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da pobreza, e em alguns casos este foi agravando (ALIER,<br />
2007). Paralelamente, os países desenvolvidos percebem<br />
que os efeitos dessa política acabavam repercutindo em seu<br />
território (KUOKKANEN, 2002).<br />
Como forma de conciliar proteção ambiental e<br />
crescimento econômico surge o ideal de desenvolvimento<br />
sustentável. Sua inserção nos documentos internacionais se<br />
dá pela primeira vez em 1987, com o Informe Brundtland<br />
das Nações Unidas, tendo sido definido como aquele que<br />
“satisfaz as necessidades presentes sem comprometer a<br />
capacidade das gerações futuras de satisfazer as suas”<br />
(Nosso futuro comum, 1987).<br />
A definição de desenvolvimento sustentável,<br />
além da proteção ambiental e do desenvolvimento,<br />
adiciona outro elemento complexo, que são os aspectos<br />
intrageracionais e intergeracionais. Dessa forma, se<br />
estabelece um comprometimento ético e filosófico com as<br />
próximas gerações, bem como, uma restrição à inclinação<br />
natural das gerações atuais de obter uma vantagem<br />
excessiva do seu controle temporário sobre os recursos<br />
ambientais, condicionando seu uso, de forma a mantê-los<br />
para as próximas gerações (WEISS, 1989).<br />
Apesar das inovações da noção de desenvolvimento<br />
sustentável, o termo possui um “alto grau de ambigüidade,<br />
ambivalência e ambição conceitual” e varia conforme os<br />
“parâmetros ideológicos ou intelectuais” utilizados, sendo<br />
contextualizado de formas distintas. A perspectiva ecológica<br />
prioriza a necessidade de manter os ecossistemas; a<br />
economia se interessa na internalização das externalidades;<br />
o discurso ético se volta para os princípios filosóficos<br />
universais, já a ciência política pela governabilidade e pela<br />
justiça distributiva (O´RIORDAN; VOISEY, 1998, p. 9).<br />
O conceito traz inúmeros questionamentos que<br />
deverão ser enfrentados no âmbito jurídico: quais são<br />
os objetivos a perseguir e como adaptá-los aos distintos<br />
contextos socioeconômicos; a adoção desse modelo<br />
exige que tipo de transformações econômicas e políticas;<br />
que estratégias facilitariam a formação dos consensos<br />
necessários para modificar as formas dominantes de<br />
distribuição da riqueza (FONT, 2000, p. 11).<br />
A flexibilidade desse conceito se evidencia no<br />
caso em tela, pois ambas as partes o utilizam como<br />
argumentação jurídica de seus posicionamentos. As partes<br />
não discutem sobre a existência do princípio, mas divergem<br />
sobre como se dá sua aplicação. A corte ao analisar a<br />
questão, reconhece o desenvolvimento sustentável como<br />
um conceito que expressa essa necessidade de conciliar a<br />
proteção ambiental e o crescimento econômico. Contudo,<br />
sua sentença no caso Gabcikovo-Nagymaros ilustra as<br />
dificuldades de definir o desenvolvimento sustentável na<br />
prática. A corte no parágrafo 141 vai atribuir essa tarefa as<br />
partes dizendo:<br />
“Não cabe à Corte determinar qual será o resultado<br />
final dessas negociações a serem conduzidas pelas partes.<br />
Cabe às próprias Partes encontrar uma solução que leve<br />
36<br />
em conta tanto os objetivos do tratado, os quais devem<br />
ser perseguidos de modo conjunto e integrado, como as<br />
normas de direito internacional do meio ambiente e os<br />
princípios do direito dos cursos d’água internacionais. A<br />
corte recorda nesse contexto que, conforme dito nos casos<br />
da plataforma continental do Mar Norte, “as partes têm<br />
obrigação de se conduzir de tal maneira que as negociações<br />
sejam frutíferas, o que não será o caso, se alguma delas,<br />
insistindo em sua posição não lhe admitir modificação<br />
alguma”.<br />
O voto separado, do vice presidente daquela<br />
corte, Juiz Weeramantry, eleva o status jurídico do<br />
desenvolvimento sustentável a categoria de principio de<br />
direito internacional. Seu posicionamento se funda no<br />
papel fundamental desse princípio em orientar a articulação<br />
entre desenvolvimento e proteção ambiental, na sua ampla<br />
aceitação pela comunidade global em diversos instrumentos<br />
jurídicos internacionais e na prática dos Estados. Tal<br />
entendimento parece mais apropriado no atual cenário,<br />
pois apesar de suas limitações práticas, cada vez mais esse<br />
conceito/princípio é assimilado nas práticas internacionais.<br />
Num contexto de crise ambiental, os Estados reconhecem<br />
a necessidade de promover alterações em sua forma de<br />
interagir com o ambiente, ainda que cheguem a um acordo<br />
sobre como proceder à aplicação prática desse princípio.<br />
Além disso, baseando se numa análise histórica,<br />
o Juiz Weeramantry identifica hábitos de culturas antigas<br />
que representam a idéia de desenvolvimento sustentável.<br />
Diante dessa constatação, ele defende que esse princípio<br />
corresponde a um dos valores mais antigos da humanidade,<br />
e, portanto, poderia ser concebido como ius gentium. Nesse<br />
sentido, afirma:<br />
“Não seria errado afirmar que entre os valores<br />
mais puros e universais, a exigir reconhecimento<br />
internacional, estão o amor pela natureza, o<br />
desejo de preservá-la e a necessidade de que a<br />
atividade humana respeite os requisitos para sua<br />
manutenção e continuidade.”<br />
O magistrado vai além do conteúdo estrito da<br />
sentença, e enfrenta a questão da necessidade de pensar a<br />
proteção do ambiente como uma obrigação erga omnes.<br />
No caso Barcelona Traction (Bélgica versus Espanha,<br />
1970) a CIJ faz uma distinção entre as obrigações de um<br />
Estado perante outro Estado (inter partes), e as obrigações<br />
do Estado perante toda a comunidade internacional (erga<br />
omnes). Segundo a CIJ, no segundo caso, todos os Estados<br />
têm um interesse jurídico na proteção de tais obrigações<br />
diante da importância dos direitos ali envolvidos.<br />
O reconhecimento da existência de um novo<br />
conceito de obrigação internacional muda radicalmente a<br />
responsabilidade dos Estados. As obrigações erga omnes<br />
prescindem de acordos bilaterais, pois implicam a todos os<br />
Estados. Tais normas pressupõem “um interesse coletivo,<br />
fundado sobre a existência de bens comunitários, que é<br />
considerado digno de proteção jurídica e determina uma<br />
solidariedade em nível universal” (VILLALPANDO, 2005,<br />
Revista Juris da Faculdade de Direito, São Paulo, v.3, jan/junho. 2010.