />
aciona<strong>dos</strong> na resistência interna a essas e<br />
outras inovações.<br />
Se o relacionamento entre servidores<br />
homens e mulheres vem sendo marcado<br />
pela discriminação de gênero, que<br />
encontra en<strong>dos</strong>so numa mentalidade tradicionalmente<br />
machista por parte <strong>dos</strong> guardas,<br />
no relacionamento entre as mulheres<br />
também se evidencia a mesma mentalidade,<br />
contudo marcada por comportamentos<br />
ciumentos, competitivos, desagregadores,<br />
oriun<strong>dos</strong>, em especial das guardas mais antigas<br />
da corporação:<br />
“Nosso relacionamento em geral é<br />
bom, mas existe certa discriminação<br />
das mais antigas com as mais novas”<br />
(Lourenço Rosseti, 25 anos, três anos<br />
de corporação).<br />
(...) Apesar da hostilidade de alguns<br />
guardas masculinos, prefiro trabalhar<br />
com eles, as mulheres guardas são muito<br />
melindrosas, querem espaço” (Paula,<br />
32 anos, três anos de corporação).<br />
(...) As GCMFs são muito competitivas<br />
e, devido a isso, geram muitos atritos.<br />
Muitas vezes, o rostinho mais bonito<br />
é o que prevalece e não o profissionalismo”<br />
(Guerra, 38 anos, quatro<br />
anos de corporação).<br />
De to<strong>dos</strong> estes relatos, pode-se, em<br />
uma primeira análise, concluir que, não havendo<br />
política institucional de gênero, nem<br />
um ideal defendido especificamente pelas<br />
mulheres, por meio de mecanismo de afirmação<br />
coletiva de identidade, a imagem da<br />
GCMFs torna-se imprecisa, individualizada<br />
e sujeita também a avaliações individuais,<br />
baseadas na experiência empírica, quase<br />
sempre mediada por pré-noções, idealizações<br />
ou mecanismos de resistência.<br />
29
“Se tivéssemos que definir dois extremos<br />
entre os quais oscilam essas avaliações,<br />
o primeiro seria o en<strong>dos</strong>so puro<br />
e simples <strong>dos</strong> estereótipos de gênero,<br />
como em alguns trechos de entrevistas<br />
já cita<strong>dos</strong> anteriormente, que destinam<br />
à mulher um lugar “natural” nos serviços<br />
internos, e o outro seria a negação<br />
pura e simples de qualquer diferença”<br />
(Soares e Musumeci, 2005, p.111).<br />
Questionou-se também as entrevistadas<br />
sobre a ampliação <strong>dos</strong> poderes<br />
das GCMs. Pelas respostas, entende-se que<br />
as guardas civis femininas não visualizam<br />
claramente essa ampliação de poderes e,<br />
se de fato isso ocorrer, deverá haver restrições<br />
de poderes. No entanto, são mais<br />
contundentes ao afirmar a quase impossibilidade<br />
disso ocorrer, pois a Polícia Militar<br />
não permitirá tal ampliação:<br />
“Existe um empecilho muito grande<br />
que é a Polícia Militar, e de quem vai<br />
controlar esse poder para que não<br />
fuja das rédeas do Estado” (Maria, 43<br />
anos, quatro anos de corporação).<br />
Da análise do I Seminário Regional<br />
das Guardas Municipais Femininas, realizado<br />
em 28 de novembro de 2003, que<br />
teve como objetivo avaliar a participação<br />
feminina nos quadros da política de segurança<br />
local, pôde-se verificar que a indefinição<br />
acerca do papel constitucional<br />
<strong>dos</strong> Guardas Civis Municipais evidenciouse<br />
de forma mais aguda quando voltada<br />
para o papel da mulher nessa instituição<br />
e do difícil relacionamento entre homens<br />
e mulheres numa corporação histórica e<br />
tradicionalmente organizada em torno<br />
das características masculinas. O cotidiano<br />
de trabalho dessas mulheres é regido pelas<br />
relações de gênero que se estabelecem<br />
entre os guardas e com seus comandantes.<br />
Se a atuação da GCM na cidade já impõe<br />
uma discussão acerca da gestão municipal<br />
de segurança pública, a atuação da GCMF<br />
polemiza ainda mais a discussão e permite<br />
resgatar práticas de trabalho policial ainda<br />
mais violentas e discriminadoras.<br />
É importante lembrar que a polícia<br />
brasileira seguiu o modelo político de<br />
organização policial presente na França e<br />
em Portugal, estes não estão a serviço do<br />
0 ARTIGO<br />
público, mas do Estado e <strong>dos</strong> grupos dominantes,<br />
no sentido de fortalecer o uso<br />
privado da violência contra a sociedade,<br />
vigiando para que qualquer ameaça considerada<br />
subversiva ao poder público fosse<br />
contida pela força da opressão (Paixão,<br />
1991). A conseqüência desse modelo de policia<br />
gerou no Brasil a desconfiança recíproca<br />
entre policiais e cidadãos. A reação do<br />
cidadão comum frente à polícia soma-se ao<br />
sentimento de medo, mesmo por pessoas<br />
que, em princípio, nada teriam a temer.<br />
A própria formação praticada<br />
nas escolas da Polícia Militar, encontramse<br />
alicerçadas na ideologia do exército,<br />
reproduzindo em sua organização as<br />
mesmas existentes no Exército Brasileiro,<br />
segundo os princípios de território a ser<br />
atacado ou defendido.<br />
Coronel Carlos Alberto de Camargo,<br />
ex-comandante geral da Polícia Militar<br />
do Estado de São Paulo, em seu livro Estética<br />
Militar (1997), defende que os militares<br />
constituem uma instituição separada do<br />
povo, destinada a corrigi-lo e a pôr ordem<br />
na vida coletiva. Como se nota:<br />
“Nas instituições policiais brasileiras<br />
ainda prevalece a cultura policial tradicional<br />
de viés “bélico”, com foco<br />
quase exclusivo na ação reativa e repressiva,<br />
com baixíssimo investimento<br />
em inteligência, pouco ou nenhum<br />
treinamento <strong>dos</strong> agentes de ponta<br />
em técnicas de mediação de conflitos,<br />
nenhuma ênfase no uso comedido<br />
da força e da autoridade, pouca<br />
ou nenhuma preocupação com a legalidade<br />
e a legitimidade do trabalho<br />
de polícia” (Soares e Musumeci,<br />
2005, p. 82).<br />
Nesse contexto, as atividades cotidianas<br />
de preservação da ordem pública,<br />
não gozam do mesmo status que as<br />
ações repressivas.<br />
Pode-se deduzir daí a enorme dificuldade<br />
que as mulheres ainda terão de<br />
enfrentar para se afirmarem como policiais<br />
ou guardas, uma vez que lhes coube<br />
a tarefa de prevenir, cuidar e orientar, sem<br />
que essa tarefa fosse assumida institucionalmente<br />
como referência de um novo modelo<br />
de polícia e policiamento.
eFerÊnCIas BIBLIOGrÁFICas<br />
BRAGA, Carlos Alexandre. Guarda municipal:<br />
manual de criação, organização e manutenção,<br />
orientações administrativas e legais. São<br />
Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 1999.<br />
CAMARGO, Carlos Alberto. estética militar.<br />
Centro de Aperfeiçoamento e Estu<strong>dos</strong> Superiores<br />
da Polícia Militar do Estado de São<br />
Paulo, 1994.<br />
CHAVES, Anesia Pacheco. e agora mulher?<br />
Rio de Janeiro: Editora Guanabara, 1986.<br />
FUNDAÇÃO Seade e Assembléia Legislativa<br />
de São Paulo. Cadernos do Fórum são Paulo<br />
Século 21 – Caderno 7: Segurança. São<br />
Paulo: Assembléia Legislativa, 1999.<br />
FÓRUM METROPOLITANO DE SEGURANÇA<br />
PÚBLICA 2000. relatório de atividades, rresulta<strong>dos</strong><br />
e propostas – 29/3/2001 a 28/6/2001.<br />
PLANO NACIONAL DE POLÍTICAS PARA<br />
MULHERES - Secretaria Especial de Políticas<br />
para Mulheres – 2004.<br />
Gestão & Regionalidade - N o 13 - 2 o Semestre 2005<br />
PLANO NACIONAL DE SEGURANÇA PÚBLI-<br />
CA – 2004.<br />
PAIXÃO, Antonio Luiz. Polícia e segurança<br />
pública. O alfares. Belo Horizonte, 9(30):27-<br />
41, jul./set.1991.<br />
SOARES, Luiz Eduardo. Meu casaco de general:<br />
500 dias no fronte da segurança pública<br />
no Rio de Janeiro. São Paulo: Companhia<br />
das Letras, 2000.<br />
SOARES, Bárbara Musumeci. Polícia e gênero:<br />
presença feminina nas PMs brasileiras.<br />
In: Boletim segurança e Cidadania, n. 2.<br />
Rio de Janeiro: Centro de Estu<strong>dos</strong> de Segurança<br />
e Cidadania, 2004.<br />
SOARES, Bárbara Musumeci, MUSUMECI<br />
Leonarda. Mulheres policiais. Presença<br />
feminina na polícia militar do Rio de Janeiro.<br />
Rio de Janeiro: Civilização Brasileira,<br />
2005.<br />
1
IMPOrTÂnCIa CresCenTe Das aLIanÇas esTraTÉGICas<br />
NO AMBIENTE COMPETITIVO ATUAL –<br />
CasO: JOINT VENTURE LG.PhILIPs DIsPLaYs<br />
Cynthia Hisako Sakaguchi Ito* e <strong>Prof</strong>. <strong>Dr</strong>. Sérgio Crispim**<br />
resUMO aBsTraCT<br />
O atual ambiente competitivo,<br />
caracterizado por um mundo<br />
altamente globalizado, tecnologias<br />
dinâmicas e pela rápida velocidade<br />
das mudanças tem revolucionado o<br />
mundo <strong>dos</strong> negócios, fazendo com<br />
que as empresas busquem constantemente<br />
alternativas para se manterem<br />
competitivas no mercado. Na última<br />
década, houve uma considerável ampliação,<br />
no cenário internacional, <strong>dos</strong><br />
processos de fusões e aquisições, assim<br />
como de alianças estratégicas e parcerias<br />
com a finalidade de adaptação ao<br />
novo cenário. Um desses processos é<br />
a joint venture. Apesar da crescente<br />
popularidade, as joint ventures tornaram-se<br />
uma forma de organização<br />
muito complexa e problemática. Em<br />
um estudo sobre joint ventures formadas<br />
entre 1924 e 1985, Harrigan<br />
constatou que apenas 46% tiveram<br />
êxito. Nesse contexto, a LG.Philips<br />
Displays mostra-se um estudo de caso<br />
interessante, mesmo porque é uma<br />
empresa que se originou de outras<br />
duas, de culturas diferentes (a LG é<br />
uma empresa de origem coreana e<br />
cultura oriental, enquanto a Philips<br />
é de origem holandesa e cultura ocidental),<br />
e tem obtido sucesso desde a<br />
sua formação.<br />
PaLaVras-ChaVe: aliança estratégica,<br />
joint venture, mercado competitivo.<br />
* Aluna do PMA da Universidade IMES.<br />
* <strong>Prof</strong>essor do PMA da Universidade IMES.<br />
2 ARTIGO<br />
The current competitive environment<br />
characterized by a highly<br />
globalized world, dynamic technologies<br />
and the fast speed of changes, has<br />
revolutionized business world, leading<br />
companies to frequently search<br />
for alternatives, to keep competitive<br />
in the market. In the last decade,<br />
there was a noticed amplification,<br />
on international scene, of merging<br />
and acquisitioning processes, as well<br />
as strategical alliances and partnerships<br />
with the purpose of adaptation<br />
to this new scene. One of these processes<br />
is the joint venture. Despite<br />
the increasing popularity, joint ventures<br />
have become a complex and<br />
problematic kind of organization. On<br />
a study about joint ventures created<br />
between 1924 and 1985, Harrigan noticed<br />
that only 46% had succeeded.<br />
In this context, LG.Philips Displays reveals<br />
to be an interesting study case,<br />
even because it is a company originated<br />
from other ones, which had<br />
two different cultures (LG is a Korean<br />
company with oriental culture, while<br />
Philips is a Dutch company with occidental<br />
culture) and has gotten success<br />
since this joint.<br />
KeYWOrDs: strategical alliance, joint<br />
venture, competitive market.
1. InTrODUÇÃO<br />
O mercado atual está cada vez<br />
mais competitivo e a natureza competitiva<br />
de muitas empresas do mundo passa por<br />
mudanças cada vez mais aceleradas e profundas.<br />
E, como o cenário competitivo do<br />
século XXI não se satisfaz com ações convencionais<br />
de economias de escala ou orçamentos<br />
volumosos de publicidade, e nem<br />
administradores convencionais, há uma exigência<br />
de administradores com uma mentalidade<br />
que valoriza a flexibilidade, inovação,<br />
integração, frente aos desafios que<br />
surgem num ritmo de mudança constante.<br />
Essas mudanças no cenário e no<br />
ambiente atual são causadas, principalmente,<br />
por dois fatores: surgimento de<br />
uma economia e tecnologia globalizadas e<br />
as rápidas mudanças tecnológicas.<br />
Segundo Hitt (2002), a economia<br />
globalizada é aquela na qual os bens,<br />
serviços, pessoas, habilidades e idéias movimentam-se<br />
livremente através das fronteiras<br />
geográficas e, esta, está em fase de<br />
constante expansão, o que implica em uma<br />
maior complexidade para o contexto competitivo<br />
de uma empresa.<br />
A tecnologia está provocando<br />
significativas mudanças na natureza da<br />
concorrência, por meio, basicamente, de<br />
três tendências: a crescente taxa de mudança<br />
e disseminação tecnológica, a era<br />
da informação e o aumento na intensidade<br />
do conhecimento necessário para as<br />
empresas atualmente.<br />
Com um cenário competitivo cada<br />
vez mais dinâmico e desafiador, as empresas<br />
utilizam com maior freqüência estratégias<br />
cooperativas como meio para sobreviverem.<br />
Nos últimos anos, tem-se presenciado<br />
um número crescente de alianças e<br />
fusões entre empresas em todo o mundo.<br />
Há diariamente anúncios de novos elos,<br />
parcerias ou alianças. Seja qual for o nome<br />
que tenham, esses relacionamentos entre<br />
empresas envolvem parceiros de várias partes<br />
do mundo e cobrem uma certa amplitude<br />
de funções e atividades.<br />
As alianças estratégicas, principais<br />
formas de parceria estratégica, são parcerias<br />
entre empresas, em que seus recursos,<br />
capacidades e competências são compartilha<strong>dos</strong><br />
para chegarem a um objetivo comum,<br />
que pode ser um produto, serviço ou<br />
processo. Fusões e aquisições podem ser<br />
Gestão & Regionalidade - N o 13 - 2 o Semestre 2005<br />
vistas separadamente ou como formas de<br />
alianças estratégicas.<br />
Segundo Hooley e Saunders<br />
(2001), as joint ventures são um tipo de<br />
aliança estratégica em que propriedades<br />
de um projeto ou operação são compartilhadas<br />
entre as empresas em questão.<br />
Dado o exposto, este artigo propõe-se<br />
a estudar a joint venture das empresas<br />
LG e Philips e, com isso, proporcionar<br />
a contextualização do cenário competitivo<br />
atual, a revisão nos conceitos de alianças<br />
estratégicas entre empresas e conhecer um<br />
processo de formação e manutenção de<br />
uma joint venture, assim como os fatores<br />
que levaram à sua formação e os resulta<strong>dos</strong><br />
obti<strong>dos</strong> desde a sua formação .<br />
A escolha da joint venture LG.Philips<br />
Displays deveu-se ao fato de que ela proporciona<br />
um estudo de caso interessante porque<br />
é uma empresa que se originou de duas<br />
empresas multinacionais reconhecidas mundialmente<br />
e de culturas diferentes. A LG é<br />
uma empresa de origem coreana e cultura<br />
oriental, enquanto a Philips é de origem holandesa<br />
e cultura ocidental.<br />
Nos próximos itens, trataremos<br />
<strong>dos</strong> referenciais conceituais utiliza<strong>dos</strong> para<br />
o estudo proposto neste artigo, em seguida,<br />
a partir do item 5, faremos uma análise<br />
das empresas LG, Philips e da joint venture<br />
LG.Philips Displays, os fatores e resulta<strong>dos</strong><br />
levanta<strong>dos</strong>, assim como as conclusões deste<br />
estudo.<br />
2. CenÁrIO DO sÉCULO XXI<br />
No cenário do século XXI, as empresas<br />
deparam-se com o desafio de desenvolver<br />
um nível ideal de globalização, que<br />
gere concentrações adequadas das operações<br />
locais e globalizadas para a empresa.<br />
Segundo Klotzle (2002), num<br />
mundo globalizado, o incremento da competitividade<br />
tornou-se questão de sobrevivência<br />
para as empresas, independente do<br />
ramo em que elas atuam. A globalização<br />
não só exige presença nos merca<strong>dos</strong>-chave,<br />
mas também aumento da produtividade,<br />
redução <strong>dos</strong> custos, melhoria da qualidade<br />
<strong>dos</strong> produtos, investimentos na qualificação<br />
<strong>dos</strong> funcionários e desenvolvimento<br />
de novas tecnologias; entretanto, muitas<br />
vezes, o incremento da competitividade e<br />
a onipresença em diversos merca<strong>dos</strong> são<br />
atividades muito onerosas para a maioria
das empresas. Poucas delas têm a capacidade<br />
de duplicar as suas cadeias de valores<br />
em tão diferentes lugares. Isso faz com que<br />
atividades de colaboração com outras empresas<br />
tenham de ser levadas em consideração,<br />
ou seja, a utilização de atividades de<br />
parceria é a maneira encontrada pelas empresas<br />
não só para sobreviverem no mercado,<br />
como também para aumentarem a sua<br />
competitividade.<br />
A taxa de mudança da tecnologia<br />
e a velocidade com que novas tecnologias<br />
são disponibilizadas e adotadas têm<br />
aumentado substancialmente nos últimos<br />
anos.<br />
No que diz respeito à fonte de<br />
vantagem competitiva, o índice atual de<br />
difusão tecnológica enfraquece a proteção<br />
das patentes com que as empresas se cercavam<br />
anteriormente.<br />
Os últimos anos foram palco de<br />
mudanças dramáticas a tecnologia da informação.<br />
Microcomputadores, telefones<br />
celulares, inteligência artificial, realidade<br />
virtual e bases de da<strong>dos</strong> de grande porte<br />
são alguns exemplos de como a informação<br />
é utilizada de mo<strong>dos</strong> diferentes em decorrência<br />
<strong>dos</strong> desenvolvimentos tecnológicos.<br />
Segundo Hitt, Ireland e Hoskisson<br />
(2002), atualmente, as empresas estão ingressando<br />
na construção de redes eletrônicas<br />
capazes de conectá-las a clientes, emprega<strong>dos</strong>,<br />
vendedores e fornecedores. O<br />
comércio eletrônico possui uma diferente<br />
forma de concorrência e requer uma abordagem<br />
de liderança diferente. Tanto o ritmo<br />
de mudança na tecnologia da informação<br />
quanto sua disseminação continuarão<br />
aumentando. A proliferação mundial de<br />
poder de processamento de da<strong>dos</strong> a custo<br />
relativamente baixo e a conexão dessa<br />
capacidade em âmbito globalizado, pelas<br />
redes de computadores, combinam-se para<br />
aumentar a velocidade e a disseminação das<br />
tecnologias da informação. Desse modo, o<br />
potencial competitivo das tecnologias da<br />
informação está se tornando viável para as<br />
empresas em todo o mundo, e não apenas<br />
para as grandes empresas da Europa, Japão<br />
e América do Norte.<br />
A combinação de internet e da<br />
rede mundial (Web) cria uma infra-estrutura<br />
que permite o fornecimento de informações<br />
aos computadores em qualquer<br />
lugar do mundo. O acesso a quantidades<br />
significativas de informações relativamen-<br />
4 ARTIGO<br />
te baratas gera oportunidades estratégicas<br />
para muitas indústrias e companhias.<br />
Ainda segundo Hitt, Ireland e<br />
Hoskisson (2002), o conhecimento representa<br />
a base da tecnologia e da sua aplicação.<br />
No cenário competitivo atual, o conhecimento<br />
está se tornando cada vez mais<br />
uma fonte valiosa de vantagem competitiva.<br />
Por esse motivo, muitas empresas lutam<br />
para converter o conhecimento acumulado<br />
de cada um de seus funcionários em um patrimônio<br />
corporativo. A probabilidade de<br />
obtenção da competitividade estratégica<br />
no cenário competitivo do século XXI é ampliada<br />
quando a empresa conscientiza-se<br />
de que a própria sobrevivência depende de<br />
sua habilidade de capturar inteligência e<br />
transformá-la em conhecimento útil, difundindo-o<br />
rapidamente por toda a companhia.<br />
As empresas que aceitam esse desafio<br />
mudam o seu enfoque, passando a explorar<br />
a informação, em vez de simplesmente<br />
obtê-la, para alcançar uma vantagem competitiva<br />
em relação aos seus concorrentes.<br />
. esTraTÉGIas e VanTaGens COMPeTI-<br />
TIVas<br />
Frente a este cenário atual, as<br />
empresas necessitam estar atentas a seu<br />
posicionamento, suas estratégias e suas<br />
competências essências, para que consigam<br />
alcançar vantagem competitiva em relação<br />
aos seus concorrentes e se mantenham<br />
competitivas no mercado.<br />
O posicionamento competitivo da<br />
empresa é uma declaração <strong>dos</strong> merca<strong>dos</strong>alvo<br />
(onde a empresa irá competir) e da<br />
vantagem diferencial (como a empresa irá<br />
competir). O posicionamento é desenvolvido<br />
para que as metas traçadas pela estratégia<br />
central sejam atingidas.<br />
A escolha <strong>dos</strong> merca<strong>dos</strong>-alvo deve<br />
levar em conta vários fatores, que podem<br />
ser dividi<strong>dos</strong> em duas categorias: levantamento<br />
da atratividade do mercado e avaliação<br />
<strong>dos</strong> pontos fortes atuais e potenciais<br />
da empresa para atender àquele mercado.<br />
A vantagem diferencial pode ser<br />
criada com base em qualquer ponto forte<br />
ou nas competências específicas da empresa<br />
em relação à concorrência. Os fatores<br />
fundamentais que devem ser leva<strong>dos</strong> em<br />
conta na criação da vantagem estão no<br />
fato de que ela deve ser um valor para o<br />
cliente e que empregue, ao mesmo tempo,
uma aptidão para empresa que seja difícil<br />
de ser copiado pela concorrência (Hooley;<br />
Saunders, 1996).<br />
A essência da formulação de uma<br />
estratégia competitiva é relacionar uma<br />
companhia ao seu meio ambiente, assim<br />
como às forças sociais e econômicas. A<br />
meta da estratégia competitiva para uma<br />
unidade empresarial em uma indústria<br />
é encontrar uma posição dentro dela em<br />
que a companhia possa melhor se defender<br />
contra as forças competitivas do ambiente<br />
externo ou influenciá-las a seu favor.<br />
Segundo Porter (1997), as cinco<br />
forças competitivas são: entrada, ameaça<br />
de substituição, poder de negociação <strong>dos</strong><br />
compradores, poder de negociação <strong>dos</strong><br />
fornecedores e rivalidade entre os atuais<br />
concorrentes. Essas forças refletem o fato<br />
de que a concorrência em uma indústria<br />
não está limitada aos participantes estabeleci<strong>dos</strong>.<br />
Clientes, fornecedores, substitutos<br />
e os entrantes potenciais são to<strong>dos</strong> concorrentes<br />
para as empresas, podendo ter<br />
maior ou menor importância, dependendo<br />
das circunstâncias.<br />
Ainda segundo Porter (1999), o<br />
conjunto das forças competitivas em uma<br />
indústria determina até que ponto o influxo<br />
de investimento ocorre e direciona o retorno<br />
para o nível da taxa de mercado livre e,<br />
assim, a capacidade das empresas de manterem<br />
retornos acima da média. Este conjunto<br />
de forças também determina a intensidade<br />
da concorrência na indústria, bem como<br />
a rentabilidade, sendo que as forças mais<br />
acentuadas predominam e tornam-se cruciais<br />
na formulação de estratégias.<br />
No contexto dinâmico e imprevisível<br />
atual, a competência no processo de<br />
formulação de estratégias é fundamental,<br />
podendo ser tratado nos mesmos moldes<br />
que caracterizam a competência individual:<br />
saber agir, saber mobilizar recursos,<br />
integrar saberes múltiplos e complexos, saber<br />
aprender, assumir responsabilidade e<br />
ter visão estratégica (Fleury; Fleury, 2000).<br />
A palavra competência pode ter<br />
vários significa<strong>dos</strong>, dependendo do seu uso:<br />
no senso comum é utilizada para designar<br />
pessoa qualificada para realizar algo; no<br />
mundo do trabalho, assume significa<strong>dos</strong> liga<strong>dos</strong><br />
às características das pessoas (input)<br />
e das tarefas (output), como o conjunto de<br />
conhecimentos, habilidades, atitudes que<br />
afetam a maior parte do trabalho de uma<br />
Gestão & Regionalidade - N o 13 - 2 o Semestre 2005<br />
pessoa, e que se relacionam com o desempenho<br />
no trabalho.<br />
Uma competência essencial pode<br />
estar relacionada ao domínio de qualquer<br />
estágio do ciclo de negócios, sendo que<br />
esse conhecimento deve estar associado<br />
a um processo de aprendizagem que seja<br />
sistemático, envolvendo a inovação e capacitação<br />
de recursos humanos. A definição<br />
para uma organização que aprende enfatiza<br />
sua capacidade de adaptação às mudanças,<br />
de forma criativa e produtiva.<br />
Segundo Hitt (2002), as competências<br />
essenciais emergem com o tempo por<br />
meio de um processo organizacional para<br />
acumular e aprender a dispor os diferentes<br />
recursos e capacidades. Na condição de<br />
capacidade de adotar medidas de ação, as<br />
competências essenciais são atividades que<br />
a empresa executa especialmente bem, em<br />
comparação aos concorrentes, e adiciona<br />
valor ímpar a seus bens e serviços por um<br />
logo período.<br />
Nem to<strong>dos</strong> os recursos e capacidades<br />
de uma empresa são bens que possuem<br />
valor competitivo e o potencial para<br />
servir de fonte de vantagem competitiva.<br />
Determina<strong>dos</strong> recursos e capacidades podem<br />
causar incompetência pelo fato de representarem<br />
áreas competitivas nas quais<br />
a empresa é fraca em relação aos concorrentes.<br />
Desse modo, determina<strong>dos</strong> recursos<br />
e capacidades podem dificultar ou evitar<br />
o desenvolvimento de uma competência<br />
essencial. As empresas que carecem de capital<br />
financeiro, por exemplo, podem tornar-se<br />
incapazes de adquirir as instalações<br />
ou recrutar pessoal dotado das habilidades<br />
necessárias à fabricação de produtos que<br />
gerem valor ao cliente. Nessa situação, o<br />
capital financeiro seria um ponto fraco.<br />
Munida de um entendimento profundo de<br />
seus recursos e capacidades, as empresas<br />
devem identificar oportunidades no ambiente<br />
externo, que podem ser exploradas<br />
por meio de suas capacidades, enquanto<br />
evitam a atuação da concorrência em suas<br />
áreas mais fracas.<br />
Para Hitt, Ireland e Hoskisson<br />
(2002), não existe vantagem competitiva<br />
que dure para sempre. Com o passar do<br />
tempo, as empresas concorrentes utilizarão<br />
seus próprios recursos, capacidades<br />
e competências essenciais para elaborar<br />
proposições diferentes, porém eficazes<br />
e capazes de gerar vantagens competiti-<br />
5
vas. Desse modo, devido ao fato de que a<br />
vantagem competitiva não ser sustentável<br />
de modo permanente, as empresas devem<br />
explorar suas vantagens atuais, enquanto<br />
utilizam simultaneamente os seus recursos<br />
e capacidades para formar novas competências<br />
essenciais que possam servir como vantagens<br />
competitivas relevantes no futuro.<br />
Ainda segundo Hitt, Ireland e<br />
Hoskisson (2002), a vantagem competitiva<br />
é criada quando os recursos e capacidades<br />
forem valiosos, raros, dispendiosos para<br />
imitar e insubstituíveis. Quando estes quatro<br />
critérios menciona<strong>dos</strong> forem atendi<strong>dos</strong>,<br />
os recursos e capacidades se transformarão<br />
em competências essenciais.<br />
4. FUSÕES, AQUISIÇÕES E ALIANÇAS ES-<br />
TraTÉGICas<br />
Dentre as características das fusões<br />
e aquisições de empresas está à busca<br />
de uma maior participação em mercado<br />
concorrente. Seria uma forma de estratégia<br />
das empresas em atingir a economia<br />
global estendendo sua atuação. Essa estratégia<br />
foi destacada por Yoshino e Rangan,<br />
sendo que, segundo eles, as empresas<br />
multinacionais e nacionais vêm percebendo<br />
igualmente que, não só é viável basear-se<br />
na competência de outras empresas<br />
do mundo para concorrer com maior eficácia,<br />
como, freqüentemente, é necessário.<br />
Um número cada vez maior de empresas<br />
vem procurando construir redes externas<br />
de alianças nacionais e internacionais para<br />
complementar suas redes internas de subsidiárias<br />
nacionais e internacionais.<br />
João Bosco Lodi, argumentou sobre<br />
algumas das razões quanto a essa onda<br />
de fusões que está ocorrendo atualmente:<br />
“Não faltam os argumentos a favor.<br />
A globalização <strong>dos</strong> merca<strong>dos</strong>, a saída<br />
para além das fronteiras nativas à<br />
busca de melhora de ganhos, velocidade<br />
de mudança tecnológica, escala<br />
das comunicações mundiais, marcas<br />
compatíveis num mercado multilingual,<br />
fragilidade das empresas nas<br />
economias emergentes, eliminação<br />
de gestores incompetentes” (LODI,<br />
J.B, 1999).<br />
O secretário-geral da Unctad, o<br />
embaixador brasileiro Rubens Ricupero<br />
6 ARTIGO<br />
observou a influência da globalização no<br />
processo de fusões de empresas. De acordo<br />
com Ricupero:<br />
“As operações internacionais de compra<br />
e venda de empresas, envolvendo<br />
grandes corporações transnacionais e<br />
gigantescas somas de dinheiro, são<br />
uma das faces mais visíveis da globalização.<br />
E, como no caso da globalização,<br />
de nada adianta opor-se ao processo.<br />
O que é preciso é estabelecer<br />
normas que, de algum modo, compensem,<br />
para a sociedade, a eventual<br />
redução da concorrência, decorrente<br />
do gigantismo das novas corporações<br />
transnacionais” (http: //jt. com.br/editoriais/00/10/08/artigos002.html).<br />
Outros autores também se manifestaram<br />
sobre a globalização, do ponto<br />
de vista da presença das multinacionais na<br />
economia mundial. Segundo Banas (1996), a<br />
grande vantagem dessas companhias reside<br />
na globalização de suas operações, que lhes<br />
permite o abastecimento nos lugares mais<br />
favoráveis (os mais baratos) no mundo inteiro,<br />
ficando livres de pressões locais.<br />
A globalização possibilitou às empresas<br />
se organizarem e expandirem seus<br />
negócios pelo mundo todo, e isso, segundo<br />
alguns autores, pode torna-se um grande<br />
perigo para o sistema capitalista. Num<br />
primeiro instante, pode até ser vantajoso<br />
aos consumidores finais, uma vez que as<br />
empresas ganham em escala, aumentam a<br />
qualidade e melhoram o serviço para ganhar<br />
mercado, o que reflete na diminuição<br />
<strong>dos</strong> custos e <strong>dos</strong> preços <strong>dos</strong> produtos finais.<br />
Entretanto, no futuro, com o domínio do<br />
mercado por poucos grupos, limitam-se as<br />
opções de escolha.<br />
De acordo com Anita Kon (1994),<br />
a centralização do capital resulta da luta<br />
da concorrência em busca do barateamento<br />
das mercadorias que, por sua vez, depende<br />
do aumento da escala de produção<br />
e da produtividade. O alto grau de centralização<br />
acaba por resultar em um número<br />
reduzido de empresas em determinado setor<br />
de produção, acirrando a concorrência<br />
e tornando mais vantajoso o caminho da<br />
combinação entre as empresas, ou seja, do<br />
surgimento <strong>dos</strong> cartéis, trustes e fusões.<br />
Esse perigo ao sistema capitalista,<br />
que é o sistema da economia mundial, foi
observado por Gunter Keseberg (2000), sócio<br />
diretor da filial brasileira da consultoria<br />
alemã Roland Berger. Ele afirma que, além<br />
do controle do mercado, a concentração<br />
das empresas tende a colocar em xeque o<br />
próprio sistema econômico mundial.<br />
É importante mencionar que,<br />
num primeiro momento, as fusões ocorreram<br />
em países desenvolvi<strong>dos</strong>, onde se<br />
concentram as principais empresas e o<br />
maior mercado consumidor mundial, para<br />
depois passarem a ocorrer também nos<br />
países em desenvolvimento. Essa forma<br />
de aumentar a participação em outros<br />
merca<strong>dos</strong> pode, com o tempo, diminuir o<br />
número de empresas em setores específicos<br />
da economia.<br />
Um <strong>dos</strong> grandes problemas dessas<br />
fusões de empresas internacionais é que a<br />
transferência de controle de uma empresa<br />
não significa necessariamente aumento de<br />
capacidade produtiva.<br />
Em muitos casos, a nova controladora<br />
é uma empresa dominante do mercado<br />
mundial e, desse modo, sua presença no<br />
mercado local pode significar uma competição<br />
desnivelada.<br />
Como foi dito anteriormente, embora<br />
a definição de aliança estratégica não<br />
seja uniforme, podemos dizer que se trata<br />
de um acordo, por meio do qual duas ou<br />
mais empresas ou organizações passam a<br />
trabalhar juntas, formal ou informalmente,<br />
combinando seus recursos e técnicas, de<br />
forma a obter ganhos de inovação, produtividade<br />
e eficiência, visando a conquista<br />
de novos nichos de mercado.<br />
Estes acor<strong>dos</strong> de cooperação parcial<br />
que as empresas podem formar para<br />
melhorar seu desempenho em merca<strong>dos</strong><br />
internacionais representam a forma mais<br />
prudente de internacionalização.<br />
Sem montar uma nova empresa, as<br />
partes concordam em colaborar em produtos<br />
específicos e em merca<strong>dos</strong> para mútuos<br />
benefícios. Como os riscos são limita<strong>dos</strong> ao<br />
projeto em questão, esta é uma maneira segura<br />
para aprender uns com os outros.<br />
Segundo, HITT, IRELAND e<br />
HOSKISSON (2002), as alianças estratégicas<br />
são parcerias entre empresas, em que seus<br />
recursos, capacidades e competências essenciais<br />
são combina<strong>dos</strong> para perseguirem<br />
interesses mútuos ao projetar, manufaturar<br />
e distribuir bens ou serviços. Elas são formas<br />
explícitas de relações entre empresas<br />
Gestão & Regionalidade - N o 13 - 2 o Semestre 2005<br />
e podem surgir de três diferentes formas:<br />
joint ventures, aliança estratégica acionária<br />
e aliança sem participação acionária.<br />
Na aliança estratégica acionária,<br />
os sócios possuem diferentes porcentagens<br />
de capital social, num novo empreendimento.<br />
As alianças estratégicas acionárias<br />
são consideradas mais eficientes para<br />
transferir know-how entre as empresas,<br />
porque estão mais próximas do controle<br />
hierárquico do que as alianças sem participação<br />
acionária.<br />
As alianças sem participação acionária<br />
são formadas por meio de acor<strong>dos</strong><br />
contratuais realiza<strong>dos</strong> para que uma empresa<br />
forneça, produza ou distribua os bens<br />
e serviços de uma outra empresa, sem haver<br />
compartilhamento do capital social. Uma<br />
vez que não envolvem a formação de uma<br />
empresa separada ou de investimentos no<br />
capital social, as alianças estratégicas sem<br />
participação acionária são menos formais e<br />
exigem menos compromissos da parte <strong>dos</strong><br />
sócios do que os outros tipos de alianças<br />
estratégicas. Os atributos das alianças sem<br />
participação acionária as tornam inadequadas<br />
para projetos complexos, em que<br />
o sucesso deve ser influenciado pela transferência<br />
eficiente de conhecimento tácito<br />
entre os sócios.<br />
A joint venture é uma aliança estratégica<br />
na qual duas ou mais empresas<br />
criam uma empresa independente combinando<br />
partes de seus ativos. As joint ventures<br />
são eficientes para estabelecer relações<br />
de longo prazo e transferir conhecimento<br />
tácito, uma importante fonte de vantagem<br />
competitiva. As joint ventures mais comuns<br />
são as em que as empresas possuem uma<br />
porcentagem igual das ações.<br />
É importante que consideremos os<br />
pontos fortes e fracos desses diferentes graus<br />
e tipos de parcerias em desenvolver alianças<br />
estratégicas apropriadas, e que reconheçamos<br />
que em redes de realidade pode haver<br />
uma mistura de estilos de parceria.<br />
Aliança estratégica é uma força<br />
competitiva principal, a qual em alguns<br />
setores como linhas aéreas, computação e<br />
telecomunicações estão substituindo competição<br />
convencional entre companhias<br />
individuais, Entretanto, os casos e estu<strong>dos</strong><br />
disponíveis para informação sugerem que<br />
enquanto os ganhos potenciais podem ser<br />
altos, alianças e redes estratégicas carregam<br />
riscos enormes.<br />
7
É importante ressaltar que, ao<br />
considerarem a estratégia de aliança, gerentes<br />
deveriam concentrar-se na questão<br />
das competências essenciais trazidas para<br />
a aliança por cada parceiro, nos benefícios<br />
e vulnerabilidades associa<strong>dos</strong> a foco<br />
e terceirização, e nas capacidades que a<br />
empresa tem de gerenciar sua estratégia<br />
em um ambiente organizacional diferente.<br />
Essas capacidades gerenciais devem contemplar<br />
as questões que incluem: entender<br />
os motivadores fundamentais favorecendo<br />
estratégias colaboradoras; a escolha de<br />
parceiros; os facilitadores e componentes<br />
importantes para a colaboração efetiva; a<br />
habilidade para definir e avaliar efetividade<br />
de rede em atingir metas de marketing;<br />
e a capacidade de uma rede oferecer uma<br />
vantagem ao cliente, na qual a estratégia<br />
da empresa é baseada.<br />
Alianças estratégicas, fusões, aquisições<br />
e redes estratégicas não são soluções<br />
para to<strong>dos</strong> os problemas estratégicos, mas<br />
trazem um desenvolvimento importante<br />
com muitos benefícios potenciais. Porém,<br />
eles também trazem muitos riscos estratégicos<br />
e vulnerabilidades e exigem novas<br />
habilidades gerenciais.<br />
Considerando os casos das alianças,<br />
fusões e aquisições de empresas, podese<br />
perceber que a cultura organizacional<br />
resultante nem sempre tem uma identidade<br />
clara. Isto acontece porque as organizações<br />
que passam por esses processos são<br />
multiculturais e a união entre elas pode gerar<br />
uma perda de identidade de ambas as<br />
empresas e uma dificuldade para construir<br />
a nova cultura.<br />
Cerca de 50% <strong>dos</strong> processos de<br />
fusões e aquisições não originam empresas<br />
eficientes por causa das diversidades culturais<br />
e a da dificuldade de se unir empresas<br />
de culturas diferentes, como será exposto<br />
no próximo tópico.<br />
Com o passar do tempo, as interações<br />
entre as pessoas que pertencem à<br />
organização e também as relações que são<br />
mantidas entre a organização e o ambiente<br />
externo com fornecedores, distribuidores,<br />
clientes causam impactos na cultura<br />
essencial da organização.<br />
4.1 JOINT VENTURES<br />
É uma sociedade entre duas empresas,<br />
de nacionalidades diferentes, fre-<br />
qüentemente estabelecendo uma nova<br />
entidade jurídica autônoma separada das<br />
duas anteriores que continuam a operar em<br />
seus respectivos países. Neste caso, ocorre a<br />
criação de uma nova empresa, com vida jurídica<br />
própria.<br />
Uma joint venture pode ser totalmente<br />
montada a partir do nada em um<br />
país, ou ainda pode ser baseada em ativos<br />
que uma das empresas porventura tenha<br />
em um dado país. Neste caso, ocorre também<br />
uma transferência de cultura de uma<br />
das empresas que participam da joint venture<br />
para a nova empresa.<br />
As joint ventures apresentam riscos<br />
culturais menores do que os das fusões<br />
e aquisições internacionais, pois as empresas<br />
decidem, através de acor<strong>dos</strong>, com que<br />
ativos elas desejam ingressar para a formação<br />
da nova empresa.<br />
A literatura tem constatado que<br />
as joint ventures administradas por uma<br />
das partes têm mais chances de sucesso que<br />
aquelas que repartem a administração.<br />
Algumas vantagens da joint venture<br />
são:<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
Alta capacidade de superar barreiras<br />
de entrada;<br />
Baixo risco político e econômico;<br />
Alta capacidade de adaptação ao<br />
mercado local;<br />
Baixo conhecimento do mercado externo<br />
requerido;<br />
Alto conhecimento do mercado estrangeiro<br />
ganho;<br />
Alto grau de controle das atividades<br />
de marketing;<br />
Alto potencial absoluto de vendas.<br />
Como desvantagens, podemos citar:<br />
·<br />
• Alto nível de investimento de recursos<br />
financeiros e de pessoal requerido;<br />
•<br />
Alto potencial para criar competidores.<br />
5. as eMPresas LG, PhILIPs e LG.PhILIPs<br />
DIsPLaYs<br />
As três empresas apresentam diferenças<br />
marcantes, com relação às estratégias<br />
de mercado adotadas, desenvolvimento<br />
tecnológico, processos, estruturas<br />
e pessoas. As posturas adotadas frente aos<br />
clientes externos, como fornecedores, parceiros<br />
e clientes finais, e internos, como os<br />
ARTIGO
funcionários, diretores e acionistas, e também<br />
frente aos principais concorrentes e às<br />
mudanças conjeturais, impactaram diretamente<br />
na cultura das organizações.<br />
A cultura oriental influenciou a<br />
cultura da empresa LG, que apesar de ser<br />
muito conservadora e hierárquica, é orientada<br />
ao desenvolvimento tecnológico e a<br />
processos, enquanto a cultura ocidental<br />
influenciou a Philips, que é orientada ao<br />
mercado e ao relacionamento com os clientes.<br />
A LG.Philips Displays é muito recente,<br />
mas mostra uma tendência de integração<br />
das duas culturas.<br />
Neste sentido, é muito importante<br />
entender como as empresas que formaram<br />
a joint venture nasceram e se desenvolveram<br />
no cenário mundial. Além disso,<br />
serão descritos os principais merca<strong>dos</strong> de<br />
atuação e os produtos e serviços comercializa<strong>dos</strong><br />
pelas empresas em estudo.<br />
5.1 LG<br />
A holding LG Corp. foi consolidada<br />
em primeiro de março de 2003 e é formada<br />
por 49 empresas, divididas em quatro<br />
segmentos de negócios. Estas empresas<br />
trabalham com a identidade da marca LG e<br />
também com a mesma filosofia.<br />
As diferentes organizações têm o<br />
mesmo objetivo, de serem as melhores em<br />
seus segmentos. A seguir, são relacionadas<br />
todas as empresas que fazem parte da<br />
LG Corp. e estão divididas por segmento<br />
de atuação:<br />
a) Química e Energia<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
LG Chem Ltd.<br />
LG Household & Health Care Ltd.<br />
LG Life Sciences Ltd.<br />
LG Petrochemical Co., Ltd.<br />
LG Siltron Inc.<br />
LG MMA Corp.<br />
LG-Dow Polycarbonate Ltd.<br />
LG-Caltex Oil Corp.<br />
LG-Caltex Gas Co., Ltd.<br />
KukDong City Gas Co., Ltd.<br />
Gestão & Regionalidade - N o 13 - 2 o Semestre 2005<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
LG Energy Co., Ltd.<br />
LG Power Co., Ltd.<br />
Seorabul City Gas Co., Ltd.<br />
Haeyang City Gas Co., Ltd.<br />
Clean Energy Technologies, Inc.<br />
b) Eletrônica e Telecomunicações<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
LG Electronics<br />
Hiplaza<br />
LG N-Sys<br />
LG Philips LCD<br />
LGIBM PC<br />
LG Innotek<br />
LG Micron<br />
LG TeleCom<br />
DACOM<br />
Powercomm Corporation<br />
Dacom IN<br />
DacomMultimedia Internet<br />
DACOM Crossing<br />
Korea Internet Data Center<br />
Customer Interaction Center Korea<br />
Inc<br />
LG CNS<br />
LG Industrial Systems<br />
LG Cable<br />
LG-Nikko Copper<br />
c) Financeira<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
d) Serviços<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
LG Investment & Securities Co., Ltd.<br />
LG Investment trust Management<br />
Co., Ltd.<br />
LG Futures Co., Ltd.<br />
LG Card Co., Ltd.<br />
Bumin Mutual Savings Bank<br />
LG International Corp.<br />
LG Engineering & Construction Corp.<br />
Hanmoo Development /<br />
InterContinental Hotels Seoul<br />
LG Mart Co., Ltd.<br />
LG MRO Co., Ltd.<br />
Konjiam Leisure Co., Ltd.<br />
LG Home Shopping Inc.<br />
LG Sports Ltd.<br />
LG Economic Research Institute<br />
LG Academy<br />
9
américas África<br />
europa e rússia<br />
40 ARTIGO<br />
Oriente Médio Ásia<br />
EUA África do Sul Alemanha Arábia Saudita Austrália<br />
Argentina Costa do Marfim Áustria Irã Cazaquistão<br />
Brasil Tunísia Espanha Israel China<br />
Chile França Jordânia Coréia<br />
Colômbia Grécia Emira<strong>dos</strong> Árabes Filipinas<br />
México Holanda Guam (EUA)<br />
Panamá Hungria Hong Kong<br />
Peru Inglaterra Índia<br />
Display<br />
Digital<br />
Plasma<br />
Projetor<br />
LCD<br />
TV de<br />
Projeção<br />
TV LCD<br />
As 49 empresas estão distribuídas em diferentes países, conforme mostrado a seguir:<br />
No Brasil, desde 1997, a LG Electronics<br />
possui dois complexos industriais,<br />
localiza<strong>dos</strong> em Manaus (AM) e Taubaté<br />
(SP), que produzem diversos modelos de<br />
eletroeletrônicos, como TVs convencionais,<br />
de plasma, LCD e de projeção, videocassetes,<br />
condicionadores de ar, aparelhos de<br />
DVD, monitores e telefones celulares. A<br />
Áudio Televisores<br />
Mini<br />
System<br />
TaBeLa: LG nO MUnDO<br />
Cinemaster DVD<br />
Flatron<br />
Itália Indonésia<br />
Polônia Japão<br />
Portugal Malásia<br />
Romênia Paquistão<br />
Rússia Cingapura<br />
Suécia Sri Lanka<br />
Turquia Tailândia<br />
Ucrânia Taiwan<br />
TaBeLa: MerCaDO LG<br />
Vídeo/<br />
DVD<br />
Vídeo-<br />
cassete<br />
eletro-<br />
domésticos<br />
Ar-condicionado<br />
Informática<br />
Vietnã<br />
subsidiária brasileira faturou R$ 1,2 bilhão<br />
em 2002.<br />
A unidade de negócios Digital Display<br />
and Media (DDM) oferece produtos com<br />
tecnologia digital de ponta, como TV digital,<br />
incluindo plasma e LCD, além de produtos digitalmente<br />
integra<strong>dos</strong>. Os produtos comercializa<strong>dos</strong><br />
pela LG Electronics no Brasil são:<br />
Telecomunicações<br />
Monitores Celulares<br />
Dispositivos<br />
Ópticos
5.2 PHILIPS<br />
Fundada por Gerard Philips, no dia<br />
15 de maio de 1891, na cidade holandesa<br />
de Eindhoven, a Philips cresceu rapidamente<br />
com o passar <strong>dos</strong> anos, passando de uma<br />
empresa familiar a um <strong>dos</strong> mais poderosos<br />
grupos multinacionais do mundo. Também<br />
no Brasil, onde chegou em 1924, a Philips<br />
viveu um momento de grande crescimento,<br />
a partir da década de 1950.<br />
O faturamento anual da Philips no<br />
Brasil gira em torno de US$ 1,5 bilhão, sendo<br />
que as exportações superam anualmente<br />
a casa de US$ 200 milhões. Na região da<br />
América Latina, que reúne 18 países sob o<br />
comando da Philips brasileira, o movimento<br />
das vendas supera os US$ 3 bilhões. As<br />
Divisões de Produtos da Philips são:<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
Consumer Electronics (produtos de<br />
áudio, vídeo e monitores para informática),<br />
Components (componentes<br />
para a indústria eletroeletrônica, de<br />
informática e de telecomunicações);<br />
DAP - Domestic Appliances and Personal<br />
Care (eletrodomésticos marca<br />
Walita e produtos para cuida<strong>dos</strong> pessoais);<br />
Lighting (produtos para iluminação);<br />
Business Electronics (centrais digitais<br />
de PABX, monitores para informática,<br />
equipamentos profissionais para<br />
broadcast e miniantenas/decodificadores)<br />
e Atividades <strong>Prof</strong>issionais<br />
(equipamentos médico-hospitalares/<br />
teste e medição).<br />
As metas da organização de manter<br />
as posições de liderança com rentabilidade<br />
e competitividade, continuam sendo<br />
perseguidas.<br />
Por não existirem no cenário econômico<br />
local indicações de que condições<br />
estruturais, queda nos juros e substancial<br />
aumento na oferta de crédito ao consumidor<br />
possam vir a impactar no mercado de<br />
eletroeletrônicos, as projeções de crescimento<br />
da organização são comparadas ao<br />
crescimento do PIB do país.<br />
Isso significa que as melhores e<br />
maiores possibilidades de aumentar as vendas<br />
estão nas exportações. Praticamente<br />
todas as Divisões de Produtos têm planos<br />
consistentes nessa direção. O plano de ne-<br />
Gestão & Regionalidade - N o 13 - 2 o Semestre 2005<br />
gócio da organização é dobrar as exportações<br />
até o final do ano de 2003, relativo ao<br />
exercício do ano de 2002.<br />
Na América Latina, a posição de<br />
liderança de mercado está fortemente<br />
consolidada no Mercosul (Argentina, Paraguai<br />
e Uruguai), sendo que conseguiram<br />
se posicionar entre as empresas que<br />
disputam o primeiro lugar em to<strong>dos</strong> os<br />
demais países.<br />
Os custos de produção e gestão<br />
das fábricas brasileiras atingiram níveis<br />
mundiais de competitividade e deverão<br />
representar forte impulso para a busca<br />
<strong>dos</strong> objetivos e metas empresariais.<br />
A Royal Philips Eletronics é uma<br />
empresas do grupo Philips que atua na<br />
divisão de produto Consumer Electronics<br />
e Components.<br />
5.3 LG.PHILIPS DISPLAYS<br />
Em julho de 2001 as empresas LG<br />
Electronics e Royal Philips Electronics se<br />
juntaram a fim de realizar a joint venture<br />
com o objetivo de serem a líderes mundiais<br />
em tecnologia e fabricação de cinescópios<br />
para televisores e monitores. A aliança deu<br />
origem a LG.Philips Displays.<br />
A joint venture consolidou a liderança<br />
do mercado, resultado da sinergia<br />
em inovação, produção e exploração<br />
de diferentes áreas geográficas. A união<br />
entre as duas empresas gerou resulta<strong>dos</strong><br />
positivos no desenvolvimento <strong>dos</strong> tubos e<br />
na comercialização <strong>dos</strong> produtos para os<br />
clientes mundiais.<br />
A LG.Philips Displays no Brasil tem<br />
quatro filiais, sendo:<br />
·<br />
•<br />
•<br />
•<br />
Duas em São Paulo: Mauá e São José<br />
<strong>dos</strong> Campos;<br />
Uma em Pernambuco: Recife;<br />
Uma no Amazonas: Manaus.<br />
Conta também com a parceria<br />
com a empresa Corning do Brasil Ltda., que<br />
está situada em Suzano, São Paulo.<br />
A principal fábrica é a de São José<br />
<strong>dos</strong> Campos, onde são fabrica<strong>dos</strong> e monta<strong>dos</strong><br />
os cinescópios para televisores 14” e<br />
20”, e daí vendi<strong>dos</strong> para as principais montadoras<br />
de TV no mundo.<br />
A fábrica da Corning Brasil, em<br />
Suzano, tem sua capacidade de produção<br />
100% voltada para atender às necessidades<br />
41
da fábrica de Capuava, Mauá. Esta fábrica<br />
produz cones em vidro para telas de TVs<br />
nos tamanhos, 14”, 20”, 21” e 29”.<br />
Na fábrica de Capuava, são fabricadas<br />
telas para TVs de 14” e 20” e controlada<br />
toda a produção da Corning do Brasil.<br />
A organização LG.Philips Displays<br />
passou a representar os produtos que eram<br />
fabrica<strong>dos</strong> pelas duas empresas que participaram<br />
da joint venture.<br />
A Philips participou com o fornecimento<br />
da tecnologia <strong>dos</strong> tubos de televisores<br />
e a LG participou com o fornecimento da<br />
tecnologia <strong>dos</strong> tubos de displays colori<strong>dos</strong>.<br />
A nova organização se beneficia<br />
das vantagens das tecnologias, industriais<br />
e experiência da Philips e também da LG.<br />
A sinergia das duas organizações<br />
trouxe resulta<strong>dos</strong> para a gestão da produção<br />
e distribuição <strong>dos</strong> seus produtos, tornando<br />
a nova empresa mais rápida e próxima<br />
<strong>dos</strong> seus fornecedores e clientes.<br />
A inovação gerada pelas duas organizações<br />
tornou possível a integração de<br />
novos produtos e melhorias no processo. O<br />
aproveitamento <strong>dos</strong> diferentes produtos<br />
das duas organizações tornou a empresa<br />
mais competitiva no mercado mundial.<br />
Outro benefício foi a aproximação<br />
física <strong>dos</strong> fornecedores e clientes. Esta<br />
proximidade gerou benefícios no entendimento<br />
das necessidades <strong>dos</strong> clientes e<br />
proporcionou o desenvolvimento de novos<br />
produtos com a ajuda <strong>dos</strong> fornecedores.<br />
A LG.Philips Displays é líder no<br />
mercado de CRT (Cathode ray tube). A indústria<br />
de tubos é ativa em todo o mundo<br />
e diferentes modelos de produto são cria<strong>dos</strong>.<br />
Novas tecnologias, como o plasma e<br />
telas de alta definição, são desenvolvidas.<br />
Os tubos da LG.Philips são finos e<br />
com alta definição de imagem. Com estas<br />
classificações o CRT se torna bastante competitivo,<br />
além de contribuir para as novas<br />
tecnologias de displays.<br />
A joint venture possibilita, desta<br />
forma, a exploração de novos merca<strong>dos</strong> e<br />
também tecnologias.<br />
A LG.Philips Displays atua no mercado<br />
hoje com duas linhas de produtos:<br />
•<br />
•<br />
Tubos de imagens coloridas para televisores;<br />
Tubos de display colori<strong>dos</strong> para monitores<br />
de computadores.<br />
Estas linhas de produtos possibili-<br />
42 ARTIGO<br />
tam a produção de diversos modelos de televisores.<br />
Os mais comuns e conheci<strong>dos</strong> são:<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
Monitores;<br />
Flatron;<br />
Tela plana;<br />
Telas curvadas até 32”.<br />
Os dois maiores clientes da<br />
LG.Philips Displays são as empresas que a<br />
originaram. A organização tem o objetivo<br />
de suprir as demandas da Philips e da LG<br />
Electronics. A capacidade restante de produção<br />
é direcionada para clientes, como<br />
Sharp, Sanyo, JVC, AOC, CEBQ, NMV e<br />
outras, que consomem uma porcentagem<br />
bastante pequena da produção total.<br />
6. LG.PhILIPs DIsPLaYs: FaTOres e resUL-<br />
TaDOs<br />
Incertezas e inseguranças estão<br />
associadas à quase todas as fusões e aquisições.<br />
No caso da joint venture LG.Philips<br />
Displays não foi diferente.<br />
A proposta de união entre as duas<br />
empresas partiu da Philips, mas a LG já estava<br />
estudando a possibilidade da aliança há alguns<br />
anos. Desta forma, o acordo para a formação<br />
da joint venture foi construído com a<br />
aprovação <strong>dos</strong> principais membros das duas<br />
organizações. No entanto, as percepções e<br />
reações <strong>dos</strong> funcionários das duas empresas<br />
foram de apreensão e insegurança.<br />
Em um primeiro momento, os funcionários<br />
ficaram receosos quanto à possibilidade<br />
de demissões. Para contornar a situação,<br />
as direções das duas empresas formalizaram<br />
uma carta-compromisso, afirmando que não<br />
haveria demissões. O objetivo era a manutenção<br />
<strong>dos</strong> principais funcionários da organização<br />
e também possibilitar a transição sem<br />
que o resultado financeiro fosse prejudicado<br />
pelo ambiente confuso e incerto.<br />
A insegurança quanto às condições<br />
de trabalho era percebida pelos membros<br />
das duas organizações. As conseqüentes<br />
restrições à formação da joint venture<br />
foram expressas de diferentes formas pelos<br />
funcionários de cada uma das empresas. As<br />
restrições se relacionavam, principalmente,<br />
aos fatores culturais, como língua, valores,<br />
crenças, estilos de gestão e a dificuldade<br />
de conversão <strong>dos</strong> valores monetários de<br />
padrões ocidentais para padrões orientais<br />
e vice-versa.
Às restrições culturais das duas<br />
partes participantes do processo somavam-se<br />
outros fatores, que são inerentes<br />
a qualquer mudança. Dentre os fatores<br />
mais comuns pode-se citar agendas pessoais,<br />
manutenção de poder, conflitos<br />
internos já existentes, dificuldade de posicionamento<br />
pró-ativo frente à mudança<br />
e dificuldade de sair da zona de conforto,<br />
entre outros.<br />
A direção das empresas LG e Philips,<br />
com a intenção de conseguir uma adesão<br />
maior ao processo, montou comitês de<br />
trabalhos para promover o entendimento<br />
<strong>dos</strong> objetivos da joint venture pelos membros<br />
das duas organizações.<br />
Os comitês são grupos de pessoas<br />
selecionadas, em geral formadoras de<br />
opinião, e que se reúnem com o objeti-<br />
A conclusão da joint venture<br />
orientou-se pela premissa estabelecida<br />
pelas duas partes de dividir a participação<br />
societária igualmente, em 50%. A nova<br />
empresa LG.Philips Displays representaria a<br />
somatória integral das duas organizações.<br />
É importante lembrar que a joint venture<br />
é específica para as fábricas de displays,<br />
não são consideradas as outras atividades<br />
e produtos de cada uma das empresas LG e<br />
Philips, que continuam a atuar nos outros<br />
merca<strong>dos</strong> como concorrentes.<br />
Os objetivos principais das duas<br />
organizações eram:<br />
·<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
Redução de custos de produção;<br />
Redução de custos de distribuição;<br />
Melhorar o aproveitamento <strong>dos</strong> recursos<br />
disponíveis;<br />
Integrar competências: tecnológica e<br />
de processos (LG) com visão de mercado<br />
(Philips);<br />
Integrar merca<strong>dos</strong>: europeu e asiáti-<br />
Gestão & Regionalidade - N o 13 - 2 o Semestre 2005<br />
TaBeLa: aTIVOs<br />
vo de discutir um assunto determinado e<br />
desenvolver sugestões que possam contribuir<br />
para a satisfação <strong>dos</strong> clientes internos<br />
e externos.<br />
Os resulta<strong>dos</strong> espera<strong>dos</strong> com a<br />
formação <strong>dos</strong> comitês deram certo e conseqüentemente<br />
algumas barreiras à mudança<br />
foram quebradas.Outras discussões<br />
que antecederam o acordo foram como<br />
seria a participação societária e como cada<br />
organização poderia contribuir para a melhoria<br />
do todo.<br />
Diversos estu<strong>dos</strong> contábeis foram<br />
desenvolvi<strong>dos</strong> em um período de dois anos<br />
para auditar o valor de cada uma das empresas.<br />
A necessidade era verificar como seria a<br />
participação societária da nova organização.<br />
Os ativos imobiliza<strong>dos</strong> e também implícitos<br />
das duas empresas diferiam bastante:<br />
PhILIPs LG<br />
FUnCIOnÁrIOs 25 mil 20 mil<br />
MerCaDO Américas e Europeu Asiático e Europeu<br />
VIsÃO Mercado/Vendas Produção/Qualidade<br />
•<br />
•<br />
co (LG) com o das Américas e europeu<br />
(Philips);<br />
Aumentar a capacidade de inovação<br />
e desenvolvimento de produtos;<br />
Formar uma empresa fornecedora de<br />
displays para qualquer empresa.<br />
A aliança entre as duas empresas<br />
resultou em mudanças significativas nos<br />
processos, estrutura, tecnologia, pessoas e<br />
estratégia de gestão.<br />
Os processos gerenciais pratica<strong>dos</strong><br />
pelas duas organizações sofreram diversas<br />
adaptações com o objetivo de aproveitar o<br />
melhor de cada um <strong>dos</strong> processos específicos.<br />
Os processos de vendas, distribuição<br />
e serviços ao cliente da Philips eram mais<br />
efetivos, enquanto os processos de fabricação<br />
e gestão empresarial internos eram mais<br />
fortes na LG. Em conseqüência da união, os<br />
custos da não qualidade da produção, venda<br />
e relacionamento com os clientes foram<br />
reduzi<strong>dos</strong> significativamente.<br />
4
A LG.Philips Displays seguiu o<br />
exemplo de diversas organizações que se<br />
unificaram para aproveitar os fatores de<br />
produção de maneira mais eficiente, além<br />
de otimizarem os canais de distribuição.<br />
A direção da nova empresa adotou<br />
as práticas de controle da qualidade da<br />
LG e treinou os funcionários para as novas<br />
políticas e procedimentos. Como exemplo<br />
<strong>dos</strong> novos processos pode-se citar a adoção<br />
da filosofia do 6 Sigma, que tem como objetivo<br />
principal a supressão do retrabalho.<br />
A otimização da utilização <strong>dos</strong> fatores<br />
de produção e também da distribuição<br />
<strong>dos</strong> produtos para os clientes finais LG, Philips<br />
e outras empresas, possibilitaram:<br />
·<br />
•<br />
•<br />
Redução do período de tempo de<br />
produção;<br />
Diminuição <strong>dos</strong> estoques de produtos<br />
semi-acaba<strong>dos</strong> e acaba<strong>dos</strong>;<br />
TaBeLa: CULTUra Da OrGanIZaÇÃO<br />
44 ARTIGO<br />
•<br />
•<br />
Redução do período de tempo de distribuição<br />
para as fábricas;<br />
Aumento na capacidade de desenvolvimento<br />
e inovação de produtos.<br />
Como resultado da melhoria <strong>dos</strong><br />
processos, que se tornaram mais ágeis e<br />
menos custosos, a organização aumentou<br />
sua competitiva no mercado mundial.<br />
O processo de reestruturação da<br />
organização talvez tenha sido o mais difícil<br />
e trabalhoso na formação da nova empresa.<br />
A empresa LG tem estrutura organizacional<br />
hierárquica, paternalista e<br />
formal, enquanto a Philips tem estrutura<br />
organizacional participativa, descentralizada,<br />
e informal. As estruturas das duas<br />
organizações são reflexos de suas culturas.<br />
O quadro abaixo mostra a cultura<br />
das duas organizações, que têm grandes<br />
referências de suas origens:<br />
PhILIPs LG<br />
OrIGeM Holandesa Coreana<br />
heMIsFÉrIO Ocidental Oriental<br />
reMUneraÇÃO Desempenho Tempo de casa<br />
POsTUra Inovadora/Aceita riscos Conservadora/Avessa a riscos<br />
PLanejaMenTO Curto prazo/Oportunidades Longo prazo<br />
FILOsOFIa Intuitiva/Ousada Analítica/Cautelosa<br />
esTrUTUra Participativa Autocrática<br />
A reestruturação foi desenvolvida<br />
em conjunto, através de diversas negociações<br />
para que os dois la<strong>dos</strong> pudessem se<br />
sentir satisfeitos. A insegurança era relacionada<br />
ao formato que a nova estrutura<br />
representaria, como seria o novo organograma<br />
e, principalmente, quem assumiria<br />
o comando da nova organização.<br />
Para responder a essas dúvidas, o<br />
comando da organização resolveu adotar<br />
um sistema de rotatividade periódica da<br />
liderança, que se daria de cinco em cinco<br />
anos. O comando do primeiro mandato ficou<br />
com a Philips e, após o período de cinco<br />
anos, será trocado por pessoas da LG. O<br />
objetivo principal é tornar a fase de transição<br />
menos traumática.<br />
Outra necessidade da reestruturação<br />
foi unificar o comando da organização,<br />
que antes era regional e passou a ser global.<br />
Desta forma, a estrutura da LG.Philips<br />
Displays compatibilizou-se com os novos<br />
processos, tecnologias, pessoas e estratégias<br />
organizacionais.<br />
A tecnologia adotada na LG.Philips<br />
Displays foi resultado do benchmarking interno,<br />
aproveitando a competência que os<br />
coreanos desenvolveram nos seus processos<br />
de gestão e tecnologias durante a história<br />
da companhia.
A aliança entre as duas empresas<br />
resultou em uma sinergia das competências<br />
de produção da empresa coreana com<br />
a visão de mercado da empresa holandesa.<br />
A otimização <strong>dos</strong> processos de gestão e a<br />
sinergia tecnológica entre as duas empresas<br />
possibilitaram o desenvolvimento de<br />
produtos já existentes e criação de novos<br />
produtos e soluções.<br />
Os novos produtos gera<strong>dos</strong> da<br />
união foram:<br />
·<br />
•<br />
•<br />
•<br />
•<br />
29 Real Flat Tinted;<br />
21 Real Flat Slim;<br />
34 Real Flat, entre outros.<br />
O processo de integração das pessoas<br />
continua em desenvolvimento. Para<br />
esse processo foi montado um time de pessoas<br />
que se chama Integration Team (time<br />
de integração), que tem como objetivo<br />
principal aproximar os funcionários e fazêlos<br />
trabalharem em grupo.<br />
A empresa promove diversas atividades<br />
de divulgação das culturas coreana<br />
e holandesa, diversificando o cardápio<br />
com comidas típicas, desenvolvendo festas<br />
folclóricas de cada país e disponibilizando<br />
cursos das línguas natais <strong>dos</strong> coreanos e<br />
<strong>dos</strong> holandeses.<br />
Além da divulgação das culturas <strong>dos</strong><br />
países de origem da LG e da Philips, são desenvolvidas<br />
atividades esportivas, como jogos<br />
e campeonatos, e também reuniões familiares<br />
para que to<strong>dos</strong> possam se conhecer melhor.<br />
A estratégia organizacional das<br />
duas empresas LG e Philips era de aproveitar<br />
as competências uns <strong>dos</strong> outros para<br />
construir uma nova empresa, que pudesse<br />
ser líder no mercado mundial e que<br />
gerasse redução de custos de produção e<br />
comercialização. Além disso, pretendiam<br />
explorar merca<strong>dos</strong> que suas marcas não<br />
tinham visibilidade.<br />
A intenção da LG era explorar o<br />
mercado europeu e das Américas, enquanto<br />
a Philips desejava entrar nos merca<strong>dos</strong><br />
asiático, africano e do Oriente Médio.<br />
A formação da joint venture terceirizava<br />
os custos de produção <strong>dos</strong> displays,<br />
mas mantinha o comando da organização.<br />
Desta forma, a LG.Philips poderia, além de<br />
comercializar seus produtos para a LG e<br />
para a Philips, explorar o segmento, vendendo<br />
produtos para outros fabricantes de<br />
televisores e de telas para computadores.<br />
Gestão & Regionalidade - N o 13 - 2 o Semestre 2005<br />
As metas de produção de cada<br />
planta são definidas em reuniões bimestrais.<br />
A definição das quantidades a serem produzidas<br />
por cada planta é acordada entre to<strong>dos</strong><br />
os líderes locais. Desta forma, as diferentes<br />
plantas têm se utilizado integralmente de<br />
seus potenciais de produção. As plantas da<br />
empresa têm trabalhado 24 horas por dia,<br />
sete dias por semana e 350 dias por ano.<br />
As reuniões semestrais de planejamento<br />
de produção definem também a<br />
exploração <strong>dos</strong> diferentes merca<strong>dos</strong>. Esse<br />
cuidado foi tomado para que as empresas de<br />
diferentes países não acabassem disputando /<br />
concorrendo com outras. A demanda de cada<br />
região é analisada para a tomada de decisão<br />
de como as diferentes plantas podem interagir<br />
e se integrar, para gerar o melhor resultado<br />
para a organização como um todo.<br />
Frente às novas estratégias, foram<br />
desenvolvidas discussões para a construção<br />
<strong>dos</strong> modelos de competências organizacionais<br />
que deveriam ser buscadas pelas pessoas.<br />
As competências definidas para o negócio<br />
da LG.Philips Displays foram: Inovação,<br />
Foco no cliente e Consciência de custo.<br />
A competência da inovação pode<br />
ser percebida na formação da visão da empresa<br />
que ficou definida como: “LOOK AT<br />
THE FUTURE”.<br />
Esta visão é praticada e traduzida,<br />
de acordo com a cultura local onde se localiza<br />
a fábrica da empresa. Como exemplo,<br />
pode-se citar a tradução brasileira e a mexicana,<br />
respectivamente:<br />
“FAZEMOS SEMPRE MELHOR” – Brasil.<br />
“HACEMOS NOSTRAS VIDAS MEJORES” -<br />
México.<br />
Para alinhar as pessoas às estratégias<br />
organizacionais foram estabelecidas as<br />
práticas de recompensas por resulta<strong>dos</strong> alcança<strong>dos</strong><br />
e também a educação continuada.<br />
A intenção <strong>dos</strong> investidores é expressa<br />
pela necessidade de redução de custos<br />
e a busca constante de margem de lucratividade.<br />
Qualquer mudança que diminua a<br />
margem de lucro é reprimida, mesmo que<br />
possa trazer resulta<strong>dos</strong> em longo prazo.<br />
7. COnCLUsÕes<br />
Os objetivos deste artigo foram<br />
identificar os fatores que levaram as empresas<br />
LG e Philips a formarem uma joint ven-<br />
45
ture e analisar os resulta<strong>dos</strong> obti<strong>dos</strong> desde<br />
a sua formação, fazendo a integração das<br />
duas, utilizando os referenciais conceituais.<br />
Como vimos anteriormente, no<br />
ambiente do século XXI, as empresas deparam-se<br />
com o desafio de desenvolver um<br />
nível ideal de globalização que gere concentrações<br />
adequadas das operações locais<br />
e globalizadas para a empresa.<br />
Este ambiente também é crescentemente<br />
caracterizado por: escassez de<br />
recursos, maiores expectativas <strong>dos</strong> clientes<br />
por serviços e qualidade, pressões de grandes<br />
distribuidores para alcançarem maiores<br />
ganhos de escala nos custos na cadeia de<br />
fornecedores, taxas muito rápidas de mudanças<br />
nos merca<strong>dos</strong> e tecnologias e merca<strong>dos</strong><br />
mais turbulentos e imprevisíveis.<br />
Uma das mais importantes respostas<br />
a essas condições competitivas de mercado<br />
tem surgido de colaboração e parceria<br />
com outras empresas, como um elemento do<br />
processo de direcionamento ao mercado.<br />
Analisando este ambiente, pudemos<br />
observar que as empresas LG Eletronics<br />
e Royal Philips Eletronics ilustram o<br />
caminho que a maioria das empresas estão<br />
seguindo, e encontraram uma maneira de<br />
se manterem competitivas e serem líderes<br />
mundiais em tecnologia e fabricação de cinescópios<br />
para televisores e monitores.<br />
As empresas constituíram uma<br />
joint venture que pode ser classificada<br />
como uma fusão (internacional parcial) ou<br />
uma aliança estratégica (joint venture internacional).<br />
Pode-se perceber com o estudo realizado<br />
destas duas organizações formadoras<br />
da joint venture LG.Philips Displays e na própria<br />
empresa que, embora tenham tido sucesso<br />
com a fusão (em 2002 foi considerada a<br />
líder mundial na fabricação de cinescópios),<br />
a situação atual exige bastante atenção com<br />
a gestão das diferenças culturais.<br />
Pudemos levantar os fatores<br />
que levaram à constituição da LG.Philips<br />
Displays que envolviam a estratégia de<br />
compartilhar competências tecnológica<br />
e de processos (LG) e visão de mercado<br />
(Philips), a fim de construir uma nova empresa<br />
que pudesse ser líder no mercado<br />
mundial. Além disso, pretendiam explorar<br />
merca<strong>dos</strong> que suas marcas individuais<br />
não tinham visibilidade, ou seja, a LG tinha<br />
a intenção de explorar os merca<strong>dos</strong><br />
europeu e das Américas; e a Philips, os<br />
46 ARTIGO<br />
merca<strong>dos</strong> asiático, africano e do Oriente<br />
Médio. Com a formação da joint venture,<br />
os custos de produção <strong>dos</strong> displays seriam<br />
terceiriza<strong>dos</strong>, mas o comando da organização<br />
seria mantido. Desta forma, a joint<br />
venture atenderia os outros objetivos que<br />
eram: redução de custos de produção e<br />
distribuição, melhor aproveitamento <strong>dos</strong><br />
recursos disponíveis, aumentar a capacidade<br />
de inovação e desenvolvimento de<br />
produtos e formar uma empresa fornecedora<br />
de displays para qualquer empresa.<br />
Conforme foi comentado anteriormente,<br />
grande parte das fusões e aquisições<br />
não trazem os resulta<strong>dos</strong> espera<strong>dos</strong><br />
e podem se tornar inviáveis, assim como<br />
vimos as vantagens e desvantagens das<br />
alianças estratégicas. O caso da joint venture<br />
estudado mostrou que as diferenças<br />
culturais entre as duas empresas, apesar<br />
de se somarem em muitos casos como nos<br />
benefícios trazi<strong>dos</strong> pela competência mercadológica<br />
da Philips e a produtiva da LG,<br />
são opostas e resultantes de particularidades<br />
de suas histórias.<br />
O estudo das histórias das duas<br />
empresas foi importante para traçar os perfis<br />
culturais de cada uma delas e também<br />
para entender como as diferenças poderiam<br />
influenciar na formação e gestão da nova<br />
organização. A empresa LG conserva traços<br />
culturais de sua história de desenvolvimento<br />
no ambiente social <strong>dos</strong> países orientais enquanto<br />
a Philips traz perfis culturais de seu<br />
desenvolvimento nos países ocidentais.<br />
As diferenças encontradas seriam<br />
suficientes para inviabilizar a formação da<br />
nova companhia, no entanto, os fatores e<br />
variáveis mercadológicos, como a globalização<br />
e crescente competitividade, fizeram<br />
com que as duas empresas assumissem os<br />
riscos <strong>dos</strong> possíveis choques culturais para<br />
a consolidação da união.<br />
Os corpos diretivos das duas empresas<br />
conseguiram trabalhar muito bem<br />
com as pessoas e promover a integração<br />
das diferentes culturas. Existe um longo<br />
caminho a ser percorrido para o desenvolvimento<br />
da identidade cultural esperada.<br />
No entanto, a nova organização<br />
conseguiu definir fatores importantes para<br />
atingir os resulta<strong>dos</strong>:<br />
•<br />
Objetivo claro: entende-se objetivo,<br />
neste caso, como o ponto a se chegar,<br />
em que tempo e com que recursos;
•<br />
•<br />
•<br />
Sistemas de avaliação e gerenciamento<br />
de indicadores;<br />
Análise de potenciais a serem trabalha<strong>dos</strong>;<br />
Alinhamento das pessoas às estratégias<br />
da organização.<br />
A fusão foi um sucesso, visto que<br />
em 2002 a LG.Philips Displays, com menos<br />
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Gestão & Regionalidade - N o 13 - 2 o Semestre 2005<br />
de um ano de existência, foi considerada a<br />
líder mundial na fabricação de cinescópios,<br />
tendo a participação de 27% do mercado<br />
mundial neste setor. Hoje, um em cada<br />
quatro televisores ou monitores para computador,<br />
tem componentes LG.Philips Displays.<br />
A LG.Philips Displays gera mundialmente<br />
30 mil empregos, distribuí<strong>dos</strong> em 27<br />
fábricas no mundo.<br />
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MUnICIPaLIZaÇÃO DO ensInO FUnDaMenTaL:<br />
DesaFIOs e PersPeCTIVas<br />
Seminário da Pós-Graduação 1<br />
Evento realizado em 17 de maio de<br />
2005, discutiu os desafios e as perspectivas<br />
da municipalização do ensino fundamental<br />
na Região do Grande ABC, tema voltado<br />
para professores e especialistas em Educação<br />
e Administração. Coordenado pelos professores<br />
Antonio Carlos Gil e <strong>Roberto</strong> <strong>Elísio</strong> <strong>dos</strong><br />
<strong>Santos</strong>, contou com a presença de Cleuza<br />
Rodrigues Retulho, secretária de Educação<br />
de Santo André, Admir Donizeti Ferro, secretário<br />
especial de Coordenação de Ações<br />
Voltadas à Comunidade de São Bernardo do<br />
Campo, Walter Figueira Júnior, diretor de<br />
Educação de São Caetano do Sul, Edgar Fernandes<br />
Neto, vice-presidente da APEOESP, e<br />
da professora Marília Claret Geraes Duran,<br />
da Universidade Metodista.<br />
PrOFa. MarÍLIa<br />
O Fundef traz um mecanismo indutor<br />
da descentralização da administração.<br />
Eu falo em municipalização de ensino entre<br />
aspas porque, na verdade, é uma municipalização<br />
induzida e não totalmente consentida.<br />
O que pode ter trazido alguns entraves<br />
no próprio processo de implantação do<br />
Fundef.<br />
A implantação do Fundef gerou<br />
impacto, em relação à educação infantil,<br />
especialmente no contexto e no processo<br />
municipalizante desencadeado em São<br />
Paulo. Tivemos algumas medidas bastante<br />
claras da parte do governo estadual, que<br />
organizou dois projetos logo no primeiro<br />
momento como governo do estado.<br />
A reorganização da rede estadual<br />
e o programa de parceria estado-município<br />
em 96 foi preparando o ambiente para<br />
a implantação do Fundef, mas a reorganização<br />
da rede estadual, foi um momento<br />
importantíssimo, no sentido de sinalizar<br />
já para uma descentralização para um<br />
descongestionamento da rede estadual e<br />
especialmente em alguns esta<strong>dos</strong> em que<br />
a rede estadual assumia quase que com-<br />
1 Transcrição elaborada pelos alunos de Iniciação Científica: Gláucia Balbachan, Cristina Salvatti<br />
Abel e Eduardo Veríssimo Chaves.<br />
Gestão & Regionalidade - N o 13 - 2 o Semestre 2005<br />
pletamente o ensino fundamental, como<br />
é o caso de São Paulo; tais esta<strong>dos</strong> tiveram<br />
que assumir determinadas medidas para<br />
que o Fundef se instalasse efetivamente.<br />
Eu trouxe aqui alguns da<strong>dos</strong> que,<br />
inicialmente, são da<strong>dos</strong> mais gerais de Brasil,<br />
para que a gente, depois, possa pensar<br />
em São Paulo.<br />
Para organizar essa tabela, eu tive<br />
que avaliar com o sead e o próprio centro<br />
escolar do Imep e, vejam, que se tomarmos<br />
aí do período de matrículas no ensino fundamental,<br />
pegando uma variação de 1996 até<br />
2000, vejam que há uma variação bastante<br />
pequena, 1%. O que isso quer dizer? Que aumentou<br />
o número de vagas? Não, apenas se<br />
transferiu de poder, da rede estadual para a<br />
municipal. O que vai ampliar aí são as matrículas<br />
da 5 a à 8 a séries, então, em relação ao total<br />
de matrículas a variação fica em 8%. Vou pegar<br />
um outro dado, da 1 a à 4 a séries, pegando<br />
agora as redes de ensino em termos de Brasil,<br />
então, vejam aí. A rede estadual vai ter uma<br />
variação a menos, o ensino fundamental especialmente<br />
as quatro séries iniciais, vai estar<br />
gradualmente colocada na rede municipal, já<br />
a federal praticamente zera, a municipal tem<br />
um incremento de 45%.<br />
Da 5 a à 8 a séries, o que nós vamos<br />
ver também é que o ensino municipal<br />
vai assumindo gradualmente, o que<br />
não é a ênfase do estado de São Paulo,<br />
até por conta da própria organização da<br />
rede pública. O que eu acho importante,<br />
porque aqui só falamos em da<strong>dos</strong> reais<br />
e nós vamos pegar alguns da<strong>dos</strong> de qualidade,<br />
a questão da duração de turnos,<br />
em termos de Brasil, porque nós temos<br />
que pensar também quando a gente fala<br />
numa política pública, não apenas regional,<br />
é colocar esta questão regional no<br />
contexto mais amplo da realidade brasileira<br />
e pelos da<strong>dos</strong> mais gerais, o que nós<br />
estamos observando aí, é que há um aumento<br />
na duração <strong>dos</strong> turnos de permanência<br />
<strong>dos</strong> alunos na escola; vejam que<br />
49
a duração de 4 a 5 horas, os turnos têm<br />
maior incremento. O que é uma medida<br />
positiva especialmente sendo considerado<br />
que estamos falando aqui, de Brasil.<br />
Outro dado importante para o<br />
Brasil do número de docentes da 1 a à 4 a<br />
séries em área não operal de escolaridade,<br />
o que no caso do estado de São Paulo é<br />
bastante alterado, considerando um perfil<br />
já bastante superior, em termos de formação<br />
para o Magistério. Em termos de Brasil,<br />
vejam que com o Fundef e a organização<br />
das verbas, nós tivemos aí, considerando<br />
os anos 2000 uma variação grande de professores<br />
que conseguem uma escolarização<br />
em nível superior.<br />
E outro dado importante do ponto<br />
de vista qualitativo, mas que nós temos<br />
que levantar algumas questões é o que<br />
diz respeito ao número de matrículas por<br />
faixa etária. No primeiro olhar nessa tabela,<br />
poderíamos dizer que nós temos uma<br />
matrícula mais ou menos regular, até 10<br />
anos, 62% passa para 65%, só que a gente<br />
não tem os da<strong>dos</strong> mais minuciosos para<br />
dizer se esse até 10 é igual à série em que<br />
estão estes alunos que efetivamente estão<br />
na 4 a série ou estão em séries anteriores,<br />
no que daria uma regulamentação da relação<br />
das séries e somarmos alunos de 11<br />
até 14 anos, nós vamos ter 31% de alunos<br />
de certa forma, acompanham um pouco<br />
na progressão em termos de escolaridade,<br />
entretanto eu posso questionar o que<br />
paralelamente à implantação da política<br />
do Fundef, também ocorre: outras medidas<br />
políticas e uma delas é a progressão<br />
continuada, será que podemos dizer que<br />
os alunos estão efetivamente em idade e<br />
série num nível ótimo ou houve um descongestionamento<br />
da rede, considerando<br />
a progressão continuada?<br />
Veja aí que trazendo a questão<br />
para as escolas estaduais, para o ensino<br />
fundamental no estado de São Paulo, nós<br />
temos uma variação que mostra que, na<br />
verdade, o Fundef mudou de lugar a verba,<br />
do estado para o município mais ou menos,<br />
mas não significou um encremento efetivo<br />
no sentido no número de matrículas oferecidas<br />
ao conjunto da população. São duas<br />
políticas, descongestionamento do sistema<br />
e do Fundef.<br />
Então vejam aqui no estado de<br />
São Paulo, as vagas municipais, como ela se<br />
amplia drasticamente por conta de ser São<br />
Paulo, um estado em que, historicamente<br />
o oferecimento do ensino fundamental,<br />
está a cargo do estado. Se pegarmos apenas<br />
este dado, nós vamos dizer que foi uma<br />
ótima medida e efetivamente, eu acho<br />
que no sentido da educação por ser uma<br />
educadora, eu entendo que a municipalização<br />
do ensino é benéfica para o aluno.<br />
Se olharmos aqui efetivamente as funções<br />
das prefeituras em relação ao ensino fundamental,<br />
é um ganho em termos de democratização<br />
de ensino.<br />
Mas a gente olha para a questão<br />
do ensino médio e ainda a educação infantil<br />
como um próximo slide, o que nós<br />
vamos ver é que as prefeituras que tradicionalmente<br />
se ocupavam com a educação<br />
infantil, são vagas que crescendo na medida<br />
em que vão sendo assumidas nos encargos<br />
relativos aos ensinos fundamentais. Então,<br />
vejam a variação em relação ao ensino<br />
médio: são vagas estaduais que tem uma<br />
variação de 35%, mas as vagas municipais<br />
remuneram, porque as prefeituras vão assumindo<br />
o ensino fundamental.<br />
E a educação infantil, veja aí que<br />
as vagas estaduais, que já não eram muitas,<br />
estão acabando e existe ainda alguma coisa<br />
muito pequena em algum espaço, as vagas<br />
municipais ainda estão bastante voltadas<br />
para a educação infantil, mesmo ainda que<br />
tenha havido uma diminuição no oferecimento<br />
e se nós olharmos a questão das creches,<br />
veremos uma alteração significativa<br />
no atendimento em relação às creches.<br />
Isso aí é um balanço real das vagas<br />
no ensino básico. Eu diria o seguinte, que a<br />
municipalização e as matrículas do ensino<br />
fundamental, nas escolas públicas paulistas<br />
com o Fundef é que houve uma municipalização<br />
induzida e através da oferta de vagas<br />
para o ensino médio, sofreu uma alteração<br />
para mais, mas não de forma significativa.<br />
E alteram-se os segmentos que<br />
atendem prioritariamente cada um <strong>dos</strong><br />
níveis de ensino. A oferta total das matrículas<br />
e educação básica no estado de<br />
São Paulo foi de 8% no período. Houve<br />
expressivo crescimento das matrículas do<br />
ensino fundamental regular municipal, o<br />
que não é vantagem porque, ao mesmo<br />
tempo, houve uma diminuição do número<br />
de matrículas que estava, você tem<br />
64% a partir de 1996, bastante acentuado<br />
em 1997.<br />
A educação infantil oferecida<br />
50 SEMINÁRIO ABERTO
preponderantemente pela dependência<br />
administrativa municipal teve seu ritmo<br />
de expansão sensivelmente reduzido<br />
em 1998.<br />
Eu entendo que algumas coisas a<br />
gente pode pensar para as nossas discussões:<br />
será que realmente diminuiu drasticamente<br />
as diferenças de custo-aluno entre<br />
governo estadual e municípios, onde há<br />
uma diferença entre o aluno do município<br />
e o aluno do estado? No que representou<br />
coisas significativas, de outro lado, o Fundef<br />
poderia ter contribuído para a transparência<br />
do financiamento e diminuir os<br />
desvios das verbas vinculadas.<br />
Nós sabemos que há várias denúncias,<br />
vários processos, denúncias especialmente<br />
em algumas prefeituras que no Brasil,<br />
como um todo, apresentam esse desvio.<br />
Assim, com esse panorama, eu quis<br />
trazer um pouco daquilo que vem sendo<br />
dito, vem sendo apresentado por inúmeros<br />
estu<strong>dos</strong> que custam a entender a implantação<br />
do Fundef em São Paulo e no Brasil.<br />
Não tenho visto da<strong>dos</strong> mais qualitativos<br />
sendo discuti<strong>dos</strong>, especialmente em relação<br />
<strong>dos</strong> vários princípios de São Paulo,<br />
porque eu entendo que um programa de<br />
pós-graduação aqui, e com essa ênfase,<br />
seria muito interessante, estu<strong>dos</strong> <strong>dos</strong> vários<br />
municípios, como cada município nos<br />
vários estu<strong>dos</strong> de caso, levantando mesmo<br />
os impactos da relação da implantação<br />
do Fundef em São Paulo e que apontem<br />
as preocupações que devemos ter quanto<br />
ao Fundef e com isso, nós já aprendemos<br />
bastante coisa, talvez tenhamos elementos<br />
para argumentar mais.<br />
Eu gostaria que a municipalização<br />
do ensino, embora induzida acontecesse<br />
como uma realidade, o que significa que<br />
é necessário mais verba para que a municipalização<br />
efetivamente aconteça. Então,<br />
a gente pode, com efetivas verbas para a<br />
educação, ter um melhor atendimento nas<br />
instâncias, a gente viabilizar uma política,<br />
que talvez possa contribuir para um ensino<br />
de melhor qualidade, mas próximo de to<strong>dos</strong><br />
e que todas as crianças tenham acesso<br />
efetivamente à educação básica, acho que<br />
é isso que nós temos.<br />
PrOF. VaLTer FIGUeIra<br />
O Fundef veio realmente para<br />
ficar e nós devemos nos adequar a uma<br />
Gestão & Regionalidade - N o 13 - 2 o Semestre 2005<br />
lei maior, entretanto, no nosso entender,<br />
nossa opinião, o Fundef revela a educação<br />
do Brasil e isso prejudicando um possível<br />
e um real projeto de municipalização de<br />
ensino no Brasil.<br />
É óbvio que o perfil da nossa cidade<br />
de São Caetano do Sul é diferenciado<br />
pela nossa posição, pelos limites geográficos,<br />
pela nossa vida socioeconômica, pela<br />
demanda escolar, pelo número, pela posição<br />
demográfica do nosso município, que<br />
perto <strong>dos</strong> nossos colegas, nossa querida colega<br />
aqui de Santo André, quando ela tem<br />
700 mil habitantes para tomar conta, nós<br />
estamos com 140 mil habitantes.<br />
Obviamente, isso deixa, aparentemente,<br />
São Caetano numa posição confortável.<br />
Entretanto, pela responsabilidade<br />
que nos cabe como educador nos faz discernir<br />
bem o que se trata de municipalização<br />
de ensino, o que de uma certa forma<br />
não colocamos em prática. Nós temos em<br />
rede estadual 21 escolas e, em termos municipais,<br />
temos três escolas, para o ano que<br />
vem, mais três, isso atendendo nossa suposta<br />
demanda e não aquela famosa história<br />
de criança na rua, criança simplesmente<br />
tem que migrar na união das escolas, principalmente<br />
nas estaduais.<br />
Nós gozamos de uma rede particular<br />
de ensino com aproximadamente 21<br />
unidades de altíssimo nível de aproveitamento,<br />
isso faz com que a nossa cidade,<br />
volto a repetir, aparentemente, se sinta<br />
acomodada, por outro lado, acaba acontecendo<br />
a exigência na qualidade de ensino<br />
tanto da ordem estadual quanto da<br />
ordem municipal e, principalmente, da ordem<br />
particular, da ordem privada. A municipal,<br />
nos cabe nesse momento explicar<br />
para vocês a nossa responsabilidade na<br />
busca dessa qualidade, fazendo estabelecer<br />
uma parceria com a escola estadual e<br />
não simplesmente nos preocupando com<br />
a municipalização propriamente dita da<br />
escola estadual. Não é de nosso interesse<br />
de ordem fiscal-contábil a manutenção<br />
dessas parcerias que temos com as escolas<br />
estaduais e através da área municipal em<br />
manter a qualidade que hoje, podemos<br />
nos dar ao luxo de estabelecer e entregar<br />
na nossa demanda escolar ao nosso alunário.<br />
Entregando através de um processo<br />
global de educação e eu digo por que<br />
foi revelado por baixo da nossa conversa,<br />
porque São Caetano já gozava desses per-<br />
51
fis geográficos, socioeconômico, em 1996,<br />
quando a gente dispunha de uma estrutura<br />
de ordem e investimento na educação,<br />
que foi de uma certa forma engessada<br />
pelo Fundef e obviamente nos dando um<br />
retorno para o governo federal na distribuição<br />
aos outros municípios mais carentes,<br />
esse é o conselho básico do Fundef<br />
e o retorno para nós, obviamente, numa<br />
taxa mais baixa de ordem financeira. Mas<br />
isso não eliminou a qualidade, continuamos<br />
a crescer pelo perfil da nossa cidade,<br />
como já dizemos, por toda essa colocação,<br />
nós fazemos uma única observação que<br />
é nossa grande preocupação, não bem<br />
uma adequação, mas a nossa preocupação<br />
pelo Fundef está por vir, porque para<br />
nós a nossa clientela agora próxima a nosso<br />
alvo, tudo está acomodado no ensino<br />
infantil e na educação fundamental, só<br />
que estamos bastante preocupa<strong>dos</strong> com<br />
o nível e o aproveitamento orçamentário<br />
dentro da lei.<br />
Obviamente no ensino médio porque<br />
o nosso jovem adolescente de ensino<br />
médio está bastante descoberto, então é<br />
bom que a gente reivindique, mas que a<br />
autoridades maiores, Congresso, Mec, to<strong>dos</strong><br />
aqueles que irão compor as análises<br />
necessárias para o Fundef.<br />
E prestem atenção no grande prejuízo<br />
que já existe no ensino médio e no<br />
alunário e vimos também isso bem próximo<br />
da nossa posição geográfica <strong>dos</strong> nossos<br />
limites geográficos da cidade, a gente<br />
percebe, conversando com as nossas diretoras<br />
das escolas estaduais e pela nossa<br />
única escola de ensino médio municipal,<br />
o nosso jovem adolescente está completamente<br />
desestruturado sobre sua perspectiva<br />
de vida futura, sobre uma preparação<br />
melhor de mercado de trabalho, para uma<br />
preparação melhor para sua própria cidadania<br />
de ensino, mas não necessariamente<br />
o mercado de trabalho, se alguém estiver<br />
nas escolas técnicas, que simplesmente foram<br />
desmontadas pelas suas respectivas<br />
responsabilidades, então a nossa preparação<br />
é em cima do ensino médio.<br />
Aqui em São Caetano do Sul, nossa<br />
demanda de ensino de educação é de<br />
100%, nós temos um programa de demanda<br />
de falta de adequação com passadas<br />
administrações públicas municipais, onde<br />
se atinge em relação às creches. Nós temos<br />
ainda 120 crianças fora do nosso foco e<br />
dentro de 15 ou 20 dias estaremos já dispondo<br />
dentro das creches, de uma estruturação<br />
administrativa compatível, dentro<br />
<strong>dos</strong> nossos espaços já adequa<strong>dos</strong>.<br />
No ensino fundamental, nossas<br />
três escolas dispõem já de todo embasamento,<br />
mas as três para o ano que vem,<br />
uma com prédio novo e as outras com<br />
prédios reforma<strong>dos</strong>. Nós atendemos toda<br />
a demanda de ensino fundamental de 1 a à<br />
8 a séries, a nossa preocupação vai garantir<br />
para o futuro que é atender a demanda do<br />
ensino médio e nós conseguimos apenas<br />
uma escola municipal e é a nossa responsabilidade<br />
e contando com a parceria das<br />
escolas da rede estadual e obviamente com<br />
a qualidade do atendimento do munícipe<br />
estudante das nossas escolas particulares<br />
que compõem o nosso município.<br />
O que nós poderíamos dizer e<br />
deixar a nossa colocação aos coordenadores<br />
do curso de pós-graduação, aos pósgraduan<strong>dos</strong><br />
é que dentro de São Caetano<br />
do Sul, existe uma preocupação muito<br />
maior com a qualidade, na aplicação nos<br />
investimentos e <strong>dos</strong> projetos, não que necessariamente<br />
isso seja uma lei, além de<br />
responsabilidade fiscal, não queremos a<br />
municipalização propriamente dita, o que<br />
nos interessa é a parceria com o estado,<br />
mesmo que a migração, pela estatística<br />
apresentada pela professora Marília, esteja<br />
mostrando que o município está absorvendo<br />
nossa tendência, isso é, manter<br />
a nossa parceria com o estado, até porque<br />
nos interessa o investimento nas escolas<br />
estaduais, como já tem sido feito pelas administrações<br />
passadas e permanece pela<br />
administração atual.<br />
Os investimentos, nos senti<strong>dos</strong><br />
laboratoriais, classes ambientais para melhorar<br />
as condições de atendimento dentro<br />
das escolas estaduais, infra-estrutura logística,<br />
porque no nosso entender, no fundo,<br />
o aluno é o nosso munícipe, seja no estado,<br />
seja no particular ou municipal.<br />
Em parceria, nós atingimos o melhor<br />
e a primeira essência do processo da<br />
educação, que é completar a qualidade,<br />
desenvolver e resgatar os valores de cidadania<br />
além de preparar o nosso jovem realmente<br />
para uma expectativa de vida, não só<br />
naquele grau de ansiedade, que vem após<br />
o ensino médio (três anos), se por ventura<br />
economicamente ele puder continuar, pelo<br />
menos no momento, o curso universitário<br />
52 SEMINÁRIO ABERTO
público. Como sabemos, não deixa de ser<br />
tão caro quanto os priva<strong>dos</strong>, pelo custo de<br />
material, custo de transporte, e assim por<br />
diante, então, a nossa preocupação é com<br />
o nosso adolescente dentro de dois anos.<br />
Graças a Deus, nós atingimos uma<br />
marca que é a grande preocupação de ensino,<br />
que é manter a qualidade da nossa estrutura<br />
logística, do conteúdo programático<br />
e pedagógico das nossas disciplinas, em<br />
parceria com o estado e, dentro do nosso<br />
município, os nossos profissionais recebem<br />
quatro capacitações por ano, fora os incentivos<br />
que nós damos aos nossos profissionais<br />
para buscarem outros cursos, outras<br />
palestras, outros estilos e padrões de capacitações,<br />
que podemos subsidiar para que<br />
eles se sintam estimula<strong>dos</strong>. Como acontece<br />
com a história do pró-labore, aqui para a<br />
rede estadual do nosso município como um<br />
incentivo ao profissional do estado, para<br />
que ele possa trabalhar um pouco mais<br />
tranqüilo e justamente mais remunerado,<br />
de uma forma que ele se sinta estimulado<br />
para continuar seu desenvolvimento.<br />
Desculpe a apresentação e o entroncamento,<br />
mas a gente fez questão de<br />
mostrar aqui o perfil e a responsabilidade<br />
sobre a qualidade de ensino, para nós a<br />
responsabilidade fiscal sobre investimentos<br />
não nos cabe e nos interessa muito mais as<br />
parcerias, porque assim, nós atingiríamos<br />
toda a população de São Caetano do Sul,<br />
que é o que nos interessa e é nossa obrigação<br />
na administração pública.<br />
Colocamos à disposição de vocês<br />
qualquer discussão e bate-papo na Câmara<br />
Municipal, informar e receber informações<br />
de vocês será uma forma de, to<strong>dos</strong> juntos,<br />
melhorarmos cada vez mais a educação,<br />
que está tão nivelada por baixo pelos projetos<br />
que normalmente vêm de cima para<br />
baixo. O importante é ter consciência e investir<br />
realmente na qualidade da educação<br />
do seu munícipe.<br />
GeIsa FernanDes rePUI<br />
Santo André têm 700 mil habitantes,<br />
94 escolas estaduais, 70 escolas municipais,<br />
isso dá um universo de mais de 130<br />
mil alunos, muita criança, muito jovem,<br />
muito adolescente e muito adulto.<br />
A Secretaria de Santo André é<br />
uma secretaria de educação e formação<br />
profissional, hoje nós temos 600 funcio-<br />
Gestão & Regionalidade - N o 13 - 2 o Semestre 2005<br />
nários, que trabalham com a qualificação<br />
e requalificação profissional. Essa é uma<br />
escolha política do governo, onde a gente<br />
tem que fazer um investimento importante,<br />
porque estas verbas precisam ser vistas.<br />
Santo André e São Bernardo são cidades<br />
muito parecidas e com experiências<br />
de municipalização totalmente opostas,<br />
São Bernardo optou pela municipalização,<br />
Santo André não optou pela municipalização<br />
e criou uma rede própria de<br />
ensino fundamental, isso não quer dizer<br />
que está certo ou errado, são escolhas públicas<br />
que precisam ser feitas em determina<strong>dos</strong><br />
momentos, é fato que a professora<br />
Marília coloca que a municipalização vem<br />
meio empurrada.<br />
De que forma ela vem sendo feita<br />
lá em Santo André? Com o fechamento de<br />
escolas, sem comunicar a prefeitura, sem<br />
comunicar as famílias e aí você só fica sabendo<br />
que no ano seguinte aquela escola<br />
não vai funcionar mesmo. Nós temos um<br />
regime de cooperação. E porque Santo André<br />
fez essa opção?<br />
Com a municipalização, foi posta<br />
em São Paulo, eu sou absolutamente<br />
a favor da municipalização, acho que ela<br />
é importante, mas da forma que ela foi<br />
colocada, o regime que é colocado, não<br />
era favorável para o município naquele<br />
momento, então nós nos sentimos mais<br />
confortáveis lá na quarta administração,<br />
portanto nós conseguimos avaliar os resulta<strong>dos</strong><br />
<strong>dos</strong> nossos erros e acertos das<br />
diferentes políticas públicas e educação é<br />
uma delas, nessa segunda gestão, como<br />
a secretaria enfim e porque não valia a<br />
pena municipalizar naquele momento,<br />
porque a municipalização não cabia em<br />
alguns aspectos para discussão da passagem,<br />
sejam os profissionais, sejam os prédios,<br />
seja uma forma ou de outra, acho<br />
sim, que no curso de pós-graduação, assim<br />
como de graduação, assim como em<br />
qualquer discussão de política pública,<br />
há, sim, interferência político-partidária,<br />
infelizmente nós tentamos aqui no ABC<br />
fazer com que os secretários de educação<br />
articulem políticas públicas para os sete<br />
municípios.<br />
Nós entramos num acordo em algumas<br />
ações, mas infelizmente temos divergências<br />
partidárias, isso faz com que ganhemos<br />
diferenças de governo porque nós imaginamos<br />
que seja melhor para a educação.<br />
5
Santo André, em 1997, optou por<br />
abrir uma rede de ensino fundamental,<br />
isso teve um custo, o custo foi de cinco mil<br />
vagas na educação infantil, só no ano da<br />
implantação do Fundef, para você ter uma<br />
idéia de quanto o município já perdeu<br />
com esses nove anos de Fundef. Este ano,<br />
Santo André recolheu 27 milhões para o<br />
Fundef e recebeu de volta 16 milhões e eu<br />
ainda tenho uma fila de 3.500 crianças esperando<br />
vaga na creche. Então, o município<br />
arrecada o recurso, faz uma política de<br />
ajuste fiscal e beneficia outros municípios,<br />
que nem sempre trabalham com a política<br />
de ajuste fiscal.<br />
É fato que os recursos do Fundef<br />
ficam para o próprio estado, até eu ouvi<br />
daqui, do professor Valter, que existe uma<br />
diferença gritante entre a necessidade de<br />
São Caetano e a necessidade <strong>dos</strong> 5.540 e<br />
poucos municípios e a nossa dificuldade é<br />
a educação infantil, porque ela é contribuição<br />
exclusiva do município, o Ministério<br />
Público não quer saber se a Emenda n o 14<br />
garante recursos para o Fundef para o ensino<br />
fundamental, ele quer saber do empreendimento<br />
para a constituição que diz<br />
que todas as crianças têm direito à escola,<br />
creche e suas necessidades.<br />
Nós recebemos, por dia, em<br />
torno de três e quatro formulários para<br />
colocar crianças em creches, nós temos<br />
listas públicas, que é de conhecimento e<br />
acompanhamento de conselho de escola,<br />
onde classificamos uma vez por ano. São<br />
visitadas cinco mil famílias porque esses<br />
são os números de inscritos, as famílias<br />
são visitadas por assistentes sociais, que<br />
não têm vínculos com a prefeitura e, para<br />
evitar qualquer problema nessa classificação,<br />
as listas se tornam públicas, para que<br />
a gente consiga atender prioritariamente<br />
às crianças com maior necessidade.<br />
No meu papel, enquanto educadora,<br />
é muito complicado entrar num processo<br />
contra essa família e tirar a criança<br />
da creche, Santo André foi até o Supremo<br />
Tribunal Federal e devemos definir qual<br />
das leis nós devemos cumprir porque a<br />
educação tem verba vinculada de 25%, é<br />
fato que o município pode colocar mais<br />
que 25%, mas também todo mundo sabe<br />
que existem outras coisas por serem feitas<br />
no município, além da educação.<br />
Se nós fizermos uma conta simples,<br />
25% para educação, 15% para saúde,<br />
42%, que mais ou menos a folha de pagamento<br />
da Prefeitura de Santo André faz,<br />
somando tudo isso, ainda tem saneamento<br />
básico, urbanização de favelas, inclusão social,<br />
existe uma série de coisas que precisam<br />
ser feitas, de uma fatia muito pequena<br />
do orçamento, então, nós defendemos sem<br />
o Fundef, que o Fundeb inclua as creches<br />
porque a Emenda Constitucional e a então<br />
Vara Civil, que não contempla as crianças<br />
de zero até 3 anos e que são os de maior<br />
custo dentro <strong>dos</strong> municípios.<br />
Hoje, em Santo André, uma criança<br />
de zero até três anos no período integral,<br />
12 a 14 horas na creche custa de 3 mil<br />
a 3.200 reais e a Emenda Constitucional do<br />
Fundef prevê “X” por cento para o fundamental,<br />
“X” com plus para o ensino médio<br />
e um “X” menor para a educação infantil.<br />
Nós corremos o risco de ver a educação infantil<br />
ter um decréscimo, mas a situação,<br />
sendo o que acontece na educação infantil,<br />
diferente do que acontece em São Caetano,<br />
serve de porta de entrada para combate<br />
a desnutrição, inclusão com crianças<br />
portadoras de deficiência, atendimento<br />
prioritário à violência doméstica enfim, é<br />
a porta de entrada para um atendimento<br />
humanizado da população, que deixou de<br />
ser só mãe para ser a mãe trabalhadora,<br />
em relação a questão da creche.<br />
Não é somente o cuidar, agora é o<br />
educar também, por isso a LDB passa essa<br />
atribuição da assistência para a educação,<br />
porque ela não é só um espaço de cuidar,<br />
mas é um espaço educar, contudo o governo<br />
passado esqueceu de passar os recursos,<br />
assim vem acontecendo com a saúde e,<br />
infelizmente, nem o atual governo contribuiu<br />
para o Fundef aquilo que é de fato<br />
obrigação do governo federal, todas as<br />
partes têm que contribuir para que to<strong>dos</strong><br />
possam receber.<br />
Em 1997, Santo André optou por<br />
ter uma rede própria de ensino e vem ano<br />
a ano construindo essa rede, nós voltamos<br />
pelas séries iniciais, nós trabalhamos na<br />
linha que chamamos de primeira infância<br />
de zero até 10 anos, trabalhamos por ciclos<br />
e não por séries. Trabalhamos por ciclos<br />
com a educação infantil, desde a creche, as<br />
crianças são agrupadas não por idade, mas<br />
por etapas do desenvolvimento.<br />
Então, na verdade, o que se fez<br />
foi empurrar todo mundo para abrir vagas<br />
nas séries iniciais para que a gente dê<br />
54 SEMINÁRIO ABERTO
conta de toda criança na escola, de fato,<br />
o Brasil conseguiu avançar e a opção foi<br />
pelo ensino fundamental e todas as crianças<br />
entre sete e 14 anos foram incluídas.<br />
Aí então se cria um outro problema que<br />
estamos vendo agora, todo esse povo está<br />
saindo do ensino fundamental e precisa de<br />
vaga no ensino médio e nós não tivemos<br />
um investimento, poucos são aqueles que<br />
conseguem fazer. Na verdade, o que a gente<br />
está tentando é contornar uma situação<br />
que o Fundef criou, na verdade, se nós tivéssemos<br />
criado um fundo para a educação<br />
básica, nós teríamos sim, uma progressão<br />
e uma entrada muito mais organizada na<br />
rede, porque é fato que os prefeitos aderiram<br />
à municipalização para receber recursos.<br />
E o que isso vem acarretando?<br />
Secretários de educação, que não são<br />
da área e que são administradores de recursos<br />
da educação são de um outro segmento.<br />
Acho que o secretário da Educação<br />
precisa se conscientizar sobre o papel<br />
administrativo, porque temos sim, 25% do<br />
orçamento, o orçamento geral de Santo<br />
André está girando em torno de 650 milhões,<br />
quase 700 milhões.<br />
A educação tem 140 milhões,<br />
portanto, é muito recurso, nós temos um<br />
recurso vinculado aos 25% e mais os recursos<br />
que a educação recebe, que é o<br />
Fundef e a verba CESE (Cota estadual do<br />
Salário à Educação), por isso, o secretário<br />
da educação precisa entender de finanças,<br />
precisa entender de administração para<br />
poder utilizar este recurso para reverter a<br />
qualidade do ensino na formação da sua<br />
educação, então o que a gente tem feito<br />
nesse sentido? Como eu disse, temos quatro<br />
gestões e não dá para culpar governos<br />
anteriores, a gente tem é que trabalhar<br />
e dar os resulta<strong>dos</strong> que a população espera,<br />
nós tivemos administração de 1992<br />
a 1996, depois, ainda uma administração<br />
da oposição até 1997, aí de 1997/2000, de<br />
2001/2004 e agora 2005/2008.<br />
Se não me falha a memória, os<br />
professores têm pelo menos uma graduação<br />
no município, 15% da rede municipal<br />
tem pós-graduação na última gestão, nós<br />
investimos, financiamos 25% <strong>dos</strong> professores<br />
que não tinham graduação, nós pagamos<br />
o curso em regime especial na Fundação<br />
Santo André.<br />
Com 3.300 horas presenciais,<br />
onde regionalidade era uma das disci-<br />
Gestão & Regionalidade - N o 13 - 2 o Semestre 2005<br />
plinas porque professores migram para<br />
rede, eles trabalham um período em Santo<br />
André, outro em São Caetano do Sul e<br />
em São Bernardo e, paralelo a isso, 15%<br />
<strong>dos</strong> professores fizeram programa de pósgraduação<br />
na Universidade de São Paulo,<br />
banca<strong>dos</strong> pela administração, porque, se<br />
teremos uma administração de qualidade,<br />
nós temos que investir em quem está<br />
na ponta, não adiantaria investir em diretores<br />
ou nos cargos comiciona<strong>dos</strong>, nós<br />
fizemos esse investimento em cursos especiais,<br />
com a USP, fizemos acor<strong>dos</strong> para<br />
três modalidades que atendemos: educação<br />
infantil, ensino fundamental e jovens<br />
e adultos; conseguimos terminar isso na<br />
gestão passada.<br />
E agora, qual é o nosso desafio?<br />
Estabelecer indicadores que contemplem<br />
os resulta<strong>dos</strong> desses investimentos de 12<br />
anos, para que a gente tente um retorno<br />
da rede. Na verdade, você faz o investimento<br />
com o professor e é necessário que<br />
ele retorne isso em qualidade para a rede<br />
em trabalho.<br />
Formação continuada faz parte<br />
de todas as redes municipais ou estaduais,<br />
não temos sofrido problemas com as escolas<br />
particulares, nós apenas autorizamos as<br />
660 escolas infantis a fazerem uma supervisão<br />
pedagógica, mas, com a rede do tamanho<br />
que nós temos, não é possível e não dá<br />
para disponibilizar recursos para manter<br />
ou fazer, enfim, esta supervisão.<br />
Fizemos um investimento pesado<br />
em inclusão de crianças com deficiência,<br />
acreditamos em inclusão na rede e não em<br />
salas especiais ou salas com recurso, nós tínhamos<br />
no início da gestão passada, cem<br />
crianças com alguma deficiência, terminamos<br />
2004 com 857 crianças incluídas na<br />
rede, dessas, mais de 350 usam cadeira de<br />
rodas. Então, são cadeirantes que estavam<br />
em algum lugar e que não têm deficiência<br />
mental, e podem estar incluí<strong>dos</strong> na rede<br />
regular, eles não precisam de atendimento<br />
especializado, só precisam de acesso universal<br />
aos espaços escolares, na realidade,<br />
eles precisam de condições para sua inclusão,<br />
condições de rampa, banheiro acessível,<br />
enfim, isso é um desafio que a gente<br />
tem, a projeção é que termine essa gestão<br />
com 2.500 crianças.<br />
Hoje em dia, nosso desafio é atender<br />
as crianças com DGD (Distúrbios Globais<br />
de Desenvolvimento), crianças que<br />
55
têm várias síndromes, que a Escola Paulista<br />
de Medicina não consegue identificar, por<br />
isso estão criando núcleos de estudo para<br />
trabalhar com 40 alunos da rede municipal,<br />
que são considera<strong>dos</strong> DGD, temos crianças<br />
com paralisia cerebral, síndrome de Down<br />
e ossos de vidro.<br />
Trabalhamos com o estado em<br />
regime de cooperação, o que significa que<br />
dividimos demanda, a escola mais próxima<br />
da residência da criança será aquela que ela<br />
vai estudar, seja ela municipal ou estadual,<br />
nós temos um regime de cooperação.<br />
Temos uma pesquisa pacto de<br />
Fundef em adiantamento com a Fapesf,<br />
com a USP e Fundação Santo André, em<br />
relação à migração das redes, ela não<br />
está finalizada ainda. Com isso temos um<br />
observatório da secretaria, que acompanha<br />
não só a rede regular, mas os cinco<br />
centros profissionalizantes e as ações na<br />
área da educação, hoje a nossa rede tem<br />
em torno de 60 mil atendimentos por<br />
dia, é uma rede grande, nós somos responsáveis<br />
pela merenda pela rede estadual,<br />
também em regime de cooperação,<br />
enfim, temos um universo de coisas que<br />
compõem os investimentos em educação,<br />
em linhas gerais.<br />
Nós criamos o sistema municipal,<br />
que não há vínculos com a diretoria<br />
regional de ensino para supervisão, estamos<br />
liga<strong>dos</strong> ao MEC e fazemos parte da<br />
implantação da Universidade Federal do<br />
ABC, que acho importantíssima para a região,<br />
temos participado do UNDPE (União<br />
Nacional <strong>dos</strong> Dirigentes Principais de Educação)<br />
e acho importante que os secretários<br />
das articulações estaduais e regionais,<br />
em nível nacional, saibam que perdemos<br />
recursos, ganhamos alunos e ainda perdemos<br />
qualidade, mas implantamos o ensino<br />
fundamental de 9 anos.<br />
PrOF. anTOnIO CarLOs GIL<br />
Então, agora nós iremos tratar<br />
da municipalização sob a ótica do profes-<br />
sor Edgar.<br />
PrOF. eDGar<br />
Na minha opinião a questão da<br />
municipalização não é um pré-enfoque teórico,<br />
mas um posicionamento político. É<br />
sentido que o que eu vou expressar aqui,<br />
na verdade, é a posição <strong>dos</strong> trabalhadores<br />
da educação estadual, que já provaram em<br />
vários congressos a nossa opinião sobre a<br />
municipalização do ensino fundamental.<br />
Primeiro, eu quero destacar que,<br />
na década de 1990, a nossa educação enfrentava<br />
uma série de problemas, que, se<br />
emprega<strong>dos</strong> no centro escolar atual, nós<br />
vamos constatar que não há muita mudança<br />
de qualidade para melhor. Por que<br />
é que eu digo? Se vocês pegarem o censo<br />
escolar do último ano, 2004 aponta que<br />
temos 55 milhões de matrículas na educação<br />
básica, <strong>dos</strong> quais, 87% estão matricula<strong>dos</strong><br />
na rede pública, e dessa fatia imensa<br />
de 87% de 55 milhões, 34 milhões estão<br />
matricula<strong>dos</strong> na educação fundamental.<br />
Então, portanto, quando se fala de municipalização<br />
nós estamos falando da maior<br />
fatia da demanda do sistema educativo<br />
básico, segundo a LBB. Porque eu estou<br />
ressaltando isso? Foram cita<strong>dos</strong> aqui pelos<br />
outros professores alguns programas<br />
na educação do governo estadual, que foram,<br />
no início da década de 1990, de 1995<br />
para cá, a reorganização da rede, veio a<br />
municipalização, via diretamente a adoção<br />
do sistema municipal ou através de<br />
parcerias e convênios com São Caetano do<br />
Sul, que fez, mas o fato é que nós temos<br />
hoje em torno de 40% municipalizado, se<br />
pegarmos de lá para cá.<br />
Bom, e porque que foi assim? Porque<br />
é que foi essa a opção pública? Primeiro,<br />
através da legislação, lembretes e bases<br />
números 93 e 94 e depois a Emenda 14 e<br />
a lei que regulamenta o Fundef, que é a<br />
9424, no ano de 1996. Essa opção política<br />
está relacionada à subordinação das diretrizes<br />
da declaração mundial de educação<br />
para to<strong>dos</strong>.<br />
Em março de 1990, houve uma<br />
conferência mundial e nessa conferência<br />
mundial de educação, onde participaram<br />
cerca de 180 países, entre os quais o Brasil,<br />
foi feito o diagnóstico da educação, e por<br />
coincidência, os problemas que nós tínhamos<br />
aqui no geral, parecem semelhantes,<br />
do ponto de vista socioeconômico do Brasil<br />
e países muito piores do ponto de vista<br />
econômico também possuíam o mesmo<br />
problema: elevadas taxas de analfabetismo,<br />
elevadas taxas de evasão e repetência<br />
escolar e o baixo acesso à educação básica.<br />
E, junto com isso, identificaram também<br />
que havia a ausência de parâmetros<br />
do trabalho docente. Então, a partir daí,<br />
56 SEMINÁRIO ABERTO
saiu a declaração de educação para to<strong>dos</strong>,<br />
onde to<strong>dos</strong> os países presentes e as ONG´s<br />
resolveriam to<strong>dos</strong> os problemas socioeconômicos<br />
das políticas públicas, presentes<br />
também lá, se comprometendo a aplicar os<br />
planos decenais, ou seja, uma política adicional<br />
por dez anos.<br />
O Brasil, ao assinar essa declaração,<br />
se comprometeu a fazer isso. Houve<br />
um atraso por conta da crise institucional<br />
que se estabeleceu com o Fernando Collor<br />
de Melo, continuou com o Itamar, e o Itamar,<br />
na verdade, continuou a administração<br />
federal por conta de um acordo de governabilidade,<br />
que ocorreu na época. E não<br />
tinha muita força para aplicar sua política<br />
educacional, ou a da Conferência Mundial<br />
de Educação para to<strong>dos</strong> que é uma outra<br />
política e isso ficou mais ou menos generalizado<br />
no tal pacto de banalização do Magistério<br />
na época.<br />
A partir daí, então, com a ascensão<br />
do Fernando Henrique, do PSDB no poder,<br />
de fato, vai se adaptar a política educacional<br />
que se consubstancia nas diretrizes<br />
aprovadas na declaração do governo de<br />
educação para to<strong>dos</strong>. E qual a principal de<br />
todas? Era descentralizar a política administrativamente<br />
da educação. E como é que<br />
isso vai se materializar? A municipalização<br />
do ensino fundamental, que não ocorreu<br />
só no Brasil. Ocorreu no Chile, na Argentina<br />
e to<strong>dos</strong> os países da América Latina, na<br />
África, e assim por diante.<br />
E essa política vem acompanhada<br />
de outro diagnóstico lá da Conferência<br />
Mundial, de que as nações, entre elas o<br />
Brasil, alocavam muitos recursos para o<br />
ensino superior, então é preciso mudar<br />
essa política. Privilegiar a educação básica,<br />
em vez do ensino fundamental. E a partir<br />
daí, vem a municipalização para o Brasil,<br />
para os vários países do mundo. Mas ela<br />
está subordinada um outro fator, porque<br />
a educação, sempre historicamente, ela<br />
sempre esteve subordinada relativamente<br />
à economia e às grandes transformações<br />
da economia. Então, nós vivemos na década<br />
de 1990, a chamada era da globalização,<br />
e vivemos sob ela ainda. Com a globalização<br />
econômica, vem uma série de medidas,<br />
produto do consenso de 1979 e que<br />
tem uma política clarinha, que é a adoção<br />
do estado, que é a adoção da concepção<br />
de Frederich Heinkmein e do Friedman, de<br />
que o estado tem que se manter neutro<br />
Gestão & Regionalidade - N o 13 - 2 o Semestre 2005<br />
e que a economia deve fluir numa forma<br />
liberal e obedecendo às leis da oferta e<br />
da procura. E, portanto, o estado só pode<br />
ser o suporte, e a partir daí, passa-se a desenvolver<br />
as concepções de que o estado<br />
deve fazer parcerias com a comunidade e<br />
a sociedade com as empresas, para manutenção<br />
e desenvolvimento da educação,<br />
da saúde e <strong>dos</strong> serviços públicos. Então,<br />
nós temos aí aquilo que o velho Covas dizia:<br />
“é uma reengenharia do estado”. O<br />
que foi aplicado no estado de São Paulo<br />
e no Brasil, vinha o suporte da legislação,<br />
LDP, a Emenda 14 e o Fundef foi operacionalizar<br />
a reforma do estado na educação,<br />
reduzindo o tamanho da educação e desresponsabilizava<br />
a União e o estado em<br />
relação às suas funções.<br />
Então, se vocês perguntarem o que<br />
é a municipalização, não é nada mais do<br />
que isso, a transferência da responsabilidade<br />
da educação que deveria ter a União.<br />
Joga a responsabilidade para o município<br />
e aí que está o grande problema. Ao jogar<br />
a responsabilidade, não de uma forma sutil,<br />
mas compulsória via a Emenda 14 e a<br />
Lei 9424, através do Fundef, simplesmente<br />
engessa a política pública <strong>dos</strong> municípios,<br />
embora a LDP tenha loucura de dizer que<br />
possa haver opção de um sistema único.<br />
Mas aí, qual o grande problema? Se produz<br />
essa política para desresponsabilizar,<br />
para reduzir a despeza do estado, e ao fazer<br />
isso, o que nós temos nessa situação,<br />
um quadro onde seis mil municípios, como<br />
já foi dito aqui, seis mil municípios, cuja<br />
maioria, nós estamos falando de mais de<br />
70%, não tem receita própria, depende de<br />
repasse da União para que possa ter vida,<br />
do ponto de vista econômico.<br />
Com isso, então, o Fundef que<br />
vislumbrava até 2007 adotar toda uma<br />
política para municipalizar todo o ensino<br />
fundamental e com todo o operativo contábil,<br />
centralizar, no fundo, os municípios<br />
para ter o recurso de volta, que está retido<br />
lá, os 60% do total de 25 milhões para gastar,<br />
ele simplesmente tem que comprovar<br />
através da fatura. Qual é o grande problema?<br />
O governo arrecadava. Os tucanos<br />
diziam que o problema da educação não é<br />
a falta de recurso, é de gerenciamento de<br />
recursos. E pasmem, que no atual governo<br />
também estão dizendo isso, que o recurso<br />
é volumoso e que se trata de ser bem<br />
administrado. É verdade, quando se trata<br />
57
de recurso público, tem que ser bem administrado,<br />
tem que haver transparência<br />
e tem que haver mecanismos para que a<br />
sociedade controle a operação <strong>dos</strong> recursos<br />
públicos. Nada mais do que a obrigação<br />
de qualquer administração pública. O<br />
problema que o Fundef não deu conta,<br />
nem do problema <strong>dos</strong> desvios <strong>dos</strong> recursos,<br />
não sou eu quem digo, os próprios relatórios<br />
do Conselho Nacional do Fundef<br />
diz isso, mais de mil prefeituras no último<br />
período têm desviado recursos públicos da<br />
educação para qualquer outra coisa, traduzindo,<br />
pura corrupção, ainda o próprio<br />
governo atual declara que boa parte de<br />
cada cem reais que saem do MEC não chega<br />
na escola. Isso significa que o Fundef<br />
não deu conta do principal problema que<br />
nós tínhamos há dez anos atrás. Qual era?<br />
De garantir que o volume <strong>dos</strong> recursos<br />
aplicado chegasse à escola. Segundo, não<br />
deu conta de eliminar a corrupção. Terceiro,<br />
não deu conta de resolver o problema<br />
de melhorar a qualidade de educação no<br />
país. Colega decidiu falar um pouco comigo<br />
mais da sua administração, estou falando<br />
no geral. E se pegarmos a história<br />
de São Paulo, vou lembrar que o governo<br />
Alckmin foi condenado por uma CPI na<br />
Assembléia Legislativa, pelo fato de ter<br />
desviado mais de quatro bilhões de reais<br />
da educação. O governo federal já, desde<br />
o governo de Fernando Henrique Car<strong>dos</strong>o,<br />
até o atual, ainda mantém até o duplo<br />
onde a educação perde por ano mais de<br />
quatro milhões.<br />
Então, nós estamos num círculo<br />
vicioso, onde a política de fun<strong>dos</strong> e a<br />
municipalização não resolvem o principal<br />
problema que nós temos, ou seja, a carência<br />
de recursos para aplicar na educação<br />
básica. E hoje é uma contradição, se fala<br />
muito na reforma universitária, que o<br />
projeto do MEC está lá no Congresso, se<br />
fala na criação da Universidade Federal<br />
do Grande ABC, mas se está falando muito<br />
pouco no Fundef, ou seja, é uma coisa<br />
que vai mexer com a nossa vida o projeto<br />
Fundef, na verdade, vai fazer uma alteração<br />
contábil e socializar a miséria. Eu digo<br />
miséria, porque o governo atual e o governo<br />
passado aplicam na educação cerca<br />
de 40%, 41% do PIB. A Unesco, que é um<br />
organismo insuspeito, diz que países como<br />
o Brasil devem aplicar no mínimo 7% do<br />
PIB na educação. Então, se levarmos ao<br />
pé da letra que está aplicado no ano de<br />
2000, sob a lei 10.100-272, que previa aplicar<br />
100% do PIB no final da década, pelo<br />
menos a meta aí previa um aumento de<br />
recurso, objetivamente para se aplicar na<br />
educação. Nesse sentido, o plano do Fundeb<br />
vem para substituir o Fundef, mas só<br />
que não vem um centavo a mais de recurso<br />
para a educação. Esse é o primeiro problema<br />
que se tem que debater.<br />
Alguns partem da premissa de<br />
que o problema da educação no Brasil não<br />
é falta de recurso. Nós dizemos, “nós trabalhadores<br />
da educação básica”, e sei que<br />
também os trabalhadores da educação<br />
superior também dizem isso, reivindicam<br />
a ampliação do recurso. Se não ampliar<br />
recurso na educação, não há melhora na<br />
educação. Essa é a primeira questão. Segunda:<br />
a política de fun<strong>dos</strong>, a troca simplesmente<br />
para o Fundeb sem o aumento<br />
de recursos não só vai maquiar a realidade<br />
e demonstrar para a sociedade que se está<br />
fazendo alguma coisa para a educação.<br />
Mas, o seu conteúdo não se altera, o que<br />
vai alterar é a redistribuição do recurso<br />
apenas, que fica naquela situação do cidadão<br />
ou da cidadã que tem o cobertor<br />
curto. Então, quando está frio, ele cobre<br />
a cabeça e descobre a canela ou cobre a<br />
canela e descobre a cabeça. É isso que vai<br />
acontecer com o Fundeb, vai distribuir o<br />
recurso sobre a base <strong>dos</strong> mesmos impostos,<br />
fundo de participação do estado, <strong>dos</strong><br />
municípios, do IPI, mais exportações para<br />
poder ter um pouco de recursos. E a conseqüência<br />
disso é que nós temos uma situação,<br />
um quadro em que vai se reduzir <strong>dos</strong><br />
recursos, onde ainda a educação infantil<br />
está numa crise total no país, mesmo nos<br />
municípios mais ricos, como a cidade de<br />
São Paulo, e mesmo o ABC tem problemas<br />
seríssimos, a baixa oferta do atendimento<br />
da demanda da educação infantil, sem falar<br />
de jovens e adultos.<br />
E, a partir daí, temos um problema<br />
sério, porque se não há uma universalização<br />
da educação infantil, se não há<br />
uma universalização do atendimento de<br />
jovens e adultos, ou seja, as conseqüências,<br />
os problemas que nós temos na educação<br />
fundamental e também no ensino<br />
médio vão se multiplicando, por conta<br />
desse problema. Mas, aí nós temos um<br />
problema, não é só garantir a universalização<br />
de acesso, como hoje nós temos, e<br />
5 SEMINÁRIO ABERTO
os da<strong>dos</strong> indicam isso, em relação à educação<br />
fundamental, o problema é a permanência<br />
e a qualidade dessa permanência,<br />
que é outro problema. E aí, os da<strong>dos</strong><br />
do Saesp já indicaram que a queda tem<br />
sido vertiginosa, principalmente no final<br />
da quinta série, da oitava série e também<br />
do ensino médio. Esse é um problema que<br />
não vai se resolver só com a vinda de recursos,<br />
mas vai se resolver também olhando<br />
para o chão da escola, para o lado da<br />
infra-estrutura, que é um problema sério.<br />
Vai se resolver olhando para o trabalhador<br />
da educação ou para o profissional da<br />
educação. E sabe-se perfeitamente que a<br />
média salarial no país é baixíssima, varia<br />
de R$ 450,00 a R$ 560,00, é o que ganha<br />
um professor do ensino fundamental no<br />
país. Para você ter uma idéia, é a média,<br />
segundo o censo dourado aplicado pelo<br />
INEP no ano passado.<br />
No caso da quinta e oitava séries e<br />
do ensino médio aumenta um pouco porque<br />
varia de R$ 650,00, não chegando a R$<br />
700,00. Isso é um problema, porque se o<br />
profissional da educação não é remunerado<br />
condignamente, as conseqüências estão<br />
no quadro que leva hoje um professor a<br />
uma exacerbação da jornada de trabalho.<br />
Então, hoje nós temos na rede pública<br />
pelo menos 50% da nossa categoria<br />
trabalhando, em média, 45, 50 horas por<br />
semana. E isso é um problema sério. É muito<br />
comum nós termos professores da rede<br />
municipal duelando com a rede estadual,<br />
ou com a rede municipal. Então, ele trabalha<br />
em média 40 horas. Só para vocês terem<br />
uma idéia, um estudo até suspeito da<br />
Organização Nacional de Saúde recomenda<br />
para todo mundo no máximo 20 horas<br />
em sala de aula. E hoje nós temos, <strong>dos</strong> 2<br />
milhões e 400 mil profissionais da educação<br />
no país, a maioria trabalhando mais<br />
de 40 horas por semana. Se nós queremos<br />
melhorar a qualidade da educação, me<br />
desculpe, não vai se melhorar nunca com<br />
uma jornada dessas. Não haverá projeto<br />
de proteção continuada que dê certo, por<br />
mais propaganda que os administradores<br />
públicos façam, porque exige um salário<br />
digno, exige uma infra-estrutura adequada,<br />
laboratório de informática, biblioteca,<br />
sala que une aluno e professor adequada.<br />
To<strong>dos</strong> os países onde a educação é excelência<br />
têm em média 20 alunos por classe.<br />
Na rede estadual, nós temos em média, na<br />
Gestão & Regionalidade - N o 13 - 2 o Semestre 2005<br />
educação fundamental 35, 40 alunos, no<br />
ensino médio, 45, 50 alunos.<br />
A partir daí, nós temos outro problema,<br />
são as doenças profissionais que<br />
estão se alastrando, coisa que era incomum<br />
há dez, 15 anos atrás, hoje é comum<br />
para os profissionais da educação, cito<br />
alguns exemplos: síndrome do pânico,<br />
depressão, calo na garganta, câncer na<br />
garganta etc. E aí é um problema sério<br />
porque as doenças profissionais, à medida<br />
em que se proliferam, nós temos uma<br />
elevada taxa de licenças, nós temos uma<br />
série de problemas que se multiplicam e,<br />
a partir daí, agravado por um outro problema<br />
que até um tempo atrás era incomum<br />
e hoje é comum: a violência na escola.<br />
Violência na escola é um problema<br />
seríssimo, e vocês vão dizer, mas é só na<br />
rede estadual e municipal. E se a gente<br />
for pegar os da<strong>dos</strong> que ocorrem nas redes<br />
municipais, eu conheço mais ou menos<br />
como Santo André, São Bernardo, nós vamos<br />
observar que a coisa é grave, está se<br />
alastrando e não se soluciona apenas com<br />
aumento da polícia, óbvio que segurança<br />
escolar tem que ter, mas é mínima. Se se<br />
desenvolver uma política econômica que<br />
altere essa realidade do desemprego estrutural,<br />
17% só na Grande São Paulo. Se<br />
não houver uma política econômica que<br />
distribua a renda, que melhore a renda da<br />
população, a escala da violência aumenta,<br />
o consumo de álcool aumenta, o aumento<br />
do uso de drogas aumenta, e vai explodir<br />
onde? Na escola. E aí vêm muitos teóricos<br />
da educação, que fazem uma maquiagem<br />
da realidade e querem que a escola resolva<br />
to<strong>dos</strong> esses problemas, todas essas<br />
mazelas que a sociedade enfrenta hoje e<br />
não vai resolver.<br />
Nessa perspectiva, então, o colega<br />
de São Bernardo diz que o Fundeb<br />
vem para ficar. Ele não vem para ficar,<br />
ele já está com os dias conta<strong>dos</strong>. Não sei<br />
se to<strong>dos</strong> acompanharam a imprensa nos<br />
últimos dias, há uma divergência no governo<br />
Lula em relação ao Fundeb, porque<br />
o Ministério da Fazenda não quer liberar<br />
mais recursos, e parece que há um acordo<br />
agora, e parece que até o fim do segundo<br />
semestre esse projeto será enviado<br />
para o Congresso. E se for enviado para o<br />
Congresso, óbvio, vai ser uma engenharia<br />
negociar esse projeto. Vocês sabem que<br />
o governo federal está com uma dificul-<br />
59
dade para reconstruir sua base de apoio,<br />
ainda mais agora com a denúncia de corrupção<br />
<strong>dos</strong> Correios, que é dirigido pelo<br />
presidente do PTB. Então, isso vai complicar<br />
um pouco a base do governo federal.<br />
Mas, de qualquer forma, esse projeto vai<br />
para o Congresso, prevendo que nos próximos<br />
quatro anos, uma vez aprovado, o<br />
governo federal vai injetar mais de 4 bilhões<br />
e 500 milhões de reais no período<br />
de quatro anos, de forma gradual.<br />
Mas só que esse dinheiro, embora<br />
aparentemente seja novo, não é. E o Fundeb,<br />
então, vai substituir o Fundef. Ele vai<br />
dar conta da educação de jovens e adultos<br />
da educação fundamental, da educação<br />
infantil e da educação do ensino médio.<br />
A partir daí, os municípios vão ter grandes<br />
progressos. Óbvio que municípios com<br />
recursos e receita próprios, como aqui no<br />
ABC ou na cidade de São Paulo, não vai<br />
ter grandes problemas, mas olhando para<br />
a forma macro <strong>dos</strong> quase seis mil municípios,<br />
eles terão problemas e aqueles colegas<br />
que acham que a municipalização vai<br />
ser umas maravilha, vejamos isso a médio<br />
e longo prazo, como vai ser. Até os municípios<br />
que são mais ricos porque a realidade<br />
de se ter um sistema educacional<br />
próprio significa ter custo adicional, uma<br />
despesa fixa, e aí a coisa vai mudar, muda<br />
a realidade completamente.<br />
E por último, eu gostaria de dizer<br />
de forma coorporativa, óbvio que a municipalização<br />
divide nossa categoria. Hoje, nós<br />
temos uma categoria estadual, ela começa<br />
a sofrer uma divisão, por conta da municipalização,<br />
os municípios, do ponto de vista<br />
da organização se torna mais difícil e óbvio<br />
que isso, mais unificado, mais poder de<br />
pressão a categoria tem, quanto mais dividido,<br />
menos pressão essa categoria tem.<br />
Então, nesse sentido, eu estou<br />
entre aqueles. Meu sindicato entende<br />
que a municipalização não é a solução de<br />
to<strong>dos</strong> os problemas, ao contrário, é uma<br />
política que está a serviço da reforma do<br />
estado para desresponsabilizar a União<br />
das suas funções e que, a médio e longo<br />
prazo, nós teremos problemas sérios no<br />
país desse ponto de vista do combate da<br />
crise da educação, da melhoria da qualidade<br />
e que nós enfrentamos uma situação<br />
onde, infelizmente, a educação nesse<br />
país não é prioridade, no ponto de vista<br />
de investimento de longo prazo,é ainda<br />
uma política pública que é vista como manipulação,<br />
como vitrine para as eleições.<br />
E para superar tudo isso, tem que fazer<br />
como no Japão, realizar investimento<br />
para a educação de longo prazo, período<br />
pós-guerra.<br />
Se investiu na educação em média<br />
10% a 15% ao ano, para ter dividen<strong>dos</strong>,<br />
retorno da educação a partir da década de<br />
1970. Na pratica, foram três décadas de<br />
investimentos a longo prazo, para que se<br />
tenha recurso, se tenha retorno não só na<br />
formação de uma geração docente, não<br />
só na aplicação de recurso para educação,<br />
porque o conhecimento é um processo dinâmico<br />
e que não está divorciado de um<br />
outro problema: a universidade. Hoje há<br />
um uni ato entre a educação básica e o<br />
terceiro grau. A universidade pública, infelizmente,<br />
vê a educação básica apenas<br />
como um laboratório, é preciso deixar se<br />
ver a educação básica como um laboratório,<br />
é preciso inverter isso, senão não vamos<br />
também mudar outra realidade que<br />
atinge a educação superior, que é o baixo<br />
nível não só de acesso, mas da qualidade<br />
do aluno, quando chega na educação superior.<br />
E, para isso, é uma luta, não só <strong>dos</strong><br />
professores, mas é uma luta <strong>dos</strong> profissionais<br />
da educação, da comunidade escolar,<br />
de toda a sociedade para que a gente possa,<br />
efetivamente, conquistar uma educação<br />
pública, estatal de qualidade.<br />
PerGUnTa:<br />
Eu queria saber da professora<br />
Cleusa mais alguns detalhes sobre a supervisão<br />
da rede de Santo André pelo MEC,<br />
que é uma coisa inédita. Ela deveria ser<br />
supervisionada pelo governo do estado,<br />
então como é que funciona, quais são os<br />
benefícios, quais os dispositivos e por que<br />
Santo André fez essa opção?<br />
PrOFa. CLeUsa<br />
Na verdade, nós não temos mais<br />
nem a supervisão da Delegacia de Ensino e<br />
nem a supervisão direta do MEC. O que nós<br />
temos é a independência. Então, a supervisão<br />
das escolas municipais é feita pelos próprios<br />
profissionais da secretaria. E a nossa<br />
ligação de vínculo para programas, enfim,<br />
para uma série de coisas que é o dia-a-dia de<br />
uma secretaria, agora é feito direto ao MEC.<br />
60 SEMINÁRIO ABERTO
O que dá essa diferença? Antes as escolas<br />
tinham que homologar seus planos escolares<br />
na Diretoria Regional de Ensino, mesmo<br />
Santo André tendo optado por ter uma rede<br />
própria sede ensino fundamental. Agora,<br />
com a criação do sistema, o Conselho Municipal<br />
de Educação tem outro papel. Ele acaba<br />
ganhando poderes que ele não tinha antes<br />
da criação do sistema e a rede ganha uma<br />
independência maior. Agora, nós temos um<br />
grupo de supervisores que fazem isso e algumas<br />
decisões nós temos que submeter ao<br />
Conselho Municipal de Educação. É composta<br />
de 50% sociedade civil e 50% governo.<br />
PerGUnTa:<br />
Eu, como professora da rede estadual,<br />
tive a experiência de estar pegando<br />
quinta série este ano. Existia o Projeto<br />
Cefam, o governo do estado acabou com<br />
o Projeto Cefam. Eu acho que foi o mais<br />
democrata, apesar de to<strong>dos</strong> os problemas,<br />
ele tinha um nível de qualidade um pouquinho<br />
melhor que a rede estadual. Então,<br />
eu me vi na situação de estar dando<br />
aulas no Cefam, que é uma escola de formação<br />
do Magistério, e no ano seguinte,<br />
estar dando aula para alunos de quinta<br />
série, no meu caso, o primário que vem<br />
da rede municipalizada de São Bernardo.<br />
E não querendo fazer nenhuma colocação<br />
partidária, mas tipo, pé no chão mesmo,<br />
o professor enfrenta o dia-a-dia, a gente<br />
observa uma propaganda muito grande<br />
do município de São Bernardo, que lá está<br />
dando tudo certo, tudo indo lindo e maravilhoso,<br />
e a gente vê propaganda, inclusive<br />
em rede de televisão nacional, que<br />
parece que tudo é uma maravilha lá.<br />
Então, a colocação que eu gostaria<br />
de fazer, é que eu me deparo com<br />
alunos de quinta série, que mal sabem ler,<br />
mal sabem interpretar um texto e aquela<br />
coisa de aluno que chega numa quinta série,<br />
e a gente se pergunta: “Mas, como é<br />
que o aluno conseguiu chegar numa quinta<br />
série?” A gente percebe que o aluno<br />
não gosta do espaço escolar, é um espaço<br />
onde ele não se sente bem. Então, varia<br />
muito na questão do tema do debate, na<br />
questão da municipalização. Pelo menos a<br />
visão que eu tenho, iria talvez solucionar<br />
um pouco as deficiências do estado, pelo<br />
número de alunos, pela falta de recursos,<br />
e a gente não observa isso. É como os co-<br />
Gestão & Regionalidade - N o 13 - 2 o Semestre 2005<br />
legas colocaram aí, houve uma transferência<br />
de recursos, <strong>dos</strong> poucos recursos,<br />
mas a eficiência deixa muito a desejar:<br />
professores de primeira à quarta séries em<br />
péssimas condições de trabalho, número<br />
elevado de alunos. Então, quer dizer,<br />
a observação que eu gostaria de fazer é<br />
nesse sentido, se fala muito do número<br />
de alunos que estão na escola. Eu gostaria<br />
muito que alguém me apresentasse<br />
da<strong>dos</strong>. Qual é a qualidade desses alunos?<br />
Ou seja, quantos alunos saem da quarta<br />
série sabendo ler, escrever, interpretar um<br />
texto, pra gente poder dar uma aula de<br />
História, de Português, de Geografia, de<br />
Matemática. Essa é uma preocupação que<br />
eu tenho, eu acho que é muito cruel uma<br />
criança chegar na quinta série, desculpe a<br />
expressão, semi-analfabeta. É uma realidade<br />
muito triste, num município que tem<br />
uma retratação muito grande, é triste. Às<br />
vezes, a gente sai meio chateada da escola,<br />
dizendo: “Não tem jeito mesmo”. É de<br />
doer o coração ver uma criança que chega<br />
na quinta série e que mal sabe ler, escrever<br />
e interpretar um texto. Escrever, eu<br />
nem vou falar nada porque é terrível, não<br />
estou falando de acento, não. Acentos,<br />
muitas vezes, muita gente se vê traída. É<br />
escrever mesmo, com as letrinhas normais<br />
que devem ser escritas.<br />
PerGUnTa:<br />
Vocês comentaram muito que as<br />
escolas dependem do governo: subsídio e<br />
tudo mais. Eu não sei quais são as políticas<br />
escolares, mas gostaria de saber se as escolas<br />
não poderiam fazer parcerias com a<br />
comunidade, para arrecadar fun<strong>dos</strong> para<br />
a própria escola. Não sei, campanhas sociais,<br />
os alunos levarem latinhas, plástico,<br />
ou fazerem festas juninas ou sorteios, alguma<br />
coisa que poderia arrecadar fun<strong>dos</strong>,<br />
para que a escola se movimentasse. Ou fazer<br />
parcerias com fábricas locais perto da<br />
escola, alguma coisa que a sociedade poderia<br />
ajudar. Isso não seria possível para<br />
arrecadação de fun<strong>dos</strong>? É permitido às<br />
escolas fazerem esse tipo de parceria para<br />
arrecadar fun<strong>dos</strong> para si próprias?<br />
PrOFa. CLeUsa<br />
Senti muito com a questão do<br />
Cefram, acho um absurdo. Por mais pro-<br />
61
lemas que o Cefram tivesse, era uma<br />
proposta importante. Tem alguns estu<strong>dos</strong><br />
que mostram que daqui a dez anos não<br />
vamos ter professor alfabetizador, nós não<br />
vamos ter, ninguém quer. Enfim, quando<br />
eu ouço professores falando, aí quem está<br />
falando não é a secretária, eu tenho o privilégio<br />
de hoje dirigir uma cidade na área<br />
da educação, falo com a tranqüilidade de<br />
quem não é filiado ao partido que está no<br />
governo da cidade, mas é um governo, um<br />
partido que eu acredito. Portanto, estou<br />
lá, deixando meu nome atrelado ao trabalho.<br />
Agora, acho que são decisões, como<br />
as que você coloca, enquanto professora,<br />
número de salas, que são difíceis da gente<br />
manter. Em Santo André, a gente tem<br />
o máximo de 25 crianças por sala, em algumas<br />
nós conseguimos ter 20 alunos por<br />
sala. E o Ministério Público, o Conselho<br />
Tutelar vai brigar comigo, porque tem um<br />
pai que quer transferir para lá, “porque<br />
você não põe 30, porque você não põe<br />
35?”. O estado chegou a ter 52 em uma<br />
sala, em Santo André.<br />
Nós fizemos um acordo, em que<br />
eu publicava todo ano quantas vagas nós<br />
teríamos, para evitar que acontecesse de<br />
as escolas serem fechadas, e aí a pressão<br />
em cima do município pelo atendimento.<br />
Há ainda quem suporte o Ministério Público,<br />
porque ou você faz ou você sai algemada,<br />
é assim, não tem muita conversa. Você<br />
tem 48 horas, 24 horas para resolver as<br />
coisas. Então, quando eu ouço você falar,<br />
eu fico lembrando da pressão que a gente<br />
tem lá. Tira o laboratório de informática,<br />
põe mais uma sala, quando a gente tem<br />
na escola biblioteca, quando você tem...<br />
O Tribunal de Contas questionou Santo<br />
André porque comprou máquina digital e<br />
scanner para as escolas, mas não é escola<br />
pública? Mas não é lá que as crianças vão<br />
ter direito e à única oportunidade de usar<br />
as novas tecnologias, se a gente não colocar<br />
isso à disposição... Quando ele falou<br />
da média, é claro que a gente não paga<br />
os professores como eu gostaria, mas um<br />
professor lá para 20 horas e mais quatro<br />
de hora atividade, que a gente chama,<br />
está recebendo mil reais e aquele que tem<br />
ensino médio. Em relação a uma média<br />
nacional, a gente não está tão abaixo, mas<br />
tem perdido professor, não para a rede<br />
privada, mas para outros serviços que não<br />
o de dar aulas, enfim. Falando um pouco<br />
na linha que você colocou, por exemplo,<br />
em Santo André, nós proibimos as escolas<br />
para arrecadar. Primeiro, porque você cria,<br />
às vezes, situações muito complicadas, então<br />
você tem empresas como a Firestone,<br />
a Pirelli, que querem participar de programas<br />
de políticas públicas, então eles que<br />
façam para o conjunto da rede.<br />
Nós lá não trabalhamos com projeto-piloto:<br />
aquela escola vai ser privilegiada<br />
e o restante da rede não. Eu lembro<br />
da TetraPak que queria lançar um novo<br />
produto e queria... “deixa eu fazer uma<br />
experiência lá na sua escola”. Até as crianças<br />
vão ter condições de comprar aquele<br />
leite, depois em caixinha. Então, a gente<br />
tem que pensar em programas de segurança<br />
alimentar, a escola tem que pensar<br />
nisso. Hoje a gente tem escolas estaduais<br />
com cantinas, onde é uma fonte de recurso,<br />
onde a Secretária de Saúde vai fazer o<br />
levantamento idade e peso das crianças,<br />
as crianças estão obesas e desnutridas. E aí<br />
nós oferecemos merenda escolar e a merenda<br />
não tem aceitação. Óbvio, a merenda<br />
vai trabalhar em outro conceito. Então,<br />
a rede municipal não tem cantina, tem<br />
que comer a merenda, não pode levar lanche<br />
de casa. Tem gente que fala “mas, aí<br />
não é gestão democrática”. Mas os índices<br />
de desnutrição que a gente está vendo em<br />
torno da cidade, mais obesidade, fez com<br />
que a gente tomasse, sim, algumas decisões,<br />
que se você for ficar discutindo, você<br />
não implementa.<br />
Então, tem merenda diferenciada<br />
para as regiões onde você tem o grau de<br />
desnutrição maior. A gente faz experiência<br />
com a aceitação de merenda, onde é<br />
melhor, o que as crianças gostam mais<br />
ou menos. Mas essa questão para mim<br />
vai num paralelo de como chamavam a<br />
professora de tia. <strong>Prof</strong>essora é profissão,<br />
tem que ser respeitado. Tia é parente, tia<br />
ganha qualquer coisa. Qualquer coisa que<br />
você falar está bom, porque tia é assim.<br />
Agora, uma professora é profissional, ela<br />
tem que receber seu salário, ela tem suas<br />
garantias. Agora, isso não implica que a<br />
escola não se mobilize. Como a gente tem<br />
lá, 98% da cidade tem coleta seletiva, as<br />
escolas fazem parte, só que todas as escolas<br />
fazem, mas para melhorar aterro<br />
sanitário, por uma questão de conscientização,<br />
de trabalho ambiental. Porque<br />
também hoje a gente tem orgulho de ser<br />
62 SEMINÁRIO ABERTO
o primeiro país no mundo em reciclagem<br />
de alumínio. A gente tinha que ter vergonha.<br />
Porque, na verdade, é só geração de<br />
renda, as escolas separam o lixo, e os recicladores,<br />
porque a gente não está mais<br />
usando o nome de catadores. Os filhos deles<br />
tão lá na rede, e as mães falavam para<br />
a gente “se você não estudar, você vai catar<br />
coisa na rua”, não é assim? “Você vai<br />
puxar carroça”, você vai fazer determinadas<br />
coisas, então, não é questão da “Cartilha<br />
Politicamente Correta”, mas usar os<br />
termos corretos, eles são recicladores. Na<br />
verdade, aí está na frente mais a questão<br />
do recurso do que a questão ambiental.<br />
Então, a gente quer criar uma outra geração<br />
de crianças, que se preocupem sim<br />
com a questão ambiental, nas coisas mais<br />
simples, que não seja só latinha. Que a<br />
latinha dá mais dinheiro, mas seja o plástico,<br />
que seja o papel, que seja o jornal,<br />
que seja tudo que tem ali na escola. Senão,<br />
a gente cria, às vezes, programas, e<br />
as escolas públicas são muito assediadas<br />
para isso, depois a empresa resolve que<br />
não é mais aquele investimento que ela<br />
quer fazer, pega as coisas e vai embora, e<br />
a gente abriu a demanda. Parceria é uma<br />
coisa, agora, vincular as ações ou recursos<br />
é complicado. É para isso que eu acho que<br />
tem que envolver família. Mas a cidade, o<br />
país tem recursos, sim, para investir, é só<br />
colocar no lugar certo.<br />
PrOF. eDGar<br />
Depende do enfoque, você deve<br />
ter visto na televisão, agora diminuiu<br />
um pouco, mas teve um período que era<br />
mais intenso, a campanha da rede Globo<br />
“Amigos da Escola”. Qual era o caráter<br />
dessa campanha? Também era, e é, quem<br />
defende esse tipo de política, de transferir<br />
uma obrigação que é do estado, em<br />
matéria de educação, para a sociedade.<br />
Então, quando a casa da escola, a escola<br />
não pode participar de projetos na coletas?<br />
Pode! Pode fazer parcerias com outra<br />
empresa? Pode! Na rede estadual de São<br />
Paulo tem várias escolas que são projetospiloto<br />
por empresas. Itaú tem, Bradesco,<br />
em escolas do estado. Mas qual é o grande<br />
problema? Vocês viram que o governo<br />
federal comemorou arrecadação recorde<br />
de impostos, ou seja, se recolhe muito<br />
dinheiro <strong>dos</strong> impostos. Nós, professores,<br />
Gestão & Regionalidade - N o 13 - 2 o Semestre 2005<br />
somos compulsoriamente desconta<strong>dos</strong> no<br />
imposto de renda, na fonte, você não tem<br />
nem opção.<br />
Porque eu estou dizendo isso?<br />
Nós pagamos IR, IPTU, INSS. Com o volume<br />
que os administradores têm na mão,<br />
e se a sociedade não cobrar dela, dessa<br />
administração, que reverta tudo isso que<br />
ele recolheu para o serviço que a população<br />
necessitar, isso vai parar em outro<br />
lugar. Isso é um debate sério. Eu estou entre<br />
aqueles que defendem a idéia de que<br />
o estado deve cumprir sua obrigação, eu<br />
estou com a consigna da Revolução Francesa:<br />
a educação é um direito da população,<br />
um dever do estado. É isso. Vão dizer<br />
que sou comunista, não sou. A Revolução<br />
Francesa não foi uma revolução comunista;<br />
foi uma revolução burguesa, certo?<br />
Então, é simples. Agora, o que acontece;<br />
hoje nós carecemos de mecanismos dentro<br />
da sociedade para exigir da administração<br />
pública que aplique os recursos que ela arrecadou<br />
em benefício da população, esse<br />
é o problema. Nós temos “n” administradores<br />
públicos aí, que estão no poder e<br />
está comprovado que desviam dinheiro<br />
público etc., e fica por isso mesmo. Tem<br />
mil Malufs da vida, Barbalhos da vida,<br />
agora mais recente, o presidente do PSB e<br />
fica por isso mesmo, gente.<br />
Ou seja, a sociedade não exige,<br />
porque é muito distante a força dela para<br />
cobrar e exigir que o prefeito, que o governador<br />
aplique aquilo que efetivamente<br />
tem que ser aplicado: 25% na educação.<br />
Nem os conselhos do Fundef conseguem<br />
fiscalizar direito, é bom que se saiba disso.<br />
Perguntem lá para os seus representantes,<br />
se há transparência no que é dinheiro<br />
gasto, não há, infelizmente, não há.<br />
Não se sabe se de fato é aplicado ou não.<br />
Agora, o que está por trás, que a rede Globo<br />
faz isso, e outras empresas fazem isso,<br />
é porque existe todo um debate ainda, de<br />
que o estado, pelo menos o Brasil em particular,<br />
centraliza praticamente a totalidade<br />
da educação.<br />
Segundo da<strong>dos</strong> da Revista Exame<br />
de dois anos atrás, o sistema educativo<br />
brasileiro movimenta anualmente 90 bilhões<br />
de reais. Pode-se ter noção do que<br />
isso significa, não? É muito dinheiro. E<br />
todo mundo quer pegar uma fatia, evidentemente,<br />
até as empresas de ensino norteamericanas.<br />
É o que está por trás da ALCA,<br />
6
eles querem abocanhar a central de serviços<br />
(educação, saúde) e as riquezas, como<br />
a água. Então, as escolas podem. A legislação<br />
é até flexível quanto a isso, só que tem<br />
tudo um interesse público por trás.<br />
Em relação ao que o professor colocou<br />
ao índice de desempenho escolar, eu<br />
não sou muito de decorar números, mas<br />
se vocês pegarem o índice de desemprego<br />
do Saresp ou do Saeb do ano passado, não<br />
sei se vocês acompanharam, há contradições<br />
exatamente nessa linha que o colega<br />
colocou. Qual é? O governo do estado, via<br />
associação, diz: “nossos alunos chegam na<br />
segunda série, mais de 70% conseguem<br />
ler identificar um texto”, lembram disso?<br />
E os da<strong>dos</strong> do Saeb diziam “não, não<br />
é bem assim”. Tanto que a proposta do<br />
MEC e que alguns esta<strong>dos</strong> e municípios já<br />
adotaram porque a proposta LDB prevê a<br />
inclusão <strong>dos</strong> alunos de seis anos de idade<br />
no ensino fundamental. E o discurso<br />
que o MEC fez ano passado foi exatamente<br />
esse. É preciso incluir os alunos de seis<br />
anos no ensino fundamental para combater<br />
o problema do analfabetismo que<br />
está havendo. Porque mais de 80% <strong>dos</strong><br />
alunos que saem da primeira série e vão<br />
para a segunda série da rede pública do<br />
país chegam analfabetos na segunda. Então,<br />
não estamos falando nem da quarta<br />
série e nem da oitava série, onde os índices<br />
também são eleva<strong>dos</strong> quando se trata<br />
de baixa disciplina. Esse é um problema<br />
gravíssimo que eu, infelizmente, o coro<br />
do poder público é que o professor é responsável<br />
por isso. E eu tenho um frisson<br />
quando eu leio qualquer coisa da Sra.Rose<br />
Duprat da Silva. Na Revista Nova Escola de<br />
dezembro, ela declarou exatamente isso:<br />
o professor é desonesto. Só não disse com<br />
essas palavras: ele trabalhou e ganhou e<br />
não cumpriu sua obrigação, de ensinar os<br />
alunos. Exatamente por conta do baixo<br />
desenvolvimento que está havendo, que<br />
está revelando nos testes do Saeb e do<br />
próprio Sadesp.<br />
PrOFa. MarÍLIa<br />
Vou me solidarizar com o professor<br />
César porque essa é uma questão que<br />
realmente tem me preocupado. Entender<br />
um pouco essas políticas, o que elas trazem<br />
no sentido de uma efetiva melhoria<br />
no desempenho escolar, ou não. Então,<br />
eu penso na questão da proteção escolar,<br />
que vem deixar visível alguma coisa que<br />
no princípio não nos preocupava. Quer<br />
dizer, se nós pensarmos no desempenho<br />
escolar das várias gerações que nos antecederam,<br />
nós podemos observar que os<br />
índices de reprovação sempre foram bastante<br />
eleva<strong>dos</strong>. Temos um nível de 40%,<br />
50% de crianças que ficavam retidas e acabavam<br />
por serem expulsas muito antes de<br />
efetivarem o direito que têm de aprender<br />
a ler e a escrever, de se constituir como cidadão.<br />
Então, eu vejo na progressão consumada,<br />
uma crítica que dá visibilidade a<br />
essa questão. Os alunos estão dentro da<br />
escola, talvez isso incomode menos, então,<br />
é importante pensar sobre isso; que<br />
elas estão dentro da escola, não foram expulsas,<br />
só que com desempenhos absolutamente<br />
diferentes, diferencia<strong>dos</strong>. E essa<br />
visibilidade não é oferecida ao conjunto<br />
da sociedade. Nós não sabemos quantas<br />
crianças estão dentro disso.<br />
Na verdade, eu acho que é uma<br />
das questões mais sérias, eu entendo,<br />
que nós temos que enfrentar porque se a<br />
criança entra na escola, ela tem condições<br />
de aprendizado. Nós temos que oferecer<br />
condições para que ela siga aprendendo,<br />
não de uma maneira artificial. E, certamente,<br />
com classes de 40 alunos, com<br />
professores atuando 40 horas semanais,<br />
quando não 60, porque eu conheço vários<br />
professores que fazem seu exercício<br />
no Magistério manhã, tarde e noite para<br />
poderem sobreviver. E nós sabemos o desgaste<br />
que significa o fato de exercemos a<br />
função docente.<br />
Eu entendo a sua preocupação e<br />
não tenho respostas, efetivamente, não<br />
temos respostas, porque a única que eu<br />
poderia dar é que nós temos que continuar<br />
fazendo denúncias, porque, se nós nos<br />
acomodamos, aí a coisa fica pior. Essa questão<br />
é questão séria que é pouco discutida,<br />
pouco ventilada na imprensa, exatamente<br />
pela falta de visibilidade que dá em relação<br />
ao real aprendizado <strong>dos</strong> alunos. Então, os<br />
alunos chegam, o professor vai passando,<br />
vão saindo da escola, há um descongestionamento<br />
do sistema, vão chegando to<strong>dos</strong><br />
na quinta série, depois vão para o ensino<br />
médio, e assim por diante. Agora, com qual<br />
qualidade? Isso, os da<strong>dos</strong> têm mostrado. Se<br />
a gente pegar os da<strong>dos</strong> <strong>dos</strong> PIS o que eles<br />
vão mostrar? Que o Brasil está lá embaixo,<br />
64 SEMINÁRIO ABERTO
em termos de nível de desempenho escolar.<br />
Não é graça.<br />
PrOF. anTOnIO CarLOs GIL<br />
Queria saber se os nossos convida<strong>dos</strong><br />
têm mais alguma coisa a dizer sobre<br />
a municipalização do ensino, que fiquem<br />
a vontade.<br />
PrOFa. CLeUsa<br />
As pessoas que tiverem interesse,<br />
principalmente nas atividades, nos trabalhos,<br />
a rede está aberta, a Secretaria de<br />
Educação fica no quarto andar do Paço<br />
Municipal. As pessoas podem escolher. A<br />
Secretaria não determina quais podem ser<br />
visitadas. Edgar, meu Conselho do Fundef<br />
não me dá sossego. Na verdade, a gente<br />
investe recursos do Fundef na folha e eles<br />
conferem. São 900 professores pagos com<br />
o Fundef e eles conferem um por um. Eu<br />
acho que é o papel mesmo. Se há algum<br />
problema na folha, por um erro de digitação,<br />
eles apontam, não aprovam as contas<br />
e depois a gente volta. Acho que esse é o<br />
papel mesmo. É assim com o Conselho de<br />
Alimentação, Conselho de Merenda, Conselho<br />
de Fundef. Acho que tem que ser assim<br />
mesmo.<br />
PrOF. eDGar<br />
Esse tema está na ordem do dia,<br />
pelo menos para nós professores. Porque<br />
está em jogo, no caso <strong>dos</strong> professores,<br />
seu próprio emprego. Então, por<br />
exemplo, o projeto do Fundef que vai se<br />
transformando em lei, deixa em aberto a<br />
municipalização do ensino fundamental,<br />
eu digo isso porque eu conheço o projeto<br />
nos seus detalhes. Se, de fato, ocorrer<br />
isso, vai mexer com a nossa categoria do<br />
ponto de vista da organização e do ponto<br />
de vista do emprego, é bom que se saiba<br />
disso. Por isso o papel do Sindicato é<br />
ser coorporativo e defender primeiro os<br />
interesses da categoria, segundo, porque<br />
diz respeito à maior fatia da educação.<br />
Nós estamos falando de educação básica,<br />
um projeto que está aí, vai entrar no<br />
Congresso, infelizmente, a sociedade o<br />
discutiu pouco, eu sei que a gente debateu<br />
bastante isso, não sei qual o grau de<br />
apoio de todo mundo, mas o fato é que<br />
Gestão & Regionalidade - N o 13 - 2 o Semestre 2005<br />
nós precisamos debater porque vai mexer<br />
com a nossa vida.<br />
Mas o projeto está lá no forno,<br />
segundo a imprensa, vai lá para o Congresso.<br />
Isso significa que a bola vai ser passada<br />
para os deputa<strong>dos</strong> e depois para os senadores.<br />
Então, isso é um tema que deve ser<br />
debatido com tanta atenção e energia, da<br />
mesma forma com que está se debatendo<br />
a reforma universitária. E, infelizmente,<br />
não está acontecendo isso. Entendam que<br />
o debate passa por questionamentos, exige<br />
posicionamentos políticos, e nós sabemos<br />
que a educação foi, é, e amanhã será polêmica.<br />
Então, por exemplo, essa concepção<br />
de fundo não é uma idéia original das<br />
pessoas que estão aí. Os pioneiros, quando<br />
lançaram o manifesto, lançaram essa idéia<br />
de criação de fundo. O pai dessa idéia é<br />
um cidadão chamado Anísio Teixeira, essa<br />
idéia é velha. Não sei se ele concebia da<br />
forma que foi concebido o Fundef ou como<br />
está sendo concebido pelo MEC. O fato é<br />
que essa idéia é velha.<br />
Mas a conclusão da gente é que é<br />
preciso haver essa aliança com a comunidade<br />
escolar, com a sociedade porque se não<br />
houver isso, nós não mudaremos a educação.<br />
Se a sociedade não criar energia, posicionar<br />
as administrações municipais, estaduais,<br />
e federal para alocar mais recursos<br />
para a educação, nós não vamos mudar a<br />
educação. Eu não tenho ilusão, tem que ter<br />
luta, tem que ter pressão.<br />
A escola, na minha vida, mostra<br />
que as mínimas conquistas que tivemos<br />
sempre foram com luta. Quando não tem<br />
luta, não tem nada. Só vem retórica de afago,<br />
de amor, como diz o Gabriel Charita. E<br />
eu digo para vocês, nem casamento resiste<br />
só de afago e amor. Se não tiver a base<br />
material, minha gente, não tem casamento<br />
que resista.<br />
Só tenho a desejar boa sorte para<br />
nós nessa luta por uma educação de qualidade,<br />
válida para to<strong>dos</strong>.<br />
PrOFa. MarÍLIa<br />
Quero dizer que foi um privilégio<br />
estar com pessoas tão preocupadas, que<br />
exercem hoje o papel importante dentro<br />
das escolas municipais, como o professor<br />
Edgar que representa a categoria <strong>dos</strong> professores,<br />
até porque é isso que dá vontade<br />
de prosseguirmos em busca de novas pers-<br />
65
pectivas para se pensar numa educação de<br />
melhor qualidade. Eu tenho uma utopia,<br />
eu acredito que talvez a gente consiga chegar<br />
lá, melhorar a nossa educação. Agora,<br />
sem ter verbas públicas, sem propostas sé-<br />
rias, sem seriedade entre as pessoas, com<br />
certeza vai ficando bem mais difícil. Então,<br />
as idéia não são novas, elas estão aí. Que<br />
a gente saiba utilizá-las com bom proveito<br />
para a maioria da população.<br />
66 SEMINÁRIO ABERTO
DI AGUSTINI, Anapatrícia Morales Vilha<br />
O UsO Da InTerneT COMO InsTrUMenTO DO<br />
COMPOSTO DE MARKETING – UM ESTUDO<br />
EXPLORATÓRIO NAS INDÚSTRIAS PRODUTORAS<br />
De aUTOMÓVeIs Da reGIÃO DO aBC<br />
São Caetano do Sul: IMES [dissertação de mestrado em Administração], 2001<br />
Esmeralda Vicente*<br />
Desde seu surgimento no final <strong>dos</strong><br />
anos 1960, nos esta<strong>dos</strong> Uni<strong>dos</strong>, a internet<br />
tem se mostrado como a tendência emergente<br />
com maior potencial de inovação<br />
nos processos <strong>dos</strong> mais varia<strong>dos</strong> setores.<br />
No início da década de 1990, a<br />
revolução causada pelo advento do acesso<br />
à internet pelo grande público, proporcionou<br />
às empresas um novo canal de comunicação<br />
direta com seus consumidores, o<br />
que o torna objeto imprescindível de uso<br />
constante e eficaz a to<strong>dos</strong> que queiram um<br />
melhor approach com seus clientes.<br />
A característica da internet, de<br />
canal facilitador da comunicação, abriu<br />
portas para que as empresas maximizem<br />
suas atividades de vendas e, dentro deste<br />
contexto, o setor automobilístico mundial<br />
tem empenhado esforços na formulação<br />
de melhores sites, onde se ofereçam mais<br />
recursos aos compradores online, buscando<br />
com isso uma maior satisfação de suas necessidades<br />
e uma otimização de custos.<br />
Todavia, a internet não se restringe<br />
unicamente ao aspecto de divulgação,<br />
mas devido às suas características interativas<br />
e de alta penetração, vem se transformado<br />
em um imenso ambiente de negócios<br />
para a criação de produtos ou serviços,<br />
diferenciação de preços e distribuição.<br />
O Brasil posicionado em 12 o lugar<br />
no ranking internacional, em números<br />
de usuários da internet e 1 o na América<br />
do Sul, e sendo seu setor automobilístico<br />
um expressivo participante da economia<br />
nacional e gerador de empregos, avança<br />
significativamente nas práticas que envolvem<br />
o uso da rede nas empresas produtoras<br />
de automóveis.<br />
Quando se trata de competitividade<br />
de preços de automóveis e vendas na<br />
internet diretas do produtor, estabelece-se<br />
a relação com a possibilidade da desinter-<br />
*Aluna do Programa de Mestrado em Administração da Universidade IMES.<br />
Gestão & Regionalidade - N o 13 - 2 o Semestre 2005<br />
mediação de seus canais, portanto a distribuição<br />
de automóveis pela rede, no Brasil,<br />
tornou-se o epicentro desse tipo de transação,<br />
causando inclusive conflitos entre<br />
produtoras e concessionárias autorizadas.<br />
Atualmente, algumas empresas automobilísticas<br />
estão disponibilizando na internet<br />
informações detalhadas e complexas sobre<br />
suas linhas de modelos, especificações técnicas<br />
com desenhos, e seguindo como tendência<br />
a indicação do número de unidades<br />
disponíveis no estoque da fábrica e das<br />
concessionárias autorizadas.<br />
Nos esta<strong>dos</strong> Uni<strong>dos</strong>, estima-se<br />
que 50% <strong>dos</strong> compradores de carros novos<br />
sejam influencia<strong>dos</strong> pela intenet na<br />
compra; no Brasil há cerca de 350 sites<br />
opera<strong>dos</strong> por montadoras, 4 mil, por concessionárias<br />
autorizadas e 150, por fornecedores<br />
de serviços de autopeças e, em<br />
muitos deles, já é possível negociar até<br />
mesmo o preço final do automóvel (Menai,<br />
2000, p. 18).<br />
A Ford Motors e a General Motors<br />
parecem ser as empresas produtoras<br />
que mais apostam globalmente no potencial<br />
do comércio eletrônico de automóveis<br />
(Vilardaga, 2000b, p. 1). A GM pretende<br />
ganhar a mesma agilidade que as empresas<br />
que operam na internet em outros setores,<br />
estabelecendo uma estreita relação<br />
com o consumidor final, na venda de seus<br />
produos. Já a Ford Motors utiliza-se de<br />
aplicações voltadas para a empresa e para<br />
os fornecedores (business to business ou<br />
B2B – atividade que reduz custo e tempo<br />
de produção e pode identificar automaticamente<br />
e reagir à demanda); entre a empresa<br />
e os clientes (business to consummer<br />
B2C – atividade que contempla estratégias<br />
de venda, compra e entrega de produtos,<br />
de acordo com a necessidade do cliente),<br />
e também para fortalecer o vínculo entre<br />
67
os consumidores, para isso realizou alianças<br />
com empresas como Yahoo, Oracle e<br />
HP/MCIWORDCOM.<br />
Apesar de realizar vendas pela<br />
internet , a Ford Motors realça que as concessionárias<br />
autorizadas continuarão sendo<br />
o braço do varejo do sistema de fabricação;<br />
a Volkwagen, por sua vez, na sede<br />
brasileira, vale-se de avançada utilização<br />
da internet entre as suas sedes nos esta<strong>dos</strong><br />
Uni<strong>dos</strong> e Europa.<br />
Em um meio em que a agilidade<br />
é fator intrínseco, os impactos deste processo<br />
(uso da internet) se fazem sentir<br />
de modo direto em variáveis como: faturamento<br />
(crescimento das vendas por<br />
causa de seu grande alcance), produção<br />
(mediante recursos tecnológicos, é feito o<br />
que se vende ou já está vendido) e marketing<br />
(considerando a diminuição no envio<br />
de catálogos de produtos e outros materiais<br />
promocionais).<br />
Para que os consumidores sejam<br />
atraí<strong>dos</strong> para esse meio de comercialização,<br />
busca-se facilitar formas de pagamento,<br />
financiamento e preço mais baixo, além<br />
de sites cada vez mais atrativos, interessantes<br />
e, principalmente, seguros, a preocupação<br />
com a segurança nas transações<br />
comerciais, tem feito com que empresas de<br />
tecnologia e de cartão de crédito, invistam<br />
no avanço de novas técnicas e ferramentas<br />
para tornar cada vez mais seguras as atividades<br />
via rede.<br />
A inserção da utilização da internet<br />
nas transações comerciais e de relacionamento<br />
com o consumidor de automóveis<br />
e os conflitos com os canais de distribuição<br />
(concessionárias autorizadas) traduzem<br />
grande modificação num setor, que pouco<br />
mudou desde Henry Ford em 1908.<br />
Um <strong>dos</strong> maiores obstáculos que<br />
o Brasil enfrenta para o crescimento do<br />
comércio eletrônico é de origem cultural,<br />
conforme Adriano (1999, p. 22-23), o<br />
comprador prefere ainda se deslocar fisicamente<br />
até a loja, tem o hábito do contato<br />
físico com o produto, antes de comprá-lo,<br />
mas isso está mudando, de acordo com a<br />
colocação feita pela Volkswagen, que há<br />
o crescimento de um perfil de consumidor<br />
sem tempo para realizar suas compras de<br />
forma física e com isso as faz de forma virtual;<br />
à medida em que forem sendo cria<strong>dos</strong><br />
mecanismos de familiaridade com a tecnologia,<br />
essa cultura do contato físico, pode<br />
6 RESENHA<br />
ser mudada. As empresas do setor buscam<br />
maneiras para que cada vez mais essa nova<br />
forma de relacionamento com seus clientes<br />
seja uma prática comum.<br />
Para a realização desta análise<br />
do uso da internet como ferramenta do<br />
composto de marketing, foram escolhidas<br />
as empresas: Ford do Brasil Ltda., General<br />
Motors do Brasil Ltda. e Volkswagen do<br />
Brasil Ltda, por terem sua produção de automóveis<br />
na região do ABC, além de suas<br />
áreas comerciais e de vendas encontraremse<br />
localizadas em suas sedes.<br />
Para o cumprimento <strong>dos</strong> objetivos<br />
deste estudo, foi utilizada a pesquisa<br />
exploratória, a partir de um levantamento<br />
de campo de natureza qualitativa. O levantamento<br />
foi realizado de forma direta<br />
com os executivos das empresas objetos do<br />
estudo, que, por fazerem parte de um universo<br />
muito pequeno, foram consideradas<br />
todas as empresas que o constitui, são elas<br />
Ford do Brasil Ltda., General Motors do<br />
Brasil Ltda. e Volkswagen do Brasil Ltda;<br />
não havendo, portanto, uma análise estatística<br />
<strong>dos</strong> da<strong>dos</strong>.<br />
Se o grupo de pessoas for pequeno<br />
a ponto de viabilizar o levantamento direto<br />
de informações a to<strong>dos</strong> os elementos,<br />
faz-se um censo (Minciotti, 1999, p. 36; Gil,<br />
1999, p. 70). Para a coleta de da<strong>dos</strong> primários<br />
deste estudo, foram uilizadas entrevistas<br />
informais – realizadas em dezembro de<br />
2000 – com gerentes e analistas de negócios<br />
liga<strong>dos</strong> à área de marketing e internet<br />
e a observação simples junto aos sites das<br />
empresas em questão.<br />
Os da<strong>dos</strong> secundários foram coleta<strong>dos</strong><br />
através de pesquisa bibliográfica,<br />
por meio de registros estatísticos e de comunicação<br />
de massa e também livros. Optou-se<br />
por seguir como etapas de análise a<br />
categorização de variáveis de análise, tabulação<br />
<strong>dos</strong> resulta<strong>dos</strong> e confrontação <strong>dos</strong><br />
da<strong>dos</strong> obti<strong>dos</strong> com o referencial teórico.<br />
A Volkswagen pretende ampliar<br />
os recursos de propagação de seus produtos<br />
pela internet, com a inserção de banners<br />
em vários sites liga<strong>dos</strong> ao setor, programas<br />
de fidelização de clientes em seu<br />
site e ainda uma ampliação da linha de<br />
produtos para venda na internet, com a<br />
integração de sistema de pagamento. Com<br />
estrutura simples, sem ícones que remetam<br />
diretamente aos produtos, a empresa<br />
busca recursos de navegação fluida em seu
site, com informações atualizadas, principalmente<br />
com as promoções do mês.<br />
A General Motors, com a realização<br />
de promoções e incentivos a curto prazo,<br />
mostrou que deseja ampliar o número<br />
de produtos vendi<strong>dos</strong> pela rede e também<br />
criar novos centro de distribuições customiza<strong>dos</strong>.<br />
Seu site, com maior eficiência de<br />
recursos, fornece ao usuário a possibilidade<br />
de entrar e sair de uma pagina sem a<br />
necessidade de dirigir-se à página inicial,<br />
evitando assim que o usuário fique perdido<br />
na sequência de informações ou em sua<br />
busca pelo produto que deseja.<br />
A Ford, com a inserção de banners<br />
em sites liga<strong>dos</strong> ou não ao segmento automobilístico,<br />
investe no aprimoramento<br />
do relacionamento entre consumidores<br />
via rede, e para tanto busca implantar<br />
recursos de CRM (Customer Relationship<br />
Management – ferramenta de integração<br />
de da<strong>dos</strong> que captura, processa, analisa e<br />
distribui os da<strong>dos</strong> focaliza<strong>dos</strong> no cliente)<br />
na internet. Busca também ambientes de<br />
discussões entre consumidores e a empresa<br />
visando melhora do processo produtivo.<br />
O site apresenta-se de forma satisfatória<br />
ao usuário, bastante completo e se mostra<br />
eficiente como canal de comunicação com<br />
o consumidor.<br />
As empresas devem manter este<br />
canal atualizado e acessível, pois é o que<br />
garante aos consumidores a possibilidade<br />
de conceber seus produtos a partir de suas<br />
preferências. Segundo Kotler (1998, p. 32),<br />
o produto exige uma atenção constante<br />
para estar sempre adaptado às necessidades<br />
e aos gostos do consumidor ou para<br />
fazer frente à entrada de um concorrente<br />
no mercado.<br />
Duas das empresas estudadas, se<br />
destacam por apresentarem satisfatórios<br />
rols de itens (entre eles cor, elementos opcionais<br />
e potência do motor) para o usuário<br />
escolher e compor seu automóvel via<br />
internet, são elas General Motors e Ford<br />
Motors, no site da Volkswagen, portanto,<br />
nota-se uma limitação da possibilidade de<br />
escolha por parte do consumidor.<br />
As três empresas, no entanto,<br />
disponibilizam informações técnicas sobre<br />
seus produtos em seus sites, em nível<br />
satisfatório; inclusive a General Motors e<br />
a Volkswagem utilizam simuladores de visualização<br />
<strong>dos</strong> itens opcionais escolhi<strong>dos</strong>.<br />
Ficou constatado também que, em todas as<br />
Gestão & Regionalidade - N o 13 - 2 o Semestre 2005<br />
empresas, o universo das escolhas fica restringido<br />
aos periféricos, a estrutura básica<br />
<strong>dos</strong> automóveis mantêm-se.<br />
Essa prática do uso da internet<br />
para a concepção <strong>dos</strong> produtos e via de<br />
troca de informações, tanto técnicas como<br />
tecnológicas <strong>dos</strong> processos, facilitam às<br />
empresas conhecer melhor seus consumidores,<br />
saber o perfil de preferências<br />
<strong>dos</strong> seus merca<strong>dos</strong>-alvo de forma barata,<br />
rápida e da fonte mais segura possível, o<br />
próprio cliente é quem fornece as informações.<br />
A única desvantagem deste processo<br />
apontada pelas empresas estudadas é a<br />
ausência de estruturas compatíveis com a<br />
demanda que proporciona.<br />
Quanto ao planejamento e esforço<br />
promocional na internet, as três<br />
empresas enfocam a importância da sinergia<br />
entre as mídias off-line e online, enquanto<br />
a mídia online resulta em ação de<br />
compra e conexão <strong>dos</strong> compradores aos<br />
show-rooms, de uma forma mais agradável,<br />
graças aos seus recursos de natureza<br />
visual e auditiva, a off-line continua informando<br />
a existência <strong>dos</strong> produtos e de seus<br />
benefícios. Uma não substitui a outra, mas<br />
devem estar em sintonia.<br />
No tocante ao preço final, a General<br />
Motors diz que a vantagem está na<br />
redução de impostos estabeleci<strong>dos</strong> pelo<br />
governo, o que possibilita um preço mais<br />
competitivo, a Ford e a Volkswagen dizem<br />
não atrelarem a composição <strong>dos</strong> preços à<br />
internet, mas a Ford Motors admite que<br />
há uma redução deste, por conta de um<br />
redimensionamento no processo de produção,<br />
já a Volkswagen pratica o mesmo<br />
preço tanto na venda física, como na virtual.<br />
Porém não há estu<strong>dos</strong> que comprovem<br />
uma melhora no custo de produção<br />
de um produto por ser este vendido de<br />
forma virtual.<br />
Com o uso da rede, há o favorecimento<br />
da criação de novos centros de<br />
distribuição, otimizando assim as entregas<br />
<strong>dos</strong> pedi<strong>dos</strong>, além da redução de estoques<br />
nas concessionárias.<br />
A autora, através deste estudo,<br />
constatou que, nas empresas produtoras<br />
de automóveis do ABC, utiliza-se a internet<br />
como ferramenta de concepção, promoção<br />
e distribuição de produtos em seus compostos<br />
de marketing, sendo essas atividades<br />
favorecidas pelo uso de recursos tecnológicos<br />
<strong>dos</strong> sites.<br />
69
Na formação de preço, a rede não<br />
é utilizada, apesar de admitirem que uma<br />
há certa redução no preço final por conta<br />
de outros fatores, que não diminuição <strong>dos</strong><br />
custos de produção. Fica, porém, evidente<br />
neste estudo que há a intenção de expansão<br />
<strong>dos</strong> meios de utilização da internet<br />
como instrumento de relacionamento e<br />
venda de automóveis junto aos seus consumidores;<br />
para isso, nota-se uma disposição<br />
de investimentos, através da criação<br />
de centros de distribuição, ampliação das<br />
70 RESENHA<br />
linhas de produtos ofereci<strong>dos</strong> via rede e<br />
melhora <strong>dos</strong> processos produtivos, o que<br />
reforça a idéia de um crescimento exponencial<br />
para os próximos anos.<br />
Por ser esta uma pesquisa de natureza<br />
exploratória, seus resulta<strong>dos</strong> não<br />
podem ser vistos como conclusivos; entretanto,<br />
buscou-se apresentar o cenário do<br />
uso da internet como ferramental dentro<br />
do composto de marketing e sua utilização<br />
por parte das empresas produtoras de automóveis<br />
do ABC.