Psicopatologia da Criança - Associação de Estudos do Alto Tejo
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PSICOPATOLOGIA DA CRIANÇA NO SUL DA BEIRA INTERIOR (PERSPECTIVA ETNOLÓGICA)<br />
Francisco Henriques<br />
Nesta parte <strong>do</strong> trabalho abor<strong>da</strong>remos as temáticas relativas à violência física e psicológica, ao<br />
infanticídio, à negligência, ao aci<strong>de</strong>nte e ao abuso sexual. Tal abor<strong>da</strong>gem visará um<br />
enquadramento <strong>de</strong>ste trabalho, em termos <strong>da</strong> reali<strong>da</strong><strong>de</strong> social <strong>de</strong>stas comuni<strong>da</strong><strong>de</strong>s, embora sem<br />
o <strong>de</strong>senvolvimento que aqueles temas mereciam.<br />
1.5.1. Violência física e psicológica<br />
A violência consiste no abuso <strong>do</strong> po<strong>de</strong>r, qualquer que ele seja.<br />
A violência física e psicológica é um <strong>do</strong>s tipos <strong>de</strong> maus-tratos i<strong>de</strong>ntifica<strong>do</strong>s. Dividimo-las por<br />
mera questão <strong>de</strong> operacionali<strong>da</strong><strong>de</strong>. A primeira é facilmente reconheci<strong>da</strong> e <strong>de</strong>ixa quase sempre<br />
sequelas psicológicas graves.<br />
Na violência física a criança é vitima, <strong>de</strong>libera<strong>da</strong>mente, ou não, <strong>de</strong> maus tratos físicos que<br />
integram “méto<strong>do</strong>s <strong>de</strong> educação coercivos / punitivos através <strong>da</strong> utilização <strong>de</strong> técnicas<br />
disciplinares (físicas) ina<strong>de</strong>qua<strong>da</strong>s e violentas, a agressão e violência física e o consumo <strong>de</strong><br />
álcool e medicamentos” (Calheiros e Monteiro, 2000:163).<br />
Segun<strong>do</strong> as autoras acima cita<strong>da</strong>s as formas <strong>de</strong> violência psicológica, sobre a criança, po<strong>de</strong>m<br />
ser entendi<strong>da</strong>s como actos conscientes “que não favorecem as necessi<strong>da</strong><strong>de</strong>s <strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>senvolvimento emocional, social e intelectual, incluin<strong>do</strong> interacções verbais agressivas, actos<br />
<strong>de</strong> aban<strong>do</strong>no <strong>de</strong>clara<strong>do</strong> e uma socialização ina<strong>de</strong>qua<strong>da</strong> através <strong>de</strong> mo<strong>de</strong>los ina<strong>de</strong>qua<strong>do</strong>s,<br />
reforço <strong>do</strong> <strong>de</strong>svio ou evitamento social” (Calheiros e Monteiro, 2000:163).<br />
A psicóloga clínica Viegas <strong>de</strong> Abreu (2002) especifica que “utilizar palavras agressivas,<br />
humilhantes ou <strong>de</strong> <strong>de</strong>sprezo, significa violentar, golpear e perturbar o seu <strong>de</strong>senvolvimento<br />
saudável porque abalam o seu amor próprio”.<br />
Na análise realiza<strong>da</strong> por Emília Galvão (1998) ao trabalho <strong>de</strong>senvolvi<strong>do</strong> pelo Núcleo <strong>da</strong> <strong>Criança</strong><br />
Maltrata<strong>da</strong> <strong>do</strong> Hospital Maria Pia, nos anos <strong>de</strong> 1994 (84 casos) e 1995 (71 casos), conclui que<br />
em 1994 os maus tratos psíquicos atingiram 11% e os físicos 9%, no total <strong>do</strong>s maus tratos. Em<br />
1995 os maus tratos psíquicos <strong>de</strong>sceram para 6% e os físicos aumentaram para 23%.<br />
Num outro trabalho, <strong>de</strong>senvolvi<strong>do</strong> em vários hospitais <strong>da</strong> região norte <strong>do</strong> país, verificou-se que<br />
os maus tratos emocionais atingiam 28 %, sobre o total <strong>do</strong>s casos i<strong>de</strong>ntifica<strong>do</strong>s, e a violência<br />
física 21% (Carvalho, Monteiro e Teixeira, 1999). Naquele estu<strong>do</strong>, o valor apura<strong>do</strong> para<br />
quantificar a violência física é muito semelhante ao <strong>de</strong>termina<strong>do</strong> pela equipa <strong>de</strong> Emília Galvão<br />
(1998) para o ano <strong>de</strong> 1995. Cremos que este facto é explicável pela objectivi<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>da</strong> queixa<br />
formula<strong>da</strong> (equimoses, hematomas, fracturas, queimaduras, etc). Ao invés, há uma gran<strong>de</strong><br />
dispari<strong>da</strong><strong>de</strong> nos quantitativos relativos aos maus tratos psíquicos. Cremos que este facto esteja<br />
correlaciona<strong>do</strong> com o conceito operatório utiliza<strong>do</strong>, fortemente subjectivo. Estas crianças eram<br />
maltrata<strong>da</strong>s no seio <strong>da</strong> família, <strong>da</strong> escola ou <strong>da</strong> comuni<strong>da</strong><strong>de</strong> mais alarga<strong>da</strong>. Para sobreviverem<br />
com algum equilíbrio emocional as crianças, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> muito novas, teriam que fazer uso <strong>de</strong><br />
mecanismos <strong>de</strong> <strong>de</strong>fesa que as aju<strong>da</strong>ssem a suplantar tais agressões. Os castigos, a humilhação,<br />
as críticas, as ameaças, as exigências <strong>de</strong>sproporciona<strong>da</strong>s para a i<strong>da</strong><strong>de</strong>, a <strong>de</strong>svalorização<br />
permanente, o ambiente <strong>de</strong> terror são elementos que se po<strong>de</strong>m incluir nos maus tratos psíquicos<br />
e físicos.<br />
AÇAFA On Line, nº 1 (2008)<br />
<strong>Associação</strong> <strong>de</strong> <strong>Estu<strong>do</strong>s</strong> <strong>do</strong> <strong>Alto</strong> <strong>Tejo</strong>, www.altotejo.org<br />
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