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Revista Dr Plinio 014

Maio de 1999

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GESTA MARIAL DE UM VARÃO CATÓLICO<br />

Intervenção inopinada<br />

do benjamin<br />

Tio Américo, o “financiador” da<br />

candidatura de <strong>Dr</strong>. <strong>Plinio</strong><br />

Coloquei-me no último lugar da<br />

mesa, bem em frente ao líder. Assim,<br />

estando vis-à-vis do chefe, se<br />

houvesse qualquer problema, eu me<br />

destacava muito, podendo impor o<br />

ponto de vista da LEC com maior<br />

facilidade. Ele disse:<br />

— Bem, convoquei os<br />

senhores porque temos de<br />

apresentar um programa<br />

para os nossos eleitores. E<br />

o programa é o que eu vou<br />

ler aqui, para ver se os senhores<br />

aprovam ou não.<br />

Primeiro ponto: Separação<br />

da Igreja e do Estado. Segundo<br />

ponto: isto, aquilo...<br />

Eram coisas de política,<br />

que não vêm ao caso.<br />

Constavam as reivindicações<br />

da LEC, que quebravam<br />

o laicismo do Brasil,<br />

entre as quais: proibição<br />

do divórcio, ensino religioso<br />

nas escolas, capelanias<br />

nos hospitais e nas<br />

prisões do Estado e nas<br />

Forças Armadas.<br />

Terminada a leitura, diz<br />

o Alcântara Machado:<br />

— Os senhores querem<br />

fazer alguma objeção?<br />

— Eu quero, <strong>Dr</strong>. Alcântara.<br />

Quase todos os olhares se volveram<br />

para mim.<br />

— Eu tenho um ponto em desacordo<br />

quanto ao primeiro tópico:<br />

separação da Igreja e do Estado.<br />

Não é desejo do Episcopado restaurar<br />

a união da Igreja com o Estado,<br />

mas nós não podemos afirmar que<br />

seja um regime bom. É um mal menor.<br />

Um homem de barba grisalha era<br />

dos poucos que não se haviam voltado<br />

quando eu pedira a palavra.<br />

Mas ao ouvir-me agora, afastou com<br />

estardalhaço a cadeira e fechou a<br />

carranca, como a querer dizer: “Eu<br />

estava vendo que admitir esses carolas<br />

aqui ia dar em encrenca no<br />

primeiro momento!” Eu sabia perfeitamente<br />

quem era ele, pois o encontrara<br />

diversas vezes na casa de<br />

meu tio, o antigo Secretário da<br />

Agricultura.<br />

— Não é que eu pretenda que a<br />

Chapa Única por São Paulo Unido<br />

deva restaurar a Idade Média... (Hipótese<br />

cujo simples enunciado já os<br />

deixou espantados!) Mas declarar<br />

que a separação da Igreja do Estado<br />

é um bem, isto eu, enquanto representante<br />

da LEC, não posso subscrever.<br />

Prefiro renunciar ao meu lugar<br />

na Chapa Única... — concluí.<br />

Enquanto eu falava, o Alcântara<br />

Machado, com um lápis e um papel<br />

na mão, me olhava reflexivo. Logo<br />

interveio em tom conciliador:<br />

— Bom, vamos dar um jeito nisso.<br />

Havia um suspense na sala, pois<br />

parecia que ia estalar a Chapa Única,<br />

perdendo os políticos o apoio<br />

tão cobiçado do eleitorado católico.<br />

— Façamos uma redação que<br />

contente todo mundo — continuou<br />

ele. — Em vez de simplesmente<br />

“separação da Igreja do Estado”, fica<br />

escrito assim: “Mantida a separação<br />

da Igreja do Estado...”. Isso<br />

quererá dizer que a separação vai<br />

ser mantida, mas pode também querer<br />

dizer: “Uma vez que seja mantida...”<br />

Poderá ser interpretada como<br />

tendo um caráter condicional. <strong>Dr</strong>.<br />

<strong>Plinio</strong> então fica satisfeito, e <strong>Dr</strong>. Fulano<br />

também.<br />

— Aí está bem, eu concordo.<br />

Foi o suficiente para se refazer o<br />

ambiente de distensão, que durou<br />

até o término da reunião.<br />

Um velho tio vem<br />

em socorro do sobrinho<br />

idealista<br />

Daí a dias, novo telefonema convocando<br />

para outra reunião da Chapa<br />

Única. Compareci. O Prof. Alcântara<br />

Machado diz: “Nós devemos<br />

cuidar agora das despesas da<br />

eleição. Precisamos ter um secretariado<br />

central, e será necessário que<br />

os candidatos paguem cada qual um<br />

tanto, para fazer face às despesas”.<br />

Saí da reunião sem saber de onde<br />

tirar o dinheiro. Meu bolso estava<br />

ultra-avariado e meu pai tivera um<br />

prejuízo nos negócios enorme, ficando<br />

muito endividado. Na hora<br />

do jantar, em casa, com a mesa presidida<br />

por minha avó, Dª Gabriela,<br />

e estando presentes alguns tios e<br />

primos, eu contei:<br />

— Há tal dificuldade assim, e eu<br />

não sei verdadeiramente como conseguir<br />

esse dinheiro.<br />

Silêncio geral. Eu tivera a esperança<br />

de que alguém propusesse um<br />

rateio. Encontrava-se ali também<br />

um irmão de minha avó, já bem velho,<br />

solteiro e ateu declarado. Ao<br />

notar que ninguém se adiantava, ele<br />

disse:<br />

— Está bom, <strong>Plinio</strong>, se ninguém<br />

quer contribuir, eu pago tudo! Você<br />

me procura depois do jantar para<br />

acertarmos.<br />

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