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— O enderêço? É muito fácil. Sabemos que Alcione tem relações afetivas<br />
com o pessoal da igreja de São Jaques do Passo Alto. Basta recordar que ali<br />
visitamos os despojos do seu tutor...<br />
— É verdade — concordou Cirilo —, como não me havia lembrado antes?<br />
Mandaremos o cocheiro tomar informações ainda hoje.<br />
Susana, que se interessara vivamente pela lembrança paterna, tomou as<br />
primeiras providências, chamando o servo para a incumbência.<br />
— Então, Cirilo — disse a dona da casa —, podemos ir amanhã cedo a<br />
São Marcelo, caso tenhas tempo disponível.<br />
— Eu também vou — disse Beatriz, resoluta-mente.<br />
Observando a atitude da neta, o velho Jaques lembrou:<br />
— Será melhor irmos todos. Além de atender a uma obrigação agradável,<br />
creio que faremos belo passeio, em arrabalde que pouco conhecemos.<br />
O chefe da família concordou alegremente, apesar da objeção que a<br />
espôsa fazia com o olhar.<br />
No dia imediato, por volta das dez horas, elegante carruagem entrava na<br />
ruazinha modesta, em que Madalena curtia a sua pobreza. Muitos moradores<br />
entreolhavam-se espantados.<br />
Arrancada por Luisa da cabeceira da enfêrma, cuja agonia se prolongava<br />
dolorosamente, Alcione foi à porta atender a quem a chamava com tanta<br />
insistência. Reconhecendo que os Davenport se aproximavam sorridentes, seu<br />
primeiro impulso foi recuar, tal o assombro. Nunca encontrara na vida momento<br />
tão amargo. Quis caminhar, sorrir, mostrar-se calma e, no entanto, seus lábios<br />
se prenderam, enquanto estranho palor lhe cobria a face num ricto de espanto.<br />
O coração batia-lhe descompassado. Que iria suceder em tais circunstâncias?<br />
A agonizante, desde a madrugada, falava em voz alta, da chegada do espôso.<br />
Impossível evitar que os Davenport a ouvissem. Num ápice, porém, lembrou-se<br />
do seu contato com as lições de Jesus e procurou dominar-se. Certo, o<br />
Evangelho não seria apenas um roteiro para os momentos fáceis. Era<br />
indispensável provar-lhe o valimento em tôdas as situações da vida. Olhou<br />
instintivamente o céu e disse consigo mesma: — “Senhor, ajudai-me a<br />
compreender vossa divina vontade !“<br />
Seu desfalecimento durara um instante. Energias cariciosas balsamizavamlhe<br />
o coração dorido e ansioso. Não lhes podia determinar a fonte, mas estava<br />
certa de que Jesus lhe enviava sua bênção.<br />
Nesse comenos, os visitantes já estavam junto dela, menos risonhos, por<br />
haverem percebido na sua atitude algo de grave, que não podiam prever.<br />
— Que foi, Alcione? — perguntou Susana preocupada, abraçando-a. - —<br />
Assim tão pálida? A doente piorou?<br />
Mais calma, a jovem teve fôrças para murmurar:<br />
— Mamãe está expirando.<br />
Cirilo e Jaques, sinceramente compadecidos, abraçaram-na,<br />
comovidamente. Beatriz, como se desejasse prestar serviço imediato,<br />
adiantou-se ao grupo, varando casa a dentro. Alcione acompanhou-os à<br />
pequena sala de visitas, que dava justamente para o quarto da agonizante,<br />
convidando-os a sentar-se, com a gentileza que lhe era inata. Percebendo o<br />
empenho que tinham em socorrê-la naquele transe, seu primeiro desejo era<br />
correr ao quarto de sua mãe e esconder as lembranças paternas, que lá<br />
estavam em cima da mesa; mas Susana e Cirilo, poderosamente atraidos para<br />
o quarto da agonizante, levantaram-se procurando lá entrar, no intuito de