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Heterogeneidade e Divisao em Discursos de Suicidas

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oculta. Quantas vezes não caímos <strong>em</strong> erro sobre as verda<strong>de</strong>iras razões que<br />

nos levam a agir?! Quantas vezes não explicamos por generosas paixões ou<br />

por consi<strong>de</strong>rações elevadas atitu<strong>de</strong>s que nos foram suscitadas por<br />

sentimentos mesquinhos ou por uma rotina cega?! (DURKHEIM, 2002, p.<br />

13).<br />

Neste trabalho, não pretend<strong>em</strong>os investigar as intenções íntimas dos suicidas, como se<br />

os seus discursos pu<strong>de</strong>ss<strong>em</strong> revelar as verda<strong>de</strong>iras motivações <strong>de</strong> seus atos. Com menos razão<br />

po<strong>de</strong>ríamos <strong>de</strong>finir o próprio suicídio a partir do fim perseguido pelo agente, pois um mesmo<br />

ato po<strong>de</strong> servir a inúmeros fins.<br />

O soldado que avança para uma morte certa a fim <strong>de</strong> salvar o seu pelotão não<br />

<strong>de</strong>seja perecer; e no entanto, não será ele o autor <strong>de</strong> sua própria morte na<br />

mesma medida que o é o industrial ou comerciante que se mata para se<br />

poupar à vergonha da falência? O mesmo se po<strong>de</strong> dizer do mártir que dá a<br />

vida pela fé, da mãe que morre para salvar o filho, etc. (DURKHEIM, 2002,<br />

p. 14).<br />

Em suma, para que um ato configure suicídio, é preciso haver ciência do resultado e<br />

voluntarieda<strong>de</strong> no ato, caracterizando uma “renúncia à existência” (DURKHEIM, 2002, p.<br />

14). Isto é, o ato <strong>de</strong>ve ter partido <strong>de</strong> alguém que soubesse da consequência morte, ainda que<br />

não a <strong>de</strong>sejasse, pois alguns suicidas gostariam <strong>de</strong> viver, mas ve<strong>em</strong> na morte sua única saída.<br />

Embora reconheçamos a proprieda<strong>de</strong> do conceito <strong>de</strong> Durkheim, lidar<strong>em</strong>os aqui<br />

especificamente com casos <strong>em</strong> que a morte resultou diretamente <strong>de</strong> atos positivos dos agentes.<br />

É interessante observar que a <strong>de</strong>limitação do que seja suicídio po<strong>de</strong> tornar-se por<br />

d<strong>em</strong>ais complexa caso não se estabeleça o limite da consciência e da voluntarieda<strong>de</strong>. Segundo<br />

o psicanalista Roosevelt Cassorla (1992), muitas vezes uma análise aprofundada revela que<br />

existe uma exacerbação inconsciente dos instintos <strong>de</strong> morte <strong>em</strong> pessoas que se aci<strong>de</strong>ntam com<br />

facilida<strong>de</strong> (ca<strong>em</strong>, são atropeladas ou sofr<strong>em</strong> aci<strong>de</strong>ntes automobilísticos, entre outros).<br />

O mesmo po<strong>de</strong> ser verda<strong>de</strong> no caso <strong>de</strong> comportamentos auto<strong>de</strong>strutivos, como fumar,<br />

beber d<strong>em</strong>ais e usar drogas, viver perigosamente, sobrecarregar-se física ou <strong>em</strong>ocionalmente.<br />

Esses indivíduos estariam caminhando sutilmente <strong>em</strong> direção à sua morte, porém o nível <strong>de</strong><br />

consciência é tão r<strong>em</strong>oto que dificilmente po<strong>de</strong>riam ser consi<strong>de</strong>rados suicidas.<br />

Por fim, há autores que falam <strong>em</strong> suicídio parcial (<strong>em</strong> oposição ao total) quando o<br />

indivíduo mata uma parte <strong>de</strong> si mesmo. Cassorla (1992) explica que o ato po<strong>de</strong> ser consciente<br />

(como no caso das automutilações) ou inconsciente (nas hipóteses <strong>de</strong> não funcionamento ou<br />

mal funcionamento <strong>de</strong> órgãos). Apesar <strong>de</strong> interessante, não trabalhar<strong>em</strong>os com esse conceito,<br />

já que nossa análise envolverá apenas casos típicos <strong>de</strong> suicídio, <strong>em</strong> que a morte é voluntária e<br />

total, resultando diretamente <strong>de</strong> um ato positivo do agente.<br />

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