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A GLOBALIZAÇÃO NO MUNDO ANTIGO - Universidade de Coimbra

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público que caberia custear o grosso das <strong>de</strong>spesas, mas antes aos cidadãos privados<br />

mais ricos, através <strong>de</strong> um serviço cívico que o estado lhes impunha: a liturgia. É<br />

certo que este ministério po<strong>de</strong>ria reverter a favor da projeção do seu patrocinador<br />

involuntário, enquanto figura pública, sobretudo se a pessoa em questão alimentasse<br />

ambições políticas, mas não <strong>de</strong>ixava, ainda assim, <strong>de</strong> ser um encargo pesado,<br />

que nem todos cumpririam <strong>de</strong> bom grado. Mesmo assim, espelhava igualmente a<br />

estreita união entre o exercício ativo da cidadania e a mimesis dramática.<br />

4.2. O processo <strong>de</strong> financiamento dos festivais <strong>de</strong> teatro<br />

A maneira como se preparava e financiava o festival dramático constitui,<br />

com efeito, uma expressão notável do espírito próprio do sistema <strong>de</strong> pólis, pois<br />

a maioria dos encargos era suportada não pelo estado, mas pelos cidadãos com<br />

mais posses. 2 Era, além disso, um dos fatores que <strong>de</strong>terminavam <strong>de</strong> forma clara<br />

a qualida<strong>de</strong> final do espetáculo. 3 A obrigação <strong>de</strong> suportar as <strong>de</strong>spesas ligadas<br />

aos festivais dramáticos era <strong>de</strong>signada por coregia (choregia) e correspondia a<br />

uma variante dos diferentes tipos <strong>de</strong> serviços públicos prestados por privados —<br />

como pagar a equipagem <strong>de</strong> um navio durante um ano (trierarquia), ou o treino<br />

<strong>de</strong> uma equipa <strong>de</strong> atletas para uma prova (gimnasiarquia). Essas tarefas <strong>de</strong>signavam-se<br />

globalmente por liturgias, ou seja um tipo <strong>de</strong> impostos especiais que<br />

o sistema <strong>de</strong>mocrático impunha aos cidadãos mais abastados. 4 Regra geral, a<br />

coregia era evitada pela classe litúrgica, por ser um pesado encargo, mas, quando<br />

2 E por vezes também pelos metecos, que po<strong>de</strong>riam custear as <strong>de</strong>spesas <strong>de</strong> montagem do<br />

espetáculo, mas somente nas Leneias, um festival mais caseiro. Ou seja, mesmo para prestar um serviço<br />

ao estado e à população, havia uma diferenciação clara entre o estatuto <strong>de</strong> cidadão <strong>de</strong> plenos<br />

direitos e o <strong>de</strong> um estrangeiro com mera autorização <strong>de</strong> residência. Cf. escólio a Aristófanes, Pluto,<br />

954. Sobre as principais características dos festivais dionisíacos celebrados em Atenas (Antestérias,<br />

Leneias, Dionísias Rurais e Dionísias Urbanas ou Gran<strong>de</strong>s Dionísias), vi<strong>de</strong> Rocha Pereira (2006) 354-368.<br />

3 Vi<strong>de</strong> Csapo & Slater (1998), 139-157, que fornecem um enquadramento muito útil sobre o<br />

problema, acompanhado dos testemunhos antigos mais pertinentes para a questão. Vi<strong>de</strong> ainda<br />

Oliveira (1991) 5-20. O trabalho <strong>de</strong> Isabel Castiajo, O teatro grego em contexto <strong>de</strong> representação, cuja<br />

publicação é esperada para 2012, constituirá o estudo mais completo sobre esta matéria, escrito até<br />

agora em língua portuguesa.<br />

4 A pertença à classe litúrgica obe<strong>de</strong>cia a qualificações <strong>de</strong> proprieda<strong>de</strong>, acessíveis apenas a<br />

uma percentagem muito reduzida da população, pois mesmo a liturgia mais baixa obrigava a posses<br />

<strong>de</strong> referência superiores ao que um trabalhador especializado po<strong>de</strong>ria esperar ganhar durante toda<br />

a vida. Para mais pormenores, vi<strong>de</strong> Csapo & Slater (1998) 139.

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