entreatos de uma vida não fascista - Grupo de Estudos em ...
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1.1 A Fina Estampa dos Estereótipos: celebração e estilização <strong>de</strong> Pagu <strong>em</strong> seu<br />
centenário<br />
A diss<strong>em</strong>inação <strong>de</strong> conhecimentos coletivizados materializados <strong>em</strong> representações<br />
naturalizadas <strong>de</strong> Patrícia Galvão são parte das inquietações <strong>de</strong>ssa dissertação. Jo<strong>de</strong>let (2001)<br />
ao argumentar que a linguag<strong>em</strong> é construtora <strong>de</strong> realida<strong>de</strong>s, que dota <strong>de</strong> sentido e<br />
inteligibilida<strong>de</strong>, aponta também para a função estratégica das representações sociais <strong>em</strong><br />
engendrar<strong>em</strong> realida<strong>de</strong>s consensuais.<br />
Como a mídia assume um papel fundamental na compreensão da produção <strong>de</strong><br />
sentidos, discorr<strong>em</strong> Mary Spink e Benedito Medrado (2000, p. 58), seja porque é persuasiva<br />
no mundo cont<strong>em</strong>porâneo e, portanto instrumental na conformação da consciência mo<strong>de</strong>rna,<br />
seja porque confere <strong>uma</strong> visibilida<strong>de</strong> s<strong>em</strong> prece<strong>de</strong>ntes aos acontecimentos, incluindo aí as<br />
novas informações e <strong>de</strong>scobertas, retomo essa plataforma para discutir tanto o dispositivo da<br />
sexualida<strong>de</strong> quanto o do esquecimento.<br />
Entre a frase <strong>de</strong> Flávio <strong>de</strong> Carvalho, ainda recorrente, proferida <strong>em</strong> entrevista ao<br />
Supl<strong>em</strong>ento Literário <strong>de</strong> O Estado <strong>de</strong> São Paulo <strong>em</strong> 1964: ―Ela era <strong>uma</strong> colegial que Tarsila e<br />
Oswald resolveram transformar <strong>em</strong> boneca. Vestiam-na, calçavam-na, penteavam-na, até que<br />
se tornasse <strong>uma</strong> santa flutuando sobre as nuvens‖ (FURLANI; FERRAZ, 2010, p. 48) e a<br />
reportag<strong>em</strong> <strong>de</strong> junho <strong>de</strong> 2004 do jornal Folha <strong>de</strong> São Paulo sobre os 17 itens, incluindo <strong>uma</strong><br />
medalha recebida pela escritora <strong>em</strong> Santos, e <strong>uma</strong> carteira profissional original encontrados<br />
pela catadora <strong>de</strong> lixos Selma Sarti estão dispostas as mesmas matrizes <strong>de</strong> sentido inerentes ao<br />
dispositivo <strong>de</strong> sexualida<strong>de</strong>:<br />
Musa do mo<strong>de</strong>rnismo brasileiro, Pagu acabou no lixo <strong>de</strong> São Paulo. O olhar<br />
lânguido, os cabelos morenos encaracolados, a boca coberta do batom mais<br />
vermelho que encantaram Oswald <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong> e cia. Foram jogados <strong>em</strong> um saco <strong>de</strong><br />
plástico azul e <strong>de</strong>ixados <strong>em</strong> <strong>uma</strong> esquina do Butantã. (MACHADO, 2004).<br />
A imag<strong>em</strong> <strong>de</strong> Pagu que se institui, material e simbolicamente, por ex<strong>em</strong>plo, nos<br />
artigos sobre seu centenário, se expressa por meio <strong>de</strong> superfícies discursivas que se<br />
<strong>de</strong>sdobram <strong>em</strong> dinâmicas <strong>de</strong> exotização, da f<strong>em</strong>inilida<strong>de</strong> incontrolável, <strong>de</strong> coadjuvante<br />
inveterada <strong>de</strong> Oswald <strong>de</strong> Andra<strong>de</strong>. As representações <strong>de</strong>ssas práticas permit<strong>em</strong> verificar o<br />
estabelecimento <strong>de</strong> um campo discursivo, como atenta, Michel Foucault, e <strong>de</strong> seus<br />
procedimentos <strong>de</strong> exclusão que engendram o discurso verda<strong>de</strong>iro:<br />
Assim, só aparece aos nossos olhos <strong>uma</strong> verda<strong>de</strong> que seria riqueza, fecundida<strong>de</strong>,<br />
força doce e insidiosamente universal. E ignoramos, <strong>em</strong> contrapartida, a vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
verda<strong>de</strong>, como prodigiosa maquinaria <strong>de</strong>stinada a excluir todos aqueles que, ponto<br />
por ponto, <strong>em</strong> nossa história procuraram contornar essa vonta<strong>de</strong> <strong>de</strong> verda<strong>de</strong> e<br />
recolocá-la <strong>em</strong> questão contra a verda<strong>de</strong>. (FOUCAULT, 2006a, p. 20)<br />
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