07.06.2021 Views

Sapeca 29

Misto de sapo e perereca Nº 29 – Junho/202l – Editor: Tonico Soares

Misto de sapo e perereca
Nº 29 – Junho/202l – Editor: Tonico Soares

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

Paulo Henriques Britto

Há o consenso de que o Brasil está apenas mediano, em prosa e verso,

também, o consenso de que Paulo Henriques Britto é um dos melhores poetas da

atualidade. Pelo pouco que li de sua poesia, achei positivo. Outras coisas que me

agradam nele é usar formas fixas e não ter pressa de publicar. Aos 20 anos, amigos

sugeriram que editasse seus poemas e respondeu que só depois dos 30, para

não se arrepender mais tarde, como Mário de Andrade, que publicou ainda jovem

Há uma gota de sangue em cada poema e o renegou, dizendo que era obra imatura.

E Ferreira Gullar também deu sumiço ao seu primeiro livro. Finalmente, aos

32, Paulo soltou dois mil exemplares de Liturgia da matéria, “um encalhe maravilhoso”.

Por azar, a editora Civilização Brasileira faliu e mandou entregar aqueles

pacotes em sua casa, e Britto jogou fora, só guardando uns vinte volumes.

Com os contos que escreve, é mais rigoroso ainda, até porque diz que tem

pouca imaginação. E acrescenta: “Mas tudo bem, James Joyce também não tinha,

nunca inventou uma história. Tudo que ele pôs em seus livros aconteceu em sua

vida. Marcel Proust também. Proust não tinha imaginação, só descreveu aquelas

festas chatíssimas em que ele foi, aquela gente horrível que ele conheceu e o livro

é uma maravilha. Como é que pode? Como que o cara com tão pouca imaginação,

com uma vida tão besta como a do Proust, escreve um livro tão bom? Esses

caras é que me dão esperança. Imaginação quem tem é Balzac”.

E mais: “Também não tenho imaginação para bolar um romance. Veja um

cara como Thomas Pynchon, que faz um romance com 700 personagens, 45 enredos,

subenredos. Balzac é extraordinário. Como é que o cara manipula tantas

histórias? Eu tenho muita inveja desses caras que têm essa imaginação prodigiosa

de bolar personagem. Henry James, um dos ficcionistas de que gosto, é extraordinário.

Tive o imenso prazer de traduzir o conto A outra volta do parafuso. É

um conto de terror dos mais barras-pesadas que eu já li. Terrível. Ele contou em

cartas que ficava horrorizado. Dizia que de noite ficava com medo, não tinha coragem

de sair do quarto. Como ele conseguia acreditar naquilo?”.

Outro exemplo: “Tem um poeta atual que eu gosto muito, um dos melhores

do Brasil, lá de Juiz de Fora, chamado Edmilson de Almeida Pereira. A produção

dele é extraordinária, publica dois livros por ano, mantendo um nível de

qualidade muito alto. Não sei como ele consegue fazer isso. Morro de inveja”.

Daí que escreve mais em verso, dizendo que tinha muita dificuldade com

o verso livre. Só o fez no princípio, antes de entender que “verso livre, se o cara

bobear, fica um negócio frouxo, não leva a nada”. Resolveu aprender a dominar

as formas e descobriu que o bom é pegar uma forma fixa – ou inventar uma, ou

então pegar uma forma clássica, como um soneto – e pervertê-la um pouquinho.

“A graça é essa. Pego uma forma tradicional e tento fazer uma coisa um pouco

diferente. Isso passou a ser meu projeto formal. E isso me ajuda a fechar o poema,

a chegar ao final. Quando tomo uma decisão formal – ‘vai ser assim, a rima

tem que ser essa’ – consigo fechar. Senão fica uma coisa frouxa”.

Cada vez mais exigente consigo mesmo, seus livros têm cada vez menos

páginas. Por profissão, é professor na PUC-RJ e tradutor aclamado e premiado.

Sempre do inglês, tendo morado por duas temporadas na Califórnia.

2

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!