Revista UnicaPhoto - Ed.16
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Seu ofício [do colecionador] é a idealização
dos objetos. A ele cabe a tarefa de Sísifo de
retirar das coisas, já que as possui, seu caráter
de mercadoria. Mas não poderia lhes conferir
senão o valor que têm para o amador, em
vez do seu valor de uso. O colecionador se
compraz em suscitar um mundo não apenas
longínquo e extinto, mas, ao mesmo tempo
melhor, um mundo em que o homem, na
realidade, é tão pouco provido daquilo de que
necessita como no mundo real, mas em que
as coisas estão liberadas da servidão de serem
úteis (BENJAMIN, 2009, p. 59).
Rebecca (Katie Chang), talvez a fetichista mais incurável
de The bling ring, depois de invadir a mansão do seu
“ultimate fashion icon”, Lindsay Lohan, experimenta o
perfume da estrela na frente do espelho em um lânguido
slow motion. Poderia ser uma publicidade de perfume,
não fosse a trilha sonora lúgubre (a esta altura do filme, os
jovens invasores estão prestes a serem descobertos pela
polícia) e a mansão escura e deserta. Coppola transforma
o conhecido em inquietante, mas sem precisar construir
choques cinemáticos para isso. Ela prefere a sutileza
de uma fragrância. Naquele perfume que é uma mera
mercadoria, Rebecca entra em contato com algo de muito
longínquo e remoto; algo que Agamben (2007) chamou de
“a epifania do inapreensível” (p. 69) ou “a apropriação da
irrealidade” (p. 81). Coppola, com sua estética do artifício
e do frívolo, faz filmes sobre esse “algo”.
REFERÊNCIAS
AGAMBEN, Giorgio. Estâncias: a palavra e o fantasma na cultura
ocidental. Belo Horizonte: UFMG, 2007.
BENJAMIN, Walter. Passagens. Belo Horizonte: UFMG, 2009.
MATOS, Olgária. “Alfklarung na metrópole: Paris e a Via Láctea”. In:
BENJAMIN, Walter. Passagens. Belo Horizonte, UFMG, 2009.
Como e quando a fotografia entrou na sua vida?
Aos sete anos de idade virei a fotógrafa oficial da família.
Minha missão era fazer fotos de minha mãe com minha
irmã recém nascida. Minha mãe tinha por hábito escrever
no verso das fotos e, em algumas delas, tinha escrito “foto
batida por Marina em 1989...”. Fotografei muito dos 7 aos
18 anos com câmera analógica. Tenho um vasto álbum de
minha infância e adolescência e também da infância de
minha irmã, que foi minha principal modelo.
ENTREVISTA
MARINA FELDHUES
Nessa conversa com Marina Feldhues, a fotógrafa,
professora, pesquisadora e ex-aluna do curso de Fotografia
da Unicap conta como se apaixonou pela fotografia e
pelos fotolivros, apresenta o grupo de estudos “Narrativas
anticoloniais” e fala sobre sua trajetória acadêmica, com
destaque para ampla contribuição para o curso MBA
“Cultura Visual: fotografia & arte latino-americana”, da
Unicap, que começou no dia 01 de março.
Foto: Joyce Nabiça /Arquivo pessoal
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Qual a importância da Fotografia?
A fotografia é importante porque media muitas relações
em nossa vida. Ela pode ser um gatilho para a recordação,
mediando nossa relação com eventos passados. Pode
mediar nossa comunicação cotidiana nos ambientes
virtuais, milhares de memes, nudes, pratos de comida,
selfies sobem à rede todos os dias. Nos comunicamos
pela fala, pelos gestos corporais, pela escrita e também
por imagens, é aí que se destaca a fotografia e o vídeo.
Especialmente agora que acessível economicamente
a maior parte das pessoas no planeta. A fotografia
pode ainda mediar nossa relação com as instituições
sociais públicas e privadas, funcionando como imagem
identitária, por exemplo. E, talvez principalmente, ela
media o nosso pensamento.
Quais são os limites da Fotografia?
Para responder, vou retornar à pergunta anterior. Como
a fotografia media nosso pensamento? Produzindo ao
menos dois tipos de imagens. Primeiro temos as imagens
que servem para dominação social, controle de corpos,
controle do modo como vemos o mundo e como nos
relacionamos com o mundo e no mundo com os outros
seres viventes. A junção imagem-texto que se dá na
fotografia com o auxílio da legenda educa o nosso olhar
por meio da repetição. Entre no google images e escreva
a palavra “traficante”, que tipo de imagens surgem?
Existe imagem de algum traficante que seja homem,
branco de paletó e gravata na tela inicial do google? Há
algum padrão visual que se repete? Qual é? Na minha
tela de busca vejo em sua maioria homens de cor de
calção, chinelo, alguns sem camisa, ostentando armas e
com o corpo tatuado. Isto é a fotografia aliada ao texto
produzindo uma imagem estereotipada do que seja
um “traficante”. E, assim, nosso olhar é treinado para
enxergar as pessoas que se encaixam nesse estereótipo