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Somos mestiços, e daí? - cchla - UFRN

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cessam de retomar. Nossas mestiçagens são, por bom número desses intelectuais, vistas como o<br />

fator que teria mergulhado a sociedade brasileira no dilema de construção de suas instituições,<br />

dividida que estaria entre o modelo de uma sociedade "racional", "moderna", "civilizada", "séria"<br />

– "a esfera pública bem separada da esfera privada" - e o modelo de nossas misturas "insensatas",<br />

"arcaicas", "grosseiras", "irracionais", "atrasadas", um dilema do qual a sociedade brasileira ainda<br />

não teria saído. Tanto o intérprete nacional como também o estrangeiro acreditam que esse<br />

dilema estaria bem representado no homem macunaímico de Mário de Andrade ("arquétipo do<br />

brasileiro e do latino-americano, dividido entre duas escolhas antagônicas – o Brasil ou bem a<br />

Europa" 55 ). Ora, o que se chama de "dilema brasileiro" não é senão a versão intelectual do<br />

mal-estar das elites brasileiras em sua relação com as mestiçagens. No espírito geral das<br />

mestiçagens, na identificação da maioria dos brasileiros com os hábitos de mestiçagens, não há<br />

divisão "entre duas escolhas antagônicas". Como vimos, nossa tendência cultural predominante é<br />

ligar, é fazer pontes, é juntar extremos, opostos. No ambiente brasileiro, como bem o demonstra<br />

R. DaMatta, predomina o "&" que tudo liga. A problemática do "entre dois", do "estar dividido"<br />

entre escolhas "inconciliáveis", do "não saber juntar", etc. encontra-se alhures, em outras<br />

paragens... Assim, poderíamos dizer, o homem de Mário de Andrade não é o arquétipo do<br />

brasileiro mas bem o drama das elites do país.<br />

Como assinalamos antes, nossas elites vivem o desconforto de pertencerem a uma cultura<br />

que não se ergueu à imagem e semelhança da cultura da metrópole colonizadora. Elas vivem o<br />

mal-estar de serem mestiças e de pertencerem a uma cultura de mestiçagens. Gostariam de ter no<br />

país "as instituições fortes dos povos do Norte" (era o lamento e a esperança de Sérgio B.<br />

Holanda) e se sabe do desconforto na alma das nossas elites de ter que se reconhecer na revelação<br />

de Gilberto Freyre: "todo brasileiro, mesmo o alvo, de cabelo louro, traz na alma, quando não na<br />

alma e no corpo - ... -, a sombra, ou pelo menos a pinta, do indígena ou do negro" 56<br />

As revistas atestam nossa tese: "Sabe-se hoje que mais de 60% dos que se jugam 'brancos'<br />

têm sangue índio ou negro correndo nas veias. O problema está no fato de que essa mestiçagem<br />

55 C. Gruzinski, Serge. La pensée..., op. cit., p. 20<br />

56 Cf. Freyre, Gilberto. Casa-Grande..., op. cit., p. 283<br />

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