O que resta dos grandes sonhos de um paÃs pequeno - Fonoteca ...
O que resta dos grandes sonhos de um paÃs pequeno - Fonoteca ...
O que resta dos grandes sonhos de um paÃs pequeno - Fonoteca ...
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
an<strong>de</strong>s esperanças<br />
ofereceu-lhes histórias. Nesse cruzamento <strong>de</strong> imagens e <strong>de</strong><br />
<strong>que</strong> <strong>de</strong> gran<strong>de</strong>zas. Isto é Portugal. “De <strong>gran<strong>de</strong>s</strong> esperanças<br />
coisa <strong>de</strong> remediado”. Belíssimo. Alexandra Prado Coelho<br />
Mozos tem por<br />
hábito anotar<br />
n<strong>um</strong> ca<strong>de</strong>rno<br />
coisas <strong>de</strong>stas:<br />
lugares,<br />
notícias em<br />
revistas,<br />
referências<br />
textos. Em<br />
“Ruínas” quis<br />
cruzar isso;<br />
filmar os<br />
espaços<br />
vazios, mas<br />
dar-lhes<br />
vozes, fazê-los<br />
habitar por<br />
fantasmas<br />
foi-se tornando cada vez mais <strong>de</strong>purado<br />
até chegar ao essencial: espaços<br />
vazios e sons.<br />
O <strong>que</strong> vemos e o <strong>que</strong> ouvimos<br />
E o <strong>que</strong> faz a força <strong>de</strong> “Ruínas” é esse<br />
cruzamento, sempre ligeiramente<br />
<strong>de</strong>slocado, entre o <strong>que</strong> os nossos<br />
olhos vêem e a história <strong>que</strong> estamos<br />
a ouvir. No Restaurante Panorâmico<br />
<strong>de</strong> Monsanto, enquanto a câmara<br />
mostra <strong>um</strong>a escadaria, a janela panorâmica,<br />
os murais, <strong>um</strong>a voz lê <strong>um</strong>a<br />
ementa <strong>de</strong> <strong>um</strong> livro <strong>de</strong> receitas do<br />
século XVI – <strong>um</strong>a lista <strong>de</strong> iguarias <strong>que</strong>,<br />
para Mozos, “se conjugava com a<strong>que</strong>la<br />
mon<strong>um</strong>entalida<strong>de</strong>”.<br />
Às vezes, como no caso do sanatório<br />
das Penhas da Saú<strong>de</strong>, o <strong>que</strong> ouvimos<br />
– neste caso: relatórios médicos<br />
com to<strong>dos</strong> os pormenores sobre o<br />
estado <strong>de</strong> saú<strong>de</strong> <strong>dos</strong> doentes à entrada<br />
e à saída do internamento – tem a<br />
ver com a história do sítio. Outras vezes<br />
é apenas <strong>um</strong>a história <strong>que</strong> podia<br />
pertencer à<strong>que</strong>le lugar, e só por acaso<br />
não pertenceu – como a carta a<br />
perguntar quais os preços <strong>de</strong> <strong>um</strong> fim<strong>de</strong>-semana<br />
para <strong>um</strong> grupo <strong>de</strong> amigos<br />
n<strong>um</strong> hotel, lida sobre a imagem da<br />
Estalagem <strong>de</strong> São José, em Porto da<br />
Barca, junto ao mar, <strong>um</strong> sítio on<strong>de</strong><br />
Mozos chegou a ficar alojado antes <strong>de</strong><br />
o estabelecimento fechar e começar<br />
a resvalar para o es<strong>que</strong>cimento.<br />
“Na recolha <strong>de</strong> textos interessavame<br />
ir para coisas <strong>que</strong> não ficam como<br />
gran<strong>de</strong> literatura, procurava mais literatura<br />
<strong>de</strong> cor<strong>de</strong>l, epistolar, relatórios,<br />
ementas”. Ficaram três poemas.<br />
O resto são textos como o edital “Ao<br />
povo do Barreiro sobre o lançamento<br />
<strong>de</strong> <strong>um</strong>a bomba”, <strong>de</strong> 1934, ou <strong>um</strong>a carta<br />
com <strong>um</strong> pedido <strong>de</strong> empréstimo –<br />
“coisas <strong>um</strong> pouco fúteis, do dia-a-dia,<br />
<strong>que</strong> as pessoas guardam, mas <strong>que</strong><br />
nunca ficarão como nada <strong>de</strong> importante<br />
a não ser para <strong>que</strong>m faz e para<br />
<strong>que</strong>m recebe”.<br />
Os “makavenkos” [“Memórias e<br />
Receitas Culinárias <strong>dos</strong> Makavenkos”,<br />
<strong>de</strong> Francisco <strong>de</strong> Almeida Gran<strong>de</strong>lla,<br />
1919], por exemplo, aparecem mais<br />
do <strong>que</strong> <strong>um</strong>a vez, sem qual<strong>que</strong>r ligação<br />
aparente com o <strong>que</strong> estamos a ver.<br />
Mas este clube <strong>de</strong> “bon vivants”, formado<br />
para os prazeres da comida,<br />
fundado em 1884 por Gran<strong>de</strong>lla e alguns<br />
amigos, apareceu naturalmente<br />
no processo <strong>de</strong> pesquisa <strong>de</strong> Mozos.<br />
“Vi <strong>um</strong>a vez n<strong>um</strong>a revista <strong>um</strong>a notícia<br />
sobre a construção <strong>de</strong> <strong>um</strong> sanatório<br />
<strong>que</strong> nunca tinha sido terminado<br />
no Cabeço <strong>de</strong> Montachi<strong>que</strong>, e percebi<br />
<strong>que</strong> o Gran<strong>de</strong>lla, <strong>dos</strong> Armazéns<br />
Gran<strong>de</strong>lla, tinha feito parte das pessoas<br />
<strong>que</strong> se juntaram para esse projecto.”<br />
Mais tar<strong>de</strong>, <strong>de</strong>scobriu n<strong>um</strong>a livraria<br />
o livro <strong>de</strong> Gran<strong>de</strong>lla e interessouse<br />
primeiro pelo lado da gastronomia.<br />
Só <strong>de</strong>pois encontrou <strong>um</strong>a<br />
Ípsilon • Sexta-feira 2 Abril 2010 • 7