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Viscondes, mazombos e coimbrãos - Quintal dos Poetas

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Assim não me preocupei muito em determinar onde a história<br />

realmente começa. Isso porque ela começou várias vezes. Para ser<br />

exato, teve início sempre que uma de suas personagens resolvia se<br />

inserir no vendaval <strong>dos</strong> acontecimentos. E estes acontecimentos<br />

tomaram rumos diferentes quando cada um se arrependeu disso. Deriva<br />

daí a ordenação circular que, certamente, se constitui numa<br />

característica <strong>dos</strong> registros desse episódio histórico tão fartamente<br />

ilustrado e repleto de inconsistências. Não poderia ser diferente, com<br />

todo mundo querendo se livrar <strong>dos</strong> incômo<strong>dos</strong> de uma pena capital,<br />

cruel e humilhante.<br />

Mas devo confessar que, apesar da minha opção por organizar este<br />

trabalho desta forma livre, não consegui me despir de alguns vícios<br />

adquiri<strong>dos</strong> em meu singelo passado acadêmico, vivido naqueles tempos<br />

em que os bons livros tinham que ser construí<strong>dos</strong> em torno de ideias<br />

novas. Assim, existe uma tese central a amarrar as diversas partes que<br />

compõem esta obra e que – devo admitir - sequer é muito original. É a<br />

ideia de que o grupo de inconfidentes tem uma identidade dupla, com<br />

pontos convergentes e divergentes, conforme o lado que se olha.<br />

Coletivamente representa uma união, um tanto romântica e mal<br />

conformada, entre dois grupos distintos e até certo ponto distantes: os<br />

<strong>mazombos</strong> 9 e os <strong>coimbrãos</strong>. 10 Vale dizer enfim: empreendedores e<br />

aventureiros desiludi<strong>dos</strong> e inconforma<strong>dos</strong> de um lado e burocratas,<br />

magistra<strong>dos</strong> e bacharéis frustra<strong>dos</strong>, ambiciosos ou muito visionários, do<br />

outro lado. Entre esses últimos me permito alinhar o próprio visconde<br />

9 Termo pejorativo que nas Minas do século XVIII identificava os brasileiros filhos de<br />

portugueses que, pelos seus costumes e valores genuinamente locais, já tinham<br />

esquecido suas raízes portuguesas. É mencionado especialmente nos depoimentos de<br />

Domingos de Abreu Vieira registra<strong>dos</strong> nos autos de devassa da Inconfidência Mineira.<br />

A singeleza da conotação dada pelo velho e simplório inconfidente me parece muito<br />

apropriada para caracterizar o clima que contagiou e entusiasmou uma parte da elite<br />

da capitania que se encontrava mais perto <strong>dos</strong> anseios do povo em geral.<br />

10 Tomei o termo para caracterizar o grupo <strong>dos</strong> inconfidentes constituído basicamente<br />

de bacharéis forma<strong>dos</strong> em Coimbra onde se embebedaram das fontes do iluminismo e<br />

poliram os espíritos em salões nobres portugueses, declamando seus poemas,<br />

cortejando suas pastoras e argumentando com fineza e elegância. Creio que nunca<br />

conseguiram se livrar inteiramente das fortes raízes lusas da sua formação, nem do<br />

enlevo que lhes proporcionava a proximidade com a nobreza, mesmo depois que<br />

passaram a achar interessantes aquelas ideias de república.<br />

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