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Previz2 - 16.07 VRamalho5

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Talvez seja a única maneira de se ser um<br />

grande português. De facto, talvez seja<br />

a única maneira de se ser um grande angolano.<br />

Ser como o Vítor Ramalho. Conjuga<br />

na sua personalidade cordial todos<br />

os elementos de generosa abertura e coragem<br />

física que se herdam das vivências<br />

africanas. Num percurso que é marcado<br />

por um empenhado envolvimento<br />

na vida publica têm sido constantes as<br />

ocasiões em que essa cordialidade e<br />

arrojo conseguiram resultados práticos<br />

bem visíveis.<br />

Como jornalista da RTP fiz a cobertura<br />

do I Congresso de Quadros Angolanos<br />

no Exterior. Foi uma iniciava que o Vítor<br />

Ramalho imaginou quando o conflito em<br />

Angola, parecia irremediavelmente cristalizado numa guerra sem quartel em que as superpotências iam medindo<br />

forças à custa do povo angolano. Vítor Ramalho, usando sem receios os poderosos meios diplomáticos que lhe<br />

conferia ser um dos mais próximos conselheiros do Presidente Mário Soares, organizou sob o engenhoso titulo<br />

de um “Encontro” no “Exterior” o mais amplo e consequente debate sobre o que estava a acontecer no “Interior”<br />

de Angola. O Congresso dos Quadros Angolanos em Abril de 1990 foi, provavelmente, o mais decisivo acontecimento<br />

na preparação do terreno para a paz entre o MPLA e a UNITA.<br />

Nessa altura o cenário nos campos de batalha era caótico e inconclusivo. Progressos e regressos dos combatentes<br />

no terreno mediam-se pelo poder do armamento que Moscovo e Washington canalizavam para a UNITA<br />

e MPLA via Cuba e África do Sul. As forças governamentais ostentavam poderosas máquinas de guerra soviéticas<br />

mobilizando em batalhas cada vez mais de guerra clássica tanques T 62 de modelo idêntico aos que<br />

guarneciam na altura as fronteiras do Pacto de Varsóvia. Angola era um campo de testes de armamento letal<br />

com soviéticos e americanos num constante braço de ferro. Washington ia equipando Savimbi com armamento<br />

cada vez mais sofisticado. Os misseis anti-aéreos Stinger passaram a ser usados com regularidades abatendo<br />

cargueiros Antonov e o ocasional MIG 23 enquanto a Norte do Cuíto Cadaval artilheiros sulafricanos iam explorando<br />

os alcances das suas mais recentes peças de artilharia pesada de campanha as G5 que chegaram a<br />

enviar obuses a cinquenta quilómetros de distancia para dentro das fronteiras angolanas. A Angola ocupada por<br />

Russos, cubanos e sul-africanos era um mundo distópico e perigoso onde se matava e morria com facilidade e<br />

sem saber ao certo porquê.<br />

Poucos tiveram a imaginação e o empenho para vislumbrar uma possibilidade de poder haver um dialogo<br />

de paz naquele inferno. MPLA e UNITA não se falavam nessa altura. Desde as matanças mútuas em Luanda<br />

no pós independência na década de 70 que o Norte e o sul de Angola se tinham dividido. Angolanos dos dois<br />

lados reivindicavam legitimidades que a história viria a provar que só poderiam ser afirmadas em conjunto. Vítor<br />

Ramalho entendeu isso e com o esprito de iniciativa que lhe é característico actuou empenhando-se a fundo na<br />

busca de pontes de entendimento entre as duas partes. É da mais elementar justiça reconhecer que muito do<br />

que correu bem no processo de pacificação de Angola se deve à diplomacia de envolvimento empenhado desenvolvida<br />

por Vítor Ramalho. Seria lúcido procurar o seu conselho e aplicar num terreno diplomático que ainda<br />

é movediço os seus conhecimentos, que têm pouco paralelo em Portugal e na Europa.<br />

Já como Presidente da União das Cidades Capitais de Língua Portuguesa, Vítor Ramalho organizou em Lisboa<br />

um monumental encontro de dirigentes africanos dos países africanos de língua portuguesa que tinham como<br />

elemento comum a passagem pela Casa dos Estudantes do Império onde, na verdade, nos anos 50 e 60 nas<br />

universidades de uma capital imperial a viver na ditadura nasceram as energias intelectuais que levariam à<br />

descolonização.<br />

Depois há o Vítor Ramalho amigo e camarada. Nada exemplifica melhor a sua coragem como a maneira enérgica<br />

com que se interpôs entre manifestantes da CGTP e Vital Moreira. 2009 foi um ano quente para o Partido<br />

Comunista Português com as deserções de militantes distintos, entre os quais, o mais destacado era seguramente<br />

o constitutionalista de Coimbra. Não fora a ação de Vítor Ramalho que fisicamente desencorajou os mais<br />

aguerridos sindicalistas comunistas, o incidente não se teria ficado pela boçalidade dos insultos de um bando<br />

ululante dirigidos a Vital Moreira. Mas ficou. Vendo as imagens do incidente do Primeiro de Maio de 2009 entende-se<br />

porquê. O meu amigo, Vítor Ramalho é um Homem mesmo muito grande.<br />

Mário Crespo<br />

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