You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
— Ora!... resmungou Pedro Ruivo.<br />
E ficou muito sério.<br />
— Estás zangado?... perguntou ela com meiguice.<br />
— Não sei. É melhor não falarmos nisso!<br />
E continuaram a andar para diante <strong>de</strong> braço dado.<br />
Não trocaram uma palavra.<br />
— Estás zangado comigo?... perguntou Cecília novamente, vergando o rosto para encarar o<br />
rapaz.<br />
Ele respon<strong>de</strong>u dando-lhe um beijo em cheio nos olhos.<br />
Ela recuou com um grito, mas Pedro Ruivo empolgou-lhe <strong>de</strong> novo a cintura e puxou Cecília<br />
para um banco <strong>de</strong> pedra que havia próximo.<br />
Quando tornaram para casa, Helena notou a filha um tanto sobressaltada.<br />
— Aconteceu-te alguma coisa? perguntou-lhe. Parece que te assustaste.<br />
Cecília negou.<br />
— Era do calor naturalmente.<br />
E logo que se achou sozinha, cobriu o rosto com as mãos e <strong>de</strong>satou a soluçar nervosamente.<br />
Contudo o resto do dia correu em paz, e à tar<strong>de</strong> arrumaram-se as cestas e puseram-se todos<br />
<strong>de</strong> novo a caminho para a cida<strong>de</strong>.<br />
Pedro Ruivo encontrou em casa uma carta tarjada <strong>de</strong> preto: era a notícia da morte <strong>de</strong> seu pai.<br />
Pouco se impressionou, esperava já por isso mesmo, e, como estivesse muito fatigado do passeio<br />
do dia, adiou para <strong>de</strong>pois os transportes do seu amor filial; <strong>de</strong>itou-se, e daí a instantes dormia<br />
profundamente.<br />
Causou no Porto e no Minho gran<strong>de</strong> espanto a toda a gente o saber que o pai <strong>de</strong> Pedro Ruivo,<br />
em vez <strong>de</strong> <strong>de</strong>ixar ao filho uma boa fortuna, apenas lhe <strong>de</strong>ixara algumas dívidas. D. Helena não o<br />
queria acreditar, e só se capacitou da verda<strong>de</strong>, quando a ouviu narrada entre lágrimas pelo próprio<br />
órfão.<br />
— Com que o Sr. ficou inteiramente pobre?! exclamou ela, com um ar que nunca até então<br />
lhe vira o futuro genro.<br />
— É verda<strong>de</strong>! respon<strong>de</strong>u este, sacudindo muito triste a cabeça; infelizmente, é verda<strong>de</strong>!...<br />
— Ora essa!... resmungou a professora, pálida <strong>de</strong> raiva. Há coisas neste mundo!...<br />
— É a sorte, D. Helena... acrescentou o Ruivo, limpando os olhos.<br />
— E agora?! interrogou ela.<br />
— Resta a resignação! Eu por mim saberei conformar-me com o <strong>de</strong>stino!<br />
— Mas é que nem todos pensam como o senhor! Há <strong>de</strong> permitir-me observar-lhe que era do<br />
seu <strong>de</strong>ver <strong>de</strong> cavalheiro prevenir-nos em tempo da <strong>de</strong>sgraça que o ameaçava. Ora essa!<br />
— Mas se eu não sabia <strong>de</strong> coisa alguma, D. Helena...<br />
— É impossível, senhor!<br />
— Mas se lhe digo que é a verda<strong>de</strong>, minha senhora?!<br />
— Diga o que quiser... eu não acredito!<br />
— Pois não acredite, exclamou Pedro Ruivo, per<strong>de</strong>ndo a paciência. Ora pílulas!<br />
— Faltar-me ao respeito! bradou Helena, possuída <strong>de</strong> cólera... Ainda bem que o senhor<br />
mostrou as unhas antes do casamento. Olha do que escapamos!<br />
— Sim! agora tenho eu todos os <strong>de</strong>feitos, mas quando me supunham rico, era “um Santo<br />
Antoninho on<strong>de</strong> te porei!” Pois se não me quiser dar a mão <strong>de</strong> Cecília, não dê! Só lhe afianço é<br />
que não serei eu só a per<strong>de</strong>r com isso!...<br />
— Hein?! Que quer dizer na sua?!...<br />
— Não posso dar explicações, minha senhora! Sua filha é quem está mais no caso <strong>de</strong><br />
esclarecer o assunto...