Tradução de Jorge Candeias
Tradução de Jorge Candeias
Tradução de Jorge Candeias
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
abandonar‑me. E eu não era suficientemente homem para me afas‑<br />
tar <strong>de</strong>la e pedir‑lhe que procurasse uma vida mais feliz. Nas minhas<br />
horas mais solitárias, quando percorria a cavalo os trilhos em volta<br />
<strong>de</strong> torre do Cervo com os alforges cheios <strong>de</strong> pão envenenado, sabia<br />
ser um cobar<strong>de</strong>, e pior que um ladrão. um dia dissera a Veracida<strong>de</strong><br />
que não seria capaz <strong>de</strong> extrair a força a um homem para alimentar<br />
a minha, que não o faria. E no entanto era isso que eu fazia todos os<br />
dias a Moli. o pergaminho sobre os antigos caiu dos meus <strong>de</strong>dos<br />
lassos. Senti‑me <strong>de</strong> súbito sufocar no meu quarto. pus <strong>de</strong> parte as<br />
tabuinhas e rolos que tinha estado a tentar estudar. Na hora antes do<br />
jantar, procurei os aposentos <strong>de</strong> paciência.<br />
tinha‑se passado algum tempo <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a última vez que a vi‑<br />
sitara. Mas a sua sala <strong>de</strong> estar nunca parecia mudar, excepto na ca‑<br />
mada superior <strong>de</strong> <strong>de</strong>sor<strong>de</strong>m que reflectia a sua paixão do momento.<br />
aquele dia não era excepção. Ervas <strong>de</strong> outono, em molhos para se‑<br />
car, estavam suspensas por todo o lado, enchendo a sala com os seus<br />
odores. Senti‑me a caminhar por um prado invertido enquanto me<br />
baixava para evitar a folhagem pen<strong>de</strong>nte.<br />
“pendurastes isto um pouco baixo,” protestei quando paciên‑<br />
cia entrou.<br />
“Não. tu é que arranjaste maneira <strong>de</strong> te tornares um pouco<br />
alto <strong>de</strong>mais. Endireita‑te e <strong>de</strong>ixa‑me olhar para ti.”<br />
obe<strong>de</strong>ci, embora isso me <strong>de</strong>ixasse com um molho <strong>de</strong> nêveda<br />
pousado na cabeça.<br />
“Bom. pelo menos remar por aí a matar gente o Verão inteiro<br />
<strong>de</strong>ixou‑te <strong>de</strong> boa saú<strong>de</strong>. Muito melhor do que o rapaz adoentado<br />
que voltou cá para casa no Inverno passado. Eu disse‑te que aque‑<br />
les tónicos resultariam. E visto que ficaste tão alto, já agora po<strong>de</strong>s<br />
ajudar‑me a pendurar aqui isto.”<br />
Sem mais <strong>de</strong>moras, fui posto a trabalhar, esticando cordas<br />
<strong>de</strong> aran<strong>de</strong>las até postes da cama, e daí a qualquer outra coisa a que<br />
uma corda pu<strong>de</strong>sse ser atada, e <strong>de</strong>pois atando‑lhes molhos <strong>de</strong> ervas.<br />
tinha‑me encurralado, em cima <strong>de</strong> uma ca<strong>de</strong>ira a atar molhos <strong>de</strong><br />
balsamina, quando exigiu saber: “porque é que já não vens chora‑<br />
mingar comigo com as sauda<strong>de</strong>s que sentes <strong>de</strong> Moli?”<br />
“Isso serviria <strong>de</strong> alguma coisa?” perguntei‑lhe em voz baixa um<br />
momento mais tar<strong>de</strong>. Fiz o melhor que pu<strong>de</strong> para soar resignado.<br />
“Não.” Ela fez uma pausa momentânea como se estivesse a<br />
pensar. Entregou‑me outro ramalhete <strong>de</strong> folhas. “Isso,” informou‑me<br />
35