Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
E os dois conversaram ainda largamente sobre o mesmo assunto, sem que nenhum <strong>de</strong>les<br />
conseguisse achar o fio do enigma.<br />
O Dr. Roberto retirou-se afinal para casa, torturado <strong>de</strong> incertezas e receoso <strong>de</strong> uma gran<strong>de</strong><br />
calamida<strong>de</strong>.<br />
Júlia compareceu ao novo inquérito.<br />
— Conhece a Menina do Bandolim? perguntou-lhe o chefe <strong>de</strong> polícia ao cabo <strong>de</strong> seu<br />
interrogatório.<br />
— Po<strong>de</strong> ser, mas se a conheço, não ligo o nome à pessoa.<br />
— Tenha a bonda<strong>de</strong> <strong>de</strong> ver este <strong>de</strong>senho; ele dá uma idéia perfeita <strong>de</strong> quem falamos.<br />
E o chefe passou à viúva um quarto <strong>de</strong> papel branco, on<strong>de</strong> havia um esboço a pena.<br />
Júlia mal olhou para o papel, exclamou:<br />
— Ah! Já sei! Agora sei quem é.<br />
E, apesar da situação, não pô<strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar <strong>de</strong> rir.<br />
Era uma excelente caricatura da Menina do Bandolim, <strong>de</strong>senhada a traços largos pelo Raul<br />
Pompéia. Esse <strong>de</strong>senho mais tar<strong>de</strong> foi reproduzido pelo próprio autor e oferecido à galeria da<br />
saudosa Gazetinha, don<strong>de</strong> o subtraiu naturalmente algum polícia secreta.<br />
— Don<strong>de</strong> a conhece? perguntou em seguida o chefe.<br />
— De uma noite, em que por acaso a vi conversando com Gregório à mesa do café <strong>de</strong> Java.<br />
— Sabe quais eram as relações entre ela e o acusado?<br />
— Absolutamente; calculo, porém, que não passariam <strong>de</strong> um ligeiro namoro sem<br />
conseqüências. Essa menina é honesta...<br />
— Conhece a letra do acusado?<br />
— Perfeitamente.<br />
— Tenha a bonda<strong>de</strong> <strong>de</strong> ver esta carta.<br />
E passando-lhe uma carta que tirou <strong>de</strong> um maço <strong>de</strong> papéis:<br />
— Parece-lhe escrita por ele?<br />
— Sim, esta letra é <strong>de</strong> Gregório ou muito se assemelha à <strong>de</strong>le.<br />
— Faça o favor <strong>de</strong> ler, disse o chefe.<br />
— “Querida Teresa”.<br />
Mas como fizesse logo um ar <strong>de</strong> dúvida, o chefe esclareceu:<br />
— Teresa é o nome da Menina do Bandolim.<br />
— Ah! disse a viúva, e continuou a leitura: “Ontem não me foi possível ver-te um só<br />
instante: o trabalho pren<strong>de</strong>u-me até tar<strong>de</strong>; hoje, porém, creio que terei a ventura <strong>de</strong> contemplar-te<br />
por muito tempo. Se até lá não me houverem já <strong>de</strong>vorado as sauda<strong>de</strong>s, aproveitarei a ocasião para<br />
te comunicar que chegou o momento <strong>de</strong> transformarmos a nossa sorte. Vai realizar-se aquilo, e<br />
com isso se realizará também o nosso casamento. Ah! quanto sou feliz só com pensar em<br />
semelhante coisa... A<strong>de</strong>us, até logo, pensa um pouquinho em mim e tem confiança na minha<br />
coragem. — Teu G.”<br />
Seguia-se a data.<br />
— Essa carta foi escrita justamente na véspera do crime, afirmou o chefe.<br />
— Mas eu então nada entendo <strong>de</strong> tudo isto, porque a véspera do crime era igualmente a<br />
véspera do casamento <strong>de</strong> Gregório.<br />
— A senhora possui a letra do acusado?<br />
— Sim, senhor, e creio que a tenho aqui mesmo, respon<strong>de</strong>u a viúva, remexendo na sua bolsa.<br />
Ah! cá está um bilhete seu, acrescentou ela, passando uma tira <strong>de</strong> papel ao chefe <strong>de</strong> polícia.<br />
O bilhete constava apenas disto:<br />
“Nhanhã. — Não posso ir, como prometi, fazer-te companhia domingo ao jantar. Chegou da<br />
Europa um velho amigo meu, o Dr. Roberto, e tenho <strong>de</strong> estar com ele esse dia. Desculpa e recebe