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ARTE<br />
MEMÓRIAS<br />
GRAVADAS<br />
DONO DE UMA MENTE ENGENHOSA E CRIATIVA, FRANCISCO DE ALMEIDA<br />
CRIOU O PRÓPRIO ESTILO DE ARTE E LEVA AS LEMBRANÇAS<br />
DO SERTÃO DE CRATEÚS PARA SUAS GRAVURAS GIGANTES.<br />
FOTOS MARÍLIA CAMELO<br />
Na casa do artista Francisco de Almeida —<br />
um modesto apartamento de poucos metros<br />
quadrados situado no bairro Bela Vista,<br />
em Fortaleza —, a sala de estar não possui<br />
móveis, aparelhos eletrônicos ou artigos de<br />
decoração. O cômodo é inteiramente ocupado<br />
por uma enorme prensa de madeira para impressão de<br />
gravuras, tão grande que até dificulta a entrada na residência.<br />
O objeto, projetado por ele próprio e fabricado<br />
com a ajuda de marceneiros, é o que o cearense utiliza para<br />
transformar anjos, santos, sereias, animais e outras criaturas<br />
de sua imaginação em obras de arte.<br />
Em seu ateliê improvisado, Francisco passa até 18<br />
horas por dia trabalhando. Engenhoso, fabrica os próprios<br />
instrumentos e utiliza técnicas variadas para atingir o efeito<br />
visual desejado e, mais que isso, contar histórias por meio<br />
de murais gigantes de gravura, que se tornaram sua marca<br />
registrada. Com mais de 40 anos de carreira, o artista é um<br />
dos principais nomes brasileiros do gênero e tem obras<br />
espalhadas por acervos em diversos lugares do país.<br />
Seu trabalho ficou conhecido pelas referências ao sertão<br />
nordestino, onde nasceu e viveu até a adolescência. Natural<br />
de Crateús, o cearense cresceu vendo o pai, ourives, derreter<br />
ouro para transformá-lo em joias e vender as peças por onde<br />
passava. A avó — a quem o artista chama de mãe — fazia<br />
rendas de bilro com espinhos de mandacaru que ele, ainda<br />
pequeno, colhia nas matas perto de casa. Quando não estava<br />
costurando, ocupava o tempo orando aos pés do pequeno<br />
altar que mantinha dentro de casa.<br />
As lembranças se traduziram em gravura. “Às vezes<br />
dizem que meu trabalho é religioso. Talvez seja porque eu<br />
via minha mãe rezando todo dia, todo minuto. E meu ‘vô’<br />
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