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Revista VOi 157

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HISTÓRIAS<br />

Passando por aqui<br />

T<br />

enho uma hora antes de começar meu trabalho.<br />

Estou sentada em frente ao computador,<br />

escrevendo estas palavras num caderno<br />

que carrego para cima e para baixo.<br />

Esquento-me com uma xícara de café, só é<br />

a segunda do dia. Não posso demorar, porque já sei que<br />

minhas mãos não conseguem acompanhar meus pensamentos,<br />

ainda mais quando uma ideia surge.<br />

Decidi que essa crônica será sobre Curitiba, ou melhor,<br />

sobre Curitiba que alguém dos anos 60 ou 70 viveu<br />

e só posso ter um vislumbre da época, das pessoas, da<br />

cidade por meio de relatos. Assim, consigo formar uma<br />

nítida imagem de como era essa cidade de que tanto<br />

ouço falar e que não consigo reconhecer pelas ruas que<br />

passo. Fico a imaginar.<br />

A moça está no sofá da sala de visita, conversando<br />

ao telefone, ou melhor, sussurrando. Ela sabe que não<br />

pode ficar muito tempo – telefone era artigo de luxo<br />

naquela época. Então, marca logo o programa de sábado<br />

com a amiga. Já pediu permissão aos pais, eles já fizeram<br />

todo o interrogatório: aonde vai? Com quem? Que horas?<br />

E determinaram o horário de volta, como sempre às 22h.<br />

O cinema fica na Rua XV de Novembro ou perto de<br />

lá – não tenho certeza, a história não é minha – o grupo<br />

de amigos se encontram na frente da bilheteria. A moça<br />

olha com timidez e o rapaz devolve o olhar na mesma<br />

moeda, talvez mais tímido, e um sorriso no canto da<br />

boca. Enquanto todos entram para tentar pegar o melhor<br />

lugar, os dois, moça e rapaz, se encontram na hora de<br />

comprar pipoca e refrigerante. O tempo não passa, são<br />

os cinco minutos mais longos de suas vidas. O silêncio<br />

predomina e, mesmo assim, ela deseja para sempre esse<br />

momento e anseia que o sentimento seja recíproco.<br />

Depois do cinema, o grupo de amigos decide passar<br />

na Confeitaria das Famílias, que fica na XV de Novembro<br />

– essa tenho certeza, porque ainda existe e conheço<br />

bem. Risadas, comentários sobre o filme e muitos olhares<br />

entre moça e rapaz, embalam a noite. A moça fica<br />

atenta no relógio e 22h em ponto, está em casa como<br />

combinado com os pais. Já fez o relatório do passeio<br />

para os pais e já está na cama. Mesmo exausta, o sono<br />

não chega, porque as lembranças da noite não a deixam<br />

em paz e tudo o que ela quer é que o próximo sábado<br />

chegue logo. Haverá baile no clube, ela vai com os<br />

pais – moça direita deve estar em família nesses eventos<br />

– e se tudo der certo, o rapaz vai pedir permissão para<br />

dançar com ela.<br />

Como se diria hoje: esse foi um dos rolês – gíria paulistana<br />

dos anos 80, muito usada pelos jovens de hoje<br />

– de uma jovem dos anos 60 ou 70, não sei ao certo. Foi<br />

um momento de um tempo que não volta mais, de uma<br />

Curitiba que já não existe, pois essa se modificou, assim<br />

como as pessoas e seus rolês.<br />

Foto: divulgação<br />

Por Patricia Munhoz<br />

82<br />

outubro 2018<br />

revistavoi.com.br

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