12.04.2013 Views

Girândola de Amores - Universia Brasil

Girândola de Amores - Universia Brasil

Girândola de Amores - Universia Brasil

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

O marujo sentiu o coração agitar-se-lhe por <strong>de</strong>ntro, como se quisesse saltar-lhe pela boca.<br />

Tremeram-lhe as pernas, faltou-lhe quase a respiração, e a pele crispou-se-lhe toda em um<br />

calafrio <strong>de</strong> febre.<br />

O vulto chegara à janela <strong>de</strong> Cecília e roçara levemente a ponta da bengala pelas gelosias<br />

fechadas.<br />

O marinheiro espiava, com uma ansieda<strong>de</strong> crescente. À semelhança dos náufragos que,<br />

sentindo escaparem-lhe os meios <strong>de</strong> salvamento, vão refugiando a esperança em tudo que lhes<br />

aco<strong>de</strong> à fantasia, ele contava ainda po<strong>de</strong>r, no fim <strong>de</strong> tudo aquilo, justificar a inocência <strong>de</strong> sua<br />

querida ama.<br />

Mas, ao quarto sinal do vulto misterioso, abriu-se discretamente uma das folhas da janela, e a<br />

cabeça encantadora <strong>de</strong> Cecília assomou à luz melancólica das estrelas.<br />

Conversaram os dois, mas Tubarão não conseguiu ouvir mais que um confuso sussurrar <strong>de</strong><br />

vozes, perdido no sonolento rumorejo da noite. Ao fim <strong>de</strong> meia hora fechou-se <strong>de</strong> novo a janela e<br />

o vulto encaminhou-se cautelosamente para o portão.<br />

O marinheiro havia já colocado à cinta a navalha que lhe <strong>de</strong>ra o comandante. Abriu a porta e,<br />

colando-se à pare<strong>de</strong>, ganhou, a passo <strong>de</strong> gato, o jardim, pelo lado contrário ao que seguia o vulto.<br />

Só o conseguiu avistar já na rua, ao dobrar <strong>de</strong> uma esquina. Tubarão correu para ele, mas,<br />

antes <strong>de</strong> alcançá-lo, saíram-lhe ao encontro dois homens.<br />

— Que <strong>de</strong>seja daquela pessoa? perguntou-lhe um <strong>de</strong>stes com acento muito espanhol.<br />

— Quero pôr-lhe a mão!<br />

— Pois entenda-se conosco!<br />

O marinheiro respon<strong>de</strong>u <strong>de</strong>sta vez com um formidável arranco <strong>de</strong> corpo inteiro, que atirou<br />

por terra os dois sujeitos. E lançou-se <strong>de</strong> novo a perseguir o vulto do jardim.<br />

Este, porém, havia aproveitado o conflito para fugir, e o marinheiro não conseguiu mais<br />

apanhá-lo.<br />

Entretanto, os dois outros homens seguiam <strong>de</strong> perto Tubarão, a falar em voz baixa, e a bater<br />

nas pedras da rua com as suas grossas bengalas.<br />

O marinheiro, quando se convenceu <strong>de</strong> que já não alcançaria o fugitivo, parou, à espera dos<br />

dois que vinham atrás.<br />

Estes pararam por sua vez, e suspen<strong>de</strong>ram a conversa. Só se puseram <strong>de</strong> novo a caminhar<br />

quando o marinheiro caminhou também.<br />

— Ora raios! bradou Tubarão, avançando <strong>de</strong> um pulo sobre eles. Já me vão azedando os<br />

fígados! e num relance segurou-os a ambos, pelo gasnete e atirou-os <strong>de</strong> cambolhada contra a<br />

pare<strong>de</strong>.<br />

Os dois cambalearam por algum tempo, um <strong>de</strong>sabou afinal sobre a calçada e o outro, sacando<br />

uma faca, investiu contra o marinheiro.<br />

— Ah! Ele é isso? rosnou este, <strong>de</strong>sviando o corpo. Pois manda <strong>de</strong> lá tua faquinha, que te<br />

quero dar a resposta!<br />

O outro, porém, em vez <strong>de</strong> mandar a faca, limitou-se a respon<strong>de</strong>r:<br />

— Hombre! siga su camiño, y no me embrome usted!<br />

— Ainda bem! resmungou Tubarão.<br />

E afastou-se lentamente, com ar <strong>de</strong> <strong>de</strong>sprezo.<br />

Também já era tempo, porque o céu principiava a vestir os prenúncios da aurora.<br />

Tubarão entrou em casa apoquentado pelos próprios raciocínios.<br />

— É o <strong>de</strong>mo! consi<strong>de</strong>rava ele. Se a patroa dá para tolices, eu cá faço o que me manda a<br />

consciência! se <strong>de</strong>scobrir que ela engana ao meu comandante, coso-a com uma naifada e levo o<br />

pequeno ao patrão! Ora, aí está!<br />

— Mas como diabo podia aquilo acontecer!... reconsi<strong>de</strong>rava ele <strong>de</strong>pois, já estendido na sua

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!