105 ARTE POPULAR, ARTE ERUDITA E MULTICULTURALIDADE ...
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Nuno Saldanha<br />
Alto Minho), que podemos encontrar um interessantíssimo conjunto de<br />
figuras, em muito ditadas pelo imaginário e pela criatividade popular.<br />
Assim, para além dos temas animalescos e seres fantásticos (sereias, a «bichamoura»<br />
da mítica popular), motivados pelo desejo de protecção, como representações<br />
de motivações antropopáticas, figuram-se homens e mulheres em<br />
poses impróprias, figuras nuas, grávidas, dançarinos, partes genitais, etc.<br />
Figura 3<br />
Cachorrada da igreja de Algozinho, Mogadouro, séc. XIII<br />
Podemos ver mesmo aí algumas<br />
figuras típicas do folclore<br />
na cional, como a re presentada<br />
na cachorrada da igreja români<br />
ca de Algozinho, em Moga -<br />
douro (Fig. 3), que nos recorda<br />
imediatamente as máscaras<br />
popu lares tradicionais daquela<br />
re gião de Bragança, como o<br />
Velho, o Chocadeiro, ou o Farandulo,<br />
ou mesmo os famosos<br />
Caretos, das zonas de Podende<br />
e La zarim (Fig. 4).<br />
Figura 4<br />
Máscara de Careto,<br />
Lazarim<br />
Como refere Meyer Schapiro, eles fazem parte de uma<br />
es fera da criação artística que está para além do conteúdo<br />
meramente religioso, impregnada dos va lores de<br />
espontaneidade, fantasia individual e deleite estético 5 .<br />
Efecti va men te, muitos destes elementos decorativos são<br />
inteiramente inúteis de um ponto de vista religioso-<br />
-didáctico e estrutural (Schapiro, 1984, 15). Eles fazem<br />
parte de um universo de emoções projectadas, imagens<br />
psicológicas de força, jogo, ansiedade e medo, muitas vezes derivados de elementos<br />
pré-cris tãos, do folclore ou de crenças populares. E não se destinam a<br />
um ensina mento religioso ou a um corpo doutrinal, ou dependentes de um<br />
simbolis mo teológico ou moral oculto, como pensavam alguns estudiosos.<br />
Se estes elementos escultóricos, patentes na arquitectura religiosa, revelam<br />
uma interessante transculturalidade, entre o foro do sagrado e do profano,<br />
ao mesmo tempo, tornam-se sintomáticos de distintos estratos culturais (e<br />
mesmo sociais), ou seja, entre o popular e o erudito.<br />
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