Sapeca 29
Misto de sapo e perereca Nº 29 – Junho/202l – Editor: Tonico Soares
Misto de sapo e perereca
Nº 29 – Junho/202l – Editor: Tonico Soares
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Paulo Henriques Britto
Há o consenso de que o Brasil está apenas mediano, em prosa e verso,
também, o consenso de que Paulo Henriques Britto é um dos melhores poetas da
atualidade. Pelo pouco que li de sua poesia, achei positivo. Outras coisas que me
agradam nele é usar formas fixas e não ter pressa de publicar. Aos 20 anos, amigos
sugeriram que editasse seus poemas e respondeu que só depois dos 30, para
não se arrepender mais tarde, como Mário de Andrade, que publicou ainda jovem
Há uma gota de sangue em cada poema e o renegou, dizendo que era obra imatura.
E Ferreira Gullar também deu sumiço ao seu primeiro livro. Finalmente, aos
32, Paulo soltou dois mil exemplares de Liturgia da matéria, “um encalhe maravilhoso”.
Por azar, a editora Civilização Brasileira faliu e mandou entregar aqueles
pacotes em sua casa, e Britto jogou fora, só guardando uns vinte volumes.
Com os contos que escreve, é mais rigoroso ainda, até porque diz que tem
pouca imaginação. E acrescenta: “Mas tudo bem, James Joyce também não tinha,
nunca inventou uma história. Tudo que ele pôs em seus livros aconteceu em sua
vida. Marcel Proust também. Proust não tinha imaginação, só descreveu aquelas
festas chatíssimas em que ele foi, aquela gente horrível que ele conheceu e o livro
é uma maravilha. Como é que pode? Como que o cara com tão pouca imaginação,
com uma vida tão besta como a do Proust, escreve um livro tão bom? Esses
caras é que me dão esperança. Imaginação quem tem é Balzac”.
E mais: “Também não tenho imaginação para bolar um romance. Veja um
cara como Thomas Pynchon, que faz um romance com 700 personagens, 45 enredos,
subenredos. Balzac é extraordinário. Como é que o cara manipula tantas
histórias? Eu tenho muita inveja desses caras que têm essa imaginação prodigiosa
de bolar personagem. Henry James, um dos ficcionistas de que gosto, é extraordinário.
Tive o imenso prazer de traduzir o conto A outra volta do parafuso. É
um conto de terror dos mais barras-pesadas que eu já li. Terrível. Ele contou em
cartas que ficava horrorizado. Dizia que de noite ficava com medo, não tinha coragem
de sair do quarto. Como ele conseguia acreditar naquilo?”.
Outro exemplo: “Tem um poeta atual que eu gosto muito, um dos melhores
do Brasil, lá de Juiz de Fora, chamado Edmilson de Almeida Pereira. A produção
dele é extraordinária, publica dois livros por ano, mantendo um nível de
qualidade muito alto. Não sei como ele consegue fazer isso. Morro de inveja”.
Daí que escreve mais em verso, dizendo que tinha muita dificuldade com
o verso livre. Só o fez no princípio, antes de entender que “verso livre, se o cara
bobear, fica um negócio frouxo, não leva a nada”. Resolveu aprender a dominar
as formas e descobriu que o bom é pegar uma forma fixa – ou inventar uma, ou
então pegar uma forma clássica, como um soneto – e pervertê-la um pouquinho.
“A graça é essa. Pego uma forma tradicional e tento fazer uma coisa um pouco
diferente. Isso passou a ser meu projeto formal. E isso me ajuda a fechar o poema,
a chegar ao final. Quando tomo uma decisão formal – ‘vai ser assim, a rima
tem que ser essa’ – consigo fechar. Senão fica uma coisa frouxa”.
Cada vez mais exigente consigo mesmo, seus livros têm cada vez menos
páginas. Por profissão, é professor na PUC-RJ e tradutor aclamado e premiado.
Sempre do inglês, tendo morado por duas temporadas na Califórnia.
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