EMPREENDA REVISTA - Ed. 24 - Maio 2019
Edição Especial de aniversário da Empreenda Revista. Revista de negócios focada em conteúdo empreendedor
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18<br />
GESTÃO E NEGÓCIOS<br />
EMPREENDEDORISMO:<br />
DA FICÇÃO À DURA REALIDADE<br />
Era uma vez um garoto que, apesar de nunca ter trabalhado,<br />
tinha ideias geniais e uma vontade muito grande<br />
de colocá-las em prática. Jones não imaginava que,<br />
para abrir seu próprio negócio, ele precisaria viver uma<br />
aventura cheia de desafios e lutar contra um impiedoso<br />
vilão: o Governo. Como todo principiante, ele compartilha<br />
sua ideia com amigos e familiares e é estimulado a<br />
dar vida a esse projeto. Essa ideia parece uma “doença<br />
contagiosa” e toma conta do garoto. Ele não fala em outra<br />
coisa, não pensa em outra coisa. Só tem olhos para<br />
seu projeto e não para de imaginar em como será feliz<br />
quando ele se tornar realidade. Até mesmo a namorada<br />
não aguenta mais ouvi-lo falar sobre a tal aventura e de<br />
suas expectativas.<br />
Em meio a todo entusiasmo e preparativos, surge o primeiro<br />
desafio: criar um bom nome. Uma tarefa difícil,<br />
principalmente quando o negócio precisa ter presença<br />
na internet – todo nome bacana que ele pensa em<br />
criar já existe e, quando não existe, alguém já registrou.<br />
Nome escolhido, agora é preciso um logotipo. Será mesmo?<br />
Ainda não tem pesquisa de mercado, não estudou<br />
o consumidor, a concorrência e nem a viabilidade do<br />
negócio. Mesmo assim, ele vai em frente com seu projeto.<br />
“É uma ideia inovadora, não tem como dar errado”,<br />
pensa Jones.<br />
Pois é assim mesmo que a maioria começa um negócio!<br />
Apenas no sentimento, na raça, na esperança de<br />
que tudo vai dar certo. E é aí que a verdadeira aventura<br />
começa! O empreendedor vai entrar em uma floresta<br />
escura e sem fim, mas com promessa de um pote de<br />
ouro no final. Até então, é dia e os passarinhos cantam.<br />
O logotipo ficou lindo, o texto de missão, visão e valores<br />
é mágico – como manda o figurino – e o plano de<br />
negócios de quatro páginas está pronto. O sentimento<br />
de confiança continua: tem algo falando que esta é<br />
a oportunidade da sua vida, um oceano azul. Mas, de<br />
repente, começa a anoitecer. Pediram um tal de ‘fiador’<br />
para o aluguel de uma sala, além de um comprovante<br />
de renda. Mas que renda? Ainda não tem um negócio,<br />
muito menos renda! E o preço do aluguel abocanhou a<br />
poupança de Jones. Se ele não começar a vender logo,<br />
além de escurecer, vai começar uma terrível chuva. O<br />
jovem empreendedor começa a ficar assuntado, afinal,<br />
a linda e encantadora floresta começa a revelar um lado<br />
obscuro, frio e burocrático.<br />
Após a noite mal dormida, em que as primeiras preocupações<br />
virem à tona, amanhece um lindo dia de sol.<br />
Chegou a hora de comprar os móveis e equipamentos<br />
para mobiliar a loja. Este é um momento mágico, seria<br />
quase “o grande final de um filme”, no qual Jones beija<br />
a mocinha. Mas é aí que o tiro sai pela culatra e deixa<br />
nosso herói desacordado por dias, quase em coma. Ele<br />
gasta mais do que deve. Compra decoração, uma mesa<br />
mais bonita, um computador mais potente, um quadro<br />
para parede onde tinha um horizonte azul pintado…<br />
Depois do baque, levanta atordoado e se dá conta de<br />
que as compras estão parceladas no cartão e a data de<br />
vencimento da fatura ainda está longe. Os móveis chegam,<br />
a internet é instalada, que dia mágico! Fica arrumando<br />
sua casa na floresta até altas horas e, depois,<br />
reúne os amigos em volta da fogueira para comemorar!<br />
“Amanhã tudo começa e minha vida vai mudar! Fiz o<br />
que precisava fazer”, pensa o empreendedor Jones.<br />
Na manhã seguinte, nosso aventureiro acorda animado<br />
e vai à luta. Mas logo cedo descobre que precisaria<br />
ter um eterno aliado: o contador (embora ele só traga<br />
péssimas notícias). Lá se foi mais dinheiro para um tal<br />
contrato social e para os primeiros impostos. Como se<br />
trata de um negócio novo e pequeno, Jones contrata<br />
dois funcionários. Em seguida, recebe da contabilidade<br />
mais impostos para pagar. As contas se acumulam antes<br />
mesmo de realizar sua primeira venda. Já ansioso<br />
com a situação, Jones senta-se em sua mesa e pensa<br />
que ainda não chegaram as contas de água, luz, IPTU e<br />
por aí vai.<br />
Quando registra sua primeira grande venda, felicidade<br />
total? Não! Percebe que deve pagar mais impostos, emitir<br />
uma nota fiscal pelo que vendeu. Isso, sem contar<br />
o valor que já havia pago por todos os produtos que<br />
estavam em sua loja. A chuva nesse momento é acompanhada<br />
de raios e trovões e está quase ininterrupta. Já<br />
desesperado, o empreendedor Jones lamenta: “Eu não<br />
tinha pensado em todos esses valores quando coloquei<br />
preço no meu produto. Como vai ser agora? Meu lucro,<br />
onde vai ficar? Como repassar esses valores para os<br />
meus clientes? Mas vou assim mesmo! Já cheguei até<br />
aqui, vamos em frente!”.<br />
Deste dia em diante, raramente fez sol na floresta.<br />
Infelizmente esse “conto” é mais comum do que se imagina.<br />
Empreender no Brasil transforma os empreendedores<br />
em aventureiros.<br />
Mas de uma coisa eu tenho a certeza:<br />
todos são heróis! E os que<br />
permanecem no mercado são,<br />
ainda, mais, pois enfrentam os<br />
desafios e os monstros da floresta<br />
diariamente, sem exceção.<br />
Fred Rocha<br />
Especialista em varejo