Gestão Hospitalar N.º 24 2021
#gestão em saúde, por Vasco Reis Homenagem Vasco Reis:“A inoculação do bichinho da saúde teve como instrumento a administração” Testemunhos de familiares e amigos Saúde Global Portugal na saúde global A síndrome de fragilidade em idosos: revisão de literatura sobre instrumentos de avaliação e escalas de classificação Acesso a cuidados de saúde para além da Covid-19 Reaproximar os doentes não-Covid dos serviços de saúde no contexto da pandemia Responsabilidade em saúde pública no mundo lusófono: fazendo justiça durante e além da emergência da Covid Infeções associadas a cuidados de saúde e segurança do doente Comunicação institucional: até quando o parente pobre na gestão dos hospitais? SNS: e agora para algo completamente diferente Projeto Oncommunities: acompanhamento online para mulheres com cancro de mama Design Thinking como ferramenta para a eficiência no bloco operatório A farmacogenética na prática clínica Como podemos ter mais ensaios clínicos nos centros de investigação e tornar Portugal mais atrativo nesta matéria? Liderança Digital: ENESIS 2020-22
#gestão em saúde, por Vasco Reis
Homenagem
Vasco Reis:“A inoculação do bichinho da saúde teve como instrumento a administração”
Testemunhos de familiares e amigos
Saúde Global
Portugal na saúde global
A síndrome de fragilidade em idosos: revisão de literatura sobre instrumentos de avaliação e escalas de classificação
Acesso a cuidados de saúde para além da Covid-19
Reaproximar os doentes não-Covid dos serviços de saúde no contexto da pandemia
Responsabilidade em saúde pública no mundo lusófono: fazendo justiça durante e além da emergência da Covid
Infeções associadas a cuidados de saúde e segurança do doente
Comunicação institucional: até quando o parente pobre na gestão dos hospitais?
SNS: e agora para algo completamente diferente
Projeto Oncommunities: acompanhamento online para mulheres com cancro de mama
Design Thinking como ferramenta para a eficiência no bloco operatório
A farmacogenética na prática clínica
Como podemos ter mais ensaios clínicos nos centros de investigação e tornar Portugal mais atrativo nesta matéria?
Liderança Digital: ENESIS 2020-22
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GH homenagem<br />
TERTÚLIAS DAS ALHEIRAS<br />
Para um Amigo<br />
”Testemunhos<br />
José de Quintanilha Mantas<br />
Filho de Augusto Mantas<br />
Meu pai, Augusto Mantas, convidava,<br />
para jantares de alheiras, (feitas em<br />
nossa casa, em Bornes, Macedo de<br />
Cavaleiros) alguns dos administradores<br />
hospitalares, colegas de trabalho,<br />
seus pares, com quem trabalhava e convivia, no dia a<br />
dia. Habituámo-nos a tratar os pares do pai, como a mãe<br />
os tratava, (Vasco Reis, Vasquinho, Correia de Campos,<br />
Campos, Francisco Ramos, Francisco) sempre dentro<br />
da cordialidade e carinho que nos mereceram.<br />
Perto das 19H30, tocavam à porta, corremos a escada<br />
(na casa velha, na Gonçalves Crespo, 78 degraus) e depois<br />
de vermos quem subia, chegámos ao pé da mãe,<br />
Mi e dissemos “Ó mãe o pai traz um Beatle...ˮ (cabelo<br />
despenteado, nós da gravata abaixo com botão desapertado,<br />
casaco na mão) nem mais que o Cristiano de<br />
Freitas, subia com o pai, apresentou-nos, o Cristiano à<br />
vontade, e começámos a preparar algumas bebidas e<br />
salgadinhos. De novo tocam à porta e vemos, a sempre<br />
linda cabeleira branca do Vasco Reis acompanhado<br />
pela Corália, casal mimoso e carinhoso. Abraços, beijos,<br />
o Vasco Reis e Corália cumprimentando o Cristiano.<br />
Conversa aqui, palavra ali, petiscando e bebendo. Chegam<br />
o Correia de Campos e Belinhas, sua mulher que<br />
se encontram à porta da rua com o Vitor da Fonseca e<br />
o Cassiano Póvoas.<br />
Passando ao jantar, a mãe geria os lugares, ficando o<br />
Vasco Reis ou o Campos à sua direita, e a Corália ou a<br />
Belinhas à direita do pai, seguidos dos restantes comensais.<br />
Sopa de agrião, alheiras de Bornes, batatas cozidas,<br />
grelos, azeite da casa, as travessas de mão em mão,<br />
explicando a mãe, nos entretantos, o seu fabrico.<br />
Eu ou o Toni abríamos as garrafas, Evel 66, Dão, Porta<br />
de Cavaleiros.<br />
Vasco Reis lembrava uma ou outra receita de família<br />
que a Corália ia fazendo, com requintes que seu marido<br />
enaltecia com ternura. Vasco Reis tinha um motus vivendi<br />
muito peculiar, no descritivo que fazia de receitas, da<br />
delicadeza dos passos que se davam à beira do fogão,<br />
saindo das mãos de sua mulher, deliciosos petiscos.<br />
No meio destes debates culinários, se desviavam as suas<br />
opiniões sobre alguns problemas hospitalares trocando<br />
com Correia de Campos e Augusto Mantas conversas<br />
amenas mas frutuosas, não menos opinadas também<br />
por Vitor da Fonseca (Vitor Manuel Mateus Ribeiro da<br />
Fonseca, meu Diretor no Such) e Cassiano.<br />
Após uma sobremesa de leite-creme, ou outra que a<br />
mãe Mi fazia, fruta, café, ficavam na sala de jantar, os<br />
Senhores, fumando e bebendo um Porto, Gouvinhas<br />
(anterior a 1898), um cognac Napoléon, um armagnac<br />
Marquis de Puysegur, prosseguindo os debates hospitalares,<br />
sempre frutuosos e elucidativos pela parte de<br />
Vasco Reis, sempre muito seguro e direto no que descrevia,<br />
cabendo à mãe Mi encaminhar as Senhoras de<br />
novo para o escritório, onde mostrava as centenárias<br />
rendas e bordados de família, louças e porcelanas com<br />
histórias curiosas, ou fotos de viagens, onde estavam<br />
meu pai, Vasco Reis e colegas, hoje, organizadas e arquivadas<br />
por mim.<br />
Foram inúmeros os jantares para os quais meu pai convidava,<br />
sempre com o cuidado de não misturar cores<br />
políticas ou incompatibilidades, relembro alguns, Carlos<br />
Costa, Francisco Ramos, Rogério de Carvalho, Monteiro<br />
Costa, Sebastião Lima Rego, Roque da Silveira, Manuel<br />
Delgado, Coriolano Ferreira, Nogueira da Rocha,<br />
Menezes Duarte, Dona Inês, Cecília Ribeiro, M.ª Emília<br />
Franco Henriques e Dona Marília. Ã<br />
Fernando Leal da Costa<br />
Professor Associado Convidado da ENSP<br />
Não tenho muitos. Não sou habitual nos<br />
links sociais das principais redes da internet.<br />
O número de Dunbar não se aplica<br />
na minha contagem, pelo que nunca me<br />
preocupei a somar se tenho mais do que<br />
150 amigos. Devem andar nas dezenas. Duas a três, no<br />
máximo. Muitos desses amigos não são pessoas com<br />
quem prive muito. Confesso que sou de poucas intimidades.<br />
Eu estou aqui e sei que os amigos estão comigo e<br />
eu com eles. Não me parece que seja só amigo daqueles<br />
com quem estou sempre, das “visitas lá de casa”. Neste<br />
último grupo, mais restrito, devem estar uma meia dúzia,<br />
descontando a família que, por sinal, também é reduzida.<br />
Há “conhecidos” que julgo serem meus amigos. Se não<br />
forem, não fará mal. Eu gosto deles. Chega isso.<br />
Há um tipo de amigos que são os Mestres. Grupo muito<br />
limitado que conto sem dificuldade. São 10. Número redondo.<br />
São aqueles de quem nunca me preocupei saber<br />
se me consideram na sua pool de amizades, mas a quem<br />
eu devo as partes mais relevantes do meu caminho pessoal,<br />
da construção do homem profissional e, também por<br />
isso, do que Sou. A maioria está viva. Três deles, lamenta-<br />
velmente, já não estão entre nós, embora o seu trabalho,<br />
o seu legado, perdure.<br />
Vasco Reis é, será sempre, um desses Mestres. Foi com ele<br />
e por ele que ingressei no Corpo de docentes da Escola<br />
Nacional de Saúde Pública (ENSP), em 2004. Deixaram-<br />
-me entrar, seguramente porque fui levado pelo Professor<br />
Vasco Reis. Graças a Vasco Reis e com a ajuda dele, iniciei-<br />
-me na docência regular e remunerada, coisa que na minha<br />
vida de Médico me tinha sido quase sempre negada,<br />
pelo establishment, pelas regras, pelas circunstâncias, por<br />
outras pessoas. Acreditou em mim, sem que nada o obrigasse<br />
a isso. Ganhei mais com a “Escola”, com os Colegas<br />
e Alunos, do que alguma vez a ENSP ganhou comigo. Só<br />
por isso já lhe estou grato.<br />
Com Vasco Reis e a sua visão de modernidade e mudança,<br />
plasmada em muitos escritos de que relevo “<strong>Gestão</strong><br />
em Saúde: um espaço de diferença”, o testemunho que<br />
nos deixou em 2007 e que deve ser de leitura obrigatória<br />
pelos Administradores <strong>Hospitalar</strong>es, um livro de cabeceira,<br />
aprendi mais do que alguma vez ensinei. Interessei-me por<br />
um lado da Administração <strong>Hospitalar</strong> e da Saúde que comecei<br />
por conhecer mal, para depois compreender que<br />
sempre o tinha conhecido, o da interface entre o core business<br />
das instituições de saúde, promover, prevenir, tratar,<br />
e as sucessivas plataformas de comando que vão de cada<br />
profissional individual, passando pelas direções de serviços,<br />
conselhos de administração local, estruturas regionais,<br />
até à Administração e Governo centrais. Devo dizer, com<br />
humildade e nesta singela homenagem, que Vasco Reis foi<br />
um dos obreiros mais significativos do meu percurso de<br />
Médico nas suas múltiplas facetas e manifestações. Não<br />
me ocorre nada de mais importante. Ã<br />
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