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24 31 -3-201 6<br />

EUROPA<br />

Quem semeia ventos<br />

· João Pimenta Lopes<br />

No passado dia 22 de<br />

Março, Bruxelas<br />

acordou ao som de<br />

explosões no átrio de partidas do<br />

Aeroporto Internacional de<br />

Zaventem e na estação de Metro de<br />

Maelbeek. As hediondas acções,<br />

reclamadas a meio da tarde desse<br />

dia pelo autoproclamado Estado<br />

Islâmico, resultaram na morte de<br />

pelo menos 35 pessoas e mais de<br />

três centenas de feridos, e<br />

trouxeram de novo, após os<br />

atentados de Novembro em Paris, o<br />

espectro do terrorismo em solo da<br />

União Europeia. Mais uma vez as<br />

acções desta, como de outras<br />

organizações terroristas, têm lugar<br />

em zonas públicas, tendo como alvos<br />

cidadãos comuns, de forma<br />

aleatória.<br />

Os meios de comunicação social<br />

dominantes alimentam agora a<br />

máquina do medo, que sempre se<br />

aproveita destes momentos para<br />

prosseguir os seus fins e aprofundar<br />

a sua propaganda. Ao longo da<br />

última semana e meia, tem feito uso<br />

à exaustão dos acontecimentos<br />

daquele dia e dos desenvolvimentos<br />

na Bélgica e noutros países como a<br />

França, a Alemanha ou até Portugal.<br />

As buscas, as detenções, as<br />

suspeitas, os casos paralelos que<br />

podem ou não ter alguma ligação,<br />

os sacos e mochilas suspeitos, a<br />

possibilidade de novos atentados, as<br />

grandes operações policiais<br />

transmitidas em directo, as<br />

constantes referências aos «árabes»,<br />

ou «muçulmanos», enchem páginas<br />

de jornais e horas de telejornais.<br />

Uma filosofia do medo que põe cada<br />

cidadão a olhar por sobre o ombro,<br />

promovendo o desconforto e a<br />

desconfiança doutrem, motivada por<br />

traços culturais ou nacionais,<br />

canalizando-o nomeadamente para<br />

os árabes e outras minorias. Uma<br />

filosofia que alimenta a extrema-<br />

-direita fascista, num enquadramento<br />

que lhes é permissivo. Assim se<br />

explicam os acontecimentos em<br />

Bruxelas no domingo, onde as<br />

autoridades permitiram que centenas<br />

de fascistas interrompessem<br />

manifestações públicas de<br />

solidariedade pelos mortos e de<br />

apelo à paz, com agressões e<br />

cânticos racistas.<br />

Das causas do terrorismo, salvo<br />

raras excepções, pouco ou nada é<br />

dito. Só da necessidade de reforçar<br />

de intervir militarmente aqui e ali e<br />

de implementar as medidas<br />

securitárias, mais questionáveis<br />

ainda quando assentes numa<br />

concepção racista, xenófoba e<br />

antidemocrática que a União<br />

Europeia vem aprofundando. Acções<br />

que acelerarão a criação de um<br />

Registo Europeu de Identificação de<br />

Passageiros (ou seja, a recolha e<br />

arquivamento de todas as<br />

informações de viagens e pessoais<br />

dos passageiros aéreos no espaço da<br />

União Europeia), limitações à livre<br />

circulação de pessoas em solo<br />

europeu enquanto que o capital, a<br />

exploração e as grandes<br />

multinacionais se continuam a<br />

«movimentar» livremente. Promove-<br />

-se assim uma gigantesca base de<br />

dados, partilhada, nomeadamente<br />

com os EUA, de todos os cidadãos<br />

europeus que atravessem fronteiras,<br />

criando perfis de cidadãos, com<br />

extensa compilação de dados<br />

pessoais.<br />

E enquanto os jornais se enchem<br />

das investigações, passa de fininho<br />

o agravamento das condições dos<br />

refugiados que tentam chegar à<br />

Europa e as consequências das<br />

criminosas políticas da União<br />

Europeia. Omite-se as condições<br />

degradantes e inimagináveis em que<br />

dezenas de milhares de homens,<br />

mulheres e crianças se concentram<br />

na fronteira com a Macedonia em<br />

Idomeni. Omite-se o encerramento<br />

e transformação dos centros de<br />

«acolhimento» na Grécia em<br />

autênticos campos de concentração<br />

e deportação, onde se criminalizam<br />

refugiados e migrantes. Omite-se a<br />

criminosa acção no mar Egeu, onde<br />

foi aplaudida a presença da NATO,<br />

com tentativas registadas de<br />

afundamento de embarcações por<br />

parte das forças turcas.<br />

Omite-se o papel da Turquia, em<br />

colaboração com o Ocidente, na<br />

violenta repressão do povo curdo,<br />

nos crimes cometidos em Cizre<br />

(autênticos actos de terrorismo de<br />

Estado), nos bombardeamentos na<br />

Síria, no financiamento e apoio ao<br />

Estado Islâmico ou à Jabhat al-<br />

-Nusra (uma facção da Al-Qaeda na<br />

Síria), força que tem igualmente sido<br />

apoiada por Israel no combate ao<br />

Hezbollah (aliados do regime sírio a<br />

combater no terreno),<br />

nomeadamente na fronteira dos<br />

montes Golãs, território que Israel<br />

ocupa há décadas. Como omissos<br />

têm sido os impunes assassinatos do<br />

exército israelita de crianças e<br />

adolescentes palestinianos nos<br />

últimos dias.<br />

Tão pouco tiveram a mesma<br />

cobertura mediática os criminosos<br />

atentados terroristas ocorridos no<br />

Iraque no dia 25, vitimando pelo<br />

menos 30 pessoas e ferindo mais de<br />

90, ou no Paquistão no dia 27,<br />

onde morreram mais de 70 pessoas<br />

e mais de 300 pessoas ficaram<br />

feridas, sobretudo mulheres e<br />

crianças.<br />

A listagem seria interminável dos<br />

grupos e actos terroristas, a que o<br />

imperialismo tem fechado os olhos,<br />

apoiado, promovido, financiado,<br />

alimentado, já para não falar dos<br />

actos terroristas que tão «nobres»<br />

democracias têm imposto.<br />

Terrorismo que como o PCP não se<br />

tem cansado de afirmar serve<br />

sempre os mais obscuros e<br />

reaccionários interesses.<br />

Sejamos claros. Qualquer acto<br />

terrorista que ceife vidas inocentes<br />

indiscriminadamente, merece firme<br />

condenação e forte combate. O<br />

terrorismo só se combate com<br />

políticas de paz, de respeito pela<br />

soberania dos estados, de<br />

cooperação entre os povos, e pela<br />

ruptura com as políticas de direita<br />

que se impõem na Europa.<br />

A juventude tem tido uma presença destacada no combate à regressão dos direitos<br />

Franceses contra Lei do Trabalho<br />

Luta de todos<br />

Trabalhadores e estudantes realizam hoje em<br />

toda a França uma grande jornada de luta pela<br />

retirada do projecto de lei do trabalho, que<br />

inclui greves em todos os sectores.<br />

A retrógrada proposta de<br />

lei foi aprovada, dia 24, em<br />

Conselho de Ministros, numa<br />

versão mais amenizada<br />

em relação ao projecto inicial.<br />

Porém, os recuos do<br />

governo Hollande-Valls, depois<br />

das grandes manifestações<br />

realizadas nas últimas<br />

semanas por sindicatos<br />

e organizações de estudantes,<br />

não alteraram a essência<br />

da reforma laboral,<br />

concebida na raiz para atacar<br />

o horário das 35 horas,<br />

facilitar despedimentos e<br />

agravar a exploração, em<br />

particular, dos jovens trabalhadores.<br />

Por isso, no dia em que<br />

os ministros aprovaram a<br />

lei para posterior debate no<br />

parlamento, quatro centrais<br />

Greves<br />

e manifestações<br />

exigem retirada<br />

do projecto<br />

sindicais e numerosas organizações<br />

estudantis voltaram<br />

a manifestar-se nas<br />

principais cidades francesas,<br />

exigindo a retirada completa<br />

do projecto.<br />

A União Nacional de Estudantes<br />

de França estimou<br />

em 150 mil o número de<br />

jovens que participaram nas<br />

acções de dia 24. Em Paris,<br />

Nantes, Rouen, Lyon,<br />

Grenoble, Besançon, Bordéus<br />

ou ainda Marselha as<br />

ruas encheram-se de protestos<br />

e palavras de ordem<br />

Desigualdade no Reino Unido<br />

Alarga-se fosso<br />

intergeracional<br />

contra a «Lei Khomri», nome<br />

da ministra do Trabalho,<br />

Myriam El Khomri, responsável<br />

pelo diploma.<br />

Desta vez, porém, a pressão<br />

dos contingentes policiais<br />

resultou em confrontos<br />

violentos e dezenas de<br />

detenções. As câmaras de<br />

televisão registaram imagens<br />

chocantes de uso desproporcionado<br />

da força contra<br />

adolescentes. O próprio<br />

ministro do Interior, Bernard<br />

Cazeneuve, foi forçado<br />

a reconhecer os «excessos»<br />

policiais e a anunciar<br />

a abertura de uma investigação,<br />

prometendo sanções<br />

adequadas.<br />

Para hoje, 31, está anunciada<br />

uma jornada de luta<br />

ainda mais ampla do que a<br />

de dia 9, data em que mais<br />

de meio milhão de trabalhadores,<br />

estudantes e reformados<br />

repudiaram a ofensiva<br />

contra os direitos laborais.<br />

A desigualdade social e de oportunidades<br />

entre as novas e as velhas gerações<br />

acentuou-se nos últimos anos e ameaça<br />

tornar o Reino Unido num país «permanentemente<br />

dividido».<br />

A conclusão é da Comissão para a Mobilidade<br />

Social e a Pobreza Infantil, uma<br />

entidade governamental, que acompanha<br />

as questões sociais.<br />

O seu presidente, Alan Milburn, alertou<br />

para a gravidade da situação, apelando<br />

ao governo que tome medidas urgentes<br />

no sentido de dar mais oportunidades<br />

aos jovens no acesso à educação, ao mercado<br />

de trabalho e à habitação.<br />

Na apresentação do estudo, Milburn,<br />

antigo ministro trabalhista, salientou que<br />

a ideia de que as novas gerações teriam<br />

uma vida melhor do que as anteriores «é<br />

parte da trama que unia a sociedade no<br />

seu conjunto».<br />

Porém, o relatório da Comissão, que incluiu<br />

uma sondagem de opinião, mostra<br />

que é o contrário que está a ocorrer.<br />

Um quinto dos inquiridos receia que o<br />

Estado invista cada vez menos em serviços<br />

públicos, criando maiores dificuldades<br />

aos jovens. E a maioria (54%) considera<br />

que a vida dos jovens será pior dos<br />

que a dos seus pais e avós, contra apenas<br />

20 por cento que se manifestam optimistas.<br />

«Tanto o nosso relatório como a sondagem<br />

indicam que chegámos a um ponto<br />

crítico, e se estas tendências se mantiverem<br />

tornar-nos-emos uma nação permanentemente<br />

dividida».<br />

Milburn salientou ainda que menos de<br />

metade dos jovens britânicos tem recursos<br />

para aceder a habitação própria. A<br />

chamada «Geração Y» ou «Geração do<br />

Milénio», jovens que nasceram entre os<br />

anos 80 e 2000, tem de fazer face a propinas<br />

universitárias muito mais elevadas<br />

do que as gerações anteriores, altos preços<br />

da habitação e uma carestia de vida<br />

sem precedentes.<br />

Nos últimos 30 anos, os jovens deixaram<br />

de ser pessoas bem remuneradas,<br />

com recursos para comprarem casa e constituírem<br />

família, e tornaram-se «parentes<br />

pobres» da sociedade.

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