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No fio da navalha: literatura e violência no Brasil de hoje

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<strong>No</strong> <strong>fio</strong> <strong>da</strong> <strong>navalha</strong> 17<strong>de</strong>mográfica do país, o <strong>de</strong>senvolvimento <strong>da</strong> <strong>literatura</strong> sempre buscou umaexpressão a<strong>de</strong>qua<strong>da</strong> à complexi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> uma experiência que evoluiutendo como pa<strong>no</strong> <strong>de</strong> fundo a <strong>violência</strong> 1 .Tomando-se esse processo em linhas gerais, em princípio, a <strong>literatura</strong>regionalista, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> o seu <strong>de</strong>sejo inicial <strong>de</strong> traçar um mapa do país econquistar seu território, até o presente, vem representando a <strong>violência</strong>ain<strong>da</strong> articula<strong>da</strong> a uma reali<strong>da</strong><strong>de</strong> social em que, na ver<strong>da</strong><strong>de</strong>, vigora umsistema simbólico <strong>de</strong> honra e vingança individuais, uma vez que a leiain<strong>da</strong> não po<strong>de</strong> garantir a igual<strong>da</strong><strong>de</strong> entre os sujeitos. Sobretudo <strong>no</strong>século XX, “o tema principal do regionalismo po<strong>de</strong> ser visto, <strong>de</strong>ssa forma,como o confronto entre um sistema global <strong>de</strong> justiça mo<strong>de</strong>r<strong>no</strong> esistemas locais <strong>de</strong> <strong>no</strong>rmatização social regulado pelos códigos <strong>de</strong> honra,vingança e retaliação” 2 .Daí os temas do cangaço, <strong>da</strong> jagunçagem, dos heróis justiceiros dosertão, muito fortes sobretudo <strong>no</strong>s romances <strong>da</strong> “geração <strong>de</strong> 30”, que reaparecemalgumas déca<strong>da</strong>s <strong>de</strong>pois, transfundidos, em Guimarães Rosa ealguns outros, como Mário Palmério, Bernardo Elis, Gilvan Lemos etc., eaté em ple<strong>no</strong>s a<strong>no</strong>s 90, <strong>no</strong> Memorial <strong>de</strong> Maria Moura, <strong>de</strong> Rachel <strong>de</strong> Queiroz.De fato, percebe-se nesses textos uma espécie <strong>de</strong> verniz <strong>de</strong> civilização e<strong>de</strong> justiça, que se dilui ao me<strong>no</strong>r impacto, espalhando todo tipo <strong>de</strong> <strong>violência</strong>e <strong>de</strong>ixando visíveis antigas estruturas autoritárias que mantêmvivos velhos códigos <strong>de</strong> honra, uma vez que um sistema legal eficiente eneutro, característica <strong>da</strong> mo<strong>de</strong>rni<strong>da</strong><strong>de</strong>, ain<strong>da</strong> não conseguiu se implantar.Tais arroubos <strong>de</strong> <strong>violência</strong> também estão ligados a velhas concepções<strong>de</strong> masculini<strong>da</strong><strong>de</strong> e macheza, além <strong>de</strong> muitas vezes surgirem envoltos porum caráter <strong>de</strong> “santi<strong>da</strong><strong>de</strong>”, estruturante <strong>de</strong> um mundo particular e arcaico<strong>de</strong> códigos e relações sociais.O <strong>de</strong>senvolvimento <strong>da</strong> <strong>literatura</strong> urbana, por sua vez, segue um caminhoparalelo, <strong>da</strong>ndo outro matiz à representação <strong>da</strong> <strong>violência</strong>. Des<strong>de</strong> os primórdiosdo romance brasileiro, a ci<strong>da</strong><strong>de</strong> surge como o “pólo mo<strong>de</strong>rnizador”, centro dosvalores, hábitos e costumes <strong>da</strong> civilização européia, além <strong>de</strong> procurar ser reduto1Ver Scholhammer, “Os cenários urba<strong>no</strong>s <strong>da</strong> <strong>violência</strong> na <strong>literatura</strong> brasileira”, em Pereira, Linguagens<strong>da</strong> <strong>violência</strong>. Uma versão modifica<strong>da</strong> do mesmo artigo foi publica<strong>da</strong> em Rocha, Nenhum <strong>Brasil</strong>existe, com o título “O caso Fonseca: a procura do real”.2Id., p. 238.

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