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O intelectual, como exilado e amador, afirma Said (2005, p. 11), é alguém que se situa 4 à<br />
margem do poder, a fim de criticá-lo com independência e lucidez, desempenhando, em<br />
determinado contexto político, uma função primordial como criador ou transmissor de ideias e<br />
conhecimentos relevantes, atuando, decisivamente, no percurso social, histórico e cultural de um<br />
povo.<br />
Nessa perspectiva, a intelectual baiana Nivalda Costa, dramaturga, diretora e atriz,<br />
desempenhou importante função como transmissora de ideias, durante o regime militar (período<br />
aqui destacado), visando interferir no percurso dos acontecimentos através de sua produção, em<br />
especial, do teatro, tomando-o como instrumento de combate, através do qual buscou se<br />
comunicar com o público, incitando-o contra o governo autoritário, propondo transformação.<br />
A dramaturga, como pesquisadora, criou suas produções artísticas a partir de diferentes<br />
estudos, promovendo (re)leituras de diversas obras, articulando, agrupando, apropriando-se de<br />
discursos outros na constituição de seus textos, realizando escolhas que vão ao encontro de suas<br />
concepções ideológicas e estéticas, revelando-se, consequentemente, uma leitora dos clássicos,<br />
dos revolucionários e dos vanguardistas.<br />
A diretora, comprometida com o fazer teatral, envolvia-se em todos os aspectos<br />
referentes à representação, sempre interessada nos elementos cênicos (figurino, objetos usados<br />
em cena, iluminação, música, projeção de imagens, movimentos corporais etc.) e na<br />
performance dos atores. Executava um método próprio de trabalho com esses, em que tomava<br />
como base principal os aportes teóricos de Antonin Artaud. Demonstrava ainda confiança no<br />
profissionalismo e talento daqueles e aceitava improvisações e contribuições dos mesmos,<br />
havendo liberdade de expressão e espaço para que opinassem e criassem.<br />
Além dessas principais tarefas, Nivalda Costa também desempenhou a função de atriz, e<br />
atuou em alguns espetáculos, posicionando-se em diferentes momentos como parte do elenco,<br />
pronta para colocar em ação suas próprias “palavras pensamentos”, quando era responsável<br />
também pelo texto encenado.<br />
Dessa forma, fundem-se as funções da intelectual e da escritora, uma vez que Nivalda<br />
Costa utiliza-se de suas produções dramáticas e literárias para denunciar injustiças e abusos de<br />
poder. Portanto, como afirma Said (2004, p. 34), nesse caso, seu papel como escritora e<br />
intelectual pode ser discutido e analisado conjuntamente, na medida em que interfere na esfera<br />
pública.<br />
Percebe-se, em relação à dramaturgia de Nivalda Costa, uma militância política, voltada,<br />
sobretudo, para denunciar injustiças sociais, criar uma nova estética e reivindicar a posição do<br />
negro na sociedade. Verificam-se produções elaboradas e dirigidas por uma negra, muitas vezes,<br />
com personagens negros e temas relacionados à cultura e à resistência daqueles. Todavia, essa<br />
dramaturgia empreendida não se limita a um teatro negro, voltado somente a esse público, pois,<br />
como antropóloga, a mesma tem plena consciência da existência de uma única raça, a humana.