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LOCKE-Segundo_tratado_Sobre_O_Governo

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<strong>Segundo</strong> Tratado <strong>Sobre</strong> o <strong>Governo</strong> Civil 23<br />

Escritura, quer na razão isto esteja assegurado, apesar dos esforços destes indivíduos para nos convencer, que a<br />

autoridade divina nos tenha sujeitado à vontade ilimitada de um outro: admirável condição da humanidade, que<br />

não tivemos inteligência para descobrir até um período muito recente. Embora Sir Robert Filmer pareça condenar<br />

a opinião contrária, creio que ele terá dificuldade em encontrar outro século além do nosso, ou outro país, que<br />

houvesse afirmado o caráter divino da monarquia. Ele reconhece que “Heyward, Blackwood, Barclay e outros<br />

que quase sobre todos os pontos lutaram com coragem em defesa ao direito dos reis” jamais pensaram nisso e<br />

“em comum acordo admitiram a liberdade e a igualdade naturais dos homens”.<br />

5. Ao primeiro que se constituiu o iniciador desta doutrina e a expandiu entre nós, com os tristes efeitos<br />

que ela arrasta consigo, deixo aos historiadores o encargo de mencioná-lo, ou à memória dos contemporâneos de<br />

Sibthorp e Manwering a tarefa de recordá-lo; aqui eu me contentarei em examinar o que disse a este respeito Sir<br />

Robert Filmer, autor conhecido por ter conduzido este argumento aos seus limites mais extremos e que consta<br />

ter-lhe proporcionado sua forma perfeita; eis de que mestre todos aqueles que querem se comportar à moda de<br />

um francês na corte aprenderam este sistema político estreito, e para se garantir o levavam no bolso: a saber, “os<br />

homens não nascem livres; está então excluído que jamais tenham tido a liberdade de escolher governantes ou<br />

formas de governo; o poder dos príncipes é absoluto e de direito divino, pois jamais escravos puderam reivindicar<br />

um contrato ou um consentimento; Adão era monarca absoluto e, da mesma forma, todos os príncipes desde<br />

então”.<br />

CAPÍTULO II<br />

DO PODER PATERNO E REAL<br />

6. A grande tese de Sir Robert Filmer é que “os homens não são naturalmente livres”; eis sobre que base<br />

sua monarquia absoluta repousa e se eleva tão alto que seu poder prevalece sobre qualquer outro, caput inter<br />

nubila; tão acima de todas as coisas terrestres e humanas, que o pensamento pode apenas tocá-lo, que as<br />

promessas e os juramentos que a divindade obriga não são suficientes para estorvá-lo. Entretanto, se este<br />

fundamento enfraquece, todo o edifício desmorona com ele e é preciso deixar os governos reencontrarem seu<br />

antigo modo de constituição por meio de procedimentos voluntários e do consentimento dos homens que se<br />

utilizam de sua razão para se unirem em sociedade. Na p. 12 ele quer provar esta tese principal, dizendo: “Os<br />

homens nascem dependentes de seus pais”, e, por conseguinte, não podem ser livres. Esta autoridade dos pais ele<br />

chama de “autoridade real”, p. 12, 14, “autoridade paterna, direito de paternidade”, p. 12, 20. Seria possível<br />

acreditar que, ao iniciar uma obra desse gênero, destinada a servir de único apoio à autoridade dos príncipes e à<br />

obediência dos súditos, ele nos teria indicado explicitamente o que é esta autoridade paterna; que ele a teria<br />

definido, senão limitado, visto que em outros <strong>tratado</strong>s oriundos de sua pena ele a apresenta a nós como ilimitada<br />

e não suscetível a limitação; deveria nos ter fornecido pelo menos muitas informações a seu respeito para que<br />

pudéssemos ter uma idéia completa desta “paternidade” ou “autoridade paterna” quando a encontramos em seus<br />

escritos. Esta eu esperava encontrar no primeiro capítulo de seu Patriarcha. Mas em vez disso, de passagem: 1. ele<br />

começa assegurando a obediência dos arcana imperii, p. 5; 2. ele apresenta seus cumprimentos “aos direitos e<br />

liberdades de nossa nação ou de qualquer outra”, p. 6, o que logo em seguida vai tratar de anular e destruir; e 3.<br />

após uma saudação a estes homens eruditos que não cumpriram sua missão com tanta penetração quanto ele, p.<br />

7, ele se lança sobre Belarmino, p. 8, e, graças à vitória que obtém, estabelece sua “autoridade paterna” sem<br />

qualquer contestação; Belarmino se vê derrotado por sua própria confissão, p. 11; a batalha está seguramente<br />

ganha, não se necessita mais de tropas; pois, feito isso, eu não o vejo mais colocar a questão ou reunir argumentos<br />

para justificar sua opinião; antes de mais nada ele nos conta a sua maneira a história desta espécie estranha de<br />

fantasma chamado “paternidade” que só bastaria a qualquer um agarrar para obter imediatamente o império e<br />

um poder absoluto ilimitado. Agora ele nos garante que esta “Paternidade” teve início na pessoa de Adão,<br />

prosseguiu seu curso, manteve a ordem no mundo durante toda a era dos Patriarcas até o dilúvio, saiu da arca<br />

com Noé e seus filhos, estabeleceu e sustentou todos os reis da terra até o cativeiro dos israelitas no Egito e então

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