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CESARE BECCARIA E AS SOMBRAS DO ILUMINISMO: DIREITO ...

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O discurso iluminista do século XVIII tem como sua marca principal a<br />

defesa da causa da emancipação humana pelo uso da razão. A fórmula célebre de Kant<br />

sapere aude (ousai saber), o apelo à autonomia do sujeito a partir das suas potencialidades<br />

racionais e o uso da ciência na dissolução da imagem mística e encantada do mundo são o<br />

que melhor caracteriza o pensamento das Luzes. No plano político, a reivindicação da<br />

emancipação pela razão faz com que o Iluminismo se caracterize como uma razão negativa<br />

de tonalidade fortemente crítica que, em suas formas extremadas, assumiu um caráter<br />

contestatório altamente subversivo em relação aos poderes constituídos. E quanto mais nos<br />

aproximamos dos grandes centros econômicos europeus, onde as pressões dos interessados<br />

em uma economia racional de mercado se confrontavam de forma cada vez mais irresolúvel<br />

com instituições burocráticas arcaicas, maiores eram os radicalismos conseqüentes do<br />

Iluminismo em seu combate contra o Antigo Regime. Ao contrário, onde o quadro políticosocial<br />

não se caracterizava por uma tensão tão acirrada colocada sobre estas bases a pressão<br />

por mudanças institucionais pôde tomar o caminho de uma conciliação de interesses e se<br />

transformar em um moderado discurso reformista.<br />

De outro lado, este discurso reformista teve seus caminhos facilitados na<br />

medida em que a reforma institucional era, para os Estados economicamente periféricos da<br />

Europa da metade do século XVIII, como Prússia, Áustria e Portugal, uma necessidade<br />

impostergável. Assim, paralelo àquele discurso reformista de origem filosófica, houve uma<br />

tendência à racionalização instrumental das instituições administrativas que se guiava<br />

hegemónicos de Luís XIV.” (<strong>AS</strong>TUTI, Guido. O Absolutismo Esclarecido em Itália e o Estado de<br />

Polícia. Tradução de António Manuel Hespanha. In HESPANHA, António Manuel (org.). Poder e<br />

Instituições na Europa do Antigo Regime. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1984, p. 254.).<br />

Astuti percebe, nesta passagem, que a afinidade entre Iluminismo e liberalismo não é inflexível e<br />

deve necessariamente ser revista em determinadas circunstâncias. Todavia, cabem algumas<br />

considerações. Em primeiro lugar, situar o auge do absolutismo europeu continental na segunda<br />

metade do século XVII parece um tanto apressado. Na verdade, a maior parte dos Estados da<br />

Europa continental ocidental alcançariam seus graus máximos de desenvolvimento absolutista<br />

apenas na segunda metade do século XVIII, justamente na época da recepção das idéias iluministas.<br />

Somente a França estabiliza seu processo de centralização do poder na época apontada, no governo<br />

de Luís XIV. E comparando-se os grandes monarcas absolutos dos fins do século XVIII com Luís<br />

XIV, dificilmente se poderia sustentar a superioridade deste. Em segundo lugar, responsabilizar “as<br />

fortes autocracias pessoais e burocráticas” (colocando a ênfase apenas na sua força), que de fato<br />

nem existiam, salvo no caso francês, pela ausência de idéias liberais no continente durante o fim do<br />

século XVII parece um tanto simplista. Ao contrário, parece-nos que o atraso na recepção das idéias<br />

liberais deve-se ao fato de que o modelo absolutista (mesmo no caso da França) ainda conseguiria,<br />

por algum tempo a partir dos últimos anos do século XVII, oferecer resposta às demandas dos<br />

setores sociais (nomeadamente a alta burguesia) que mais se interessariam pelo liberalismo.<br />

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