13.07.2015 Views

cultura - Pedro P. Ferreira

cultura - Pedro P. Ferreira

cultura - Pedro P. Ferreira

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

50mais precisamente, no “domaine public payant” (sempre em francês, por razõeshistóricas). Isso significa que o conhecimento tradicional fica acessível a todos, masseus originadores têm direito a pagamento caso algum produto de valor comercial sejaderivada dele. Contudo, como veremos abaixo, em muitas sociedades tradicionaisexiste a noção de direitos privados sobre conhecimentos. Cheguei mesmo a sugeriruma correlação um tanto paradoxal: quanto menos uma sociedade concebe direitosprivados sobre a terra, mais ela desenvolve direitos sobre “matérias intangíveis”,exemplificados em particular pelo conhecimento. Como então apoiar um projeto quetem como consequência o “domaine public payant” para conhecimentos tradicionais,quando sabemos que isso muitas vezes é contrário ao direito costumeiro?Minha conclusão era a de que a contradição podia ser resolvida observandoque, quando consideramos direitos costumeiros, estamos nos movendo no campo das<strong>cultura</strong>s (sem aspas), ao passo que quando consideramos as propostas legaisalternativas e bem-intencionadas estamos no campo das “<strong>cultura</strong>s”.Decorre daí que dois argumentos podem ser simultaneamente verdadeiros:Direitos intelectuais existem em muitas sociedades tradicionais: isso dizrespeito a <strong>cultura</strong>.Há um projeto político que inclui organizações indígenas e não-indígenas e queconsidera a possibilidade de colocar o conhecimento tradicional no domínio público(payant): isso diz respeito a “<strong>cultura</strong>”.O que pode parecer um truque com palavras é na verdade uma conseqüênciada reflexividade que mencionei.A reflexividade e seus efeitos (com agradecimentos a Mauro Almeida).Sabemos, desde Bertrand Russell, que a reflexividade é a mãe de todos osparadoxos do tipo “o mentiroso”. O cretense que diz sobre si mesmo: “minto”, está aomesmo tempo mentindo e dizendo a verdade. Pois se estiver mentindo, estará dizendoa verdade; e se estiver dizendo a verdade, estará mentindo. O paradoxo, comoBertrand Russell foi o primeiro a notar, decorre da perigosa capacidade do cretense defalar sobre sua própria fala. Toda linguagem que possa falar de si mesma é dotadatambém da capacidade de fazer certas afirmações que são simultaneamente falsas everdadeiras. Isso acontece não só com a linguagem comum, mas também, comomostrou Alfred Tarski na década de 1930, com muitas outras sub-linguagens, inclusive

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!