105 ARTE POPULAR, ARTE ERUDITA E MULTICULTURALIDADE ...
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Nuno Saldanha<br />
meiro quartel do século XX, o pintor português por excelência» 48 . Trinta<br />
anos depois, quando das comemorações do Cinquentenário da Morte de<br />
Malhoa, escrevia um novo artigo, a propósito do pintor, dizendo que a ele<br />
cou bera mostrar, pelo gosto, quais os valores tradicionais, senão castiços, da<br />
pátria em que nascera e verificá-los na sua obra, inserindo-o no espírito de<br />
uma burguesia citadina, embora de raízes rurais 49 (França, 1983, 10-13).<br />
É verdade que a «estética de poder» republicana, na sua busca pela simbologia,<br />
encenação e recriação da portugalidade, «minada pelo estrangeirismo»,<br />
se aproveitara da obra de Malhoa como forma de exemplo paradigmático da<br />
aplicação prática dos seus princípios políticos. Claro que não foi o único e<br />
muitos dos epítetos que lhe são atribuídos podemos encontrá-los referidos a<br />
outros artistas, numa extensa lista que vai desde Silva Porto ou Columbano,<br />
passando por Isaías Newton, Carlos Reis, José Campas, até Adriano de<br />
Sousa Lopes, a partir da década de 20 50 . O mesmo se passaria, aliás, nos<br />
mais diversos campos da cultura, da arquitectura, da literatura ou da música.<br />
Mas esta busca da especificidade cultural nacional não se ficava por aqui, ela<br />
desenvolvia-se também retrospectivamente, procurando na História os seus<br />
modelos paradigmáticos. Malogradamente, na pintura, não os havia, nomeadamente<br />
na Paisagem. E só o «mítico» Nuno Gonçalves haveria de sobressair,<br />
empolado ao limite.<br />
Seria precisamente a aposta de Malhoa na temática de Género, que possibilitaria<br />
este aproveitamento da sua obra e a consequente ascensão de prestígio,<br />
nomeadamente dentro das correntes estéticas ou estilísticas do Rea -<br />
lismo 51 . Malhoa não se tornou realista por fazer pintura de género, mas o<br />
Género acabou por o levar ao Realismo.<br />
Esta associação, entre o artístico e o político, de que o pintor se tornara alvo,<br />
era de facto uma tendência que se fazia crescente na primeira metade do sé -<br />
culo, quando, ao mesmo tempo, os nacionalismos europeus se desenvolviam<br />
de forma galopante.<br />
Apesar de tudo, das incongruências e das críticas, Malhoa não fora apenas<br />
vítima do seu sucesso. As circunstâncias acabariam por se tornar favoráveis,<br />
fazendo dele uma figura incontornável da história e historiografia da Arte<br />
Por tuguesa. E, ao mesmo tempo, torna-se num marco fundamental da cul-<br />
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