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UMA BIOGRAFIA PORTUGUESA EM LEVANTADO DO CHÃO ...

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4.3. Quem vence afinal?<br />

A história do Alentejo, percorrida em três quartos de séculos, da instauração da República<br />

Portuguesa, em 1910, à Revolução dos Cravos, em abril de 1974, embora com flashes do<br />

século XV, não possui vencedores. O livro do latifúndio inscreve em sua versão final uma<br />

nova ordem, quando a herdade dos Horques é invadida pelos camponeses, ponto culminante<br />

do romance. Essa possível alteração da ordem latifundiária continua a suscitar os seus novos<br />

problemas, tão comum nas relações sociais, mas por enquanto o ar festivo do momento e a<br />

presença da celebração não só dos vivos como também dos desaparecidos prefiguram um<br />

movimento de unidade e solidariedade que pode resultar numa ordem justa. 406<br />

A introdução de um momento festivo insinua a perpetuação de um horizonte excessivo de<br />

efemeridade dos intervalos, tanto mais que, mesmo aí, o horizonte do trabalho acena sempre<br />

à maneira de espectro do dia seguinte, 407 pois a história das searas repete-se com notável<br />

constância, mas tem suas variantes. 408<br />

Votando à temática mitológica, a repetição constitui-se num tema capital no processo de<br />

conclusão de Levantado do chão. A questão dessa dimensão temporal, vinculada à ideia do<br />

eterno, aponta para a importância da passagem do tempo na narrativa. Como foi afirmado, o<br />

processo de unidade temporal baseado no passado, presente e futuro é continuamente<br />

presentificado na visão estética de José Saramago, insinuando a ordem mítica do romance,<br />

que ao finalizar retorna aos temas já apresentados.<br />

Se por um lado existe uma vitória dos camponeses, que adquirem mais direitos e menos<br />

exploração, e uma derrota dos latifundiários, que se desarticulam, a terra não deixará de<br />

existir para recrutar quem nela trabalhe. Se existe uma vitória, esta é a do chão, de onde<br />

surgirão e deitarão os seres humanos, pois durante milhões de anos, milhões de milhões de<br />

homens nasceram da terra e para ela voltaram, 409 observação do narrador em Manual de<br />

122<br />

406<br />

MACNAB, Gregory. A interface história-invenção em três romances de José Saramago. In: Revista de<br />

Letras. Curitiba: UFPR, n. 38, 1989, p. 136.<br />

407<br />

FARIA, Duarte. Recensão crítica a Levantado do chão, de José Saramago. In: Colóquio/Letras. Lisboa:<br />

Calouste Gulbenkian, n. 76, nov. 1983, p. 79.<br />

408<br />

SARAMAGO, José. Levantado do chão. 12 ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2005, p. 303.<br />

409<br />

SARAMAGO, José. Manual de pintura e caligrafia. São Paulo: Cia. das Letras, 1992, p. 199.

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