E que eu não caia sem antes ter entesado a última ... - cpvsp.org.br
E que eu não caia sem antes ter entesado a última ... - cpvsp.org.br
E que eu não caia sem antes ter entesado a última ... - cpvsp.org.br
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
MARÇO/93 TUPARI 11<<strong>br</strong> />
O problema do suicídio en-<<strong>br</strong> />
tre os Kaiowá começa a<<strong>br</strong> />
adquirir índices preocup<strong>antes</strong><<strong>br</strong> />
em meados da década de 70<<strong>br</strong> />
quando chama a atenção das<<strong>br</strong> />
instituições <strong>que</strong> atuam entre<<strong>br</strong> />
os Kaiowá de Mato Grosso do<<strong>br</strong> />
Sul. Entretanto, em 1991 os<<strong>br</strong> />
casos de suicídio aumentaram<<strong>br</strong> />
na área de Dourados, atraindo<<strong>br</strong> />
a atenção da mídia nacional e<<strong>br</strong> />
in<strong>ter</strong>nacional.<<strong>br</strong> />
Não há consenso entre os<<strong>br</strong> />
indigenistas e estudiosos do<<strong>br</strong> />
assunto, so<strong>br</strong>e as causas <strong>que</strong><<strong>br</strong> />
levam os Kaiowá ao suicídio e<<strong>br</strong> />
os motivos atribuídos. Formu-<<strong>br</strong> />
lações do senso comum, va-<<strong>br</strong> />
riam principalmente entre:<<strong>br</strong> />
perda do espaço físico (<strong>ter</strong>ra),<<strong>br</strong> />
reação às religiões pentecos-<<strong>br</strong> />
tais, excesso de bebida alcoó-<<strong>br</strong> />
lica, imposição do trabalho<<strong>br</strong> />
como bóia-fria nas fazendas<<strong>br</strong> />
da região, perda da cultura e<<strong>br</strong> />
desestruturação da <strong>org</strong>aniza-<<strong>br</strong> />
ção familiar. Quase todos re-<<strong>br</strong> />
J^^Su^djOud^<<strong>br</strong> />
O SUICíDIO KAIOWA<<strong>br</strong> />
J-C&r^yükün ajvrr^cuixiJicxfD-<<strong>br</strong> />
conhecem o encadeamento de<<strong>br</strong> />
vários fatores gerando uma si-<<strong>br</strong> />
tuação crítica ao limite extre-<<strong>br</strong> />
mo do suicídio.<<strong>br</strong> />
Grande número de repórte-<<strong>br</strong> />
res, psicólogos, psiquiatras,<<strong>br</strong> />
etc, ascendem curiosamente à<<strong>br</strong> />
área Kaiowá de Dourados<<strong>br</strong> />
buscando insistentemente nos<<strong>br</strong> />
índios uma resposta para as<<strong>br</strong> />
causas do suicídio. Furtam-se<<strong>br</strong> />
assim, de <strong>que</strong>stionar as insti-<<strong>br</strong> />
tuições de sua própria socie-<<strong>br</strong> />
dade so<strong>br</strong>e a responsabilidade<<strong>br</strong> />
das mesmas nesta situação crí-<<strong>br</strong> />
tica.<<strong>br</strong> />
Cabe perguntarmos, até <strong>que</strong><<strong>br</strong> />
ponto a atuação das <strong>org</strong>aniza-<<strong>br</strong> />
ções indigenistas <strong>não</strong> estão<<strong>br</strong> />
voltadas para si próprias, vi-<<strong>br</strong> />
sando ações imediatistas e in-<<strong>br</strong> />
<strong>ter</strong>esses políticos principal-<<strong>br</strong> />
mente na<strong>que</strong>las de cará<strong>ter</strong> go-<<strong>br</strong> />
vernamental: federal, estadual<<strong>br</strong> />
e municipal? Até <strong>que</strong> ponto<<strong>br</strong> />
estas ações <strong>não</strong> contribuem<<strong>br</strong> />
para manutenção dos Kaiowá<<strong>br</strong> />
na deplorável condição em<<strong>br</strong> />
<strong>que</strong> se encontram, à mercê de<<strong>br</strong> />
ações salvacionistas de cunho<<strong>br</strong> />
governamental, religioso ou<<strong>br</strong> />
filantrópico? Já <strong>que</strong> <strong>não</strong> con-<<strong>br</strong> />
vivemos em nossa região com<<strong>br</strong> />
o flagelo da seca <strong>ter</strong>íamos<<strong>br</strong> />
uma versão similar mais tími-<<strong>br</strong> />
da, mas igualmente maléfica:<<strong>br</strong> />
a indústria do suicídio? Até<<strong>br</strong> />
<strong>que</strong> ponto estas ações <strong>não</strong><<strong>br</strong> />
mantêm os laços estabeleci-<<strong>br</strong> />
dos, perpetuando uma situa-<<strong>br</strong> />
ção de inferioridade onde os<<strong>br</strong> />
benefícios alcançados são<<strong>br</strong> />
<strong>sem</strong>pre conjunturais, contin-<<strong>br</strong> />
gentes e passageiros?<<strong>br</strong> />
Podemos nos perguntar ain-<<strong>br</strong> />
da em <strong>que</strong> medida in<strong>ter</strong>essa de<<strong>br</strong> />
fato à maioria das instituições<<strong>br</strong> />
indigenistas conhecer a reali-<<strong>br</strong> />
dade vivida pelos Kaiowá e<<strong>br</strong> />
considerar essa mesma reali-<<strong>br</strong> />
dade na formulação de s<strong>eu</strong>s<<strong>br</strong> />
projetos, se a maoria delas ne-<<strong>br</strong> />
ga o cará<strong>ter</strong> de al<strong>ter</strong>idade à<<strong>br</strong> />
sociedade Kaiowá atuando na<<strong>br</strong> />
perspectiva da integração ou<<strong>br</strong> />
conversão religiosa?<<strong>br</strong> />
A repercursão da divulga-<<strong>br</strong> />
ção na imprensa dos casos de<<strong>br</strong> />
suicídio provocou a prolifera-<<strong>br</strong> />
ção de iniciativas de progra-<<strong>br</strong> />
mas de apoio criando para os<<strong>br</strong> />
Kaiowá um quadro complexo<<strong>br</strong> />
e extremamente confuso; pro-<<strong>br</strong> />
gramas foram iniciados geran-<<strong>br</strong> />
do grande expectativa e <strong>não</strong><<strong>br</strong> />
tiveram seqüência (por exem-<<strong>br</strong> />
plo, "Nosso índio, Um Cida-<<strong>br</strong> />
dão" — governo do M.S., e<<strong>br</strong> />
Fundação Nacional de Saúde).<<strong>br</strong> />
Outros nem sairam do papel.<<strong>br</strong> />
É urgente uma mudança no<<strong>br</strong> />
enfo<strong>que</strong> e tratamento dispen-<<strong>br</strong> />
sados à <strong>que</strong>stão do suicídio.<<strong>br</strong> />
Talvez a trave ainda esteja no<<strong>br</strong> />
nosso olho e o bárbaro <strong>não</strong> se-<<strong>br</strong> />
ja nesse caso, o "outro".<<strong>br</strong> />
Levi Mar<strong>que</strong>s Pereira é antropó-<<strong>br</strong> />
logo. Trabalha há 12 anos com<<strong>br</strong> />
os Guarani — Kaiowá e Nhan-<<strong>br</strong> />
deva. É metodista.<<strong>br</strong> />
(z££z_