Caminhos <strong>da</strong> crítica <strong>de</strong> Augusto MeyerSem querer negar alguma reminiscência literária aci<strong>de</strong>ntal, tenhopara mim que Machado não tomou <strong>de</strong> empréstimo Natureza ou Pandorasenão a si mesmo, isto é, a esse profundo bucho <strong>de</strong> ruminante que todostrazemos na cabeça e on<strong>de</strong> to<strong>da</strong>s as sugestões, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> mistura<strong>da</strong>se tritura<strong>da</strong>s, preparam-se para nova mastigação, complicado quimismoem que já não é possível distinguir o organismo assimilador <strong>da</strong>s matériasassimila<strong>da</strong>s...Não é minha a imagem; lá está em Brás Cubas. (Ob. cit., p. 205)A atitu<strong>de</strong> crítica <strong>de</strong> Augusto Meyer, assimiladora e ao mesmotempo criativa, não se distancia do aspecto que surpreen<strong>de</strong> no autor<strong>de</strong> sua predileção.Complicado terreno. Po<strong>de</strong>-se mesmo estu<strong>da</strong>r a evolução do métodocrítico <strong>de</strong> Augusto Meyer ao longo <strong>de</strong> seus diferentes ensaiossobre a obra <strong>de</strong> Machado <strong>de</strong> Assis. Certa vez, aliás, perfilhou a excelência<strong>de</strong> Eça <strong>de</strong> Queirós e chegou a proclamá-la. Respon<strong>de</strong>ndoa um inquérito <strong>de</strong> José Condé, do Correio <strong>da</strong> Manhã, em 1948, sobre“os <strong>de</strong>z maiores romances”, incluiu Os Maias na lista: “Parece-meque Os Maias representam muito bem a contribuição <strong>da</strong> língua portuguesa,pois Machado não consegue integrar-se na família dos genuínosromancistas, falta-lhe humil<strong>da</strong><strong>de</strong>, ilusão <strong>de</strong> criador, paciência<strong>de</strong> acompanhar as personagens com aquele mínimo <strong>de</strong> simpatia,sem o qual tudo se reduz a um jogo subjetivo <strong>de</strong> análise psicológica,e a poesia <strong>da</strong> narrativa per<strong>de</strong> o fôlego, exausta.” (Ob. cit.,pp. 665-666)Mas estamos longe <strong>de</strong> um juízo perfeito e acabado. Em outra circunstância,Augusto Meyer reduz seu entusiasmo pela obra <strong>de</strong> Eça,acha-a, <strong>de</strong> certa forma, muito fecha<strong>da</strong> e previsível. Vê no autor <strong>de</strong> OsMaias um integrante <strong>da</strong> “família inquieta <strong>de</strong> Balzac, esse comilão <strong>de</strong>teses” (ob. cit., p. 226). Elogia-lhe a obra, mas não resiste a compará-la,agora <strong>de</strong>sfavoravelmente, à <strong>de</strong> Machado <strong>de</strong> Assis:71
Fábio LucasNão vejo <strong>de</strong> modo algum no honesto Eça apenas o tom dos ardores,exigências e perversões físicas; o que prevalece na sua obra é uma sensuali<strong>da</strong><strong>de</strong><strong>de</strong> artista que põe to<strong>da</strong>s as coisas em evidência ao claro sol <strong>da</strong> ver<strong>da</strong><strong>de</strong>.A sensuali<strong>da</strong><strong>de</strong> é a arte <strong>de</strong> cultivar o momento que passa, <strong>de</strong> ficar no presente,no imediato; a sensuali<strong>da</strong><strong>de</strong> é também questão <strong>de</strong> pele, quando muito,<strong>de</strong> mucosa – <strong>de</strong> qualquer modo, uma coisa superficial. Daí a sua falta <strong>de</strong>profundi<strong>da</strong><strong>de</strong> moral, a pobreza psicológica dos seus romances, a ausênciacompleta <strong>de</strong> penumbra sugestiva e <strong>da</strong>quele segundo texto sem letra <strong>de</strong> forma,feito <strong>de</strong> entrelinha e reticência, <strong>de</strong> brancos <strong>de</strong> página e cochicho interior,que é, por exemplo, o gran<strong>de</strong> recurso <strong>de</strong> Machado <strong>de</strong> Assis. (Ob. cit., p.227)E não contém sua crítica à veia cômica <strong>de</strong> Eça, arrematando: “... esentimos que se repetem um pouco os aba<strong>de</strong>s que arrotam com estrondo,os inumeráveis Acácios e Gouvarinhos, nem sempre <strong>de</strong>senhadoscom o escrúpulo <strong>da</strong> verossimilhança, virtu<strong>de</strong> que ele prezavatanto no escritor <strong>de</strong> ficção.” (Ob. cit., pp. 227-228)Também Machado recebe comentários restritivos <strong>de</strong> AugustoMeyer, que manifestou certa implicância com os motivos livres doromancista. Ao resenhar a edição <strong>de</strong> Quincas Borba, com as suas variantes,em trabalho crítico <strong>da</strong> Comissão Machado <strong>de</strong> Assis, observa,quanto à figura <strong>de</strong> Rubião, certo afastamento, na segun<strong>da</strong> versão,entre o narrador e a cena. E acrescenta:Mas o que mais importa é acentuar que em ambos os casos, texto <strong>de</strong>finitivoe variante, a ver<strong>da</strong><strong>de</strong>ira presença é menos a <strong>da</strong> personagem, ou <strong>da</strong> cenaviva, que a do autor. O emprego <strong>de</strong>stas mo<strong>da</strong>li<strong>da</strong><strong>de</strong>s verbais, presente dramáticoe imperfeito narrativo, associado ao uso oportuno do discurso indireto,ou discurso misto, como dizia Adolf Tobler, mais conhecido hoje em dia porestilo indireto livre, permitiria ao autor i<strong>de</strong>ntificar-se com a personagem, masna ver<strong>da</strong><strong>de</strong> essa i<strong>de</strong>ntificação ficou prejudica<strong>da</strong> pela intransigência com queMachado insiste em manter suas franquias <strong>de</strong> autor, interferindo diretamenteno entrecho. (Ob. cit., p. 347)72
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