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sumário<br />
janeiro<br />
2020<br />
05<br />
ENTREVISTA<br />
À Mesa Com MIGUEL CASTRO OLiVEIRA<br />
43<br />
CRÓNICA<br />
ANTÓNIO VENTURA<br />
13<br />
26<br />
30<br />
36<br />
REPORTAGEM<br />
O IMPACTO DA GUERRA DO ULTRAMAR <strong>NO</strong>S<br />
AÇORES<br />
ENTREVISTA<br />
DEPUTADA BÁRBARA CHAVES<br />
reportagem<br />
a relação entre o espólio arqueológico<br />
e os públicos mais jovens<br />
CRÓNICA<br />
jOÃO CASTRO<br />
53<br />
56<br />
58<br />
62<br />
REPORTAGEM<br />
GALERIA FONSECA MACEDO<br />
crónica<br />
leituras desalinhadas<br />
reportagem<br />
víctor alves - a abordagem<br />
"pragmática" da guerra civil portuguesa<br />
destaque<br />
top notícias <strong>2019</strong><br />
o político do ano<br />
MURAL FÉNIX<br />
COMISSÃO DELTA<br />
josé contente 20 38 44<br />
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editorial<br />
O Ciclo<br />
Passado o ano de <strong>2019</strong> e entrados<br />
em 2020, costuma ser tempo<br />
de fazer balanços e projetar<br />
conjunturas.<br />
Elencar um conjunto de destaques<br />
positivos na Região Autónoma dos<br />
Açores em <strong>2019</strong> será uma tarefa<br />
muito difícil ou mesmo impossível.<br />
Elencar o negativo será, também,<br />
uma tarefa muito difícil numa<br />
revista com 60 páginas.<br />
Posto isto, nada melhor que<br />
enveredar por uma análise<br />
sintetizada daquilo que foi <strong>2019</strong> e<br />
daquilo que se espera de 2020.<br />
O ano de <strong>2019</strong> ficou marcado por<br />
uma perda insubstituível na política<br />
Regional com o falecimento do<br />
Eurodeputado André Bradford.<br />
Todas as palavras serão escassas<br />
para o descrever e homenagear,<br />
permanecendo o incomodativo<br />
vazio que se torna evidente.<br />
No quadro da ação política, podese<br />
destacar o novo ciclo do PSD/A<br />
que, em 8 anos, conhece o seu<br />
quarto presidente. José Bolieiro<br />
reuniu consensos e prepara-se para<br />
começar um novo ciclo interno e<br />
quebrar o ciclo externo, o socialista.<br />
A inércia ou compaixão do<br />
Governo Socialista manteve-se<br />
igual a si mesmo, está tudo bem<br />
e recomenda-se para o interior.<br />
Com tantos problemas na região<br />
e secretários regionais a mostrar<br />
desgaste e incapacidade, Vasco<br />
Cordeiro não mexe no Governo para<br />
dar a entender uma cumplicidade<br />
de união. Está órfã de razão. Em<br />
termos desportivos, equipa que<br />
vence não se mexe, entendimento<br />
análogo encontrado por Vasco<br />
Cordeiro na versão que em equipa<br />
que perde não se mexe.<br />
O outro episódio político que<br />
merece destaque é a epidemia de<br />
interesses dentro do CDS/A.<br />
Não se percebe que um partido<br />
como o CDS/A entre neste ciclo<br />
conturbado, ao invés de aproveitar o<br />
desgaste de uma direita moribunda<br />
nos Açores e retirar dividendos<br />
significativos. O timing para os<br />
democratas cristãos inquietos é<br />
como uma cenoura sedutora.<br />
Por muito que Artur Lima seja<br />
indesejado por fações nostálgicas<br />
dentro do partido, na verdade<br />
ele tem conseguido resultados<br />
eleitorais que desmontam qualquer<br />
armadilha ancorada em falsos ideais<br />
e silvestres arrufos.<br />
O Bloco de Esquerda, sem rumo<br />
depois da saída de Zuraida Soares,<br />
remeteu-se ao papel de presenças<br />
e manifestações altruístas em<br />
qualquer dobrar de esquina.<br />
João Paulo Corvelo revela um<br />
espírito de despedida, mantendo os<br />
níveis de subsistência.<br />
O PPM, resiliente, mantém o seu<br />
rumo, tendo sido muitas vezes<br />
a bengala do PSD/A, apesar de<br />
apresentar mais trabalho que os<br />
próprios. O ataque cerrado ao PS<br />
do deputado Paulo Estêvão tem-no<br />
mantido na agenda política.<br />
Para 2020, ano de eleições, iremos<br />
ter um combate na esfera da<br />
manutenção, embora se descortine<br />
uma maior pulverização no<br />
hemiciclo do parlamento regional. A<br />
democracia e o populismo são isso<br />
mesmo.<br />
Os socialistas temem a perda<br />
da maioria absoluta por via da<br />
legislação eleitoral que abriu o<br />
círculo de compensação, o que<br />
irá permitir aos partidos recentes<br />
poderem eleger deputados por<br />
esse círculo, reduzindo assim a<br />
amplitude socialista. Por outro<br />
lado, José Manuel Bolieiro irá<br />
tentar, pelo círculo de São Miguel,<br />
quebrar o ciclo dos sete deputados,<br />
reduzindo assim a possibilidade de<br />
uma maioria absoluta para Vasco<br />
Cordeiro.<br />
Com o desgaste socialista e os<br />
problemas que a região enfrenta,<br />
Vasco Cordeiro perdeu o timing<br />
para a preparação da pré-campanha,<br />
pois teria dado sinais diferentes<br />
se a mesma tivesse começado em<br />
setembro com a renovação do<br />
governo. O tempo escassa e as<br />
eleições estão a poucos meses de<br />
distância.<br />
RUI SIMAS<br />
DIRETOR<br />
Ficha Técnica:<br />
ISSN 2183-4768<br />
Proprietário Associação Agenda de Novidades<br />
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Sede de Redação Rua da Misericórdia, 42, 2º Andar,<br />
9500-093 Ponta Delgada<br />
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Diretor/Editor Rui Manuel Ávila de Simas CP3325A<br />
Subdiretor João Rocha CP 2926<br />
Redação Rui Santos TPE-288 A, Claúdia Carvalho<br />
TPE-288 A, diogo costa TPE-298-A<br />
Revisão ana sofia massa<br />
Paginação leonor manaças<br />
Captação e Edição de Imagem Rodrigo Raposo,<br />
RAQUEL AMARAL<br />
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CIMAS, Leonor Manaças<br />
marketing digital raquel amaral<br />
MULTIMÉDIA RODRIGO RAPOSO<br />
informática joão botelho<br />
Relações Públicas Cila Simas<br />
Nº Registo ERC 126 641<br />
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ricardo silva<br />
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Estatuto Editorial:<br />
A <strong>NO</strong> é uma revista de âmbito regional (não ficando<br />
excluídos os países de língua portuguesa e<br />
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A <strong>NO</strong> disponibiliza informação independente e<br />
pluralista relacionada com a política, cultura<br />
e sociedade num contexto regional, Nacional e<br />
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A <strong>NO</strong> é uma revista autónoma, sem qualquer<br />
dependência de natureza política, ideológica<br />
e económica, orientada por critérios de rigor,<br />
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A <strong>NO</strong> é produzida por uma equipa que se compromete<br />
a respeitar os direitos e deveres previstos na<br />
Constituição da República Portuguesa; na Lei de<br />
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pela leitura e pela escrita, mas acima de tudo,<br />
promover a cidadania e o conhecimento.<br />
A <strong>NO</strong> rege-se pelo cumprimento rigoroso das<br />
normas éticas e deontológicas do jornalismo e<br />
pelos princípios de independência e pluralismo.<br />
04 <strong>NO</strong>JAN20
entrevista<br />
à mesa com<br />
Miguel Castro Oliveira<br />
director executivo - ceo da i am event production & brand consultancy<br />
cila simas<br />
Tenho comigo Miguel<br />
Oliveira, o CEO da empresa<br />
I AM Events, uma empresa<br />
do norte de Portugal que já<br />
chegou aos Açores, aliás, já<br />
fez um evento nos Açores e<br />
está de regresso à Região para<br />
mais eventos. Miguel, quero<br />
conhecer um bocadinho mais,<br />
quero que me contes, que me<br />
fales um pouco mais sobre o<br />
que é a empresa I AM Events.<br />
I AM Events é uma empresa<br />
com a pronúncia do norte,<br />
estando no mercado há cerca<br />
de cinco anos. Nós fazemos<br />
produção de eventos globais,<br />
consultoria para marcas,<br />
contratação de artistas, etc.<br />
Eestamos de regresso aos<br />
Açores como disse e muito<br />
bem, passado quatro anos,<br />
para voltar com um evento<br />
gastronómico, neste caso<br />
“Francesinha In Azores”,<br />
que, ao fim de algumas<br />
tentativas, vai conseguir marcar<br />
presença novamente. Ficam<br />
já convidados para no fim de<br />
semana de 2,3,4 e 5 de abril de<br />
2020 marcarem presença aqui,<br />
em São Miguel, no Pavilhão da<br />
Associação Agrícola.<br />
Relativamente à ilha, São<br />
Miguel tem, de há alguns<br />
anos para cá, chamado,<br />
digamos assim, para virmos<br />
cá. Fizemos já consultoria a<br />
algumas empresas cá e, agora<br />
sim, estamos com vontade de<br />
estar mais presentes nesta ilha<br />
e fazer alguns eventos que<br />
não podemos estar agora a<br />
divulgar, mas que, com certeza,<br />
brevemente, traremos muitas<br />
novidades.<br />
Miguel, será só São Miguel o<br />
destino deste regresso ou estão<br />
já outras ilhas no horizonte?<br />
Quando nós optámos pelo nome<br />
de “Francesinha in Azores” foi<br />
exatamente a pensar nas outras<br />
ilhas também. Portanto, São<br />
Miguel vai ser a primeira ilha<br />
a ter o evento, mas sim, já há<br />
outros planos para outras ilhas<br />
do arquipélago dos Açores.<br />
Eu agora gostava que me<br />
<strong>NO</strong>JAN20 05
entrevista<br />
vídeo<br />
ENTREVISTA disponível EM VÍDEO NA REVISTA ONLINE<br />
"<br />
Os Açores têm<br />
uma beleza<br />
própria que<br />
por si só é<br />
cativante,<br />
mesmo sem<br />
estar na moda.<br />
As pessoas<br />
são muito<br />
especiais, a<br />
pronúncia<br />
é muito<br />
cativante.<br />
falasses um pouco do que é<br />
a I AM Event, porque cinco<br />
anos já são muitos anos no<br />
mercado, principalmente<br />
no mercado continental. O<br />
que é que vocês têm feito no<br />
continente português?<br />
Nós temos feito um pouco de<br />
tudo. Nós temos feito desde a<br />
música ao teatro, à consultoria<br />
em algumas marcas que<br />
temos o prazer de trabalhar<br />
e de ter ajudado a crescer<br />
no parâmetro nacional, que<br />
não quero estar aqui a frisar<br />
nenhum nome em específico<br />
porque seria injusto para<br />
todos os outros clientes, mas<br />
acima de tudo, nós somos<br />
uma empresa que está pronta<br />
para dar resposta a qualquer<br />
desafio, de qualquer marca,<br />
de qualquer empresa. Um<br />
cliente que tenha um desafio<br />
é o que nós queremos, ou<br />
seja, estamos preparados para,<br />
com as parcerias que temos,<br />
estarmos presentes em todo o<br />
tipo de eventos.<br />
Naquilo que foi o passado<br />
da I AM Event, existe<br />
algum evento que te tenha<br />
marcado, não só pelo desafio<br />
mas também pelo gosto de o<br />
fazer?<br />
É muito complicada essa<br />
questão, muito complicado<br />
mesmo, porque eu tenho<br />
vários eventos que me<br />
06 <strong>NO</strong>JAN20
entrevista<br />
marcaram. Não consigo<br />
especificar aqui um mais<br />
que o outro. Estava a tentar<br />
aqui lembrar-me de um que<br />
tivesse… Acima de tudo, tenho<br />
o prazer de fazer o que gosto,<br />
portanto todos os eventos<br />
que são realizados, são-no<br />
com prazer. Seja de grande<br />
dimensão, ou de pequena<br />
dimensão, é sempre um<br />
prazer. Claro que me lembro<br />
do primeiro evento, porque é<br />
o primeiro e esse marca-nos<br />
sempre de forma especial.<br />
Foi a primeira fatura que a<br />
empresa emitiu. Lembro-me<br />
desse evento, mas mais uma<br />
vez, sem estar aqui a focar<br />
nomes de empresas ou marcas,<br />
tenho esse “contentinho”<br />
especial. Se virem o nosso<br />
site em iamevents.pt,<br />
podem reparar que temos lá<br />
dezenas de clientes, desde<br />
Câmaras Municipais, marcas<br />
internacionais, e seria injusto<br />
estar aqui a destacar uma ou<br />
outra sem mencionar todas.<br />
Mas sim, esse primeiro é só<br />
pelo facto de ter sido a primeira<br />
fatura que nós passámos e eu<br />
lembro-me perfeitamente disso,<br />
só por isso. De resto, todos eles<br />
têm um lugar especial.<br />
Vir para os Açores, o que é<br />
que te atrai nos Açores? É só<br />
porque está na moda?<br />
No primeiro evento que fizemos<br />
nos Açores, em 2016, não<br />
existia o número de carros<br />
alugados que se vêm agora<br />
nas estradas, nem coisa que<br />
se parecesse. O desafio foi<br />
fazer um evento diferente,<br />
portanto, não trouxemos um<br />
único produto do continente,<br />
trouxemos apenas a mãode-obra<br />
e todos os produtos<br />
foram regionais. O pão, o<br />
queijo, os enchidos, carnes.<br />
Foi interessante porque nós<br />
tivemos que acabar o evento<br />
mais cedo no outro dia, porque<br />
terminámos com a carne na<br />
ilha, que estava cortada. Era<br />
fim-de-semana, os talhos<br />
estavam encerrados. Foi muito<br />
engraçado porque, em 2016,<br />
sem esta moda que se vê<br />
hoje em dia, o evento foi um<br />
sucesso, portanto, nem quero<br />
imaginar como vai ser agora<br />
em 2020, no qual está na moda<br />
os Açores. Mas não fugindo<br />
à questão, os Açores têm uma<br />
beleza própria que por si só é<br />
cativante, mesmo sem estar na<br />
moda. As pessoas são muito<br />
especiais, a pronúncia é muito<br />
cativante. Nós estamos em<br />
Portugal, é como ir a Lisboa,<br />
como ir ao Algarve fazer<br />
um evento, sendo que, esta<br />
barreira que existe, que é o<br />
mar, faz-nos às vezes pensar<br />
que vamos para outro local,<br />
para outro país. Estamos em<br />
Portugal, numa zona muito<br />
bonita que eu especialmente<br />
"i am. we are.<br />
they are."<br />
é o slogan da<br />
i am, agência<br />
de produção de<br />
eventos globais<br />
e de consultoria<br />
para marcas.<br />
<strong>NO</strong>JAN20 07
entrevista<br />
A <strong>NO</strong> REVISTA sentouse<br />
à mesa com Miguel<br />
Castro Oliveira, Diretor<br />
Executivo - CEO da I AM.<br />
Com sede em Vila Nova<br />
de Gaia e com grandes<br />
projectos desde 2015, a<br />
I AM foi criada com base<br />
na ideia de afirmação de<br />
uma identidade única.
entrevista<br />
adoro. Não querendo dizer que<br />
é só São Miguel, mas é a ilha<br />
que melhor conheço. Já tive a<br />
oportunidade de vir cá algumas<br />
vezes e conheço bastante bem.<br />
Tem uma beleza natural, as<br />
pessoas são espetaculares,<br />
portanto, acho que isso não se<br />
explica, sente-se. É chegares cá<br />
e sentires-te bem.<br />
Miguel, este evento da<br />
“Francesinha In Azores”,<br />
que já começa pela alteração<br />
do próprio nome, traz um<br />
conceito diferente? Há<br />
algumas alterações naquilo<br />
que foi em 2016 o “Festival<br />
das Francesinhas”?<br />
Acima de tudo houve um<br />
erro que foi chamar Festival<br />
das Francesinhas em 2016.<br />
Não devia ter sido chamado<br />
Festival das Francesinhas<br />
porque deu uma ideia errada às<br />
pessoas do que é que seria e daí<br />
corrigirmos para “Francesinha<br />
In Azores”, porque isto é um<br />
evento gastronómico e não um<br />
festival.<br />
Como tu disseste há<br />
bocadinho, fizeram questão<br />
de utilizar tudo aquilo que era<br />
açoriano, portanto, realmente<br />
este nome escolhido para 2020<br />
tem mui to mais a ver com<br />
aquilo que se vai passar do<br />
que propriamente o “Festival<br />
das Francesinhas”, porque<br />
vem de fora o chef, mas<br />
depois aquilo que é utilizado<br />
cá é açoriano.<br />
Certíssimo. O conceito vai<br />
manter-se nesse aspeto. Todos<br />
os produtos serão comprados<br />
e selecionados cá. Lembrome<br />
que em 2016 tivemos<br />
uma situação com o pão,<br />
porque o pão de cá não era<br />
tão bom para a francesinha<br />
porque “chupava” muito o<br />
molho, ficava ensopado, e nós<br />
tivemos que andar a trabalhar<br />
para alterar. Na altura foi um<br />
processo bastante interessante.<br />
Nesta altura já não vai ser<br />
preciso fazer isso, já temos<br />
esse fornecedor com esse pão<br />
preparado, mas sem dúvida<br />
nenhuma, todos os produtos vão<br />
ser de São Miguel.<br />
Se fores fazer este evento<br />
na ilha Terceira ou na ilha<br />
do Faial, o conceito vai ser<br />
o mesmo? A utilização dos<br />
produtos açorianos como<br />
marca dos teus eventos nos<br />
Açores?<br />
Sim, sem dúvida. A única coisa<br />
que andará com a I AM serão as<br />
pessoas e a sabedoria, o segredo<br />
do molho e a confeção. Todos<br />
os produtos serão sempre da<br />
ilha onde nós estivermos a fazer<br />
o evento.<br />
Naquele que diz respeito<br />
ao staff que tu trazes de<br />
fora, que ainda não é tão<br />
pequeno como isso, este<br />
staff é escolhido por ti? Vai<br />
fazer uma visita primeiro ao<br />
espaço? Como é que isto tudo<br />
se processa?<br />
Esse processo passa mesmo<br />
só por mim – a seleção. É um<br />
processo muito próprio. Eu<br />
identifico algumas empresas<br />
que gostaria que fizessem e<br />
depois, por algum motivo,<br />
não especial, seleciono uma<br />
e faço o convite. As pessoas,<br />
de facto, são pessoas que nós<br />
conhecemos há muitos anos<br />
e que já trabalham também<br />
no continente. Lembro-me<br />
de um dos parceiros que será<br />
o próximo a vir cá, mas que<br />
para nós não é o importante,<br />
ou seja, nós não vimos para<br />
cá promover o restaurante<br />
do Porto que vem cá fazer as<br />
francesinhas. Nós estamos cá a<br />
fazer um evento gastronómico<br />
nos Açores e esse é o que<br />
nós queremos promover – os<br />
produtos regionais com a<br />
francesinha do Porto, com<br />
o molho especial do Porto,<br />
mas não é importante qual é a<br />
empresa que o vem fazer. Não é<br />
esse o cerne da questão.<br />
Não é importante quem o<br />
vem fazer, mas é importante<br />
que quem o vem fazer o saiba<br />
fazer em condições. Como<br />
disseste, o segredo está no<br />
molho. Lá pelos condimentos,<br />
pelas carnes, o chouriço,<br />
o pão e toda esta parte da<br />
francesinha ser regional, o<br />
segredo está em quem vem<br />
fazer o molho, em quem vem<br />
preparar a francesinha.<br />
Inclusive as compras para a<br />
confeção do molho são feitas<br />
pelos chefes. Nós não vamos<br />
com eles às compras, eles não<br />
querem. Nós só pagamos. Eles<br />
não querem que nós vejamos<br />
as quantidades – “não, isto é<br />
nosso. Vocês podem fazer o<br />
que quiserem, tirar o queijo,<br />
pôr o queijo, pôr as carnes”,<br />
mas o molho só há duas ou<br />
<strong>NO</strong>JAN20 09
WWW.<strong>NO</strong>REVISTA.PT | <strong>NO</strong><br />
três pessoas que vão fazer as<br />
compras e que sabem o que<br />
estão a comprar. As marcas dos<br />
vinhos, as marcas dos produtos,<br />
as quantidades, tudo é segredo<br />
deles.<br />
Fala-nos um bocadinho<br />
daquilo que são os cinco<br />
anos de experiência que<br />
a tua empresa tem feito.<br />
Costuma-se dizer que a<br />
barreira dos cinco anos,<br />
quando é ultrapassada, é<br />
sucesso (quase) garantido.<br />
Do que está para trás, o que<br />
nos podes dizer? Quais foram<br />
os eventos mais marcantes<br />
ou o que é que te marcou na<br />
história da I AM?<br />
Marcaram-me muitos eventos<br />
na história, mas dando aqui<br />
alguns exemplos que me vêm já<br />
à cabeça – lembro-me da Comic<br />
Con Portugal, em 2018, que<br />
foi a primeira vez que a Comic<br />
Con foi feita ao ar livre como<br />
nunca tinha sido em nenhum<br />
país, o conceito era sempre em<br />
pavilhões fechados. São quase<br />
100 mil metros de espaço para<br />
um evento. Lembro-me também<br />
com a BMW, em que ganhámos<br />
um prémio de criatividade,<br />
em 2018. Ganhámos também,<br />
na área desportiva, com a<br />
apresentação do Sporting Clube<br />
de Braga (SCB), o Braga Day,<br />
no qual ganhámos também<br />
o melhor evento desportivo.<br />
Esses eventos, nomeadamente o<br />
da BMW e do SCB, que foram<br />
dois prémios que nos foram<br />
atribuídos, são eventos que<br />
têm algum peso, não porque<br />
os outros foram melhores ou<br />
piores, mas esse prémio e<br />
esse reconhecimento é, um<br />
bocadinho, um reconhecimento<br />
de todos os eventos. Esses<br />
são dois eventos que, tanto<br />
um como outro, nos deixaram<br />
muito orgulhosos de ir erguer o<br />
troféu ao palco.<br />
Miguel, relembrando as datas<br />
deste evento no pavilhão da<br />
Associação Agrícola – 2, 3, 4<br />
e de abril – porque o nosso<br />
OCS não está só na RAA,<br />
está também para as nossas<br />
comunidades, para o resto<br />
do Mundo. Muitas mais<br />
pessoas te irão ouvir e ter<br />
conhecimento deste evento.<br />
Para 2020, o que é que podes<br />
“levantar um bocadinho mais<br />
o véu” daquilo que a tua<br />
empresa irá fazer?<br />
Nós em 2020 vamos, acima<br />
de tudo, dar um salto na<br />
criatividade. Essa vai ser uma<br />
das grandes diferenças para<br />
2020 da I AM. Deixar de ser<br />
só produção e consultoria para<br />
ir também para a criatividade.<br />
Daí sim, já se estão a preparar<br />
coisas muito interessantes para<br />
2020.<br />
E estas coisas vão chegar<br />
também aos Açores?<br />
Eu espero bem que sim,<br />
que essas “coisas” cheguem<br />
aos Açores já no próximo<br />
ano de 2020. Estamos em<br />
conversações para que<br />
alguns desses projetos sejam<br />
realizados em São Miguel,<br />
inclusive e noutras ilhas.<br />
Convido toda a gente a vir a<br />
São Miguel, seja nos eventos<br />
que a I AM está a produzir<br />
ou não, mas que venham cá.<br />
Quero agradecer à Associação<br />
Agrícola pela forma como nos<br />
acolhe e nos dá oportunidade<br />
de fazer um evento num local<br />
tão emblemático, o do famoso<br />
bife de São Miguel. Não<br />
queria deixar de agradecer à<br />
Associação Agrícola por este<br />
carinho que tem com a I AM e<br />
que nos trata tão bem.<br />
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eportagem<br />
o impacto da guerra<br />
do ultramar nos açores<br />
"Marcas que a memória não esquece e que o tempo não apaga"<br />
diogo costa<br />
Decorreu no passado dia 11<br />
de dezembro, na Universidade<br />
dos Açores (UAç), o debate<br />
sobre “O impacto da Guerra<br />
do Ultramar nos Açores”,<br />
numa iniciativa levada a cabo<br />
pelo Núcleo de Estudantes<br />
de História e Património da<br />
Universidade dos Açores<br />
(NEHPUA).<br />
Segundo Maria Borges,<br />
Presidente do NEHPUA, “seria<br />
interessante proporcionar<br />
um momento de partilha de<br />
conhecimentos, experiências e<br />
memórias”, sob diversos pontos<br />
de vista. Nesse sentido, foram<br />
convidados para palestrar nestas<br />
conferências o Doutor Mota<br />
Amaral, para abordar o tema<br />
de um ponto de vista político;<br />
a Doutora Susana Serpa Silva e<br />
o Doutor Sérgio Rezendes para<br />
tratar a vertente histórica; o<br />
Coronel Salgado Martins, bem<br />
como Amaro de Matos, com<br />
testemunhos na primeira pessoa<br />
de quem esteve nas frentes de<br />
batalha.<br />
Na sessão de abertura, a<br />
Doutora Isabel Albergaria,<br />
Diretora do Curso de História e<br />
Coordenadora do Departamento<br />
de História, Filosofia e Artes, e<br />
a Doutora Ana Gil, Presidente<br />
da Faculdade de Ciências<br />
Sociais e Humanas da UAç,<br />
exaltaram e congratularam<br />
esta iniciativa do NEHPUA,<br />
vista como “exemplo de<br />
cidadania” e “vitalidade para<br />
a vida académica”, abordando<br />
uma temática que “atravessa<br />
a História das gerações ainda<br />
vivas”.<br />
O primeiro orador convidado<br />
a palestrar foi o Doutor João<br />
Bosco Mota Amaral, primeiro<br />
Presidente do Governo da<br />
Região Autónoma dos Açores<br />
que exerce no presente funções<br />
docentes na Faculdade de<br />
Ciências Sociais e Humanas<br />
da UAç. O palestrante veio<br />
trazer um testemunho político<br />
daquilo que foram os anos que<br />
antecederam a Guerra, bem<br />
como do período em que a<br />
mesma ocorreu.<br />
12 <strong>NO</strong>JAN20
eportagem<br />
Mota Amaral começou por<br />
enquadrar o conflito na<br />
História, afirmando que a<br />
Guerra do Ultramar “não<br />
aconteceu por acaso, tem os<br />
seus antecedentes”. O antigo<br />
governante dividiu o seu<br />
discurso, abordando primeiro<br />
as campanhas de pacificação, e<br />
depois, a Guerra Colonial.<br />
Situando-se no século XIX,<br />
com a Conferência de Berlim,<br />
Mota Amaral menciona o<br />
arranque do movimento<br />
colonialista e imperialista,<br />
altura em que “os países<br />
europeus queriam partilhar<br />
a África, como se África<br />
não tivesse dono”. O orador<br />
afirmou que “isto, obviamente,<br />
foi bem acolhido por alguns<br />
e mal acolhido por outros.<br />
Houve momentos de diálogos<br />
positivos, mas também vários<br />
momentos de confrontos, daí as<br />
campanhas de pacificação”, que<br />
na sua opinião, “passava-se no<br />
meio de grandes excessos”<br />
Com o “rebentar” da Guerra,<br />
em 1961, Mota Amaral<br />
confessa que ficou com a<br />
impressão de que “alguns<br />
responsáveis portugueses<br />
pensaram que isso era mais uma<br />
campanha de pacificação, sem<br />
se aperceberem que o quadro<br />
político geral tinha mudado”.<br />
O pacto colonial que outrora<br />
consistia na exploração dos<br />
recursos naturais das colónias,<br />
em benefício da metrópole,<br />
passava a ser condenado<br />
pelas Nações Unidas. Aliás,<br />
ainda antes da constituição<br />
das Nações Unidas, na Carta<br />
do Atlântico, assinada por<br />
Roosevelt e Churchill, estava<br />
presente o compromisso de<br />
autorizar a independência<br />
dos povos coloniais, tarefa<br />
vista como fundamental para<br />
a organização das Nações<br />
Unidas.<br />
"<br />
Foi dentro deste quadro que se desenrolou a guerra em Angola,<br />
Moçambique e na Guiné, que era de facto, para as populações<br />
envolvidas nela, uma guerra de libertação. Uma guerra contra o<br />
poder colonial. As nossas forças armadas deram o seu melhor. Sobre<br />
o ponto de vista militar, a situação, supostamente, estava estabilizada<br />
e vencida, mas o problema era um problema político. - Mota Amaral<br />
<strong>NO</strong>JAN20 13
eportagem<br />
Para Mota Amaral, as supostas<br />
campanhas de pacificação<br />
“terminaram mal”. “Felizmente, e<br />
devido às ligações estabelecidas,<br />
acabou por se reconstruir esta<br />
relação com os PALOP, que<br />
tem caminho para andar, mas há<br />
sobressaltos, custos e sofrimentos<br />
que se podia ter poupado se<br />
tivesse seguido um caminho<br />
diferente”.<br />
Quando questionado sobre se este<br />
conflito poderia ter sido evitado,<br />
o antigo governante afirma que<br />
“estava no ADN do Estado<br />
Novo”, e que “na lógica do<br />
Estado Novo não cabia o diálogo<br />
e democratização”, concluindo<br />
ao falar da importância da<br />
reconstrução da teia de relações<br />
“que deixou uma língua comum,<br />
que é um grande valor”.<br />
De seguida, foi a vez da Doutora<br />
Susana Serpa Silva “tomar a<br />
palavra”. A investigadora e<br />
professora auxiliar da Faculdade<br />
de Ciências Sociais e Humanas<br />
da UAç levou ao Anfiteatro<br />
VIII daquela Universidade “um<br />
conjunto de publicações que<br />
retratam, por um lado, factos da<br />
Guerra Colonial associada aos<br />
Açores, e por outro, memórias<br />
da Guerra Colonial, sobretudo<br />
memórias no feminino”.<br />
Na opinião da Doutora, apesar de<br />
já existirem vários estudos sobre<br />
este acontecimento, “ainda há<br />
um longo caminho a percorrer na<br />
investigação sobre a Guerra do<br />
Ultramar”, sobretudo, no que diz<br />
respeito aos Açores.<br />
Mencionando Manuel Faria,<br />
no artigou que publicou na<br />
Enciclopédia Açoriana, “em<br />
relação aos Açores, a Guerra<br />
Colonial produziu os mesmos<br />
efeitos registados no resto do<br />
país”.<br />
A oradora fala da imprensa<br />
açoriana na altura, com<br />
diversos registos fotográficos<br />
e artigos que “davam eco a<br />
esta problemática”. Segundo<br />
Susana Serpa Silva, esta era<br />
uma imprensa “naturalmente<br />
alinhada com o Estado Novo e,<br />
portanto, eivada de um espírito<br />
nacionalista, que procurava<br />
justificar a mobilização pelos<br />
sagrados princípios de um país<br />
plurirracial, pluricontinental, que<br />
tinha a nobre missão de levar<br />
a fé católica e a civilização a<br />
povos espalhados pelo sertão<br />
africano”.<br />
Por outro lado, a oposição<br />
do Estado Novo procurava<br />
também reunir jornalistas<br />
para apresentar a sua posição<br />
contrária, uma Guerra Colonial<br />
diferente daquela que o regime<br />
queria transparecer. A oradora<br />
deu o exemplo de um artigo<br />
do Açoriano Oriental, que<br />
dava conta da prisão de Acácio<br />
Gouveia, Gustavo Soromenho e<br />
Mário Soares, após estes terem<br />
apresentado uma declaração<br />
a favor da democratização<br />
da República, perante alguns<br />
jornalistas.<br />
Susana Serpa Silva apresentou<br />
vários artigos de jornais<br />
regionais, após o início da<br />
Guerra Colonial, que relatavam<br />
a partida dos soldados, as<br />
cerimónias que se realizavam<br />
nas partidas, nomeadamente,<br />
missas campais no adro do<br />
Santuário da Esperança, em<br />
Ponta Delgada, o regresso das<br />
comitivas que terminavam as<br />
suas missões, distinções de<br />
que eram alvo alguns militares,<br />
açorianos, etc.<br />
14 <strong>NO</strong>JAN20
eportagem<br />
Do lado oposto, dando a<br />
conhecer o “lado mais negro da<br />
Guerra”, as páginas dos jornais<br />
açorianos “enchiam-se” com<br />
a divulgação das mortes de<br />
militares açorianos, números<br />
que a oradora apresentou na<br />
seguinte tabela.<br />
Para além destes dados, Susana<br />
Serpa Silva apresentou mais<br />
números relativos à influência<br />
dos Açores na Guerra do<br />
Ultramar. A palestrante<br />
menciona Pires Ferreira, que<br />
na sua dissertação de mestrado<br />
refere que a mobilização<br />
de açorianos para África<br />
iniciou-se em 1961, aumentou<br />
consideravelmente em 1967,<br />
atingindo o seu ponto alto em<br />
1969.<br />
A investigadora mostra também<br />
um gráfico, presente na referida<br />
dissertação de Pires Ferreira,<br />
que apresenta o esforço relativo<br />
a cada unidade mobilizadora de<br />
Caçadores Independentes para<br />
os três teatros de operações, no<br />
qual Angra de Heroísmo e Ponta<br />
Delgada se destacam entre<br />
as unidades que mobilizaram<br />
mais homens para a Guerra<br />
do Ultramar, estimando-se em<br />
cerca de 14000, o número de<br />
soldados que partiram para<br />
África. Susana Serpa Silva<br />
apresenta ainda estatísticas<br />
relativas às freguesias açorianas<br />
que disponibilizaram mais<br />
homens para este conflito,<br />
destacando-se São José, em<br />
Ponta Delgada, e Santa Cruz, na<br />
Praia da Vitória.<br />
Uma vez que as marcas<br />
provenientes de um conflito<br />
desta dimensão não se estendem<br />
apenas aos homens que nela<br />
participaram, a Doutora<br />
referiu ainda a importância da<br />
sociedade em geral, mas das<br />
mulheres, em concreto, ao longo<br />
de todos os anos de guerra.<br />
“Multiplicaram-se iniciativas<br />
de apoio aos combatentes.<br />
As delegações distritais<br />
do Movimento Nacional<br />
Feminino criaram movimentos<br />
a favor dos expedicionários<br />
açorianos, promovendo serões,<br />
angariações de donativos,<br />
compravam tabaco, produtos<br />
de higiene, entre outros<br />
produtos”, refere Susana Serpa<br />
Silva.<br />
“Em torno da Guerra Colonial,<br />
foram-se construindo,<br />
naturalmente, muitas<br />
memórias. Memórias de<br />
guerra, por quem combateu,<br />
por quem lá esteve. Memórias<br />
de quem ficou cá a viver a<br />
angústia da separação e da<br />
incerteza”.<br />
Nesse sentido, a oradora falou<br />
do seu trabalho na recolha de<br />
memórias no feminino, através<br />
de entrevistas e inquéritos<br />
junto de mães, esposas, irmãs<br />
e familiares de combatentes.<br />
Apresentou ainda exemplos de<br />
correspondência e aerogramas<br />
trocados entre militares e<br />
família durante os anos da<br />
Guerra.<br />
<strong>NO</strong>JAN20 15
eportagem<br />
"<br />
O que se verifica é que há vários problemas no que toca às memórias do<br />
Ultramar. Há cortinas de silêncio que só gradualmente se vão dissipando.<br />
Por vezes uma grande relutância em partilhar essas memórias, que se<br />
consideram do domínio privado. Nem sempre as pessoas conseguem<br />
exteriorizar aquilo que sentiram e que viveramm - Susana Serpa Silva<br />
Susana Serpa Silva concluiu a<br />
sua apresentação confessando<br />
que o seu “grande receio é que<br />
neste momento estão-se a perder<br />
os protagonistas, as memórias<br />
e estes objetos”, afirmando<br />
que “urge de facto recolher<br />
testemunhos orais, objetos e<br />
documentos particulares que<br />
nos falam de estados de alma,<br />
do quotidiano das operações<br />
militares” e lamentando<br />
a “escassez de apoios” à<br />
investigação histórica.<br />
Seguiu-se a apresentação<br />
do Doutor Sérgio Rezendes,<br />
assessor científico do Museu<br />
Militar dos Açores e professor<br />
no Colégio do Castanheiro,<br />
que veio enriquecer a tarde<br />
com mais dados e documentos<br />
históricos que ligam os<br />
Açores à Guerra do Ultramar,<br />
e, sobretudo, com a missão<br />
de demonstrar aos alunos e<br />
interessados os métodos para<br />
recolha de dados e memórias.<br />
O docente começa por afirmar<br />
que “a documentação guardada<br />
pelos ex-combatentes pode<br />
ser extremamente valiosa.<br />
Eles próprios não têm noção<br />
daquilo que têm. Para eles<br />
são memórias, vulgares<br />
papéis, mas para nós enquanto<br />
investigadores e historiadores,<br />
convém que essa documentação<br />
seja preservada”.<br />
Sérgio Rezendes refere ainda a<br />
importância das entrevistas com<br />
ex-combatentes, dando o seu<br />
testemunho da aprendizagem<br />
que os estudantes podem ter ao<br />
privar “com estas pessoas”.<br />
Outro aspeto “fundamental”<br />
para o orador é o trabalho de<br />
campo. Percorrer as ilhas dos<br />
Açores para perceber melhor e<br />
conhecer as figuras envolvidas<br />
neste conflito.<br />
Procurar os monumentos, e<br />
melhor que isso, as campas,<br />
os mausoléus dos nossos excombatentes.<br />
Esse passo é<br />
fundamental para vocês terem<br />
uma leitura do local de pertença<br />
e até mesmo para fazerem um<br />
ponto de situação de como<br />
a sociedade atual os está a<br />
tratar. E isto pode implicar um<br />
momento feliz ou um momento<br />
triste.<br />
Sérgio Rezendes refere também<br />
a importância de não “agarrarse<br />
à questão do conflito em si”.<br />
Focar-se sim na estrutura mental<br />
que acompanha o soldado a<br />
partir do momento em que ele<br />
sai de casa, “perceber o quadro<br />
mental destes homens”.<br />
Do ponto de vista social,<br />
“também era preciso perceber<br />
como é que estavam os nossos<br />
cá”. O investigador fala numa<br />
sociedade que “sofre com a<br />
partida dos seus filhos, mas não<br />
pode sofrer em excesso”, pelo<br />
facto de viverem em tempo de<br />
ditadura. Havia uma necessidade<br />
de mostrar o espírito patriótico,<br />
exemplificada pelo orador<br />
com uma fotografia de uma<br />
montra de um estabelecimento<br />
em Ponta Delgada, durante o<br />
Concurso do Dia das Montras.<br />
16 <strong>NO</strong>JAN20
eportagem<br />
No que diz respeito à<br />
preservação de todo o<br />
património documental<br />
e histórico da Guerra do<br />
Ultramar, Sérgio Rezendes<br />
diz ser necessário “arregaçar<br />
as mangas” e organizar os<br />
arquivos de documentos<br />
históricos, recorrer às<br />
bibliotecas como base de<br />
sustentação de todos os dados<br />
e estudos provenientes de<br />
acontecimentos deste género,<br />
etc.<br />
Por fim, o orador menciona<br />
ainda a importância de ver a<br />
História dos dois lados, ou seja,<br />
conhecer o nosso lado, mas<br />
tentar conhecer e saber mais<br />
como é que este conflito foi<br />
para os povos das ex-colónias,<br />
de modo a “posicionar e ter<br />
uma leitura mais íntima”.<br />
O que eu vos venho apresentar<br />
aqui, não vou dizer que é<br />
uma “mão cheia de nada”,<br />
porque efetivamente é muita<br />
informação que tenho vindo a<br />
recolher, dentro e fora do país,<br />
mas acima de tudo é um modus<br />
operandi, é uma mensagem<br />
aos alunos que me convidaram<br />
para vir cá, para que vejam este<br />
conflito em várias áreas, fora<br />
da caixa, a nível internacional”.<br />
Uma história que nos une hoje,<br />
em tempo de paz, através de um<br />
motivo que foi a guerra.<br />
O segundo painel das<br />
conferências focou-se no aspeto<br />
mais militar, levando dois<br />
homens que viveram a Guerra<br />
do Ultramar a falar sobre a sua<br />
experiência: Coronel Salgado<br />
Martins e Amaro de Matos.<br />
Coronel Salgado Martins<br />
cumpriu duas comissões<br />
de serviço no ex-Ultramar<br />
Português, em Angola e na<br />
Guiné.<br />
Durante a sua intervenção,<br />
abordou, de maneira mais<br />
técnica e tática, os anos de<br />
guerra. Apresentou também<br />
dados relativos ao número de<br />
açorianos que partiram para<br />
África, bem como os que lá<br />
falecerem, tal como já tinha<br />
sido apresentado antes.<br />
O Coronel referiu ainda a<br />
importância da “africanização<br />
da Guerra”, que começou a<br />
surgir a partir de meados da<br />
década de 60. Esta manobra<br />
consistia em recrutar tropas<br />
nos próprios territórios, o que<br />
permitia envolver as populações<br />
na Guerra, diminuindo a base<br />
de recrutamento das guerrilhas,<br />
completar a capacidade de<br />
recrutamento metropolitano,<br />
praticamente esgotado,<br />
vantagem no conhecimento<br />
do terreno e de adaptação ao<br />
meio, entre outras mais-valias<br />
para as tropas portuguesas.<br />
Estima-se que em 1973, 42%<br />
dos efetivos em Angola já eram<br />
tropa recrutada localmente,<br />
em Moçambique já era<br />
mais de metade, e na Guiné<br />
correspondia a 20%.<br />
Para além da “africanização<br />
da Guerra”, da prática de<br />
uma guerra de baixo custo<br />
adequada a um conflito de baixa<br />
intensidade, e da organização<br />
operacional, o Coronel Salgado<br />
Martins destaca como fatorchave<br />
para o sucesso de<br />
Portugal na Guerra do Ultramar,<br />
o facto de “ter sido executada<br />
<strong>NO</strong>JAN20 17
eportagem<br />
por soldados corajosos,<br />
com enorme capacidade de<br />
improvisação, frugalidade,<br />
robustez e adaptabilidade às<br />
mais rudes condições de vida”.<br />
Contudo, apontou também<br />
às consequências inerentes a<br />
qualquer guerra, realçando as<br />
mais de 9000 mortes registadas e<br />
mais de 30000 feridos.<br />
Concluindo a sua apresentação,<br />
o Coronel Salgado Martins cita<br />
uma passagem da publicação<br />
Exército na Guerra Subversiva:<br />
“Para os militares, o interesse<br />
do estudo dos conflitos<br />
subversivos, reside ainda,<br />
no facto de a solução desses<br />
conflitos não poder nunca ser<br />
obtida unicamente pelas forças<br />
armadas”, ou seja, na sua<br />
opinião, a missão das Forças<br />
Armadas “era dar tempo ao<br />
poder político para encontrar<br />
uma solução que só apareceu<br />
passados 14 anos”.<br />
Por fim, foi a vez de Amaro de<br />
Matos dar o seu testemunho<br />
daquilo que vivenciou,<br />
na primeira pessoa, em<br />
Moçambique, entre 1972 e 1974.<br />
O fundador da Associação para a<br />
Defesa do Património Marítimo<br />
dos Açores e da Associação<br />
Cívica “Casa do Triângulo” foi<br />
primeiro-cabo especialista em<br />
rádio montador.<br />
Amaro de Matos começou por<br />
citar José Saramago, que refere<br />
na História do Cerco de Lisboa,<br />
que “a História foi vida real no<br />
tempo em que ainda não era<br />
História”, afirmando depois<br />
que, “após 68 anos, e passados<br />
já 45 desde a data do regresso,<br />
tenho plena consciência que vivi<br />
um tempo real que hoje já teve<br />
tempo para ser efetivamente<br />
História”.<br />
“Entendi dar aqui, da guerra em<br />
que participei, um testemunho<br />
voltado para as suas implicações<br />
sociais”, sublinha o orador.<br />
“As certezas sucediam-se:<br />
Primeiro as inspeções, depois as<br />
"<br />
incorporações, as mobilizações<br />
e finalmente as partidas. As<br />
incertezas vinham depois:<br />
Quando? Para onde? Por que<br />
meio? Quanto tempo falta?<br />
E a maior incerteza de todas:<br />
Voltaremos?”<br />
Amaro de Matos fala de um país<br />
que estava cansado de guerra e<br />
confessa que o que se sentia na<br />
altura, no seio militar, era que a<br />
causa deste conflito não passava<br />
de uma “teimosia em não<br />
resolver em termos políticos”.<br />
O ex-combatente recorda a<br />
sua passagem por África com<br />
um misto de nostalgia e de<br />
esperança:<br />
Nostalgia enquanto que, apesar de todas as privações e<br />
incertezas, tenho recordações calorosas de África (…)<br />
Tenho esperança de que África viva um dia um ciclo de<br />
paz e prosperidade que a sua grandiosidade justifica.<br />
Ainda espero igualmente que a falta de atenção com<br />
que se tem olhado para os ex-combatentes seja revista<br />
para que não se cumpra o que sabiamente nos disse<br />
Eduardo Lourenço: “Existimos quando se começa<br />
a notar a nossa ausência. Quase sempre tarde... em<br />
Portugal nunca”.<br />
Finalizando a sua intervenção,<br />
era notória a mágoa de Amaro<br />
de Matos para com o regime<br />
fascista que liderava Portugal,<br />
voltando a realçar que tudo<br />
não passou de uma “teimosia<br />
política”:<br />
Ainda não sei avaliar o que teria<br />
sido a minha vida se tivesse<br />
sido possível omitir dela este<br />
capítulo. O que sei é que nasci<br />
num país doente e que o monstro<br />
que criou e alimentou se serviu<br />
de mim e de mais de um milhão<br />
de camaradas meus. Sei que o<br />
meu país hipotecou parte do seu<br />
futuro coletivo e pagou caro essa<br />
teimosia.<br />
Assim, urge de facto não deixar<br />
cair no esquecimento todos os<br />
artefactos e todos os homens<br />
que construíram este pedaço<br />
da grandiosa História do nosso<br />
país. Soldados de um regime,<br />
soldados de uma pátria, soldados<br />
de si mesmo, ou até mesmo<br />
soldados de uma teimosia.<br />
Certo é que foram estes homens<br />
que, por uma causa nobre ou<br />
não, partiram para África sem<br />
grande escolha, sem futuro<br />
certo, apenas com a certeza das<br />
memórias que guardarão para<br />
sempre e que necessitam de ser<br />
preservadas como pedaço da<br />
nossa História.<br />
18 <strong>NO</strong>JAN20
PUB<br />
PUB
o político<br />
do ano <strong>2019</strong><br />
josé contente<br />
deputado do ps/açores
destaque<br />
Findo mais um ano civil, é tempo de balanços e escrutínio sobre a atividade política na<br />
região. Para o efeito, a <strong>NO</strong> <strong>Revista</strong> decidiu destacar o melhor e mais notável político<br />
regional pela forma como desempenhou, durante o último ano, a sua ação política.<br />
22 <strong>NO</strong>JAN20
destaque<br />
j<br />
José António Vieira da Silva<br />
Contente nasceu na freguesia<br />
e vila de Velas, Ilha de São<br />
Jorge, a 13 de junho de 1958.<br />
É casado, tem dois filhos e<br />
é professor universitário de<br />
profissão, sendo licenciado<br />
em Geologia-Biologia<br />
pela Universidade dos<br />
Açores (UAc) e Mestre em<br />
Metodologia das Ciências<br />
pela Faculdade de Ciências da<br />
Universidade de Lisboa.<br />
Exerceu funções docentes<br />
no ensino secundário e na<br />
Universidade dos Açores.<br />
Foi neste estabelecimento<br />
de ensino superior diretor<br />
da Secção de Didática das<br />
Ciências da Educação.<br />
É assistente de carreira na<br />
Universidade dos Açores e<br />
está atualmente a completar<br />
o doutoramento, cuja tese<br />
será defendida, em 2020,<br />
na Universidade Clássica<br />
de Lisboa, na área STEM<br />
(Ciência, Tecnologia e<br />
Sociedade), e que se baseia<br />
fundamentalmente na<br />
integração dos micro satélites,<br />
da robótica, dos drones e da<br />
Inteligência Artificial, dentro<br />
da abordagem da resolução<br />
de problemas, destinada à<br />
Educação Científica para o<br />
século XXI. No seu empenho<br />
por uma cidadania mais ativa<br />
foi, também, fundador da<br />
associação cívica “Fórum<br />
Açoreano”.<br />
<strong>NO</strong>JAN20 23
no | www.norevista.pt<br />
É Membro da Comissão<br />
Nacional e da Comissão<br />
Regional do Partido Socialista.<br />
Foi coordenador das campanhas<br />
eleitorais do PS/Açores nas<br />
eleições regionais de 1996,<br />
2000 e 2004, 2008 e 2012,<br />
tendo sido igualmente, nesses<br />
quatro atos eleitorais, eleito<br />
deputado regional pelo círculo<br />
eleitoral da Ilha de São Miguel.<br />
Exerceu as funções para que<br />
foi reconduzido desde 9 de<br />
novembro de 1996-2008<br />
de Secretário Regional da<br />
Habitação e Equipamentos e de<br />
Secretário Regional da Ciência<br />
Tecnologia e Equipamentos de<br />
2008-2012. É deputado regional<br />
desde 2012, tendo sido reeleito<br />
em 2016-2020.<br />
José Contente candidatou-se<br />
pelo PS, em 2013, às eleições<br />
autárquicas para presidente da<br />
Câmara de Ponta Delgada, onde,<br />
apesar de não ter conquistado<br />
a mesma, obteve um resultado<br />
merecedor de atenção,<br />
deixando em aberto a almejada<br />
alternância na presidência da<br />
maior autarquia dos Açores.<br />
O deputado tem sido uma figura<br />
incontornável dentro do PS,<br />
ocupando cargos de liderança e<br />
mantendo-se sempre igual a si<br />
próprio nos princípios de missão<br />
a que se propôs.<br />
A sua matriz ideológica regese<br />
pelo rigor, honorabilidade e<br />
respeito escrupuloso na ordem<br />
da democracia.<br />
Quer como governante, quer<br />
como deputado, como cidadão<br />
ativo, José Contente sempre<br />
elevou o seu discurso, a sua<br />
atitude e a sua forma de estar<br />
a padrões de alta qualidade,<br />
defendendo argumentos sem<br />
ofender destinatários.<br />
Um percurso imaculado na<br />
propositura, no confronto e<br />
nas divergências, imprimindo<br />
sempre o superior interesse dos<br />
Açores em primeiro lugar.<br />
Como parlamentar, percurso<br />
nos últimos 7 anos, não se tem<br />
rogado a falsos pergaminhos, a<br />
prepotências de estatuto nem a<br />
segregações inusitadas no status<br />
quo político-partidário.<br />
Tem sido uma referência de<br />
homem de bons costumes,<br />
de princípios e com valores<br />
exemplares na nossa sociedade.<br />
Com um sentido de humor<br />
inteligente consegue, em<br />
poucas palavras, sem oprimir,<br />
sem ofender e sem destratar a<br />
democracia, suprimir ataques<br />
políticos e pessoais com<br />
a elegância e classe que o<br />
caracterizam.<br />
José Contente tem tido a mestria<br />
de saber gerir o passado com o<br />
presente na construção de um<br />
PS mais consistente sem que a<br />
sua presença seja ostensiva.<br />
Na transição de Carlos César<br />
para Vasco Cordeiro, assumiu o<br />
seu lugar como deputado com<br />
espírito de missão sem que em<br />
nenhum momento resvalasse<br />
para o revanchismo. Nessa<br />
qualidade de deputado, tem sido<br />
ele a intervir nas situações mais<br />
complicadas para proteger o<br />
legado socialista. E neste último<br />
ano, com o desgaste do PS, tem<br />
sido ele a figura de consensos<br />
que no parlamento e fora dele<br />
tem equilibrado e defendido<br />
a causa socialista de forma<br />
credível.<br />
A qualidade de trabalho<br />
apresentado como deputado<br />
quer na substância, quer na<br />
pertinência, quer mesmo<br />
nas suas intervenções<br />
parlamentares, tem dignificado<br />
o arauto da autonomia regional.<br />
José António Vieira da Silva<br />
Contente, como político, como<br />
governante, como deputado e<br />
como cidadão tem conseguido<br />
um percurso invejável no<br />
tratamento e diálogo com<br />
os seus opositores, sabendo<br />
evitar, sempre, os incidentes<br />
pessoais no confronto de ideias,<br />
pensamentos e ideologias,<br />
respeitando as divergência<br />
políticas, as exaltações de<br />
circunstância e, sobretudo,<br />
a verdadeira essência da<br />
democracia, o cidadão.<br />
24 <strong>NO</strong>JAN20
O deputado tem sido uma<br />
figura incontornável<br />
dentro do PS, ocupando<br />
cargos de liderança e<br />
mantendo-se sempre igual<br />
a si próprio nos princípios<br />
de missão a que se propôs.<br />
<strong>NO</strong>JAN20 25
entrevista<br />
em entrevista<br />
bárbara chaves<br />
ps/açores na alraa<br />
claúdia carvalho<br />
Bárbara Pereira Torres<br />
de Medeiros Chaves,<br />
deputada pelo PS/Açores na<br />
Assembleia Legislativa da<br />
Região Autónoma dos Açores<br />
(ALRAA), nasceu em 1976.<br />
É Licenciada em Engenharia<br />
do Ambiente e Mestre em<br />
Ordenamento do Território<br />
e Planeamento Ambiental.<br />
Desempenha um regime de<br />
exclusividade na ALRAA e<br />
é Presidente da Comissão<br />
Permanente de Economia.<br />
Pertenceu, no passado,<br />
à Comissão de Assuntos<br />
Parlamentares, Ambiente e<br />
Trabalho.<br />
A <strong>NO</strong> <strong>Revista</strong> sabe que é<br />
Licenciada em Engenharia<br />
do Ambiente e Mestre em<br />
Ordenamento do Território<br />
e Planeamento Ambiental.<br />
Tendo este percurso<br />
profissional, em que momento<br />
da sua vida é que decidiu<br />
ingressar pela vida política?<br />
Vejo a política como uma forma<br />
de fazer algo por Santa Maria<br />
e pelos Açores. Foi assim que,<br />
em 2008, encarei o convite de<br />
Carlos César para integrar a<br />
lista de deputados regionais<br />
por Santa Maria e é assim<br />
que penso até hoje. Por isso,<br />
em meu entender, a política<br />
não é algo que se “ingresse”;<br />
é sim, um compromisso que<br />
se assume para contribuir<br />
para o desenvolvimento das<br />
comunidades em que estamos<br />
inseridos. Nasci numa família<br />
socialista, os meus pais sempre<br />
foram socialistas, o meu pai<br />
desempenhou funções políticas<br />
e desde cedo me interessei pela<br />
política e pelas questões que<br />
preocupam a sociedade. Aos<br />
14 anos era já da Juventude<br />
Socialista e fui crescendo entre<br />
os ideais socialistas. Portanto,<br />
encaro as funções de deputada<br />
com muita responsabilidade,<br />
com muito sentido de missão e<br />
determinação, sem me desviar<br />
do meu objetivo que é o<br />
desenvolvimento da minha terra<br />
e aumento da qualidade de vida<br />
dos Marienses em particular e<br />
dos Açorianos em geral.<br />
Antes de ser deputada do<br />
PS/Açores na Assembleia<br />
Legislativa da Região<br />
Autónoma dos Açores<br />
(ALRAA), que outro cargo ou<br />
função desempenhava até aí?<br />
Após terminar a licenciatura<br />
fiz como qualquer jovem<br />
licenciado faz hoje em<br />
dia: ingressei num estágio<br />
26 <strong>NO</strong>JAN20
entrevista<br />
profissional em Santa Maria, no<br />
Serviço de Ambiente, similar<br />
ao atual programa Estagiar.<br />
Depois, ingressei no quadro da<br />
Direção Regional do Ambiente,<br />
na Horta e após 3 anos, quando<br />
abriu concurso para Santa<br />
Maria, concorri e aqui fiquei,<br />
no Serviço de Ambiente.<br />
Sempre foi meu objetivo<br />
regressar à minha ilha e tentar<br />
dar o meu contributo para o<br />
desenvolvimento da terra que<br />
me viu nascer. Desempenhei<br />
entre 2005 e 2008 funções<br />
de chefia nesse Serviço, num<br />
período muito trabalhoso, mas<br />
extremamente desafiante ao<br />
nível da qualidade ambiental,<br />
conservação da natureza e<br />
ordenamento do território.<br />
Nesse período, fruto da política<br />
ambiental implementada, foi<br />
possível fazer-se crescer o<br />
serviço, com novas valências e<br />
áreas de atividade, com ganhos<br />
efetivos em termos ambientais.<br />
Enquanto deputada da<br />
bancada socialista, ocupa<br />
um regime de exclusividade<br />
em relação a essa atividade?<br />
Se não, que outras funções<br />
desempenha para além das já<br />
mencionadas?<br />
Desempenho funções em<br />
regime de exclusividade desde<br />
o meu primeiro mandato, por<br />
uma questão de opção.<br />
Enquanto Presidente da<br />
Comissão Permanente de<br />
Economia, qual considera<br />
ser a sua responsabilidade ao<br />
ocupar este cargo?<br />
A Comissão de Economia<br />
trabalha matérias muito<br />
importantes para o<br />
desenvolvimento da Região,<br />
como a agricultura e as pescas,<br />
as acessibilidades marítimas,<br />
aéreas e terrestres, o turismo,<br />
a energia, as finanças, entre<br />
outras. Encaro, por isso,<br />
a função de Presidente da<br />
Comissão de Economia com<br />
grande responsabilidade e<br />
respeito por todos os deputados<br />
que integram a Comissão.<br />
O objetivo das comissões<br />
é promover o debate e o<br />
esclarecimento das matérias<br />
em análise e faço por gerir<br />
os trabalhos de forma a<br />
permitir que todos se sintam<br />
esclarecidos. Julgo importante<br />
realçar a importância de,<br />
nesta Comissão, termos tido<br />
cada vez mais iniciativas<br />
apresentadas pela sociedade<br />
civil, nomeadamente através<br />
das petições públicas. Merece<br />
também destaque o trabalho<br />
realizado na comissão, onde<br />
ouvimos representantes de<br />
entidades, especialistas e o<br />
chamado cidadão comum.<br />
No plenário de outubro,<br />
na discussão do Plano e<br />
Orçamento para 2020, dizia<br />
que “falar de sustentabilidade<br />
é falar de futuro”. Considera<br />
que os Açores têm dado os<br />
passos certos no rumo à<br />
sustentabilidade ambiental?<br />
A sustentabilidade assenta<br />
em 3 pilares fundamentais:<br />
as questões sociais, as<br />
económicas e as ambientais.<br />
Não é possível dissociá-las;<br />
é necessário, sim, articulálas<br />
e geri-las, desenvolvendo<br />
políticas que coloquem as<br />
pessoas no centro da aplicação<br />
de políticas - para que ninguém<br />
fique para trás - dando aos<br />
fatores ambientais um carácter<br />
aglutinador onde todas as outras<br />
atividades se desenvolvem.<br />
E isso tem sido conseguido,<br />
apesar de ser um trabalho<br />
que nunca não terminará,<br />
porque existirão sempre novos<br />
desafios a superar. A Região foi<br />
distinguida recentemente como<br />
Destino Turístico Sustentável,<br />
que é muito difícil de conquistar<br />
atendendo aos critérios que<br />
tem que ser respeitados para<br />
se atingir esse objetivo; temos<br />
merecido ao longo dos anos um<br />
conjunto significativo de outros<br />
galardões e distinções que, em<br />
meu entender, permitem-nos<br />
afirmar que estamos no rumo<br />
certo e que é desta forma que<br />
atingiremos os padrões de<br />
sustentabilidade que permitirão<br />
aos açorianos e às próximas<br />
gerações terem uma melhor<br />
qualidade de vida.<br />
Durante o seu percurso e até<br />
ao presente, qual momento<br />
destacaria enquanto deputada<br />
pelo PS/Açores na ALRAA?<br />
Em termos parlamentares, o<br />
veto do então Presidente da<br />
República Cavaco Silva à<br />
revisão do Estatuto Político-<br />
Administrativo da Região<br />
Autónoma dos Açores, que<br />
forçou uma nova votação por<br />
parte do Parlamento Regional, é<br />
sem dúvida um dos momentos<br />
mais marcantes que destaco,<br />
pois permitiu o reforço da nossa<br />
Autonomia face a visões mais<br />
centralistas que ainda existem.<br />
Inevitável, destacar, como<br />
aspeto negativo, a perda de dois<br />
colegas e amigos deputados,<br />
o André Bradford e o Paulo<br />
Parece, situação que me fez<br />
refletir sobre a necessidade<br />
de se viver mais o presente,<br />
<strong>NO</strong>JAN20 27
no | www.norevista.pt<br />
reforçando os valores da família<br />
e da amizade.<br />
Quais são os seus projetos no<br />
futuro no que diz respeito ao<br />
partido socialista?<br />
Projetar o futuro é importante,<br />
mas confesso que não penso<br />
muito nisso em relação a mim!<br />
O que me importa realmente<br />
é que o Partido Socialista<br />
continue a ter a capacidade de<br />
desenvolver políticas e ações<br />
que melhorem a qualidade<br />
de vida dos Açorianos, que<br />
levem os Açores sempre mais<br />
além e que contribuam para<br />
uma Região cada vez mais<br />
empreendedora, dinâmica e<br />
solidária, colocando sempre as<br />
pessoas em primeiro lugar.<br />
Quais considera as temáticas<br />
mais pertinentes a serem<br />
debatidas de momento na<br />
nossa região?<br />
Há temas que merecem uma<br />
atenção constante para o Partido<br />
Socialista dos Açores e que,<br />
apesar dos bons resultados<br />
que se têm alcançado, vão<br />
continuar a ser uma prioridade,<br />
como são os casos do emprego,<br />
da saúde, da educação, da<br />
mobilidade dos Açorianos,<br />
do crescimento económico,<br />
entre outros. Simultaneamente,<br />
temos nos próximos tempos<br />
novos desafios a que é precioso<br />
responder, nomeadamente no<br />
que diz respeito ao combate à<br />
pobreza, ao acesso à habitação<br />
e na proteção dos nossos<br />
idosos e das nossas crianças.<br />
Mas a gestão do nosso<br />
"O QUE ME IMPORTA<br />
REALMENTE É QUE O<br />
PARTIDO SOCIALISTA<br />
CONTINUE A TER<br />
A CAPACIDADE DE<br />
DESENVOLVER POLÍTICAS<br />
E AÇÕES QUE MELHOREM A<br />
QUALIDADE DE VIDA<br />
DOS AÇORIA<strong>NO</strong>S"<br />
Mar, a melhoria dos nossos<br />
sistemas de Transportes e a<br />
proteção do Ambiente, são<br />
também temáticas que estarão<br />
certamente em destaque.<br />
Sobre a última Comissão<br />
Permanente de Economia da<br />
audição do novo presidente do<br />
Conselho de Administração<br />
da SATA, sente que todas as<br />
questões colocadas foram<br />
bem resolvidas? Vê em Luís<br />
Rodrigues um profissional<br />
do setor capaz de conseguir<br />
diminuir os prejuízos da<br />
companhia açoriana?<br />
Sobre a audição realizada na<br />
Comissão de Economia posso<br />
garantir que todos os partidos<br />
políticos, mesmo aqueles que<br />
não têm assento na comissão,<br />
tiveram oportunidade de<br />
colocar todas as perguntas que<br />
entenderam ser pertinentes.<br />
Realço a importância de todos<br />
os deputados terem tido a<br />
possibilidade de questionar<br />
o futuro presidente do<br />
Conselho de Administração<br />
da SATA cujo currículo foi,<br />
aliás, bastante elogiado. As<br />
respostas que obtivemos nessa<br />
audição revelaram que o futuro<br />
presidente da nossa companhia<br />
aérea está preparado, e também<br />
bastante motivado, para<br />
enfrentar os desafios que se<br />
colocam quer em termos de<br />
reestruturação quer em termos<br />
de sustentabilidade da SATA.<br />
28 <strong>NO</strong>JAN20
as frases<br />
"ps e psd querem um incinerador em São miguel<br />
a toda A FORÇA"<br />
ANTÓNIO LIMA, BLOCO DE ESQUERDA açores<br />
"os açores não logram alcançar o sucesso que o governo regional<br />
e o partido socialista não artificalmente proclamado"<br />
maria joão carreiro, psd açores<br />
"não há cura sem dor"<br />
luís rodrigues, presidente sata<br />
"as propostas apresentadas no orçamento de estado para 2020 registam o<br />
esforço de transparências para a região e a continuidade de investimentos<br />
fundamentais, de acordo com os compromissos que assumimos com os açorianos"<br />
isabel almeida rodrigues, ps açores<br />
<strong>NO</strong>JAN20 29
eportagem<br />
A relação entre o espólio<br />
arqueológico e os públicos mais jovens<br />
Uma viagem pelos tesouros do Mar: a aventura que dá a conhecer e<br />
sensibiliza para a preservação do património subaquático da Região<br />
RUI SANTOS<br />
o<br />
O Clube de História da Fundação<br />
Sousa Oliveira recebeu Sandra<br />
de Sousa Bairos, Técnica de<br />
Serviço Educativo do Museu<br />
Carlos Machado e licenciada em<br />
Geografia pela Universidade de<br />
Coimbra. A convidada apresentou<br />
o seu trabalho educativo, criado<br />
no âmbito da sua tese de mestrado<br />
em Património, Museologia e<br />
Desenvolvimento na Universidade<br />
dos Açores, intitulada “Contributo<br />
para a Criação de um Serviço<br />
Educativo da Fundação Sousa<br />
de Oliveira: O Desenvolvimento<br />
de Laços entre o Espólio<br />
Arqueológico e os Públicos mais<br />
jovens”, a qual deu origem ao seu<br />
livro Uma viagem pelos tesouros<br />
do Mar dos Açores, que visa<br />
sensibilizar para a conservação<br />
do património e para a questão<br />
ambiental, contando com o apoio<br />
da Direção Regional da Cultura.<br />
30 <strong>NO</strong>JAN20
eportagem<br />
O moderador do evento<br />
foi o arqueólogo Diogo<br />
Teixeira Dias, que na sua<br />
introdução falou um pouco<br />
sobre o percurso académico<br />
e profissional da oradora,<br />
afirmando ter sido uma tese<br />
“elaborada com grande<br />
dificuldade, mas uma tese<br />
altamente meritória”, porque<br />
“fez uma omelete onde ainda<br />
não haviam ovos”, uma vez<br />
que “o espólio arqueológico da<br />
Fundação Sousa de Oliveira,<br />
apesar de estar disponível ao<br />
público, só teve inventário, no<br />
mês passado”, referindo-se ao<br />
mês de novembro.<br />
Sandra Bairos utilizou a<br />
Fundação para partilhar um<br />
serviço educativo, pois achou<br />
que “aqueles textos tinham<br />
histórias que as pessoas<br />
deviam conhecer”, pelo<br />
facto de retratarem “períodos<br />
importantes da história”.<br />
Explicando o processo do seu<br />
trabalho, a oradora confirma<br />
ter vindo para a Fundação para<br />
tentar fazer um levantamento do<br />
que é que existia em termos de<br />
espólio. A primeira dificuldade<br />
com que se deparou foi a<br />
falta de inventariação, “estava<br />
disperso e não estava estudado”.<br />
Sandra criou uma estratégia de<br />
orientação que se baseava em<br />
sete perguntas e na resposta às<br />
mesmas, tendo em conta o seu<br />
Target, o público jovem.<br />
As questões foram as seguintes:<br />
O que é uma Fundação?<br />
Quais são os objetivos de uma<br />
Fundação? Porque é que se<br />
cria uma Fundação? Quem<br />
foi Sousa de Oliveira? O que<br />
é um arqueólogo? O que é a<br />
Arqueologia?, e, depois, registar<br />
alguns dos elementos que<br />
fazem parte do espólio, saber<br />
porque é que Sousa de Oliveira,<br />
“pioneiro da arqueologia nos<br />
Açores”, escolheu Vila Franca<br />
do Campo para fazer as suas<br />
escavações arqueológicas.<br />
A oradora sublinhou que,<br />
dando resposta a estas questões,<br />
“estava a criar um serviço<br />
educativo”, querendo “criar<br />
ações que comunicassem essa<br />
informação com os públicos”,<br />
passando, assim, “por uma<br />
nova fase. Deixaria de ser<br />
um relatório de um trabalho<br />
efetuado na Fundação, e tinha<br />
de passar a ser um trabalho de<br />
campo, um projeto”.<br />
Pelo facto da Fundação não<br />
ter as condições necessárias,<br />
“pode perfeitamente cooperar<br />
com outro sítio e desenvolver<br />
esse serviço educativo<br />
<strong>NO</strong>JAN20 31
eportagem<br />
através de parcerias” não<br />
só com outras instituições<br />
culturais, mas também “indo<br />
às escolas”, usufruindo<br />
das “aulas de Cidadania” e<br />
ainda de disciplinas como<br />
“História, Geografia e<br />
Cultura dos Açores”, algo<br />
“fundamental para promover<br />
este conhecimento sobre a<br />
arqueologia nos Açores, porque<br />
é uma coisa que ouve-se falar<br />
muito pouco, mas ela existe”,<br />
afirmou.<br />
Este projeto seria para<br />
implementar através de uma<br />
parceria com o Museu de Vila<br />
Franca do Campo, “porque<br />
este reunia as condições,<br />
como Técnicos de Serviço<br />
Educativo e espaço reservado<br />
à arqueologia, e tinha também<br />
alguns artefactos de Sousa de<br />
Oliveira”, ou seja, “acho que<br />
tinha tudo para dar certo”.<br />
Deste modo, a interveniente<br />
desenvolveu ações que<br />
pudessem ser executadas<br />
naquele território, “porque isso<br />
das parcerias entre instituições<br />
culturais é fundamental para o<br />
desenvolvimento. As fundações<br />
e as instituições culturais não<br />
devem estar fechadas sobre si<br />
próprias”.<br />
Uma das ações desenvolvidas<br />
seria “um roteiro pedestre,<br />
que partia do Museu de Vila<br />
Franca e ia até a um sítio onde<br />
tinha sido desenvolvida uma<br />
campanha (arqueológica)”.<br />
Durante o percurso “o guia<br />
contava a história de Vila<br />
Franca do Campo”, ponto de<br />
partida para as escavações.<br />
O segundo momento “era<br />
uma dramatização, muito<br />
inspirada numa visita que<br />
eu fiz a Machado de Castro<br />
(Museu) em Coimbra, em que a<br />
dramatização é uma das ações<br />
de serviço educativo, através de<br />
um percurso guiado”.<br />
A ação pressuponha “um guia<br />
personalizado de Sousa de<br />
Oliveira a contar a história<br />
do que é ser arqueólogo,<br />
como um detetive que conta<br />
as histórias dos objetos, e<br />
explicando-os, conta a história<br />
de determinados modos de vida<br />
de um determinado povo num<br />
determinado espaço e tempo”.<br />
Diogo Teixeira Dias disse<br />
que explicar no terreno “é<br />
muito fácil quando se trata da<br />
arqueologia convencional”,<br />
referindo-se à arqueologia<br />
em terra, explicitando que<br />
“quando se trata da realidade<br />
subaquática, então muito<br />
mais para crianças, a coisa<br />
complica-se, porque uma<br />
criança não pode mergulhar”,<br />
e , “desejavelmente”, o espólio<br />
arqueológico deve ficar no seu<br />
contexto, “no mar, a menos que<br />
haja risco de roubo ou esteja<br />
32 <strong>NO</strong>JAN20
eportagem<br />
num local muito abrasado”.<br />
Como exemplo, o arqueólogo<br />
referiu um barco naufragado,<br />
colocando a questão retórica:<br />
“como é que se levanta um<br />
naufrágio?”. Mencionou que<br />
os nórdicos fazem-no com os<br />
navios vikings, porém “estamos<br />
a falar de outros orçamentos”.<br />
Sandra Bairos alegou ser<br />
importante, para o público<br />
mais jovem, “contar a história<br />
de todo aquele património que<br />
existe debaixo de água”. Daí a<br />
criação do seu livro, que leva<br />
a “considerarem que estas<br />
histórias são tesouros, e o que é<br />
que fazemos com os tesouros?<br />
Nós temos que protegê-los e<br />
salvaguardá-los”.<br />
A viagem começa aqui:<br />
Então, a autora criou as<br />
personagens que vão fazer<br />
uma viagem a vários sítios<br />
subaquáticos dos Açores, de<br />
interesse arqueológico, “que são<br />
barcos naufragados, canhões ou<br />
cemitérios de âncoras”.<br />
A personagem principal do<br />
livro é o Tito, “o menino do<br />
mar”. O avô do Tito chamavase<br />
Doraço e era pescador, mas<br />
não trazia peixe, daí todos se<br />
questionarem sobre o facto:<br />
“um pescador que não traz<br />
peixe, mas que pescador é esse?<br />
Ele na verdade não era bem um<br />
pescador”.<br />
O avô Doraço, sempre que<br />
vinha das suas viagens ao<br />
mar, “ia para o alpendre e<br />
começava a contar histórias,<br />
e as pessoas que passavam<br />
pela rua ouviam-no a contar<br />
histórias, os amigos do Tito não<br />
acreditavam naquelas histórias<br />
e sentia-se muito triste por esse<br />
facto, porque ele acreditava nas<br />
histórias que o avô contava”.<br />
O avô do Tito acabou por<br />
desaparecer no mar e o Tito<br />
ia sempre para a ponta do cais<br />
falar com o mar “sobre aquilo<br />
que eu vou contar que eram<br />
histórias”.<br />
O Doraço é uma personagem<br />
que representa o avô “como<br />
nós gostamos, que contam<br />
histórias”, que eram sempre<br />
sobre o mar, “sobre peixes<br />
grandes que viviam em barcos<br />
que estavam lá no fundo do<br />
mar e que eram tesouros, que<br />
o fundo do mar tinha muitos<br />
tesouros, mas que os tesouros<br />
eram para ficar lá”. O Tito “ia<br />
para as bibliotecas para tentar<br />
perceber essas histórias que o<br />
avô contava”.<br />
“Numa das suas idas à ponta<br />
do cais, estava a falar e ouve<br />
um barulho, era uma tartarugaboba<br />
(chamada Tamar) e uma<br />
criatura metálica que era um<br />
robô, Strike era o nome do<br />
robô. Era um robô que pertencia<br />
a uma expedição que estudava<br />
fontes hidrotermais. Uma das<br />
fontes hidrotermais era a Lucky<br />
Strike, e por isso o nome dele<br />
era Strike”.<br />
A autora, ao longo da obra,<br />
tenta sempre adicionar mais<br />
conteúdo à sua história, por<br />
exemplo a personagem da<br />
tartaruga-boba consciencializa<br />
para a problemática atual<br />
com as tartarugas que comem<br />
plásticos e que ficam presas<br />
em redes de pescadores, sendo<br />
o seu nome (Tamar) inspirado<br />
numa associação Brasileira que<br />
protege a espécie. O facto de<br />
contar histórias de naufrágios<br />
implica uma história que conta<br />
muitas outras histórias, não só<br />
do naufrago, mas também do<br />
barco que era, “antes de ser um<br />
barco que transportava pessoas,<br />
também, se calhar participou<br />
em guerras, contando, assim,<br />
as histórias que fazem parte do<br />
nosso mar”.<br />
Então, a viagem começa pelo<br />
Tito a descobrir estas histórias.<br />
A tartaruga e o robô convidamno<br />
e o Tito vai mergulhar ao<br />
mar a fim de conhecer esses<br />
“verdadeiros tesouros que são<br />
objetos que contam histórias.<br />
Como se esse mar fosse um<br />
museu, e os barcos naufragados<br />
fossem os objetos, e as histórias<br />
a comunicação. Os livros<br />
são meios de comunicação<br />
fundamentais”, sublinhou.<br />
A oradora, durante a sua<br />
intervenção, mostrou alguns<br />
exemplos dos náufragos<br />
visitados pelo Tito, e das<br />
histórias que a personagem<br />
ia descobrindo sobre estes<br />
mesmos náufragos, ao longo da<br />
sua aventura.<br />
O Dori naufragou em 1964,<br />
a cinco minutos do porto de<br />
Ponta Delgada, e a menos de<br />
20 metros de profundidade.<br />
“Foi um cargueiro que<br />
transportava muito aço, mas<br />
também teve outras histórias<br />
muito importantes, por exemplo<br />
participou na invasão da<br />
Normandia”.<br />
“Existem mais do que<br />
1000 naufrágios que estão<br />
identificados (nos Açores), mas<br />
apenas 30 são visitados. Uma<br />
forma de fazermos as crianças<br />
visitarem e reconhecerem<br />
estes espaços, naturalmente, é<br />
através do texto. O objetivo é<br />
sensibilizar para este património<br />
cultural”, afirmou a oradora.<br />
O Canárias era um barco a<br />
vapor espanhol que naufragou<br />
ao largo da ilha de Santa Maria,<br />
em 1871, e está localizado<br />
junto à Praia Formosa. Devido<br />
ao facto de estar “a três metros<br />
de profundidade” é possível<br />
ser visitado. Teve uma história<br />
“muito interessante, não só<br />
<strong>NO</strong>JAN20 33
eportagem<br />
Guia do Património Cultural Subaquático dos Açores<br />
transportou escravos, mas<br />
também participou na guerra<br />
dos 10 anos da independência<br />
de Cuba, ou seja, são várias<br />
histórias. Foi uma embarcação<br />
muito importante na Segunda<br />
Guerra Mundial”, sublinhou.<br />
O cemitério de âncoras, na<br />
Baía de Angra, formou-se,<br />
“porque ali passavam muitas<br />
embarcações, estava num<br />
ponto de paragem obrigatório”.<br />
Naquela zona, o vento, que<br />
sopra de Sul e Sueste, ficou<br />
conhecido localmente por<br />
"vento carpinteiro", “porque<br />
trazia as madeiras dos barcos<br />
para a costa, um fenómeno<br />
histórico daquela baía”.<br />
O Mazzini era um cargueiro a<br />
vapor italiano, de 128 metros,<br />
que naufragou ao largo da ilha<br />
Graciosa, em 1925, “e muitas<br />
pessoas foram buscar os objetos<br />
que hoje em dia têm em casa”.<br />
O moderador, Diogo Teixeira<br />
Dias, referiu, quanto a isso, que<br />
“muitas vezes as pessoas não<br />
fazem por mal, mas têm que<br />
ver a realidade, porque estão<br />
a pegar em património que é<br />
de todos”, situação para a qual<br />
Sandra Bairos apela no seu<br />
livro: “a personagem do avô<br />
Doraço já dizia que aqueles<br />
objetos são para ficar ali, e<br />
esta é uma forma de lutar pela<br />
preservação e pela salvaguarda<br />
do património”.<br />
O Her Majesty Ship Pallas<br />
naufragou em 1783, na Calheta,<br />
ilha de São Jorge. “Era um<br />
batedor, era aquele que ia à<br />
frente nos comboios de guerra,<br />
e fez parte da Guerra dos 7 anos<br />
e da Guerra da Independência<br />
Americana”.<br />
O Caroline era um veleiro<br />
Francês que naufragou junto<br />
à ilha do Pico, em 1901, foi<br />
“muito importante porque<br />
transportava uma substância<br />
que era o nitrato do chile, que<br />
servia para fertilizante dos solos<br />
europeus, mas também como<br />
um componente de explosivos”.<br />
O Slavónia naufragou, em<br />
1909, no Lajedo na ilha<br />
das Flores. Transportava<br />
emigrantes, vinha de Nova<br />
Iorque para Liverpool, “e os<br />
passageiros enviaram bilhetes<br />
ao comandante com interesse<br />
em observar as ilhas dos<br />
Açores, durante essa alteração<br />
de rota embateu na ilha das<br />
Flores e naufragou”. Antes de<br />
se chamar Slavónia chamavase<br />
Yamuna e pertencia ao<br />
transporte de correspondências<br />
do Post Office, únicas<br />
embarcações autorizadas a<br />
transportar correspondência<br />
britânica na época vitoriana.<br />
A autora decidiu optar pelas<br />
34 <strong>NO</strong>JAN20
eportagem<br />
crianças como público alvo,<br />
porque, na sua opinião, “devese<br />
sensibilizar, cada vez<br />
mais cedo, porque, quando<br />
crescerem, esses valores já<br />
estão intrinsecamente inseridos,<br />
para que no futuro a sociedade<br />
tenha sensibilidade para estas<br />
questões”.<br />
O moderador arqueólogo,<br />
Diogo Teixeira Dias,<br />
salientou que “em termos de<br />
boas práticas do património<br />
subaquático os Açores estão<br />
classificados nos cinco<br />
primeiros pela UNESCO, a<br />
nível mundial”.<br />
O mesmo disse que “o chamado<br />
achado recolhido, são achados<br />
móveis, que se podem levantar<br />
com alguma facilidade”, e, em<br />
alguns casos, temos que revelálos<br />
do mar, porque correm o<br />
risco de serem levados para<br />
casa por alguém que seja malintencionado”.<br />
Em suma, o arqueólogo<br />
clarificou, resumidamente,<br />
o processo pelo qual passa<br />
o achado. Afirmou que a<br />
legislação regional nesse aspeto<br />
“é muito boa e foi pioneira”,<br />
sendo que “estabelece<br />
valores mais altos para os<br />
achados subaquáticos do<br />
que propriamente aquilo que<br />
acontece no continente”.<br />
Relativamente à questão<br />
do pagamento ao achador,<br />
a legislação regional<br />
“desburocratiza imenso. É claro<br />
que são processos demorosos,<br />
mas em termos de pagamentos<br />
é desburocratizado. O achador<br />
tem direito a uma parte do<br />
valor comercial da peça”, e é<br />
“salvaguardado” nesse sentido,<br />
já que “caso não concorde<br />
com esse valor, pode recorrer<br />
e a Direção Regional nomeia<br />
um perito, o achador nomeia<br />
outro”, e, assim, “o valor é<br />
desempatado”. Posteriormente,<br />
“a peça é entregue e depois o<br />
Governo Regional é que decide,<br />
mediante o contexto, quem<br />
tem condições para a receber”,<br />
pois, devido à fragilidade de<br />
alguns achados, é provável que<br />
se danifiquem por não estarem<br />
reunidas as condições para o<br />
seu tratamento, como é o caso<br />
do exemplo que Diogo Teixeira<br />
testemunhou: “as peças que<br />
saem do mundo subaquático<br />
não podem entrar no mundo<br />
seco repentinamente, porque<br />
eu assisti desfazer-se um santo<br />
que era antiquíssimo de certeza,<br />
porque não houve o cuidado<br />
com isso”.
crónica<br />
JOÃO F. CASTRO<br />
PROFESSOR MESTRADO EM GESTÃO PORTUÁRIA<br />
Nova<br />
energia,<br />
no Mar<br />
dos Açores<br />
de Gases com Efeito de Estufa<br />
(GEE) que, após a sua emissão,<br />
permanecem na atmosfera<br />
terrestre, por longos anos,<br />
provocando alterações da sua<br />
composição, o que, adicionado<br />
à variabilidade natural, poderá<br />
gerar uma situação de irreversibilidade,<br />
na mudança do clima,<br />
atribuída à atividade humana.<br />
A CQNUAC tem sido desenvolvida<br />
pelas diferentes Conferência<br />
das Partes (COP), que<br />
a concretizam em objetivos,<br />
destacando-se: o Protocolo de<br />
Quioto, em 1997, que definiu<br />
metas quantitativas, para as<br />
emissões de cada País; e o<br />
Acordo de Paris, em 2015, ao<br />
estabelecer que, o aquecimento<br />
global, deveria ser contido<br />
abaixo de 2 ºC, preferencialmente<br />
em 1,5 ºC.<br />
A União Europeia (UE), avalia<br />
o(s) progresso(s)das principais<br />
fontes de emissões, comunicados<br />
pelos Países, tendo acordado<br />
reduzir as emissões de GEE<br />
(tendo por base o ano de 1990),<br />
estabelecendo objetivos, de<br />
redução em 20% até 2020, de<br />
40% até 2030 e de 80% a 95%<br />
até 2050.<br />
No entanto o transporte marítimo<br />
internacional não ficou<br />
abrangido pelo acordo de Paris.<br />
Não foram estabelecidas metas<br />
intercalares para 2020 e 2030<br />
para as emissões e remoções<br />
do transporte marítimo internacional.<br />
Se nada for feito,<br />
estudos estimam que estas<br />
emissões poderão aumentar<br />
significativamente, prevendo-se<br />
Este texto será lido no ano<br />
2020. O Secretário Geral, da<br />
Organização das Nações Unidas<br />
(ONU), António Guterres, na sua<br />
mensagem de ano novo, destacou<br />
novamente a problemática das<br />
Alterações Climáticas, que comprometem<br />
o futuro do Planeta.<br />
A ONU, hoje com 193 estados-membros,<br />
foi criada após<br />
a 2ª Guerra Mundial, para<br />
desenvolver a cooperação internacional.<br />
Em 1992, no Rio de<br />
<strong>Janeiro</strong>, realizou a Conferência<br />
das Nações Unidas para o Meio<br />
Ambiente e o Desenvolvimento,<br />
da qual resultou a Convenção<br />
Quadro das Nações Unidas para<br />
as alterações Climáticas (CQNU-<br />
AC). Subscrita pela maioria<br />
dos países do mundo, teve por<br />
base os alertas da comunidade<br />
científica para a necessidade de<br />
estabilização da concentração<br />
36 <strong>NO</strong>JAN20
crónica<br />
que, possam mesmo ultrapassar<br />
as emissões realizadas em<br />
terra, sobretudo quando 90%<br />
das trocas comerciais (75% na<br />
Europa), são realizadas por via<br />
marítima. Neste momento a<br />
Organização Marítima Internacional<br />
(IMO) tem o objectivo<br />
de reduzir 50% das emissões<br />
até 2050, comparando com<br />
o ano de 2008. A Convenção<br />
Internacional para a Prevenção<br />
da Poluição por Navios (MAR-<br />
POL – “Marine Pollution”), no<br />
seu anexo VI, define regras para<br />
as emissões gases para a atmosfera.<br />
Delimita áreas de emissões<br />
controladas (ECA – Emission<br />
Controled Area), e regras, a que<br />
os combustíveis utilizados pelos<br />
navios, têm de obedecer, como<br />
os teores de enxofre e de sulfuretos<br />
utilizados. Em 2012 introduziu<br />
novos limites (3,5%),<br />
para a percentagem de enxofre<br />
nos combustíveis, prevendo-se<br />
para 1 de <strong>Janeiro</strong> de 2020 a<br />
aplicação do limite de 0,5%.<br />
Em Portugal estudos apontam<br />
para que, as emissões resultantes<br />
do transporte marítimo,<br />
tenham impacto na qualidade<br />
do ar, chegando às zonas costeira,<br />
com contribuições de 10%<br />
a 20% para as concentrações<br />
de óxidos de nitrogénio (<strong>NO</strong>x),<br />
acima de 20% para o dióxido de<br />
enxofre (SO2) e inferior a 10%<br />
no caso das partículas.<br />
De entre as medidas apontadas,<br />
para enfrentar o problema,<br />
destaca-se o recurso a combustíveis<br />
alternativos, visando<br />
reduzir a utilização de combustíveis<br />
tradicionais. O LNG<br />
(Liquified Natural Gas) parece<br />
apresentar a relação custo/<br />
benefícios mais ajustada, com<br />
baixos níveis de emissões e<br />
isenção de contaminantes, proporcionando<br />
energia de qualidade,<br />
a um custo competitivo,<br />
nomeadamente quando comparado<br />
com os combustíveis<br />
provenientes de hidrocarbonetos,<br />
normalmente utilizados nos<br />
navios. Mesmo sabendo que<br />
em 2050, a utilização de LNG<br />
de forma isolada, não permitirá<br />
cumprir as metas de descarbonização.<br />
Contudo permitirá<br />
assegurar a manutenção das<br />
rotas comerciais bem como a<br />
operacionalidade existente.<br />
Os Açores, com uma Zona<br />
Económica Exclusiva (ZEE)<br />
e fundos adjacentes, com uma<br />
área na ordem dos 2 mil Km2,<br />
poderão assumir um papel<br />
de relevo neste processo, na<br />
gestão de uma “nova” fonte de<br />
energia, nomeadamente para a<br />
navegação no Atlântico Norte.<br />
Um desafio! Uma oportunidade!<br />
para o Mar dos Açores!<br />
Feliz Ano Novo!<br />
<strong>NO</strong>JAN20 37
ENTREVISTA<br />
mural fénix<br />
lídia meneses (Presidente Lions Clube Lagoa)<br />
"<br />
Não devo ditar qualquer papel da mulher ou desenhar<br />
-lhe um perfil. Preocupa-me, porém, que a ausência da mulher<br />
na esfera pública e política coloque em risco todo o percurso<br />
realizado pela igualdade, até agora.<br />
" Claúdia<br />
carvalho
ENTREVISTA<br />
l<br />
Lídia Meneses é a atual<br />
presidente do Lions Clube<br />
Lagoa. É também responsável<br />
pelo Departamento de<br />
Imagem e Comunicação,<br />
no Grupo Marques e<br />
caracteriza-se como uma<br />
“artista de formas e linhas”.<br />
Realizou recentemente, num<br />
conjunto de esforços com<br />
três associações – Associação<br />
Umar Açores, Lions Clube<br />
Lagoa e Alternativa –,<br />
um mural situado em<br />
Santa Clara, cujas formas<br />
representam a figura da<br />
fénix. A presidente do Lions<br />
Lagoa diz ser “apenas um<br />
meio” para que se transmita<br />
o todo, a mensagem. “O meu<br />
papel é o de transmissora ou<br />
artista de uma ideia coletiva”,<br />
confessa. Assim, Fénix<br />
insurge a ideia de “relembrar<br />
o instinto maternal/ paternal,<br />
que tanto homens como<br />
mulheres, podem reconhecer<br />
no seu íntimo”.<br />
É a primeira vez que as três<br />
associações (Associação Umar<br />
Açores, Lions Clube Lagoa<br />
e Alternativa- Associação<br />
Contra as Dependências)<br />
unem esforços em prol de<br />
uma causa importante?<br />
É a primeira vez que as 3<br />
entidades se associam em prol<br />
de uma causa comum. No<br />
seguimento do tema da direção<br />
lionística <strong>2019</strong>/20, a Igualdade,<br />
os Lions Clube da Lagoa,<br />
associaram-se à UMAR-Açores<br />
nas manifestações dos 16 dias<br />
de Ativismo Contra a Violência<br />
Sobre a Mulher, de raiz<br />
internacional, coordenado pelo<br />
Center of Women´s Leadership.<br />
Onde é que podemos visitar o<br />
Mural Fénix? Quando e onde<br />
foi planeado?<br />
O mural Fénix Renascida<br />
encontra-se na EN1-1A,<br />
freguesia de Santa Clara, a<br />
caminho do Arco 8. A ideia de<br />
utilizar o símbolo da Fénix,<br />
como mote de uma campanha<br />
feminista, nasceu aquando de<br />
uma homenagem realizada a<br />
Clarisse Canha, responsável<br />
pela implementação da UMAR,<br />
na R.A.A, numa mostra<br />
de cinema de Igualdade de<br />
Género, o IMPRÓPRIA, o qual<br />
trouxe a debate a luta contra<br />
os preconceitos e estereótipos<br />
sociais. Foi, portanto, uma<br />
inspiração resultante do<br />
momento.<br />
Como surgiu a ideia sobre<br />
este mural? Surgiu em<br />
conjunto com as outras<br />
associações ou foi uma<br />
iniciativa pensada, em<br />
primeiro lugar, pelo Lions<br />
Clube Lagoa (LCL)?<br />
A ideia do mural surgiu num<br />
flash de memória. Na verdade,<br />
as imagens surgem, assim,<br />
como resultado das vivências<br />
e trabalho com a comunidade.<br />
A Fénix é de todos. Surgiu,<br />
por mero acaso, porque o meu<br />
papel é o de transmissora ou<br />
artista de uma ideia coletiva.<br />
Sou apenas um meio. Quando<br />
falho nessa empatia, é para<br />
mim uma frustração. Este foi,<br />
portanto, um trabalho coletivo.<br />
Porquê a figura da fénix a<br />
representar a Campanha<br />
Internacional e Nacional: 16<br />
Dias de Ativismo Contra a<br />
Violência Sobre a Mulher?<br />
O que é que essa figura<br />
representa em termos de<br />
construção do papel feminino<br />
na sociedade?<br />
Não devo ditar qualquer papel<br />
da mulher ou desenhar-lhe um<br />
perfil. Preocupa-me, porém, que<br />
a ausência da mulher, na esfera<br />
pública e política, coloque em<br />
risco, todo o percurso realizado<br />
pela igualdade, até agora. E<br />
isto, sim, esta indisponibilidade<br />
parece-me estar relacionado<br />
com o exagero de papéis que a<br />
mulher acarreta, em Portugal.<br />
As fases do feminismo<br />
trouxeram ganhos, mas ainda<br />
estamos longe de atingirmos<br />
um desempenho igual, devido<br />
a mentalidades e obstáculos.<br />
Quando uma mulher considera<br />
irrelevante deslocar-se a uma<br />
mesa de voto para exercer a<br />
sua responsabilidade enquanto<br />
cidadã, um direito conseguido<br />
com o sangue de muitas<br />
companheiras, isso preocupame.<br />
A opinião das mulheres<br />
é crucial, neste momento<br />
de grandes avanços. Como<br />
disse Barack Obama: “Se as<br />
mulheres governassem todos<br />
os países, o mundo seria<br />
melhor, pois haveria uma<br />
melhoria geral, no padrão de<br />
vida e nos resultados (...)”.<br />
Estamos a conseguir obter<br />
alguns resultados positivos,<br />
até para o sexo oposto, como<br />
a extensão da licença de<br />
paternidade, a existência de<br />
creches acessíveis. Falta, ainda,<br />
a existência de uma sociedade<br />
na qual as mulheres possam<br />
ser mais livres, sem medo de<br />
<strong>NO</strong>JAN20 39
serem violadas, intimidadas<br />
sexualmente, infantilizadas<br />
e desacreditadas. Uma<br />
sociedade em que possam<br />
sonhar e tornar-se naquilo que<br />
sonharam.<br />
No fundo, a figura da Fénix<br />
vem relembrar o instinto<br />
maternal/ paternal, que tanto<br />
homens como mulheres,<br />
podem reconhecer no seu<br />
íntimo. Reconhecer que há<br />
ciclos de avanço e retrocesso<br />
e que a mulher, a mãe, a<br />
filha, a irmã, as suas avós e<br />
ancestrais sempre tiveram a<br />
capacidade de se regenerarem.<br />
Mitologicamente é uma ave<br />
poderosa e protetora, com<br />
a capacidade de destruir<br />
e construir. Ela relembra<br />
que podemos voar sobre os<br />
obstáculos, rumo a uma esfera<br />
superior.<br />
Sendo presidente do Lions<br />
Clube Lagoa, acha que esta<br />
iniciativa vai de encontro<br />
com os princípios do clube<br />
de igualdade e justiça social?<br />
De que forma é que o LCL<br />
influenciou a dinâmica desta<br />
iniciativa?<br />
Foi apenas em 2017 que a<br />
primeira mulher presidente<br />
da Associação Internacional<br />
dos Lions Club foi eleita,<br />
Gudrun Björt Yngvadóttir<br />
é atuante em diversas<br />
organizações profissionais e<br />
comunitárias, é responsável<br />
por ter implementado o New<br />
Voices, um programa que<br />
promove a paridade de género<br />
e a diversidade, bem como<br />
visa aumentar o número de<br />
mulheres, jovens adultos e<br />
população mal representada,<br />
dentro do Clube Lions. Em<br />
<strong>2019</strong>, ainda como assessora<br />
social da direção 2018/19,<br />
"<br />
É um desejo<br />
global, atual<br />
e premente, o<br />
da igualdade<br />
de género,<br />
nomeadamente<br />
o direito à<br />
saúde, ao<br />
salário igual<br />
e às mesmas<br />
condições e<br />
oportunidades.<br />
fui convidada para realizar o<br />
1ºFórum Novas Vozes: pela<br />
Igualdade de Género, na<br />
cidade da Lagoa contanto para<br />
isso, com o apoio da Câmara<br />
Municipal da Lagoa e diversos<br />
oradores de renome, entre os<br />
quais, a atriz Mariana Monteiro<br />
e a representante europeia do<br />
programa, Carla Cifola, num<br />
resultado bem sucedido, de<br />
impacto público e objetivos<br />
válidos, os quais foram sendo<br />
implementados, ao longo<br />
deste ano. Assim sendo, esta<br />
iniciativa da Imprópria e da<br />
UMAR Açores estão alinhadas<br />
com os valores dos Lions<br />
Clube Lagoa, para <strong>2019</strong>/20,<br />
nada a admirar, visto que este<br />
é um desejo global, atual<br />
e premente, o da igualdade<br />
de género, nomeadamente<br />
o direito à saúde, ao salário<br />
40 <strong>NO</strong>JAN20
igual e às mesmas condições e<br />
oportunidades.<br />
Sabemos que os estudantes<br />
da Escola Secundária<br />
Antero de Quental (ESAQ)<br />
também participaram neste<br />
projeto. Como é que sentiu a<br />
envolvência dos alunos num<br />
projeto como este?<br />
A professora Alexandra<br />
Baptista, na qualidade de<br />
mulher artista e professora de<br />
Desenho, na ESAQ, foi uma<br />
das várias pessoas convidadas<br />
a tomar parte do evento. Os<br />
seus alunos tiveram, assim, a<br />
oportunidade de visualizarem<br />
técnicas de pintura e de desenho,<br />
nomeadamente, as dificuldades<br />
inerentes ao desenho e<br />
pintura, numa escala maior<br />
e de confraternizarem com<br />
profissionais da área do design e<br />
do grafitti.<br />
Sente que a sensibilização<br />
sobre este tipo de temas ganha<br />
maior preponderância quando<br />
é realizada desta forma, com<br />
o envolvimento dos mais<br />
jovens?<br />
O envolvimento de todos é<br />
essencial na realização dos<br />
objetivos a que nos propomos,<br />
uma sociedade mais justa e<br />
igualitária, é uma luta que não<br />
tem idade, cor, sexo ou estatuto<br />
social.<br />
Tem sido ativista neste tipo<br />
causas? Se sim, será que<br />
nos pode indicar qual o<br />
seu contributo sobre estes<br />
assuntos?<br />
Tenho sido ativista na medida<br />
que luto por ter opiniões<br />
formadas, um percurso laboral<br />
independente e pela realização<br />
pessoal dos meus sonhos e<br />
ambições. Vejo-me, porém,<br />
muitas vezes em situações nas<br />
quais desejaria ser advogada<br />
na defesa da causa feminina,<br />
pois observo ditos, escritos e<br />
manifestos incongruentes com<br />
a atual evolução da mulher e<br />
com aquela que sempre foi a<br />
sua natureza, a de criadora, de<br />
seres ou de obras, de ideias ou<br />
de objetos. As mulheres são<br />
líderes, por direito natural. Vejo<br />
que é tempo de ocuparmos o<br />
nosso espaço e terminarmos de<br />
vez com observações sexistas<br />
e redutoras do nosso perfil, o<br />
qual, na verdade, não existe,<br />
nem deve ser desenhado. Sou<br />
contra estereótipos. Nessa<br />
medida o meu ativismo está<br />
na escolha da minha atividade<br />
profissional enquanto designer,<br />
professora, artista plástica, mãe<br />
e voluntária. É nesta ânsia de<br />
fazer e de ser que encontro as<br />
maiores barreiras.<br />
Se pudesse deixar algumas<br />
palavras aos nossos leitores<br />
sobre a violência contra a<br />
mulher, ou até mesmo ao<br />
tema de forma genérica, o que<br />
diria?<br />
Como artista de formas e<br />
linhas, deixo as palavras<br />
aos contempladores: "Sou<br />
igual à Fénix... Às vezes<br />
renasço das cinzas sem que<br />
ninguém espere... E volto ao<br />
campo para a nova batalha.<br />
Renascer faz parte de mim,<br />
vou insistir na busca, gosto<br />
do improvável, sou movida<br />
a desafios, acredito no poder<br />
da transformação, não me<br />
contento com o óbvio." –<br />
Marlene Araújo.<br />
<strong>NO</strong>JAN20 41
PUB
crónica<br />
A NTÓNIO VENTURA<br />
DEPUTADO PELO PSD AÇORES<br />
NA ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA<br />
regiões<br />
ultraperiféricas<br />
Considero que existe uma<br />
lacuna no âmbito do trabalho<br />
parlamentar das Comissões<br />
da Assembleia da República e<br />
que se prende com a ausência<br />
de uma atenção política<br />
permanente sobre as Regiões<br />
Ultraperiféricas.<br />
Neste sentido, e reconhecendo<br />
que é preciso corrigir esta<br />
situação, seria útil que a<br />
Comissão dos Assuntos<br />
Europeus promovesse uma<br />
audição ao Comité das Regiões.<br />
Importa referir que o Comité<br />
das Regiões é um órgão<br />
consultivo da União Europeia<br />
(UE), representado por<br />
autoridades locais e regionais<br />
dos 28 Estados-Membros que<br />
compõem a União Europeia.<br />
É um facto que as cidades e<br />
as regiões enfrentam vários<br />
desafios que se mantém<br />
atuais e cuja especificidade<br />
dos seus territórios exige<br />
ajustamentos e respostas locais,<br />
tais como os impactos dos<br />
acordos comerciais bilaterais<br />
e multilaterais da União<br />
Europeia, a crise migratória,<br />
o despovoamento e o<br />
envelhecimento populacional, a<br />
coesão territorial, as sucessivas<br />
crises na agricultura e nas<br />
pescas, as alterações climáticas,<br />
as energias renováveis, entre<br />
outros.<br />
Mas, se assim é, também<br />
é um facto que a mesma<br />
especificidade das regiões,<br />
detém um considerável<br />
potencial de desenvolvimento,<br />
embora esteja, muitas vezes,<br />
em estado latente.<br />
Interessa, pois, aproveitar<br />
estas potencialidades. Por<br />
exemplo, estou convicto que as<br />
Regiões Ultraperiféricas podem<br />
contribuir para um futuro<br />
melhor da EU, desde que sejam<br />
consideradas no que concerne<br />
à sua posição geográfica<br />
mundial, à sua dimensão<br />
marítima, ao seu domínio<br />
científico e tecnológico, como<br />
zonas de fronteira, entre<br />
outros aspetos que têm sido<br />
permanentemente, e nalguns<br />
casos propositadamente,<br />
esquecidos na decisão política<br />
da UE.<br />
São apontados muitos<br />
benefícios das Regiões<br />
Ultraperiféricas, desde logo,<br />
podem ser um laboratório<br />
privilegiado para a investigação<br />
e a experimentação em<br />
áreas como, a astrofísica, o<br />
aeroespacial, a vulcanologia, a<br />
sismologia e a oceanografia.<br />
Num mundo cada vez<br />
mais globalizado a posição<br />
geoestratégica das Regiões<br />
Ultraperiféricas torna-se<br />
numa mais-valia e num trunfo<br />
geopolítico para a União<br />
Europeia, materializando-se<br />
numa política onde a UE pode<br />
fortalecer a sua ação externa.<br />
Porém, cabe, acima de tudo,<br />
à União Europeia valorizar<br />
todos os seus territórios, pelo<br />
aproveitamento das suas<br />
vantagens em favor das suas<br />
populações.<br />
A audição do Comité das<br />
Regiões irá permitir que<br />
tenhamos um privilegiado<br />
parceiro de conhecimento e de<br />
reivindicação para o trabalho<br />
do Parlamento Português.<br />
Neste âmbito da reivindicação,<br />
assume utilidade democrática o<br />
Parlamento Nacional pressionar<br />
as Instituições Europeias para<br />
se usar de forma adequada<br />
e eficiente o artigo 349.º do<br />
Tratado de Funcionamento<br />
da União Europeia (TFUE),<br />
garantindo que as Regiões<br />
Ultraperiféricas disponham<br />
de um tratamento efetivo de<br />
diferenciação ao nível das<br />
políticas de coesão social e<br />
económica.<br />
Estou convicto que daqui<br />
em diante teremos um novo<br />
desafio em termos de trabalho<br />
parlamentar em prol dos<br />
Açores. Um trabalho que<br />
acresce ao que se está a fazer<br />
pela denominação de Região<br />
Ultraperiférica.<br />
<strong>NO</strong>JAN20 43
REPORTAGEM<br />
Delta Airlines – Açores:<br />
Um divórcio sem madrasta má<br />
“Não pediu para vir, como também, praticamente não pediu para sair”<br />
RUI SANTOS / DIOGO GOSTA<br />
a<br />
A redação da <strong>NO</strong> <strong>Revista</strong><br />
acompanhou a Comissão<br />
Permanente de Economia,<br />
realizada na delegação da<br />
Assembleia Legislativa da<br />
Região Autónoma dos Açores,<br />
em Ponta Delgada, no dia 16<br />
de dezembro, onde o Bloco<br />
de Esquerda (BE), o CDS-PP,<br />
o Partido Socialista (PS) e o<br />
Partido Social Democrata (PSD)<br />
questionaram e auscultaram<br />
Carlos Morais, Presidente<br />
da Associação de Turismo<br />
dos Açores (ATA), e Marta<br />
Guerreiro, Secretária Regional<br />
da Energia, Ambiente e Turismo<br />
(SREAT), de forma a obterem<br />
44 <strong>NO</strong>JAN20
REPORTAGEM<br />
esclarecimentos sobre o fim da<br />
operação da Delta Airlines entre<br />
Nova Iorque e Ponta Delgada.<br />
Já na edição digital de novembro<br />
da <strong>NO</strong> <strong>Revista</strong>, após a decisão<br />
de abandonar a rota por parte<br />
da companhia aérea norteamericana,<br />
foi elaborado um<br />
artigo que levantava questões,<br />
algumas delas esclarecidas<br />
nesta Comissão relativamente<br />
ao futuro da Região sem esta<br />
operação.<br />
A primeira ronda de audições<br />
desta Comissão começou com<br />
Carlos Morais, Presidente da<br />
ATA, que, perante todos os<br />
representantes dos partidos<br />
presentes, providenciou<br />
esclarecimentos relativos à<br />
posição da Associação de<br />
Turismo dos Açores, durante<br />
todo o processo, desde a vinda da<br />
Delta Airlines para os Açores até<br />
ao abandono da rota.<br />
Carlos Morais fez questão de<br />
começar a sua intervenção a<br />
frisar o facto de, quando esta<br />
direção da ATA tomou posse, a<br />
20 de maio de <strong>2019</strong>, a operação<br />
da Delta já estava em curso, no<br />
seu segundo ano de operação.<br />
O interveniente sublinhou ainda<br />
que, da parte da ATA, tendo<br />
em conta aquilo que estava<br />
contratualizado para o ano de<br />
<strong>2019</strong>, “tudo foi feito para que<br />
esta operação tivesse sucesso e<br />
tivesse a sua continuidade”.<br />
“Em 2018, quando veio para os<br />
Açores, neste caso para Ponta<br />
Delgada, não pediu para vir,<br />
como também, praticamente,<br />
não pediu para sair”, afirmou<br />
Carlos Morais relativamente<br />
à companhia aérea norteamericana,<br />
que, segundo o<br />
mesmo, “é a segunda maior<br />
companhia aérea do mundo”.<br />
Prosseguindo no seu<br />
esclarecimento às perguntas<br />
colocadas por Carlos Silva,<br />
deputado do PS/Açores, o<br />
Presidente da ATA acrescenta<br />
que já em 2015 houve um<br />
interesse da Delta Airlines em<br />
conhecer melhor o mercado<br />
Açores, através da Vinci,<br />
do Governo Regional e da<br />
Associação de Turismo dos<br />
Açores:<br />
Já nesse sentido, tudo foi feito<br />
na altura para que levasse,<br />
em 2018, para além de slots,<br />
passasse a uma questão mais<br />
concreta, e passasse a voar para<br />
PDL, numa primeira fase com<br />
5 voos, numa segunda fase, no<br />
Dando uso ao seu direito de<br />
réplica, Carlos Silva afirmou<br />
que, em relação às dormidas,<br />
pelas informações que<br />
tentou apurar, e após fazer<br />
alguns cálculos, as dormidas<br />
provenientes da operação<br />
da Delta rondavam os 3%<br />
e não os 10% mencionados<br />
anteriormente, algo que “de<br />
qualquer forma é um número<br />
relevante”. Porém, sem centrarse<br />
nesta questão, o deputado<br />
socialista procurou saber se<br />
Carlos Morais achou justas<br />
as críticas de Mário Fortuna,<br />
Presidente da Câmara de<br />
segundo ano, com 7 voos, por<br />
uma questão operacional, pura e<br />
simplesmente operacional, e que<br />
tinha uma expressão que nós<br />
consideramos que andará à volta<br />
dos 10% de dormidas.<br />
Quando questionado sobre<br />
possíveis falhas na promoção do<br />
destino Açores, Carlos Morais<br />
afirmou que “tudo foi feito”,<br />
realçando que, desde que tomou<br />
posse, os contratos feitos para<br />
<strong>2019</strong> com a Delta Vacations,<br />
entidade promotora dos destinos<br />
para onde a Delta Airlines voa,<br />
“foram cumpridos”.<br />
Comércio e Indústria de Ponta<br />
Delgada, após o abondando da<br />
rota por parte da companhia<br />
norte-americana, que, na altura,<br />
afirmou que a “promoção<br />
do destino Açores falhou”,<br />
acusando Governo Regional<br />
e ATA de “não terem sabido<br />
aproveitar uma oportunidade<br />
única para a Região”, falando<br />
numa quebra de 4% nas<br />
dormidas e num prejuízo<br />
anual de 20 milhões de euros,<br />
acusações que o Presidente da<br />
ATA considera injustas.<br />
De seguida, foi a vez de António<br />
Vasco Viveiros, deputado do<br />
<strong>NO</strong>JAN20 45
REPORTAGEM<br />
PSD/Açores, colocar questões<br />
mais direcionadas para saber<br />
que compromissos foram feitos<br />
em termos de promoção, se<br />
foram cumpridos nos timings<br />
certos, e que montantes<br />
envolviam.<br />
De seguida, na tentativa de<br />
melhor elucidar António<br />
Vasco Viveiros, deputado do<br />
PSD/Açores, Carlos Morais,<br />
relativamente à natureza dos<br />
compromissos feitos com a<br />
Delta Vacations, afirmou que<br />
se tratavam de uma série de<br />
campanhas de marketing que<br />
em 2018 foram totalmente<br />
pagos numa verba a rondar<br />
os 156 mil dólares. No ano<br />
seguinte, foi feito também um<br />
contrato de marketing orçado<br />
em 220 mil dólares, do qual<br />
parte da verba foi assumida<br />
pelo Turismo de Portugal (TP),<br />
e a restante pela Associação<br />
de Turismo dos Açores,<br />
frisando que “em nenhum<br />
momento a Delta disse que,<br />
quer TP, quer ATA estavam<br />
em incumprimento com a<br />
companhia”.<br />
Outra questão colocada pelo<br />
deputado social-democrata<br />
prendia-se com uma eventual<br />
falta de condições do aeroporto<br />
de Ponta Delgada que poderiam<br />
explicar, de certa forma, a<br />
decisão da Delta, algo que o<br />
Presidente da ATA realçou que<br />
“nunca foi referenciado”.<br />
Foi sim referenciada uma outra<br />
questão que o senhor deputado<br />
levantou, relacionada com o<br />
tipo de cliente que frequentava<br />
aquelas rotas. Um avião tem<br />
vários tipos de tarifa e uma<br />
tarifa que eles não conseguiam<br />
vender era a Classe Executiva,<br />
portanto, o padrão de turista<br />
que estava a frequentar aquela<br />
rota era um padrão de turista de<br />
classe média.<br />
Nesse sentido, Carlos Morais<br />
afirmou que “há um caminho<br />
muito grande que a Região<br />
tem que fazer para aumentar<br />
a sua notoriedade”, visando o<br />
mercado “luxury” como algo<br />
a consolidar no arquipélago,<br />
de modo a aumentar a sua<br />
notoriedade e atratividade.<br />
Relativamente aos contactos<br />
feitos com a Delta, o Presidente<br />
da ATA sublinhou que houve<br />
uma fase em que estes eram<br />
da responsabilidade do<br />
Turismo de Portugal, devido<br />
à situação de instabilidade<br />
que se vivia na Associação<br />
de Turismo dos Açores, e<br />
que, mais tarde, passaram<br />
para a sua responsabilidade,<br />
mas confessou que ambas as<br />
entidades tiveram dificuldades<br />
em contactar com a empresa<br />
norte-americana, afirmando que<br />
“as respostas quando tardaram,<br />
tardaram sempre da parte da<br />
Delta”.<br />
Chegou a vez de serem<br />
levantadas questões pelo Bloco<br />
de Esquerda Açores, através do<br />
seu representante, o deputado<br />
Paulo Mendes, que procurou<br />
saber que dados e perspetivas<br />
levaram a ATA a convencer<br />
a companhia aérea norteamericana<br />
a voar para a Região,<br />
se alguma vez foi colocada<br />
a possibilidade de criação<br />
de rotas para outras ilhas e<br />
se foi alguma vez solicitada<br />
pela Delta ou oferecida pelas<br />
entidades regionais, algum tipo<br />
de contrapartida, para além das<br />
mencionadas na audição.<br />
No que diz respeito àquilo que<br />
“convenceu” a Delta a voar<br />
para os Açores, Carlos Morais<br />
fala em “motivações notórias”,<br />
dando ênfase à crescente<br />
notoriedade do nosso mercado<br />
e ao mercado de proximidade<br />
com os Estados Unidos da<br />
América.<br />
De seguida, o Presidente da<br />
ATA afirma que, em <strong>2019</strong>,<br />
ainda com a anterior direção<br />
do organismo, foram feitos<br />
contactos com a Delta no<br />
sentido de aumentar o número<br />
de frequências e foi abordada<br />
também a hipótese de fazer uma<br />
rota com mais um voo para a<br />
ilha Terceira, algo que não foi<br />
contemplado pela companhia<br />
aérea, que procedeu sim ao<br />
aumento das frequências em<br />
Ponta Delgada.<br />
Abordando as possíveis<br />
contrapartidas existentes, à<br />
data do pagamento dos 200 mil<br />
dólares pela ATA e pelo TP,<br />
foi também oferecido, caso a<br />
Delta assim o entendesse, um<br />
reforço da verba através de um<br />
concurso público internacional,<br />
no sentido de dar continuidade<br />
à rota.<br />
Seguiu-se o deputado Alonso<br />
Miguel, do CDS-PP, que<br />
questionou diretamente Carlos<br />
Morais, relativamente à razão<br />
para este “cancelamento<br />
súbito”, a que o Presidente da<br />
ATA respondeu de imediato que<br />
se tratava de uma questão de<br />
rentabilidade: “Entre o ‘dever’<br />
e o ‘haver’, a empresa tem que<br />
rentabilizar o ativo que tem, que<br />
neste caso é o avião”, voltando<br />
de novo à questão das tarifas de<br />
Classe Executiva e da aposta no<br />
mercado “luxury” que tem que<br />
ser feita na Região.<br />
Carlos Morais deu ainda o<br />
seguinte exemplo para clarificar<br />
o seu ponto de vista: “Posso ter<br />
uma taxa de ocupação de 80%,<br />
como era o caso, a preço de<br />
1€ cada passageiro que está a<br />
bordo e posso ter uma taxa de<br />
80% a 1000€ cada bilhete e aí é<br />
que está a diferença”.<br />
Na segunda ronda de questões,<br />
o Presidente da ATA foi de<br />
46 <strong>NO</strong>JAN20
REPORTAGEM<br />
novo questionado por alguns<br />
dos deputados. Primeiramente,<br />
Carlos Silva, da bancada<br />
socialista, mencionou a recémestabelecida<br />
ligação da TAP<br />
entre Ponta Delgada e Boston<br />
e perguntou a Carlos Morais se<br />
esta ligação seria importante<br />
para colmatar a saída da Delta,<br />
algo que o Presidente da ATA<br />
não desenvolveu muito, por não<br />
ser o tema da Comissão, mas<br />
na opinião do mesmo, “é um<br />
mercado importante”, tratandose<br />
de “uma operação anual que<br />
faz toda a diferença”.<br />
Já o deputado Paulo Mendes,<br />
do BE/Açores, voltou a<br />
questionar Carlos Morais sobre<br />
que “dados e perspetivas foram<br />
dadas à Delta Vacations”, que<br />
levaram na altura a companhia<br />
norte-americana a investir<br />
no mercado Açores e, nesse<br />
sentido, “o que foi feito em<br />
setembro deste ano para que a<br />
Delta mudasse de ideias”.<br />
Em relação a esta questão, o<br />
Presidente da ATA afirmou que<br />
“não há rato escondido com o<br />
rabo de fora”. Carlos Morais<br />
frisou o facto de os “aeroportos<br />
serem um negócio”, ou seja,<br />
“também têm interesse nesse<br />
sentido”, e afirmou:<br />
Não houve nenhuma<br />
contrapartida. Os meios de<br />
financiamento são os meios<br />
normais que existem na Região.<br />
O programa VIP, que é do<br />
Turismo de Portugal, onde<br />
existe um diploma que apoia<br />
a captação de novas rotas,<br />
há um próprio programa da<br />
Vinci, em relação à captação de<br />
novas rotas para determinados<br />
aeroporto, e tem depois a verba<br />
que a Região entenda, conforme<br />
prioridade, em fazer promoção<br />
num determinado destino<br />
turístico.<br />
De seguida, Luís Rendeiro,<br />
deputado do PSD/Açores,<br />
questionou o Presidente da<br />
Associação de Turismo dos<br />
Açores no sentido de perceber<br />
se existiu algum tipo de ligação<br />
entre a vinda da Delta Air Lines<br />
para a Região e o acordo da<br />
Base das Lajes com os Estados<br />
Unidos da América. Depois,<br />
mencionou também o incidente<br />
que aconteceu no aeroporto<br />
de Ponta Delgada, em agosto<br />
deste ano, quando um Boeing<br />
757 da Delta Air Lines efetuou<br />
um hard landing, deixando a<br />
aeronave inoperacional durante<br />
quase dois meses e quis saber<br />
se esse incidente teria “pesado”<br />
na decisão da companhia aérea<br />
norte-americana.<br />
Relativamente ao incidente<br />
em agosto, Carlos Morais<br />
assegurou que, na reunião<br />
realizada em setembro, essa<br />
questão não foi mencionada<br />
como sendo uma causa da<br />
<strong>NO</strong>JAN20 47
REPORTAGEM<br />
decisão da Delta. No que diz<br />
respeito à possível ligação com<br />
o acordo da Base das Lajes,<br />
o inquirido afirmou que “não<br />
teve conhecimento, que em<br />
momento algum, a Delta tenha<br />
voado para Ponta Delgada ao<br />
abrigo do acordo da Base das<br />
Lajes”.<br />
Por fim, foram colocadas outras<br />
questões, ainda por parte da<br />
bancada social-democrata,<br />
nomeadamente pelo deputado<br />
António Vasco Viveiros, com<br />
o intuito de entender se a<br />
instabilidade que se viveu na<br />
ATA, antes da tomada de posse<br />
da atual direção, poderá ter<br />
afetado o relacionamento com<br />
a Delta. De seguida, o deputado<br />
voltou a abordar as dificuldades<br />
no contacto entre Turismo de<br />
Portugal e ATA com a Delta Air<br />
Lines, achando “estranho” que a<br />
Região não tivesse um nível de<br />
abordagem e contactos diferente<br />
daqueles que tinham. António<br />
Vasco Viveiros procurou ainda<br />
saber por que razão a empresa<br />
norte-americana aumentou<br />
a sua frequência semanal de<br />
cinco para sete voos, como já<br />
foi referido, mesmo sem ter<br />
conseguido alcançar os números<br />
pretendidos relativamente à sua<br />
tarifa mais elevada.<br />
Abordando a instabilidade<br />
na anterior direção da ATA,<br />
Carlos Morais afirmou não ter<br />
conhecimento nesse sentido.<br />
Relativamente aos contactos<br />
com a companhia aérea, ou<br />
falta deles, o Presidente da ATA<br />
referiu o seguinte:<br />
Se o senhor deputado fosse meu<br />
cliente e de repente eu queria<br />
marcar uma reunião consigo, e<br />
o senhor não respondesse aos<br />
emails, eu ficaria preocupado, e<br />
no fundo foi isso que aconteceu.<br />
Se nós estamos a tentar fazer<br />
um contacto com a Delta e<br />
não há feedback do lado de<br />
lá, as campainhas vermelhas<br />
tocam no sentido de tentarmos<br />
perceber o porquê deste<br />
silêncio. Infelizmente o silêncio<br />
veio-se a traduzir numa decisão<br />
irreversível por parte da Delta.<br />
Relativamente ao aumento<br />
do número de voos semanais,<br />
Carlos Morais afirmou que<br />
esta era uma questão de<br />
operacionalidade, relacionada<br />
com o número de horas da<br />
tripulação, número de horas dos<br />
comandantes, “com uma série<br />
de questões que eles entendem<br />
que na operação fazia mais<br />
sentido ser sete voos em vez de<br />
cinco”.<br />
Após os esclarecimentos<br />
prestados pelo Presidente da<br />
ATA, foi a vez da Secretária<br />
Regional da Energia, Ambiente<br />
e Turismo prestar declarações<br />
sobre a situação, apresentando<br />
alguns dados importantes na<br />
contextualização do acontecido.<br />
Marta Guerreiro começou por<br />
dizer que foram desembarcados<br />
pela Delta nos Açores 16152<br />
passageiros durante o verão<br />
de <strong>2019</strong>. De acordo com<br />
um inquérito da ANA aos<br />
passageiros desembarcados<br />
por esta companhia, 20%<br />
dos mesmos eram residentes<br />
em Portugal ou visitavam<br />
familiares, restando 80% que<br />
representam 12900 hóspedes<br />
de nacionalidade, “à partida”,<br />
americana. Tendo em conta a<br />
estadia média de 3 noites, do<br />
mercado norte americano na<br />
ilha de São Miguel, durante o<br />
verão, estamos a falar de cerca<br />
de 39550 dormidas, ou seja,<br />
20,8% das dormidas totais<br />
do mercado norte americano.<br />
Deste modo é possível verificar<br />
que grande percentagem do<br />
mercado norte americano é<br />
promovido também pela Azores<br />
Airlines ou pela TAP, por<br />
via de Portugal Continental.<br />
Assim, a SREAT admite que a<br />
ausência da Delta “não deixa de<br />
ser um impacto significativo”,<br />
no entanto, “estamos a falar<br />
de 20% do total do mercado<br />
norte americano, os 80% têm<br />
origem noutras companhias” e<br />
perspetiva-se fechar <strong>2019</strong> “de<br />
acordo com a tendência que<br />
verificamos ao longo destes<br />
meses, com 190600 dormidas<br />
do mercado norte americano em<br />
São Miguel”.<br />
Colocando a situação numa<br />
“escala mais geral” e “se<br />
tivermos a intenção que se<br />
estima fechar o ano (<strong>2019</strong>)<br />
em São Miguel com cerca<br />
de 2 milhões de dormidas,<br />
estamos a falar de um impacto<br />
(da ausência da Delta), nessas<br />
dormidas, de 1,9%”, constatou<br />
a Secretária Regional.<br />
Relembrando que a operação da<br />
Delta era uma operação sazonal,<br />
do final de maio ao início de<br />
setembro, Marta Guerreiro<br />
referiu que essa operação “não<br />
justifica os bons crescimentos<br />
que tivemos no mercado norte<br />
americano no final do ano”.<br />
Também de janeiro a maio,<br />
período em que a Região<br />
não tinha a Delta, e face ao<br />
mesmo período de 2018,<br />
“conseguimos ter crescimentos<br />
bastante significativos, em<br />
concreto 57%”. Relativamente à<br />
notoriedade que os Açores têm<br />
vindo a adquirir no mercado<br />
norte americano, a SREAT disse<br />
que “esta também é uma boa<br />
resposta à critica, infundada, de<br />
eventual falta de promoção”.<br />
“Como a própria companhia<br />
(Delta) indicou, de forma<br />
muito clara, não se tratou de<br />
um problema de ausência<br />
de promoção”, acrescentou,<br />
mencionando que as ações<br />
48 <strong>NO</strong>JAN20
REPORTAGEM<br />
“COMO A PRÓPRIA<br />
COMPANHIA (DELTA)<br />
INDICOU, DE FORMA<br />
MUITO CLARA,<br />
NÃO SE TRATOU<br />
DE UM PROBLEMA<br />
DE AUSÊNCIA DE<br />
PROMOÇÃO”<br />
de marketing foram feitas,<br />
nomeadamente planos de<br />
marketing entre a ATA e a<br />
Delta Vacations; promoções<br />
e iniciativas com outros<br />
operadores de marketing<br />
locais; contactos com canais<br />
televisivos através da produção<br />
de filmes; marketing digital<br />
para potenciar segmentos<br />
que se identificam com o<br />
posicionamento do destino<br />
Açores de turismo certificado<br />
ela natureza e, também,<br />
no âmbito de certificação<br />
do destino como turísticosustentável.<br />
Segundo Marta Guerreiro, as<br />
ações e iniciativas que foram<br />
desenvolvidas durante <strong>2019</strong><br />
nos Estados Unidos da América<br />
(EUA), não só permitiram<br />
crescimentos na operação da<br />
Delta, “como aconteceu de<br />
2018 para <strong>2019</strong>”, mas também<br />
nas outras companhias que<br />
servem de porta para que<br />
os turistas cheguem até aos<br />
Açores, demonstrando assim<br />
que a promoção não tivesse<br />
sido em vão.<br />
De acordo com a interveniente,<br />
a Delta deu nota de que estava<br />
a contar com uma distribuição<br />
de classes, dentro do avião,<br />
que permitisse uma taxa tarifa<br />
média superior, alegando que<br />
tiveram muito mais tarifas<br />
económicas do que executivas,<br />
“o que nos parece normal no<br />
destino turístico”. A Delta<br />
também deu nota de uma<br />
alteração de estratégia, da qual<br />
os Açores não foram a única<br />
rota descontinuada, o mesmo<br />
aconteceu com a Islândia e<br />
Málaga, “num desinvestimento<br />
em rotas turísticas, em<br />
contrapartida de rotas para<br />
grandes cidades, o que está<br />
relacionado com o cenário de<br />
alguma recessão económica que<br />
se pode antever”.<br />
A SREAT salientou que a lógica<br />
de negócio anglo-saxónica da<br />
companhia aérea dos EUA é<br />
bastante diferente da lógica<br />
das empresas europeias, pois<br />
são “pouco premiáveis nas<br />
suas decisões aos incentivos<br />
e campanhas de marketing”,<br />
analisam a rentabilidade das<br />
rotas “de uma forma muito<br />
fria”. Marta Guerreiro avançou<br />
que, apesar do acontecido, a<br />
Delta “ficou com a nota de<br />
poder retomar o destino em<br />
futuros planeamentos da sua<br />
atividade”, pois acompanha<br />
“o desenvolvimento que se<br />
continua a verificar na Região,<br />
em especial no crescimento do<br />
mercado norte americano, quer<br />
nos Estados Unidos quer no<br />
Canadá”, sublinhando, como já<br />
<strong>NO</strong>JAN20 49
REPORTAGEM<br />
o tinha dito Carlos Morais, ter<br />
sido “uma decisão puramente<br />
comercial que não é premiável<br />
nem influenciável, infelizmente,<br />
pela nossa vontade”, assegurou.<br />
Questionada sobre os contactos<br />
que estabeleceu com a<br />
companhia, a SREAT lembrou<br />
que a Delta decidiu vir para a<br />
Região em 2018, num anúncio<br />
que foi publicado e que resultou<br />
da sua própria iniciativa,<br />
esclarecendo que, para tal<br />
acontecer:<br />
Houve muito trabalho,<br />
como existe com várias<br />
companhias, nas várias feiras<br />
da especialidade, em várias<br />
reuniões paralelas, onde se tenta<br />
dar nota do desempenho que<br />
o destino está a ter e mostrar<br />
que mesmo depois de várias<br />
reuniões e de encontros, a Delta<br />
decidiu iniciar os voos para<br />
os Açores, da mesma forma<br />
como também decidiu, pelas<br />
suas razões comerciais, sem<br />
pedir, quer no início quer no<br />
fim, qualquer apoio em termos<br />
de campanhas de marketing,<br />
descontinuar esta rota.<br />
Marta Guerreiro relembrou que<br />
mesmo sem a rota da Delta,<br />
os Açores já se promovem<br />
nos EUA há muitos anos, e o<br />
pretendido foi intensificar essa<br />
presença através de “contactos<br />
quer com a administração da<br />
própria Delta, quer com a Delta<br />
Vacations, onde foi delegada<br />
a produção que se pretendia<br />
desenvolvida, desde 2018 e<br />
inclusivamente em <strong>2019</strong>”.<br />
Em <strong>2019</strong>, a ATA teve uma<br />
alteração na presidência com<br />
Carlos Morais a assumir o<br />
cargo, “mas a mesma não<br />
teve influência nenhuma na<br />
promoção que foi feita, que<br />
continuou a ser feita, quer<br />
de forma direta com a Delta,<br />
quer com a ATA”. A SREAT<br />
disse que os contactos foram<br />
“vários e contínuos, como<br />
acontece com qualquer outro<br />
mercado”, salientando que da<br />
parte do Governo Regional<br />
dos Açores, “naturalmente que<br />
esta rota mereceu uma atenção<br />
especial”, devido ao facto de<br />
se tratar de uma companhia<br />
"que tem associado a si um<br />
elevado grau de notoriedade”.<br />
Marta Guerreiro mencionou<br />
que ela própria falou com<br />
administradores da empresa<br />
e com responsáveis pela<br />
gestão de rotas e pelas áreas<br />
comerciais, no entanto, (para a<br />
Delta) “as rotas têm na sua ótica<br />
de valer por si”.<br />
A SREAT frisou que tem<br />
indicação das taxas de ocupação<br />
dos voos, mas não da parte da<br />
rentabilidade, porque “essa<br />
Delta não partilhou connosco<br />
apesar dos vários contactos<br />
que fomos mantendo durante o<br />
início do verão”.<br />
Quanto à dificuldade,<br />
mencionada pelo Presidente<br />
da ATA, em contactar a<br />
Delta, a Secretária Regional<br />
disse desconhecer tal facto,<br />
afirmando que, da sua parte,<br />
“nós mantivemos sempre esse<br />
contacto”.<br />
Sobre a questão da rentabilidade<br />
da operação versus ocupação<br />
e do facto de em 2018 para<br />
<strong>2019</strong> ter havido um aumento da<br />
frequência semanal nos voos da<br />
companhia norte americana de<br />
cinco para sete, “a justificação<br />
que a Delta deu para isso teve<br />
haver com razões puramente<br />
operacionais. Com este aumento<br />
de frequência, de acordo com<br />
o que nos disseram na altura,<br />
torna-se mais fácil a gestão<br />
para eles”. Mesmo assim, com<br />
este aumento de 2 frequências<br />
semanais, “conseguimos manter<br />
uma taxa de ocupação acima<br />
dos 80%”, vincou.<br />
A interveniente referiu que a<br />
Delta não ficou a esperar para<br />
saber se tinha apoio ou não<br />
antes de anunciar a rota. A<br />
mesma salientou que o Governo<br />
dos Açores trabalha em parceria<br />
com a ATA: “fazemos muitas<br />
iniciativas em conjunto, muitos<br />
contactos em conjunto, nas<br />
feiras, em reuniões, e o primeiro<br />
contacto, depois da Delta ter<br />
anunciado a sua vinda para a<br />
Região, começou por ser nosso,<br />
desde logo”. Foi anunciado<br />
“nós vamos voar e vamos voar<br />
cinco vezes por semana e não<br />
pediram nada, nós é que fomos<br />
lá e perguntamos como é que<br />
podíamos apoiar para que os<br />
voos pudessem ter o sucesso<br />
que todos queríamos que<br />
tivesse”.<br />
Os contactos foram quase todos<br />
por vídeo conferência de Skype,<br />
também com trocas de e-mails,<br />
trocas de informações assíduas.<br />
Menos disponíveis da parte da<br />
Delta para reuniões presenciais,<br />
sim é verdade, tem também a<br />
ver com a lógica deles.<br />
Marta Guerreiro garantiu a<br />
continuação de investimento<br />
“de forma mais acentuada”<br />
no mercado norte americano<br />
“pois o turismo nos Açores<br />
assim o justifica”, dando como<br />
sinal disso o início de operação<br />
por parte da TAP, a partir do<br />
final da próxima primavera,<br />
de ligações dos Açores para<br />
os EUA e dos EUA para os<br />
Açores, nomeadamente de<br />
Ponta Delgada para Boston e<br />
vice-versa. Uma ligação que<br />
“vem aproveitar esse espaço<br />
vazio que a Delta deixa”.<br />
Para além desta nova rota<br />
da TAP, a SREAT anunciou,<br />
50 <strong>NO</strong>JAN20
REPORTAGEM<br />
mencionando ainda ser cedo<br />
para dizer nomes que “várias<br />
outras companhias nos têm<br />
contactado com interesse em<br />
voar para a Região”, pois “estão<br />
atentas à evolução daquilo<br />
que tem sido os números dos<br />
Açores”.<br />
À margem da Comissão<br />
Permanente de Economia,<br />
a <strong>NO</strong> <strong>Revista</strong> questionou a<br />
Secretária Regional da Energia,<br />
Ambiente e Turismo sobre se<br />
a TAP teve alguma cooperação<br />
com o Governo Regional ou<br />
vai iniciar a ligação com os<br />
EUA por iniciativa própria.<br />
Marta Guerreiro respondeu<br />
que: A TAP deu nota dessa<br />
intenção, de iniciativa própria,<br />
e que nós vemos como um<br />
interesse de uma companhia<br />
um mercado para os Açores que<br />
tem uma notoriedade bastante<br />
interessante.<br />
Em relação à ligação da TAP<br />
colmatar a ausência da DELTA,<br />
a SREAT disse que:<br />
Estamos a comparar coisas<br />
que não são propriamente<br />
comparáveis. A TAP iniciou<br />
uma rota anual, enquanto que<br />
a Delta estava a voar apenas<br />
de final de maio a início de<br />
setembro, e, portanto, em<br />
termos de disponibilização<br />
de lugares, teremos mais<br />
lugares do que tínhamos este<br />
ano, e acreditamos que com<br />
a continuidade da promoção<br />
neste mercado conseguiremos<br />
aumentar o número de turistas<br />
norte americanos nos Açores.<br />
O acompanhamento integral<br />
desta Comissão e os<br />
esclarecimentos prestados pelos<br />
intervenientes permitiram à<br />
nossa redação concluir que<br />
este “divórcio” entre a Delta<br />
Air Lines e os Açores, por<br />
muita “mágoa” que deixe, por<br />
aquilo que a companhia aérea<br />
representaria para a Região,<br />
deveu-se sobretudo a questões<br />
comerciais. Não houve uma<br />
“madrasta má” no meio deste<br />
processo. Pode ter havido<br />
falhas, ao nível da comunicação<br />
entre as partes, ao nível da<br />
segmentação e targeting, mas<br />
não existiu, que se saiba,<br />
nenhum sinal de incompetência<br />
ou incumprimento, de nenhuma<br />
das partes, que levasse a este<br />
desfecho. Existe sim, por<br />
parte das entidades regionais,<br />
a convicção que a promoção<br />
dos Açores no mercado norteamericano<br />
tem potencial para<br />
crescer e a certeza de que irá<br />
existir outro “casamento” com<br />
outras companhias.<br />
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REPORTAGEM<br />
GALERIA FONSECA MACEDO<br />
“No Feminino” – nove artistas femininas numa exposição coletiva<br />
Claúdia carvalho<br />
n<br />
“No Feminino” – nove artistas<br />
femininas numa exposição<br />
coletiva<br />
“No Feminino” é a exposição<br />
que reúne nove trabalhos, nove<br />
nomes, nove artistas femininas.<br />
É, de facto, a exposição coletiva<br />
que inaugura e dá a conhecer<br />
as novas instalações da Galeria<br />
Fonseca Macedo. A <strong>NO</strong> <strong>Revista</strong><br />
esteve presente, no dia 14 de<br />
dezembro, na inauguração<br />
desse espaço, que também ficou<br />
marcado pela performance de<br />
Maria João Gouveia, com o<br />
costume design de Sara França<br />
– “opções muito bem pensadas”<br />
que dão oportunidade à figura<br />
feminina de mostrar o seu pé<br />
de igualdade perante o sexo<br />
oposto.<br />
A diretora da galeria, a Doutora<br />
Fátima Mota, explicou à <strong>NO</strong><br />
<strong>Revista</strong> que este projeto reúne<br />
“um grupo bastante interessante<br />
de jovens artistas” com ligações<br />
aos Açores, a São Miguel – seja<br />
por terem nascido nessa ilha,<br />
por terem família nos Açores<br />
ou mesmo por terem uma boa<br />
relação de amizade com a<br />
galeria.<br />
<strong>NO</strong>JAN20 53
REPORTAGEM<br />
"<br />
este é um tema que ocupa muitas pessoas e também me ocupa a mim como diretora de uma<br />
galeria – esta noção de que, durante muitos anos, talvez demasiados anos, as mulheres e as artistas<br />
mulheres não tiveram a mesma projeção e as mesmas oportunidades que os homens tiveram. Hoje em<br />
dia, as coisas estão a modificar-se, de tal maneira que se consegue fazer, numa pequena ilha dos<br />
Açores, uma exposição só com trabalhos de artistas femininas - fátima mota<br />
Considera que ainda se<br />
verifica, especialmente no<br />
mundo das Artes, que às vezes<br />
ela mandou um bocadinho<br />
de certa forma injusto e<br />
fechado, que as mulheres já<br />
conseguiram estabelecer o seu<br />
espaço ou que o Mundo das<br />
Artes ainda é muito ligado à<br />
figura masculina?<br />
Eu penso que hoje em dia, pelo<br />
menos nos países Ocidentais,<br />
que o lugar está a ser bastante<br />
bem conquistado pelas<br />
mulheres e há mulheres que<br />
são espetaculares em termos da<br />
sua produção e isto está a ser<br />
revertido, não tenho dúvidas<br />
nenhumas disso. No Mundo<br />
Ocidental, acho que as coisas<br />
estão a encaminhar-se para que<br />
a mulher tenha o seu espaço tal<br />
qual como o homem tem o seu<br />
espaço. Isso aí não é problema,<br />
só que o Mundo Ocidental é,<br />
de alguma maneira, também<br />
um lugar que pode espalhar<br />
também a sua influência junto<br />
de outras civilizações, nas quais<br />
a mulher ainda não tem essa<br />
capacidade de ocupar um lugar<br />
ao mesmo nível do homem e<br />
nós temos a obrigação de falar<br />
sobre esses assuntos porque,<br />
dessa forma, ao falarmos, ao<br />
provocarmos a discussão,<br />
estamos também ajudar a estas<br />
mesmas sociedades.<br />
Qual é que tem sido, até<br />
agora, o feedback das pessoas<br />
que têm vindo visitar aqui<br />
esta exposição?<br />
Eu acho que as pessoas têm<br />
gostado imenso do espaço,<br />
primeiro porque é um<br />
espaço bastante amplo, tem<br />
um pé direito de bastante<br />
generoso e permite, de facto,<br />
fazer exposições com obras<br />
grandes, inclusivamente uma<br />
exposição coletiva que implica<br />
a convivência de vários tipos<br />
de expressões, que às vezes<br />
podem ser conflituosos. No<br />
caso presente, não é o caso,<br />
mas isso, de facto, acontece.<br />
Porque temos espaço suficiente<br />
entre as peças, porque temos<br />
recuo suficiente para podermos<br />
ter uma boa perspetiva para<br />
cada peça, acho que o facto<br />
de ter sido a escolha de<br />
uma exposição de grupo foi<br />
adequado ao espaço que nós<br />
temos.<br />
Como é que foi a<br />
organização? Falava que são<br />
nove artistas. Como é que foi?<br />
Primeiro, como é que surgiu,<br />
no fundo, como é que surgiu a<br />
ideia, de onde é que se partiu<br />
e disse que nove pessoas iam<br />
reunir aqui as suas peças?<br />
Como eu sou a Diretora da<br />
Galeria, cabe-me a mim fazer<br />
as decisões nesse âmbito,<br />
54 <strong>NO</strong>JAN20
REPORTAGEM<br />
portanto fui eu que decidi que<br />
esta seria uma exposição só<br />
com mulheres porque eu, de<br />
facto, represento na minha<br />
galeria, muitas mulheres e fazia<br />
todo o sentido que assim fosse.<br />
Para além da exposição, houve<br />
também uma performance,<br />
realizada pela Maria João<br />
Gouveia, bailarina do balé<br />
clássico, que se apresentou<br />
com o costume design de<br />
outra designer de moda, a<br />
Sara França. Também estas<br />
duas opções foram muito bem<br />
pensadas, primeiro porque<br />
havia espaço para que uma<br />
performer pudesse estar aqui à<br />
vontade na sala e juntamente<br />
com os visitantes e, por outro<br />
lado, de ser uma performer<br />
feminina porque se enquadra<br />
exatamente na mesma discussão<br />
de dar oportunidade às<br />
mulheres, neste caso bailarinas,<br />
designers e coreógrafas para<br />
desenvolverem um projeto.<br />
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<strong>NO</strong>JAN20 45
crónica<br />
POR RICARDO SILVA<br />
“Tóquio” -<br />
Diário, 1946,<br />
de Franco<br />
Nogueira<br />
É um livro que me chamou a<br />
atenção pelo título e pelo autor e<br />
neste sentido surpreendeu a vários<br />
níveis. Assumido em forma de<br />
Diário o valor deste livro reside<br />
no testemunho direto da dura<br />
e difícil realidade nipónica nos<br />
meses subsequentes à rendição<br />
na Segunda Guerra Mundial.<br />
Como é do conhecimento geral, a<br />
utilização da bomba atómica em<br />
1945, no Japão, marcou o início da<br />
Era Nuclear e estruturou e ainda<br />
estrutura o relacionamento entre<br />
nações. Arma de paz para uns, pelo<br />
efeito dissuasor, cumprindo o adágio<br />
romano “Sivis pace para bellum” –<br />
“Se queres a paz prepara a guerra”;<br />
é arma de guerra para outros pelo<br />
efeito destruidor que pode ter num<br />
país (e na Terra) relativamente ao<br />
seu delicado ecossistema. O que é<br />
certo é que os Homens e o Planeta<br />
a partir da experiência nuclear<br />
aplicada ao Japão demarcaram uma<br />
56 <strong>NO</strong>JAN20
crónica<br />
linha de perigo em que o Nuclear<br />
faz pensar duas vezes antes da<br />
sua utilização. E foi isso que<br />
Franco Nogueira teve o condão,<br />
enquanto jovem de apenas 25<br />
anos, vivenciar. Se ao lermos este<br />
Diário sentimos a agonia de um<br />
povo, não a resignação, ficanos<br />
a ideia de que foi a palavra<br />
Dedicação como valor e ideal<br />
supremo de um país, neste caso do<br />
Japão, que levou ao lançamento<br />
das bombas pelos americanos.<br />
Terminada a guerra na Europa,<br />
com a derrota dos nazis, os<br />
combates continuaram no Pacífico<br />
com o denodo e o fanatismo típico<br />
das forças armadas imperiais<br />
japonesas, caraterizado no verso<br />
do hino da Academia Naval<br />
Japonesa “morrerei apenas<br />
pelo meu imperador”. Assim,<br />
Washington decidiu acelerar o<br />
fim das hostilidades tendo em<br />
conta os custos de uma conquista<br />
no terreno face à ferocidade dos<br />
soldados nipónicos. A 6 de agosto<br />
de 1945 o bombardeiro Enola Gay<br />
largou a “Little Boy” por cima de<br />
Hiroshima, fazendo imediatamente<br />
66 mil mortos e várias dezenas<br />
de milhar nos dias seguintes. A 9<br />
de agosto, uma segunda bomba,<br />
“Fat Man”, caiu sobre Nagasaki<br />
e matou 40 mil pessoas. Ou seja,<br />
em apenas três dias desapareceram<br />
mais de 100 mil pessoas e outras<br />
tantas dezenas de milhar nas<br />
sequelas dos meses seguintes. O<br />
imperador Hiroito visitou as ruínas<br />
da cidade e proclamou a rendição<br />
do Japão a 14 de agosto.<br />
Ora, é o retrato deste cenário de<br />
destruição, inclusive de Tóquio,<br />
que Franco Nogueira, relata.<br />
Um país exangue, prostrado, um<br />
destroço, ocupado pelas potências<br />
aliadas, designadamente pelos<br />
Americanos que também tiveram<br />
o sentido diplomático de se<br />
apresentarem como libertadores<br />
e não como vencedores,<br />
colaboradores numa reconstrução<br />
de um país e não meramente como<br />
ocupantes sem fins claros. Esta<br />
posição e situação faz-nos recordar<br />
a recente invasão ao Iraque com<br />
resultados completamente opostos<br />
aqueles que se conseguiram no<br />
Japão.<br />
Numa escrita realista de<br />
grande pormenor não é difícil<br />
imaginarmos o que terá sido<br />
aquela tragédia histórica do povo<br />
japonês que, por outro lado,<br />
aproveitou o momento difícil para<br />
fazer uma viragem fundamental na<br />
sua trajetória política e económica<br />
na região e no mundo.<br />
De uma febre de poder, militarista,<br />
expansionista que começou<br />
décadas antes da segunda guerra<br />
mundial, sempre marcada por<br />
ofensivas militares brutais, o<br />
Japão, assente numa cultura de<br />
2 mil anos, encetou um caminho<br />
de paz, modernização da sua<br />
economia de tipo ocidental,<br />
baseada no valor já aqui falado<br />
da Dedicação. O povo japonês<br />
fez do trabalho e da empresa<br />
novos focos de abordagem ao<br />
mundo e os resultados chegamnos,<br />
impressionantes, até hoje.<br />
Foram proféticas as palavras do<br />
imperador Hiroito na sua rendição:<br />
“Desejo que todos concordem<br />
comigo”, como ensejo para se<br />
baixar armas e carregar com<br />
grande luta, é certo, a energia para<br />
uma nova vida do país conhecido<br />
também como Sol Nascente. Um<br />
novo futuro estava a caminho.<br />
O diário do futuro Ministro<br />
dos Negócios Estrangeiros de<br />
Salazar mostra já um homem<br />
de grande formação intelectual,<br />
muito curioso, critico e atento<br />
à realidade que o rodeava. É<br />
curioso que no percurso do livro<br />
já se sente a Reconstrução, firme<br />
e decidida após o colapso. Não<br />
posso deixar de referir a recente<br />
escolha do Papa Francisco para<br />
denunciar “o fruto da guerra”. A<br />
fotografia tirada por Joseph Roger<br />
O’Donnell, fotógrafo da marinha<br />
norte-americana, a uma criança<br />
que transporta consigo, às costas, o<br />
seu irmão morto, e aguarda,<br />
descalço, pela sua vez de entregar<br />
o corpo do mesmo num dos<br />
crematórios de Nagasaki é de um<br />
simbolismo fortíssimo. A imagem<br />
é impressionante pelo seu poder<br />
de comoção e alerta para os males<br />
da guerra. O Papa fê-la distribuir<br />
em postal como motivo de reflexão<br />
nesta época natalícia e, inclusive,<br />
citou-a na sua mensagem “Urbi<br />
et Orbi” – à cidade (de Roma) e<br />
ao mundo – como apelo à Paz e<br />
Respeito pelas crianças. Em tudo<br />
o que se possa ler desta poderosa<br />
fotografia, não posso deixar de<br />
referir o que disse o fotógrafo<br />
acerca da mesma para caracterizar<br />
o caráter coletivo do povo japonês.<br />
A criança manteve-se durante mais<br />
de 10 minutos imóvel, hirta, nunca<br />
chorando, embora emocionada<br />
pelo morder dos lábios que<br />
sangravam! Entregou o seu<br />
irmão, que parecia a dormir pela<br />
serenidade aparente, virou costas e<br />
sempre sem chorar, avançou para<br />
um futuro que queria novo.<br />
Esta imagem foi a caminhada<br />
que Franco Nogueira intuiu na<br />
sua estadia em Tóquio, que teve<br />
o cuidado de registar em Diário,<br />
e que desembocaria num milagre<br />
económico que a Oriente, e no<br />
século XX, seria o primeiro, a<br />
predestinar outros que surgirão<br />
neste século XXI.<br />
A leitura vale a pena!<br />
<strong>NO</strong>JAN20 47
REPORTAGEM<br />
Víctor Alves – a abordagem<br />
“pragmática” da Guerra Civil Portuguesa<br />
lançamento do livro "GUERRA CIVIL PORTUGUESA (1828-1834)<br />
Claúdia carvalho<br />
v<br />
Víctor Alves, jornalista da<br />
RTP/Açores, nascido na ilha<br />
Terceira, lançou no passado<br />
mês de dezembro Guerra<br />
Civil Portuguesa (1828-1834),<br />
um livro que aborda, de uma<br />
forma diferente, a Guerra Civil<br />
Portuguesa, que decorreu nesse<br />
período em Portugal. O evento<br />
decorreu no dia 14 de dezembro<br />
na livraria Letras Lavadas e a<br />
<strong>NO</strong> <strong>Revista</strong> teve oportunidade<br />
de entrevistar o autor terceirense<br />
para perceber não só os motivos<br />
que o levaram a publicar uma<br />
obra deste teor, bem como sobre<br />
aquilo que ela (re)trata.<br />
Apesar de confessar que<br />
58 <strong>NO</strong>JAN20
REPORTAGEM<br />
já existiam outras obras,<br />
notícias e estudos que<br />
retratassem e falassem sobre<br />
ela, o jornalista terceirense<br />
considerou que seria urgente<br />
trazer ao público uma nova<br />
abordagem sobre a batalha,<br />
sobre os acontecimentos, numa<br />
linguagem simplista, clara e<br />
sintética.<br />
Por ser um tema que sempre<br />
“impressionou” o autor, Victor<br />
Alves decidiu que, depois<br />
de ter recolhido informação<br />
proveniente das grandes<br />
capitais europeias sobre a<br />
guerra, tornava-se necessário<br />
reuni-la, compilando-a no livro<br />
que agora publica. Apesar de<br />
saber e estar consciente que<br />
“a batalha está documentada”<br />
"<br />
Uma linguagem<br />
mais “terra a<br />
terra”, mais<br />
acessível,<br />
mais popular,<br />
mais perto das<br />
pessoas, mais<br />
jornalística<br />
– no fundo,<br />
aquilo que nós<br />
fazemos todos<br />
os dias e que se<br />
transformou,<br />
de facto, numa<br />
fonte histórica<br />
impressionante.<br />
pelos históricos e académicos<br />
que assim o fizeram, Victor<br />
Alves confessa, na sua<br />
pesquisa, ter-se deparado com<br />
uma visão diferente daquela<br />
que os historiadores tinham.<br />
Na sua pesquisa, Victor Alves<br />
confessou que, ao aprofundar<br />
os seus conhecimentos sobre o<br />
tema, descobriu que existiam<br />
cerca de 4000 refugiados<br />
liberais na ilha Terceira que<br />
pertenciam à elite intelectual<br />
portuguesa daquele tempo.<br />
Falamos em Almeida Garrett<br />
e Alexandre Herculano, por<br />
exemplo.<br />
Estes intelectuais faziam,<br />
assim, passar informação sobre<br />
o ambiente na Terceira e nos<br />
Açores. Sendo correspondentes<br />
<strong>NO</strong>JAN20 59
REPORTAGEM<br />
anónimos, entregavam-na aos<br />
capitães das embarcações do<br />
comércio da laranja e eram,<br />
precisamente, essas pessoas que<br />
levavam a informação às principais<br />
capitais europeias – Londres,<br />
Paris, Alemanha. É assim que<br />
é construída essa visão “terra a<br />
terra”, mais pragmática, mais<br />
próxima das pessoas, mais curta<br />
e mais concisa – confessa o autor,<br />
tendo sido por aí que enveredou<br />
quando decidiu escrever e publicar<br />
Guerra Civil Portuguesa (1828-<br />
1834).<br />
Quando questionado se a sua<br />
profissão tinha influenciado<br />
a sua forma de contar este<br />
acontecimento de forma diferente,<br />
o autor respondeu que sim e ainda<br />
acrescentou que “o jornalismo é<br />
uma fonte de História”, embora<br />
muitas pessoas achem que o jornal<br />
sirva “para embrulhar sabão”, não<br />
atribuindo a real importância ao<br />
jornalismo e à sua capacidade de<br />
distribuir e difundir informação.<br />
Para Victor Alves, “o jornalismo<br />
que se faz todos os dias é um<br />
registo, é uma ata daquilo que se<br />
passa nas comunidades”.<br />
“Bem ou mal, os jornais relatam<br />
todos os dias aquilo que foi o<br />
acontecimento das comunidades”.<br />
Nas capitais europeias, era isso<br />
que acontecia. Várias gazetas<br />
informavam e contavam aquilo<br />
que se passou naqueles anos em<br />
Portugal. Em Lisboa, o cenário era<br />
diferente, controlado pelo poder. O<br />
jornal era “a voz do dono”, era o<br />
jornal do rei D. Miguel. A Gazeta<br />
de Lisboa retratava, na verdade,<br />
os eventos da realeza, onde o rei<br />
“deixou claro que a imprensa era<br />
para calar, e calou”. Victor Alves<br />
60 <strong>NO</strong>JAN20
REPORTAGEM<br />
adianta que esta gazeta produzia<br />
decretos reais e passeios do<br />
rei e da sua família por Lisboa<br />
e arredores. A perspetiva<br />
da imprensa internacional,<br />
contrariamente àquilo que se<br />
verificava em Lisboa, era uma<br />
imprensa “séria, honesta, de<br />
debate desapaixonado sobre o<br />
evento”, sobre aquilo que se<br />
estava a passar em Portugal e na<br />
Terceira, concretamente.<br />
Para o autor, era essa visão que<br />
o interessava e que, “já tendo<br />
a visão do outro lado”, poderse-ia<br />
fazer uma comparação e<br />
ter uma história real, baseada<br />
não só num lado, numa versão<br />
da história, mas completando-a<br />
com diferentes fontes, diferentes<br />
imprensas, diferentes capitais<br />
"<br />
Eu não uso<br />
notas de rodapé,<br />
as referências<br />
de não sei<br />
quantas páginas<br />
à frente. Eu uso<br />
uma linguagem<br />
que nós usamos<br />
no jornalismo.<br />
Isso ajuda<br />
as pessoas a<br />
fazerem uma<br />
leitura correta<br />
sobre as coisas<br />
e a perceberem<br />
à primeira.<br />
europeias que relatavam e<br />
retratavam esse evento.<br />
Segundo Victor Alves, a<br />
receção das pessoas a esta<br />
forma diferente e pragmática<br />
de contar a história tem sido<br />
muito boa. Para ele, o que tem<br />
surpreendido as pessoas tem<br />
sido, de facto, a linguagem<br />
pragmática característica do<br />
jornalismo.<br />
Apesar de poder ser um livro<br />
“maior com 300 ou 400<br />
páginas”, o autor achou por<br />
bem contar a história de forma<br />
breve, introduzir o assunto de<br />
forma sintetizada, deixando<br />
“no ar a vontade de as pessoas<br />
fazerem alguma pesquisa e<br />
aprofundarem mais um pouco<br />
sobre o tema”, confessa.<br />
<strong>NO</strong>JAN20 61
top notícias <strong>2019</strong><br />
janeiro<br />
Exploração de aquacultura micaelense é “bom<br />
exemplo de aplicação dos apoios europeus”<br />
(1374 visualizações)<br />
O eurodeputado socialista Ricardo Serrão Santos<br />
elogiou a exploração de aquacultura da Aquazor,<br />
em Ponta Delgada, por esta ser “um bom exemplo<br />
de aplicação dos apoios europeus”, promovendo<br />
“a ligação entre a área científica, por via da<br />
investigação, desenvolvimento e inovação, e o<br />
capital e conhecimento de mercado”.<br />
fevereiro<br />
André Bradford “nunca deixará Bruxelas<br />
esquecer que os Açores são Europa” (3052<br />
visualizações)<br />
André Bradford, candidato socialista às eleições<br />
europeias do próximo dia 26 de maio, assumiu<br />
que a “prioridade das prioridades” é “defender os<br />
interesses estruturais dos Açores em Bruxelas”.<br />
Falando à saída da Convenção Somos Europa,<br />
que reuniu cerca de mil socialistas de todas as<br />
regiões do país, André Bradford defendeu ser<br />
“fundamental manter e reforçar as políticas de<br />
coesão, agrícola e de pescas a nível europeu” para<br />
“reduzir as assimetrias e combater as desigualdades<br />
entre territórios, ao mesmo tempo se valorizam as<br />
nossas maiores vocações produtivas”.<br />
março<br />
Sofia Ribeiro congratula aprovação de diretiva<br />
que protege agricultores (1263 visualizações)<br />
“É um grande dia para a agricultura europeia”,<br />
afirmou Sofia Ribeiro, “porque finalmente os<br />
agricultores têm uma diretiva que os protege de<br />
práticas comerciais desleais, o que permitirá<br />
uma maior estabilidade e segurança dos seus<br />
rendimentos”.<br />
A eurodeputada social-democrata falava após o<br />
debate sobre a diretiva que irá garantir justiça ao<br />
longo da cadeia de abastecimento agroalimentar,<br />
esta passada segunda-feira, na sessão plenária em<br />
Estrasburgo.<br />
62 <strong>NO</strong>JAN20
no | www.norevista.pt<br />
abril<br />
Parlamento Europeu aumenta verbas para<br />
pescas e economia do mar nos Açores e Madeira<br />
(2033 visualizações)<br />
O Parlamento Europeu (PE) aprovou a sua posição<br />
sobre o Fundo Europeu dos Assuntos Marítimos e<br />
das Pescas (FEAMP) para 2021-2027, aumentando<br />
a dotação para 7.739 mil milhões de euros a preços<br />
correntes, contra os 6.140 mil milhões propostos<br />
pela Comissão Europeia.<br />
Os eurodeputados também incluíram disposições<br />
para que seja tida em conta a situação específica<br />
das Regiões Ultraperiféricas (RUP), para apoiar<br />
a pesca de pequena escala e contribuir para uma<br />
gestão sustentável.<br />
maio<br />
Novo single da jovem cantautora açoriana Sara<br />
Cruz chega a número um em Portugal (6052<br />
visualizações)<br />
“Out With Grace”, o novo single da jovem cantora<br />
e compositora açoriana, Sara Cruz, foi lançado no<br />
passado dia 24 de maio e já está no primeiro lugar<br />
do Top 100 Singer Songwriters (cantautores) em<br />
Portugal, uma listagem iTunes.<br />
junho<br />
“A mudança necessária para com os Açores<br />
ficou, na sua essência, por concretizar” diz<br />
António Lima (2342 visualizações)<br />
Os trabalhos parlamentares de junho, na<br />
Assembleia Legislativa Regional, arrancaram,<br />
esta manhã, com um de três debates de urgência<br />
agendados para esta sessão plenária, neste caso<br />
sobre o “incumprimento dos compromissos<br />
do Governo da República para com a Região<br />
Autónoma dos Açores”, apresentado pelo BE/<br />
Açores.<br />
julho<br />
HORTA WIFI já está em funcionamento (1564<br />
visualizações)<br />
O Município da Horta dotou vários pontos de<br />
interesse turístico da cidade da Horta, com<br />
pontos de acesso à internet sem fios, com a rede<br />
denominada de HORTA WIFI, projeto ao qual José<br />
Leonardo Silva, presidente da Câmara Municipal<br />
da Horta, refere-se como “um abrir da cidade ao<br />
mundo”.<br />
<strong>NO</strong>JAN20 63
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agosto<br />
Banda UHF nas Festas de Santa Bárbara (1023<br />
visualizações)<br />
A banda musical UHF é a cabeça de cartaz das<br />
Festas de Santa Bárbara, que decorrem entre 24 e<br />
31 de agosto em honra de Santo António.<br />
As festas desta freguesia do concelho de Angra<br />
do Heroísmo são palco do concerto dos UHF, que<br />
apresenta temas emblemáticos como “Menina<br />
Estás à Janela”; “Cavalo de Corrida” ou “Rua do<br />
Carmo”, no dia 29 de agosto, pelas 22H30.<br />
setembro<br />
“Incumprimento” no radar meteorológico na<br />
Serra de Santa Bárbara (2369 visualizações)<br />
O candidato do PSD/Açores às eleições<br />
legislativas nacionais, António Ventura, acusou<br />
hoje os governos dos Açores e da República “de<br />
não cumprirem a promessa da instalação de um<br />
radar meteorológico na Ilha Terceira”, sendo que<br />
“durante quatro anos nada se fez a esse respeito”.<br />
outubro<br />
Ribeira Grande Kickboxing Challenge (3652<br />
visualizações)<br />
No sábado, dia 2 de novembro, a partir das 20h00,<br />
o Pavilhão Multiusos da Associação Agrícola<br />
de São Miguel vai ser palco do Ribeira Grande<br />
Kickboxing Challenge, promovido pelo Arrifes<br />
Kickboxing Clube (AKC). Este evento irá contar<br />
com 10 combates, entre os quais irá ser disputado<br />
o título de Campeão Nacional de Profissionais<br />
em Low Kick, categoria de -62,5 kg, bem como<br />
o título nacional de Full Contact defendido pelo<br />
atleta AKC Renato Costa.<br />
novembro<br />
A crise sísmica do Faial explicada pelo Centro<br />
de Informação e Vigilância Sismovulcânica dos<br />
Açores (40892 visualizações)<br />
A crise sísmica ao largo da ilha do Faial prolongase<br />
por alguns dias, passando já os “1000 eventos<br />
registados”. Para obter mais informação sobre o<br />
fenómeno, a <strong>NO</strong> <strong>Revista</strong> contactou Rui Marques,<br />
presidente do Centro de Informação e Vigilância<br />
Sismovulcânica dos Açores (CIVISA).<br />
64 <strong>NO</strong>JAN20
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dezembro<br />
Aeroporto João Paulo II atingiu<br />
recorde de dois milhões de<br />
passageiros em <strong>2019</strong> (9448<br />
visualizações)<br />
O voo do Porto, com chegada a<br />
Ponta Delgada, pelas 14:40 de hoje,<br />
assinalou o recorde de dois milhões<br />
de passageiros desembarcados no<br />
Aeroporto João Paulo II num único<br />
ano, o qual ainda está por terminar.<br />
A <strong>NO</strong> <strong>Revista</strong> esteve presente no<br />
evento, onde obteve declarações<br />
do passageiro dois milhões, Inês<br />
Capela, e do Diretor dos Aeroportos<br />
dos Açores (DAA), José Luís Alves.<br />
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www.iroa.pt<br />
facebook.com/iroaazores<br />
A IMPORTÂNCIA DO REGIME DE<br />
INCENTIVOS À COMPRA DE TERRAS<br />
AGRÍCOLAS (RICTA) <strong>NO</strong> DESENVOLVIMENTO<br />
DO SETOR AGRÍCOLA<br />
Dr. Ricardo Silva<br />
Presidente do Conselho de<br />
Administração da IROA, S.A.<br />
O Regime de Incentivos à<br />
Compra de Terras Agrícolas,<br />
abreviadamente designado<br />
por RICTA, aprovado pelo<br />
Decreto Legislativo Regional<br />
n.º 23/2008/A, de 24 de julho,<br />
e regulamentado pelo DRR n.º<br />
1/2009/A, de 23 de fevereiro,<br />
constitui um importante<br />
instrumento de política agrícola<br />
da Região Autónoma dos<br />
Açores (RAA).<br />
De facto, em cumprimento dos<br />
comandos constitucionais, que<br />
estabelecem como objetivos da<br />
política agrícola a promoção<br />
do acesso à propriedade<br />
da terra e a sua exploração<br />
direta, e das competências<br />
legislativas próprias da Região,<br />
em termos de emparcelamento<br />
rural e de estrutura<br />
fundiária das explorações<br />
agrícolas, estabelecidas no<br />
respetivo Estatuto Político<br />
Administrativo, a medida<br />
RICTA, criada nos Açores e<br />
inovadora em termos nacionais,<br />
tem como finalidade principal a<br />
aquisição de terrenos por parte<br />
dos respetivos arrendatários<br />
rurais, bem como dos<br />
terrenos destinados a ações de<br />
emparcelamento, norteando-se,<br />
essencialmente, por objetivos<br />
de redimensionamento das<br />
explorações agrícolas.<br />
Com a consciência de que a<br />
propriedade da terra é, senão<br />
o principal, pelo menos um<br />
dos mais importantes fatores<br />
de estabilidade económica<br />
e social das explorações<br />
agrícolas, o Governo Regional<br />
dos Açores tem erigido como<br />
opção política fundamental no<br />
âmbito agrícola a aquisição de<br />
terra por parte dos agricultores,<br />
potenciando a obtenção<br />
de melhores desempenhos<br />
da atividade agrícola. Na<br />
verdade, se a aquisição do<br />
direito de propriedade da terra<br />
por parte de quem a explora,<br />
contribui decisivamente para<br />
a modernização e melhoria<br />
das condições de exploração,<br />
designadamente quanto à<br />
segurança do aproveitamento<br />
das benfeitorias introduzidas,<br />
é também verdade que a<br />
esta matéria é essencial<br />
uma orientação guiada por<br />
objetivos de reestruturação<br />
fundiária dirigidos para o<br />
emparcelamento agrícola e<br />
para o rejuvenescimento dos<br />
empresários agrícolas.<br />
O facto de este regime ser<br />
único a nível nacional e<br />
exclusivamente suportado<br />
por verbas regionais, é bem<br />
revelador da preocupação<br />
do Governo Regional no<br />
sentido de contribuir para uma<br />
maior competitividade das<br />
explorações, pugnando pelo<br />
aumento da sua dimensão<br />
e redução da dispersão das<br />
parcelas.<br />
O RICTA (regime de incentivo<br />
à compra de terras agrícolas)<br />
representa um instrumento<br />
essencial de reestruturação<br />
fundiária, possibilitando o<br />
acesso ao crédito, em condições<br />
mais favoráveis, por parte dos<br />
agricultores a título principal<br />
que pretendam adquirir terrenos<br />
na qualidade de arrendatários,<br />
comproprietários e proprietários<br />
de prédios encravados ou<br />
confinantes.<br />
De facto, nos casos em que<br />
o empréstimo não exceda<br />
€ 100.000, a taxa de juro é<br />
52 <strong>NO</strong>JAN20
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suportada exclusivamente pela<br />
RAA, através da IROA, S.A. e,<br />
na parte em que o empréstimo<br />
for superior àquele valor (até €<br />
250.000 para pessoas singulares<br />
e € 500.000 para as pessoas<br />
coletivas), os beneficiários<br />
suportam apenas uma taxa<br />
de juro de 2%, cabendo o<br />
pagamento do remanescente à<br />
IROA, S.A..<br />
Para além da bonificação da<br />
taxa de juro dos empréstimos<br />
contraídos para o efeito, é<br />
atribuída aos beneficiários,<br />
nas ações de emparcelamento,<br />
uma comparticipação a fundo<br />
perdido, até um máximo de<br />
15% sobre o valor da avaliação<br />
corretiva, nos seguintes termos:<br />
a) Emparcelamento com área<br />
superior a 5 ha – 5%;<br />
b) Jovem agricultor – 5%;<br />
c) Aquisição de terrenos nas<br />
ilhas de Santa Maria, Graciosa,<br />
São Jorge, Flores ou Corvo –<br />
5%.<br />
Para a operacionalização do<br />
programa RICTA encontram-se<br />
outorgados protocolos com as<br />
instituições de crédito que se<br />
mostraram interessadas, onde se<br />
definiram as condições gerais<br />
de recurso ao crédito no âmbito<br />
deste regime de incentivos,<br />
com fundamento em razões de<br />
economia, de transparência e de<br />
uniformização de critérios nas<br />
relações a estabelecer entre a<br />
IROA, S.A. e as instituições de<br />
crédito.<br />
Considerando que o setor<br />
agrícola continua a ser o<br />
principal pilar da economia<br />
açoriana, numa perspetiva<br />
de estabilidade e equilíbrio<br />
social de parte significativa<br />
da população do arquipélago,<br />
entendemos que há que<br />
continuar a apostar numa<br />
melhor eficácia económica<br />
do setor e na sua contribuição<br />
para o desenvolvimento da<br />
Região, objetivos para os quais<br />
em muito tem contribuído o<br />
RICTA.<br />
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<strong>NO</strong>AGO19<br />
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<strong>NO</strong>JAN20 69
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