Hamlet à luz de Bakhtin: a carnavalização da tragédia - CCHLA ...
Hamlet à luz de Bakhtin: a carnavalização da tragédia - CCHLA ...
Hamlet à luz de Bakhtin: a carnavalização da tragédia - CCHLA ...
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
Como po<strong>de</strong> ser lido na citação acima, os palhaços, ou clowns em inglês, abrem o<br />
Ato 5 quebrando a linha trágica <strong>da</strong> finalização do Ato 4. Essas personagens ain<strong>da</strong> se<br />
mostram irônicos, pois, são clowns que estão fazendo papel <strong>de</strong> coveiro. São visões<br />
dicotômicas <strong>da</strong> vi<strong>da</strong>: o riso e o choro, o luto e a diversão, unidos em um mesmo elemento.<br />
Eles representam <strong>de</strong> fato o conceito <strong>da</strong> <strong>carnavalização</strong>, na acepção bakhtiniana do termo: a<br />
mistura. Elementos que pareciam distantes um dos outros estão unidos e não há fronteiras<br />
entre eles.<br />
Ain<strong>da</strong> na cena acima, além <strong>da</strong>s informações importantes que eles nos passam sobre<br />
a morte e o enterro <strong>da</strong> personagem Ofélia, há o tom <strong>de</strong> escárnio, <strong>de</strong> humor. O uso <strong>da</strong><br />
palavra afogar no diálogo é <strong>de</strong> duplo sentido, configurando uma sexual pun. Os uso <strong>da</strong>s<br />
puns foi uma forma encontra<strong>da</strong> por Shakespeare para atribuir a uma palavra sentidos<br />
duplo. O autor utiliza a língua para erotizar a fala <strong>da</strong>s personagens <strong>da</strong>ndo um tom <strong>de</strong><br />
comédia e quebrando assim a uni<strong>da</strong><strong>de</strong> trágica preconiza<strong>da</strong> por Aristóteles.<br />
Um dos clowns, o primeiro, é uma <strong>da</strong>s únicas personagens em to<strong>da</strong> a peça que<br />
consegue manter com <strong>Hamlet</strong> uma conversa que lhe é a altura. Ou seja, mais uma coisa<br />
chama a atenção: uma personagem oriun<strong>da</strong> do universo carnavalizado consegue ter um<br />
diálogo com o Herói <strong>de</strong> forma profun<strong>da</strong>, usando as mesmas técnicas retóricas que ele.<br />
Ele, o palhaço, consegue rebater, e <strong>à</strong>s vezes, parecer ser dotado <strong>de</strong> uma inteligência maior<br />
do que a do próprio <strong>Hamlet</strong>. Os clowns shakespearianos são elementos populares <strong>da</strong><br />
cultura carnavaliza<strong>da</strong>, que, por outro lado, utilizam um linguajar tão apurado quanto o do<br />
próprio príncipe. <strong>Hamlet</strong> parece <strong>à</strong> vonta<strong>de</strong> na conversa com o personagem, parece<br />
reconhecer na personagem um “eu”.<br />
3.3.2 O Bobo <strong>da</strong> Corte<br />
Ain<strong>da</strong> no ato 5, os contextos <strong>da</strong> teatrali<strong>da</strong><strong>de</strong> e <strong>da</strong> <strong>carnavalização</strong> aparecem muito<br />
fortes. É no Ato 5 que somos informados sobre Yorick. Yorick é o ex-bobo <strong>da</strong> corte <strong>da</strong><br />
Dinamarca que exerceu influências fortes na personali<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>Hamlet</strong>. No livro A cultura<br />
Popular na I<strong>da</strong><strong>de</strong> Média e no Renascimento (1997) <strong>Bakhtin</strong> explica um pouco sobre o<br />
papel dos bobos na cortes na cultura medieval e renascimento:<br />
Os bufões e os bobos são personagens característicos <strong>da</strong> cultura cômica <strong>da</strong> I<strong>da</strong><strong>de</strong><br />
Média. [...] Os bufões e bobos [...] não eram atores que <strong>de</strong>sempenhavam seu<br />
papel no palco [...]. Pelo contrário eles continuavam sendo bufões e bobos em<br />
34