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18 EM FOCO<br />
31-3-2016<br />
Revisões constitucionais<br />
Os direitos estão cá!<br />
Cronologia<br />
1982 – Extinção do<br />
Conselho da Revolução;<br />
diminuição de poderes do<br />
Presidente da República;<br />
criação do Tribunal<br />
Constitucional.<br />
1989 – Esvaziamento dos<br />
limites materiais, com o fim<br />
da irreversibilidade das<br />
nacionalizações e do<br />
«princípio da apropriação<br />
colectiva dos principais<br />
meios de produção e solos»;<br />
eliminação de referência à<br />
Reforma Agrária.<br />
1992 – Adaptação do texto<br />
constitucional aos princípios<br />
do Tratado de Maastricht.<br />
1997 – Redução do<br />
número de deputados e<br />
admissão de círculos<br />
uninominais;<br />
constitucionalização de<br />
limitações do direito à<br />
greve; eliminação da<br />
referência à obrigatoriedade<br />
do serviço militar.<br />
2001 – Adaptação para<br />
aprovar Convenção que<br />
criou o Tribunal Penal<br />
Internacional, tornando<br />
possível a extradição de<br />
portugueses.<br />
2004 – Introdução de<br />
artigo com norma que<br />
subordina a legislação<br />
portuguesa, incluindo a<br />
própria Constituição, ao<br />
direito comunitário;<br />
aprofundamento da<br />
autonomia políticoadministrativa<br />
das regiões<br />
autónomas dos Açores e<br />
Madeira.<br />
2005 – Aditamento de<br />
novo artigo para possibilitar<br />
a realização de referendo<br />
sobre a aprovação da mal<br />
chamada «Constituição<br />
Europeia».<br />
Éna revisão de 1989, com<br />
o cavaquismo imperante<br />
e o PS enredado nas suas<br />
cedências, que a Constituição<br />
sofre um dos mais violentos<br />
ataques. Atingida é sobretudo<br />
a área económica, embora os<br />
estragos se tenham feito sentir<br />
também no campo social.<br />
São eliminados o princípio da<br />
irreversibilidade das<br />
nacionalizações (estabelecendo<br />
a reprivatização da titularidade<br />
ou de direitos de exploração<br />
dos meios de produção e<br />
outros bens nacionalizados) e<br />
a referência constitucional à<br />
Reforma Agrária<br />
(a transferência da posse útil<br />
da terra aos que nela<br />
trabalham através da<br />
expropriação dos latifúndios e<br />
explorações capitalistas).<br />
Marca negativa que ficou desta<br />
segunda revisão constitucional<br />
foi também a introdução do<br />
carácter tendencialmente<br />
gratuito do Serviço Nacional<br />
de Saúde (SNS), expediente<br />
usado para abrir a porta às<br />
taxas moderadoras. Desde aí o<br />
custo suportado pelos utentes<br />
foi sempre a aumentar,<br />
desmentindo a garantia de PS<br />
Horizonte de progresso<br />
«Num quadro em que o exercício dos direitos emerge como questão essencial,<br />
a Constituição da República não só constitui um factor de condicionamento<br />
da ofensiva e de legitimação da luta em sua defesa como mantém no seu<br />
texto, apesar de sucessivas revisões, princípios e disposições susceptíveis de<br />
constituírem orientação para políticas económicas e sociais capazes de, pela<br />
mão de um governo patriótico e de esquerda, retomar soluções e perspectivas<br />
de dimensão democrática e de progresso social.»<br />
(Da Resolução Política aprovada no XIX Congresso do PCP, em Dezembro<br />
de 2012)<br />
e PSD de que o «tendencial»<br />
apontaria para a gratuitidade.<br />
Mas sendo verdade que a<br />
Constituição sofreu ao longo<br />
dos processos de revisão fortes<br />
investidas que a mutilaram em<br />
domínios essenciais no plano<br />
económico, por acção das<br />
forças políticas que em<br />
sucessivos governos<br />
executaram a política de<br />
direita, agindo inclusivamente<br />
à margem da lei (por violação,<br />
omissão ou não efectivação do<br />
preceituado na Lei<br />
Fundamental), é igualmente<br />
um facto indesmentível que as<br />
forças mais conservadoras no<br />
plano dos direitos dos<br />
trabalhadores e na área social<br />
nunca conseguiram, como<br />
pretendiam, levar a água ao<br />
seu moinho. Apesar de todas<br />
as tentativas – e foram várias<br />
–, e não obstante aqui ou ali<br />
terem feito mossa, o que é<br />
indesmentível é que os direitos<br />
não foram eliminados, estão<br />
cá, são elementos constitutivos<br />
do regime democrático como o<br />
direito ao trabalho com<br />
direitos, o direito à saúde, ao<br />
ensino, à segurança social, à<br />
justiça social.<br />
Uma história<br />
de ataques<br />
e resistência<br />
Eleitos a 25 de Abril de 1975 por sufrágio directo e<br />
universal, na primeira e mais concorrida eleição<br />
livre em Portugal (91% dos cidadãos recenseados),<br />
os 250 deputados constituintes tiveram como única e<br />
exclusiva missão redigir a Constituição, tarefa que viria a<br />
estar concluída dez meses depois com a sua aprovação a 2<br />
de Abril de 1976.<br />
Saída da Revolução de Abril, a Constituição rompeu<br />
com a concepção anterior do Estado fascista e<br />
implantou um regime baseado na soberania popular, no<br />
pluralismo de expressão e organização política<br />
democrática, no respeito e na garantia de efectivação<br />
dos direitos e liberdades fundamentais e na separação e<br />
interdependência de poderes, visando a realização da<br />
democracia económica, social e cultural e o<br />
aprofundamento da democracia participativa.<br />
Desde então, foram sete os processos de revisão a que a<br />
Lei Fundamental foi<br />
sujeita. Subjacente, em<br />
todos eles, o intuito das<br />
forças conservadoras de<br />
esvaziar o seu sentido<br />
avançado e emancipador<br />
através de alterações que<br />
representaram uma linha<br />
de regressão e retrocesso<br />
em aspectos fulcrais das<br />
conquistas democráticas,<br />
sociais e políticas obtidas<br />
pelo povo português após<br />
a Revolução do 25 de<br />
Abril.<br />
Todas as revisões – pelo<br />
conteúdo e pela forma –<br />
foram assim, no<br />
essencial, executadas sob<br />
o impulso não do<br />
aperfeiçoamento e<br />
melhoria da Constituição<br />
mas do seu<br />
empobrecimento,<br />
amputando-a de<br />
elementos centrais da<br />
nova estrutura económica criada com a Revolução e de<br />
direitos sociais e laborais.<br />
Como sublinhava Jerónimo de Sousa em entrevista ao<br />
Avante! por ocasião do 30.º aniversário da Constituição<br />
(30/3/2006), aludindo às revisões constitucionais<br />
negociadas entre o PS e o PSD, com o apoio do CDS,<br />
«aquilo que teve uma perspectiva estratégica foi de facto<br />
a liquidação da nova estrutura económica criada com a<br />
Revolução – isso é que era determinante, a devolução<br />
do poder económico ao grande capital – para de<br />
seguida, obviamente, com as revisões, sobretudo na de<br />
1997, dirigir o ataque contra os direitos dos<br />
trabalhadores, designadamente o direito à greve (através<br />
da chamada criação dos serviços mínimos)».