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Somos mestiços, e daí? - cchla - UFRN

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das misturas, das substituições, das recriações que se pratica a todo instante na vida brasileira,<br />

animando o corpo social, estruturando-o e regenerando-o. Nesse sentido, as mestiçagens, para<br />

além das formas instituídas e legitimadas do social, asseguram a circulação dos sentimentos, das<br />

paixões, do sexo, asseguram diversas trocas anônimas, engendram diversos acordos secretos, sem<br />

que se possa classificá-los, prevê-los, controlá-los.<br />

É, sem dúvida, esse aspecto transgressivo e incontrolável das mestiçagens brasileiras que<br />

incomoda os diversos poderes sociais e as elites intelectuais e políticas. A pluralidade, a<br />

heterogeneidade, a duplicidade tornam-se incômodos que afetam todos aqueles que têm a sede do<br />

controle social. Finalmente, podemos dizer que a reprovação, os preconceitos, a desconfiança e o<br />

pessimismo das mestiçagens são o temor da diversidade, o temor do inesperado e do inédito. Da<br />

ordem do transitório, do imperfeito, do inacabado, do insatisfeito, do imprevisível, do risco, da<br />

aliança que vai fazer surgir o inesperado, as mestiçagens estão permanentemente na aventura da<br />

errância. Aqui também poderíamos fazer lembrar as reflexões de Michel Maffesoli a propósito<br />

dos nomadismos sociais. Contrariamente a quietude e a segurança do sedentarismo, as<br />

mestiçagens despertam o mesmo sentimento que o errante, o migrante, o estranho, o "bárbaro"<br />

provocam. Como observa o autor: "Encontra-se aí a fobia da mudança e daquilo que é móvel. O<br />

bárbaro vem perturbar a quietude do sedentário. (...) porque pode escapar, o bárbaro afirma sua<br />

soberania sobre a vida. É seu escapismo, essa capacidade de se evadir, que o predispõe, a todo<br />

momento, à mudança, à subversão da ordem estabelecida." 22<br />

No Brasil, as mestiçagens exprimem também um estilo de vida centrada no presente,<br />

como se toda uma coletividade vivesse a vida na plenitude do instante mágico passageiro e,<br />

assim, na confrontação com a ideologia produtivista de tipo burguesa. Esta baseada, entre outras<br />

coisas, no controle de todo gasto improdutivo de energia (dos corpos, do sexo, do tempo, etc.),<br />

em nome de uma economia que prepara o "progresso" e o "futuro". Modelo de uma verdadeira<br />

ideologia de espera do futuro, ideologia que se apresenta em diversas formas, religiosas ou<br />

22 Cf. Maffesoli, Michel. Du nomadisme. Paris, Le Livre de Poche, 1997, p. 41<br />

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