Somos mestiços, e daí? - cchla - UFRN
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mestiçagens ao lugar de uma anomalia cultural condenou também o "jeitinho" ao estatuto de uma<br />
patologia social que infecta o sistema das instituições políticas brasileiras. Daí as tantas boutades<br />
no discurso dos intelectuais críticos universitários que definem o Brasil como "república de<br />
bananas" e que não cansam de repetir, com o charme de esquerda, "este não é um país sério".<br />
Modos de representar a sociedade brasileira que somente ajudam a perpetuar a baixa auto-estima<br />
que nos legou o colonizador europeu (nas suas diversas versões) com seu julgamento<br />
preconceituoso e racista do homem mestiço nacional e de nossas mestiçagens.<br />
O certo é que, se penetramos o sentido profundo de todas as representações depreciativas<br />
que cercam as mestiçagens, veremos que aquilo que é latente no discurso das nossas elites e dos<br />
diversos poderes sociais do país é o temor de uma socialidade apoiada em práticas que escapam a<br />
todo o controle – cuja manifestação encontra nisso que venho chamando de mestiçagens sua<br />
expressão maior. São estas a metáfora maior do campo social brasileiro. Enquanto dispositivo<br />
que alimenta a circulação de pessoas, de corpos, de imagens, de idéias, de valores, de práticas e<br />
de regras, as mestiçagens provocam suspeita, desconfiança, temor.<br />
Assim, mesmo se aqueles que pertecem às elites e aqueles que ocupam funções de poder<br />
tentam integrar o social brasileiro ao modelo da separação, do controle, da homogeneidade, as<br />
mestiçagens transformam a socialidade cotidiana em espaço de diversidade, de pluralidade, e em<br />
que se recusa toda dicotomia purista e moralista. Tudo funciona como se na cultura brasileira um<br />
dispositivo inconsciente trabalhasse contra toda separação, disjunção<br />
Se é verdadeiro que a sociedade brasileira conserva uma parte de suas características<br />
como cultura apoiando-se em ambigüidades que tentam conjugar desigualdades e violências, e<br />
mesmo estruturas autoritárias, não é menos certo, por isso, que ela não faça conhecer aos que<br />
nela vivem a experiência de códigos de flexibilização das normas, princípios, conceitos, etc.<br />
Assim, graças a esse seu traço, a sociedade brasileira tem sido descrita como tolerante, versátil,<br />
maleável, heteróclita – ainda os diversos sentidos que isso possa adquirir na vida cotidiana.<br />
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