comunicação e expressão por J. B. Oliveira* Juizeco e Chefete... A estes dois termos recorreu recentemente o presidente do Senado – e do Congresso Nacional – Renan Calheiros, para referir-se ao juiz federal de primeiro grau Vallisney de Souza Oliveira, da 10ª Vara do Distrito Federal, e ao ministro da justiça Alexandre de Morais. A resposta política ao pronunciamento veio de duas fontes. O presidente da Associação dos Juízes Federais Roberto Veloso retrucou: “É inaceitável que numa democracia haja esse tipo de tratamento entre os membros dos poderes. Da mesma maneira que um senador é membro do Poder Legislativo, um juiz é membro do Poder Judiciário. Devem se respeitar mutuamente; é isso que esperamos do presidente do Senado Federal. E a ministra Carmen Lúcia, presidente do Supremo Tribunal Federal, arrematou: “Todas as vezes que um juiz é agredido, eu e cada um de nós juízes é (sic) agredido e não há a menor necessidade de, numa convivência democrática, viva e harmônica, haver qualquer tipo de questionamento que não seja nos estreitos limites da constitucionalidade e da legalidade. ” Já paramos um bocadinho aqui para explicar esse termo que aí está entre parênteses. Sic é um vocábulo latino que significa “assim” e é usado para deixar claro que se procedeu a uma citação textual, ao pé da letra, de algo que pode ser incorreto, não recomendável ou duvidoso. No caso presente, a concordância verbal usada por Sua Excelência não primou por sua excelência gramatical! A flexão deveria ser somos! Por duas razões: a primeira e mais singela é que o verbo se refere a um sujeito composto: eu e cada um de nós juízes. Logo, por se tratar de mais de um sujeito, o verbo vai obrigatoriamente para o plural. Em segundo lugar, pela “hierarquia dos pronomes pessoais do caso reto” (é, na gramática também existe essa ordem...). A presença do pronome eu leva sempre o verbo para a primeira pessoa do plural: “tu (segunda pessoa), nosso filho (terceira pessoa) e eu (primeira pessoa) constituímos uma família”. A razão é que, estando o pronome eu junto a qualquer outro do caso reto, ele leva à utilização do pronome pessoal do caso reto, na primeira pessoa do plural: nós! Embora seja advogado, vou me restringir ao aspecto gramatical da questão, uma vez que os tais vocábulos causaram estranheza... Renan Calheiros usou o Grau Diminutivo do Substantivo em sua fala. Se estão lembrados da matéria – estudada em Morfologia, na parte de Flexões do Substantivo – o grau pode ser normal, aumentativo ou diminutivo (é assim: diminutivo e não diminuitivo, como já tive o desprazer de ouvir mais de uma vez...). Pois bem, esse tal diminutivo pode ser analítico – quando formado com a ajuda de um adjetivo – ou sintético – pela junção dos sufixos inho ou zinho. Então, no primeiro caso, as expressões seriam juiz pequeno e chefe pequeno. No segundo, na forma analítica, seriam juizinho e chefinho ou chefezinho... Porém..., ao lado dessas formas populares, há as eruditas, formadas com sufixos mais raros e incomuns. Entre eles eco (jornaleco, livreco) e ete (ramalhete, palacete). Foi desses que o senador se valeu para, do alto de sua imponente cadeira de chefe do Poder Legislativo, expressar sua pouca consideração aos dois outros Poderes da República, definidos no artigo 2º da Constituição como “Independentes e harmônicos entre si”! O interessante, é que o diminutivo nem sempre tem sentido pejorativo, negativo! Ocorre que especialmente nós, brasileiros, usamos muito a chamada linguagem afetiva, em que o diminutivo expressa carinho, afeto, afago. É o que ocorre quando falamos benzinho, amorzinho, amoreco. Esse carinho está presente até mesmo em palavras como neguinho, pretinho, baixinho, pixote... Essa mania de aplicar o diminutivo acaba gerando atropelos à sisuda Gramática que, por exemplo, nos ensina que o Advérbio – palavra que modifica o Verbo – é invariável. Para indicar uma distância, deveríamos usar o adverbio longe, ou perto e pronto. Em relação a tempo cronológico, cedo e basta. Mas é comum dizermos pertinho, longinho, cedinho... Em casos extremos, já ouvi, no Rio de Janeiro – imaginem – o diminutivo do pronome pessoal do caso reto: elazinha, elezinho, euzinho... E aqui no interior de nosso estado, em Itapetininga, colhi o exemplo do diminutivo do gerúndio! “Hoje está chovendinho”! e “Aí, hein? namorandinho!” Agora, cá entre nós, certamente não foi nesse sentido de ternura que Renan Calheiros manejou os referidos diminutivos... Pelo menos em relação àqueles dois representantes da trilogia republicana brasileira! * J. B. Oliveira é Consultor de Empresas, Professor Universitário, Advogado e Jornalista. É Autor do livro “Falar Bem é Bem Fácil”, e membro da Academia Cristã de Letras www.jboliveira.com.br – jboliveira@jbo.com.br 50
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