13.07.2017 Views

edição de 5 de junho de 2017

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

STORYTELLER<br />

Bliznetsov/iStock<br />

Velho Briza<br />

Candidato ao governo do Rio <strong>de</strong><br />

Janeiro, que começara a campanha<br />

com 2% <strong>de</strong> intenção <strong>de</strong> voto<br />

LuLa Vieira<br />

Uma vez minha agência foi contratada<br />

pelo PSDB para fazer a campanha <strong>de</strong><br />

seu candidato ao governo do Rio <strong>de</strong> Janeiro,<br />

Ronaldo Cezar Coelho, um empresário<br />

respeitado, rabeira nas pesquisas <strong>de</strong> intenção<br />

<strong>de</strong> voto, mas com um belo potencial<br />

<strong>de</strong> crescimento graças a uma folha corrida<br />

com muitos méritos e um discurso bastante<br />

coerente, além <strong>de</strong> ser uma pessoa simpática.<br />

Na chapa, como senador, meu querido<br />

irmão Técio Lins e Silva, paladino na <strong>de</strong>fesa<br />

dos perseguidos pela ditadura, advogado<br />

brilhante e figura das mais carismáticas. O<br />

vice era o professor Carlos Lessa, ex-presi<strong>de</strong>nte<br />

do BNDES, economista genial e um<br />

dos cariocas mais apaixonados pela sua cida<strong>de</strong>.<br />

Fui o último a ser convidado, numa<br />

equipe que tinha Milton Coelho da Graça,<br />

Bob Feith, que estava voltando <strong>de</strong> Nova<br />

York, on<strong>de</strong> era correspon<strong>de</strong>nte da Globo, e<br />

outros cobrões do mesmo porte.<br />

Junto com eles, vieram alguns dos melhores<br />

profissionais <strong>de</strong> televisão daquela<br />

época, nomes até hoje consagrados, ainda<br />

em plena ativida<strong>de</strong>. Uma equipe <strong>de</strong> sonhos,<br />

num ambiente <strong>de</strong> trabalho <strong>de</strong>licioso. Alugamos<br />

uma casa enorme na Lagoa Rodrigo<br />

<strong>de</strong> Freitas e montamos um estúdio da<br />

maior qualida<strong>de</strong>, capaz <strong>de</strong> produzir os mais<br />

emocionantes programas <strong>de</strong> televisão que<br />

o talento po<strong>de</strong> criar. Estou exagerando? Um<br />

pouco. Mas só um pouco, posso garantir.<br />

Do outro lado, o concorrente, Brizola,<br />

não tinha nada disso, a não ser o carisma<br />

natural do velho engenheiro e a sua charla<br />

<strong>de</strong> estancieiro dos pampas, capaz <strong>de</strong> manter<br />

uma conversação por horas, falando <strong>de</strong><br />

um mundo <strong>de</strong> heróis valentes, frases <strong>de</strong><br />

efeito e imagens poéticas, algumas carentes<br />

<strong>de</strong> sentido. No horário gratuito tínhamos<br />

o mesmo tempo, uns <strong>de</strong>z minutos cada<br />

candidato.<br />

Nós fazíamos programas que tinham cuidado<br />

<strong>de</strong> produção padrão Globo, baseados<br />

nas mais apuradas pesquisas, com textos<br />

que mereciam exames cuidadosos, utilizando<br />

as mais mo<strong>de</strong>rnas técnicas <strong>de</strong> persuasão.<br />

Sabem estas coisas todas que o pessoal<br />

que trabalha com internet fica dizendo<br />

que elegeu o Obama? Pois é, a gente já fazia<br />

mais ou menos isso <strong>de</strong>s<strong>de</strong> aquela época. Do<br />

outro lado, Brizola vestido com uma camisa<br />

azul tendo ao fundo uma pare<strong>de</strong> também<br />

azul, sem roteiro nem nada, falava o que<br />

lhe dava na telha. Um papo meio <strong>de</strong>sgarrado,<br />

i<strong>de</strong>ia puxando outra, câmera fixa, e<br />

cada vez mais ele subia nas pesquisas. Uma<br />

verda<strong>de</strong> era indiscutível: nossa tecnologia<br />

e nossa arrogância <strong>de</strong> especialistas estavam<br />

per<strong>de</strong>ndo para uma cara que não apresentava<br />

planos <strong>de</strong> governo e dizia coisas que<br />

não tinham significado concreto. Por exemplo.<br />

Todo programa ele se referia a certas<br />

“perdas internacionais” que o Brasil estava<br />

tendo. Nunca explicou o que queria dizer<br />

nem o que isso tem a ver com o estado do<br />

Rio <strong>de</strong> Janeiro. Mas parecia um risco grave.<br />

Resumo: Brizola, um gaúcho, candidato<br />

ao governo do Rio, que começara a campanha<br />

com 2% <strong>de</strong> intenção <strong>de</strong> voto, sem<br />

recursos materiais, com um discurso meio<br />

atabalhoado, subia diariamente nas pesquisas.<br />

E nós empacados. Até que um dia resolvemos<br />

apelar. Entrar na briga direto, na<br />

tentativa <strong>de</strong> polarizar a disputa. E fizemos<br />

um programa da maior profundida<strong>de</strong>, apresentando<br />

nosso plano <strong>de</strong> governo e dando<br />

algumas cutucadas no Brizola, que não<br />

apresentava plano algum. E ficamos esperando<br />

a resposta.<br />

Brizola simplesmente ignorou. O máximo<br />

que fez foi se dizer vítima <strong>de</strong> uma “orquestra<br />

perversa”. E, para nosso candidato,<br />

reservou uma pérola. A certa altura, falando<br />

<strong>de</strong> seus adversários referiu-se a ele como<br />

“um tal <strong>de</strong> Ronaldinho”, com sotaque bem<br />

gaúcho. Per<strong>de</strong>mos. Tirando os CIEPs, Brizola<br />

fez um governo controverso. Um acordo<br />

com Collor trouxe dinheiro para algumas<br />

obras viárias importantes. Já que estava<br />

com a mão na massa, dizem que fez acordos<br />

outros, inclusive na área da segurança.<br />

Mas, apesar <strong>de</strong> cercado <strong>de</strong> uma troupe para<br />

lá <strong>de</strong> suspeita, não enriqueceu. Nem queria,<br />

seu negócio era outro.<br />

Lula Vieira é publicitário, diretor da<br />

Mesa Consultoria <strong>de</strong> Comunicação,<br />

radialista, escritor, editor e professor<br />

lulavieira@grupomesa.com.br<br />

36 5 <strong>de</strong> <strong>junho</strong> <strong>de</strong> <strong>2017</strong> - jornal propmark

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!