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entreatos de uma vida não fascista - Grupo de Estudos em ...

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Nesse sentido, a matriz das relações <strong>de</strong> gênero é anterior à <strong>em</strong>ergência do"ser<br />

h<strong>uma</strong>no". Consi<strong>de</strong>r<strong>em</strong>os a interpelação médica que, apesar da <strong>em</strong>ergência recente<br />

das ecografias, transforma <strong>uma</strong> criança, <strong>de</strong> um ser "neutro" <strong>em</strong> um "ele" ou <strong>em</strong> <strong>uma</strong><br />

"ela": nessa nomeação, a garota torna-se <strong>uma</strong> garota, ela é trazida para o domínio da<br />

linguag<strong>em</strong> e do parentesco através da interpelação do gênero. Mas esse tornar-se<br />

garota da garota <strong>não</strong> termina ali; pelo contrário, essa interpelação fundante é<br />

reiterada por várias autorida<strong>de</strong>s, e ao longo <strong>de</strong> vários intervalos <strong>de</strong> t<strong>em</strong>po, para<br />

reforçar ou contestar esse efeito naturalizado. A nomeação é, ao mesmo t<strong>em</strong>po, o<br />

estabelecimento <strong>de</strong> <strong>uma</strong> fronteira e também a inculcação repetida <strong>de</strong> <strong>uma</strong> norma.<br />

(BUTLER, 1999, p. 161)<br />

No segundo capítulo, apresento <strong>uma</strong> outra Patrícia possível, distante das molduras,<br />

caricaturas, estilizações, <strong>em</strong> um recorte dinâmico que abarca suas ansieda<strong>de</strong>s políticas na<br />

década <strong>de</strong> 1930: a autora <strong>de</strong> um romance sobre mulheres operárias ainda pouco discutido e<br />

estigmatizado pela crítica literária.<br />

No romance, discuto a representação das personagens operárias; a dinâmica das<br />

relações <strong>de</strong> gênero; a regulamentação da <strong>vida</strong> social; b<strong>em</strong> como mapeio os modos <strong>de</strong><br />

existência <strong>de</strong>ssas mulheres capazes <strong>de</strong> resistir<strong>em</strong> às novas tecnologias inscritas no processo <strong>de</strong><br />

metropolização <strong>de</strong> São Paulo. Qu<strong>em</strong> são essas mulheres? Suas materialida<strong>de</strong>s corporais são<br />

atravessadas por quais investimentos discursivos? Os enfrentamentos tracejam possíveis<br />

estilísticas da existência, linhas <strong>de</strong> fuga 8 <strong>em</strong> seus modos <strong>de</strong> subjetivação? A presença <strong>de</strong>ssas<br />

mulheres <strong>em</strong> espaços marcados como masculinos é circunscrita?<br />

Entre às representações <strong>de</strong> progresso material que circulavam no projeto do Estado<br />

Nacional Varguista está a ironia da narradora como categoria revolucionária que revela as<br />

mazelas, as disparida<strong>de</strong>s e <strong>de</strong>smascara o tom apaziguador <strong>de</strong>sse processo que reivindica e<br />

produz trabalhadores disciplinados.<br />

Em meio a estes novos traçados urbanos, estabeleço a tarefa <strong>de</strong> evi<strong>de</strong>nciar os<br />

vínculos entre a elite paulistana, com seu tradicional i<strong>de</strong>al <strong>de</strong> brasilida<strong>de</strong>, e o projeto <strong>de</strong><br />

mo<strong>de</strong>rnização <strong>em</strong>preendido pelo governo Vargas para discutir como a produção <strong>de</strong> Patrícia<br />

Galvão aqui analisada adquire efeitos <strong>de</strong> um dispositivo <strong>de</strong> resistência.<br />

Nesse entendimento, ressalta-se que a participação <strong>de</strong> Patrícia Galvão no baluarte do<br />

movimento antropofágico, a Revista <strong>de</strong> Antropofagia, se dá na segunda fase, chamada <strong>de</strong> 2ª<br />

Dentição (1929), quando sob a alcunha <strong>de</strong> Pagu assina <strong>de</strong>senhos, artigos e poesias. Vale<br />

<strong>de</strong>stacar que antes <strong>de</strong>ssa colaboração, a artista estreava nas páginas da revista carioca Para<br />

8 ―Fugir <strong>não</strong> é renunciar às ações, nada mais ativo que <strong>uma</strong> fuga. É o contrário do imaginário. É também fazer<br />

fugir, <strong>não</strong> necessariamente os outros, mas fazer alg<strong>uma</strong> coisa fugir, fazer um sist<strong>em</strong>a vazar como se fura um<br />

cano. ... Fugir é traçar <strong>uma</strong> linha, linhas, toda <strong>uma</strong> cartografia. Só se <strong>de</strong>scobre mundos através <strong>de</strong> <strong>uma</strong> longa<br />

fuga quebrada‖. (DELEUZE, 1998, p. 30)<br />

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