Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
Miguel Bemfica, CCO<br />
da MRM/McCann Spain,<br />
e um dos fundadores<br />
da Escola Cuca<br />
Nature/iStock<br />
miguel bemfica<br />
especial para o PROPmaRK<br />
Quando eu morava em São Paulo, alguns dias acordava<br />
às quatro da manhã. Pegava meu carro e me encontrava<br />
com meus amigos Marquinhos Meirelles e Tato Butori,<br />
entre outros, e dirigíamos por uma hora até o Guarujá.<br />
Ali, chegávamos antes do amanhecer. Às seis em ponto<br />
entrávamos na Praia do Tombo. Víamos o sol nascer.<br />
Tartarugas. Gaivotas. Peixes <strong>de</strong> todos os tamanhos.<br />
E o melhor: pegávamos algumas ondinhas em plena<br />
quarta-feira. Eram duas horas <strong>de</strong> surfe no mínimo. Lembro-me<br />
que a gente se trocava no meio da rua, tomávamos<br />
banho com a água mineral comprada no posto <strong>de</strong> gasolina<br />
ao lado. E voltávamos para a agência. Se na ida o caminho<br />
dava uma hora, na volta, graças ao trânsito, quase duas<br />
horas. Mas voltávamos com um sorriso <strong>de</strong> orelha a orelha,<br />
com lembranças maravilhosas das ondas do dia e muitas<br />
vezes chegávamos antes que muitos amigos que tinham<br />
se <strong>de</strong>spertado em São Paulo e não tinham surfado nada.<br />
Quando me perguntam se tenho sauda<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Paulo,<br />
é disso o que mais lembro. Aquelas duas horas <strong>de</strong> surfe no<br />
meio da semana, chegar na agência com a prancha <strong>de</strong>pois<br />
<strong>de</strong> já ter feito o meu “homework” era <strong>de</strong>licioso e muito<br />
inspirador. Nesse dia, apesar <strong>de</strong> nas tar<strong>de</strong>s trabalhar com<br />
um pouco <strong>de</strong> sono, às vezes <strong>de</strong>rramando areia da praia<br />
no meu <strong>de</strong>sk sem querer, qualquer briefing tinha um sabor<br />
especial. Porque eu já estava com a sensação <strong>de</strong> que o<br />
meu dia tinha valido a pena.<br />
Quem surfa, ou tenta surfar como eu, sabe do que eu<br />
estou falando.<br />
O surfe já me levou a lugares sem nome. A países sem<br />
nenhuma infra. A resorts maravilhosos construídos <strong>de</strong>pois<br />
<strong>de</strong> um tsunami. O surfe já me trouxe amigos <strong>de</strong> países<br />
e profissões e ida<strong>de</strong>s muito diferentes. Já me fez viajar<br />
o mundo inteiro a lugares em que nem o TripAdvisor<br />
conhece. O surfe já me fez ter medo <strong>de</strong> morrer algumas<br />
vezes. Sim, o surfe te <strong>de</strong>ixa muito humil<strong>de</strong> rapidinho.<br />
Uma lição aprendida no surfe fica para sempre. É como<br />
um briefing que sempre te surpreen<strong>de</strong>. O surfe já me fez<br />
enten<strong>de</strong>r os rastafáris, e também os amigos businessmen<br />
importantes que levam todos seus amigos para comemorar<br />
um aniversário <strong>de</strong> 50 anos numa ilha com uma onda<br />
exclusiva. O surfe é uma benção, alguns dizem. Estava ali<br />
<strong>de</strong>s<strong>de</strong> sempre, como uma página em branco. Até que um<br />
maluco pegou um toco <strong>de</strong> ma<strong>de</strong>ira e começou a se divertir.<br />
Não existe uma onda igual. Por isso é tão fascinante. E<br />
tão inspirador.<br />
É como digo sempre na minha escola, a Escola Cuca.<br />
O surfe é como a publicida<strong>de</strong>. Não adianta saber toda a<br />
teoria. Você tem <strong>de</strong> entrar na água e remar, remar, remar.<br />
Sem a prática, sem passar perrengues, sem ver <strong>de</strong> perto e<br />
treinar com os craques que já ganharam tudo nas praias<br />
<strong>de</strong> Cannes, você não chega a lugar nenhum.<br />
O surfe também me inspira a me manter bem fisicamente.<br />
Well, quase. Graças ao surfe, comecei a fazer ioga<br />
e você não imagina como o ioga se parece ao surfe. Quase<br />
todos os movimentos do ioga, se você coloca uma prancha<br />
embaixo, é puro surfe. Essa nossa vida mo<strong>de</strong>rna é<br />
tão cheia <strong>de</strong> informação e pressão que, às vezes, a gente<br />
esquece <strong>de</strong> respirar e <strong>de</strong> se conectar com o que é verda<strong>de</strong>iramente<br />
importante: o presente. E não há nada que te<br />
conecte mais com o presente do que uma onda. Porque<br />
fazer campanhas, ganhar concorrências, ganhar prêmios,<br />
fazer diferença para algumas marcas é importante. Mas se<br />
você não cuida <strong>de</strong> você mesmo primeiro, jamais vai conseguir<br />
fazer um trabalho relevante para qualquer produto.<br />
Vou ser eternamente agra<strong>de</strong>cido ao meu amigo Marcio<br />
Santoro, que um dia me convenceu <strong>de</strong> voltar a surfar<br />
<strong>de</strong>pois <strong>de</strong> 15 anos fora d’água. Ele me disse: é igual bicicleta,<br />
Miguel. Você vai ver que não esqueceu. Depois <strong>de</strong><br />
ter voltado, cada vez mais acredito piamente que pessoas<br />
felizes trabalham melhor. E mais equilibradamente. Por<br />
isso recomendo que você tenha algum hobby antes que<br />
a sua profissão se converta em um. Qualquer hobby. Sem<br />
um hobby, sem alguma paixão fora do trabalho, é muito<br />
fácil você cair na armadilha <strong>de</strong> pensar que a publicida<strong>de</strong><br />
é a sua única praia.<br />
Joeygil/iStock Ccaetano/iStock<br />
Cristina Robles/Divulgação<br />
Paixão sem infra<br />
As Maldivas (foto acima à esquerda) exercem verda<strong>de</strong>iro<br />
fascínio no publicitário Miguel Bemfica (primeira foto),<br />
ganhador do Grand Prix do Entertainment Lions <strong>2017</strong><br />
com o case Beyond Money para o Santan<strong>de</strong>r <strong>de</strong> Madri.<br />
Além da prancha, uma praia <strong>de</strong>serta é suficiente.<br />
Sim, uma camisa estilosa entrega o hobby.<br />
jornal propmark - <strong>27</strong> <strong>de</strong> <strong>novembro</strong> <strong>de</strong> <strong>2017</strong> 29