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cultura - Pedro P. Ferreira

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28Como veremos a seguir, a história se complicava ainda mais na medida em queos Krahô atuais afirmam que são a justaposição de dois grupos Jê diferentes, quemantêm uma certa separação geográfica.Até agora, lidamos com minha segunda questão: o que é que pode serconstruído como forma de representação legal e legítima? Insisto na palavra“construído”, pois pode ser que a própria idéia de representação estivesse totalmenteausente entre os Krahô. O que significa, afinal, ‘costumeiro’ no relato acima? Escrevihá algum tempo que há uma falácia no conceito de direito costumeiro, no sentido deque ele é talhado para espelhar o direito positivo em todos os seus atributos.A noção de ‘costumeiro’ apresenta vários problemas em sua utilizaçãopragmática. Ela supõe que ‘costume’ (outra palavra para <strong>cultura</strong>) seja algo dado queprecisa apenas ser explicitado ou codificado. Além disso, supõe que unidades como‘os Krahô’, ‘os Katukina’, ‘os Kaxinawa’, ou tantas outras unidades étnicas, sejaentidades não problemáticas do mesmo tipo que, por exemplo, país. Isso érelativemente simples de entender. Mas que acontece se todo o nosso construto decoisas como sociedade, representação e autoridade não tiver (ou não tiver tido)nenhum equivalente entre esses povos? Os dois movimentos aparentemente opostos desubmeter as nações indígenas e de lhes dar poder se fundam idéia da existência decoisas como nações e autoridades locais, isto é, papéis sociais específicos comatributos tanto de autoridade quanto de representação legítima. Conseqüentemente,já desde o início do século XVI, Francisco de Vitoria falava de ‘príncipes’ indígenas ede seu ‘domínio’ sobre territórios, como se a existência destes fosse dada. Todo oprocedimento do requerimiento, que exortava as ‘nações indígenas’ que seconvertessem ao cristianismo, supõe a existência de autoridades indígenas locais comatributos comparáveis aos dos reis espanhóis. Em 1755, o Marques de Pombal ordenouo reconhecimento de ‘principais’ indígenas, numa prefiguração do Indirect Rulebritânico, uma decisão que demonstra um interessante exercício de imaginaçãopolítica. Chefes amazônicos receberam insígnias e supostos territórios sujeitos a suaautoridade, quer tal autoridade tivesse ou não existido anteriormente, muito emborana prática essas “autoridades indígenas” ganhassem um papel pouco mais quedecorativo.

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