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LOCKE-Segundo_tratado_Sobre_O_Governo

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| CLUBE DO LIVRO LIBERAL<br />

Resumo do Primeiro Tratado do <strong>Governo</strong> Civil<br />

Por Bernard Gilson<br />

DESMASCARADOS E DERRUBADOS OS FALSOS<br />

PRINCÍPIOS DE ONDE PARTEM SIR ROBERT FILMER E<br />

SEUS ADEPTOS<br />

CAPÍTULO I<br />

1. Para o homem, a escravidão é um estado tão vil, tão miserável e tão diretamente contrário ao<br />

temperamento generoso e à coragem de nossa nação, que é difícil imaginar como um inglês, e menos ainda um<br />

cavalheiro, poderia advogar em seu favor. Na verdade, como qualquer outro <strong>tratado</strong> que tentaria convencer os<br />

homens, sem exceção, de que eles são escravos e devem sê-lo, eu teria considerado o Patriarcha de Sir Robert<br />

Filmer uma nova exibição pretensiosa, comparável ao elogio de Nero, ao invés de um discurso sério, concebido<br />

como tal, se a gravidade do título e da introdução, a imagem apresentada no cabeçalho do livro e os aplausos que<br />

o têm acompanhado não me obrigassem a acreditar na sinceridade do autor e também do editor. Então o tomei<br />

nas mãos com todas as esperanças que atraem um <strong>tratado</strong> cuja aparição provocou tanto alarido, e o li de um só<br />

fôlego com toda a seriedade que lhe era devida; mas confesso que, neste livro que devia forjar as correntes de<br />

toda a humanidade, eu me surpreendi muito ao não encontrar senão uma corda de areia, útil, talvez, àqueles cuja<br />

arte e ofício consistem em levantar nuvens de poeira para cegar o povo e fazê-lo extraviar-se mais facilmente, mas<br />

frágil demais para arrastar na servidão aqueles que mantêm seus grandes olhos abertos e bastante bom senso<br />

para pensar que as correntes são pouco convenientes, ainda que se cuidasse de limá-las e poli-las.<br />

2. Se alguns pensam que eu exagero quando falo de forma tão livre de um homem que é o grande campeão<br />

do poder absoluto e ídolo daqueles que o adoram, eu lhes suplico, apenas uma vez, que não recusem esta pequena<br />

concessão a um indivíduo que, mesmo após ter lido o livro de Sir Robert e assim como a lei o autoriza, não pode se<br />

impedir de considerar a si mesmo um homem livre; pois eu sei que isso não é uma falta, a menos que se encontre<br />

alguém mais informado que eu sobre os rumos do destino e que tem alguma revelação da próxima notícia: há<br />

tanto tempo adormecido, desde que foi publicado este <strong>tratado</strong> consagrou-se a perseguir toda a liberdade pela<br />

força de seus argumentos e, de agora em diante, este modelo acanhado proposto por nosso autor servirá de<br />

Decálogo e de critério perfeito da política para todas as épocas futuras. Seu sistema tem pouco espaço. Reduz-se a<br />

isto: “Todo governo é uma monarquia absoluta”; e eis sobre o que ele se baseia: “Nenhum homem nasce livre”.<br />

3. Desde que surgiu no mundo uma geração pronta a lisonjear os príncipes formulando a opinião de que<br />

estes são investidos de um direito divino de exercer o poder absoluto, sem levar em conta leis destinadas a reger<br />

a instituição de seu cargo e o exercício de seu governo, ou condições para que eles iniciem suas funções, ou ainda<br />

o compromisso de respeitá-las, fosse este ratificado por juramentos ou promessas da maior solenidade, estas<br />

pessoas negaram à humanidade seu direito à liberdade natural: assim fazendo, não somente expuseram todos os<br />

indivíduos à pior miséria da tirania e da opressão, tanto quanto puderam, mas ainda os títulos dos príncipes<br />

tornaram-se duvidosos e seus tronos abalados (pois, segundo esta doutrina, todos os príncipes, com uma única<br />

exceção, também eles nascem escravos, e, em virtude de um direito divino, são herdeiros legítimos de Adão),<br />

como se eles quisessem entrar em uma guerra contra todo o governo e inverter as próprias bases da sociedade<br />

humana.<br />

4. Entretanto, seria preciso acreditar em sua palavra, quando eles nos dizem que todos nascemos<br />

escravos; e o mal não tem remédio, devemos assim permanecer. Para nós, a vida e a servidão tiveram início no<br />

mesmo momento; jamais nos libertaremos de uma sem nos separarmos da outra; todavia, eu ignoro onde, quer na

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