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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense

As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense Coleção Documentos, volume 16 Autor: Reto Monico

As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense
Coleção Documentos, volume 16
Autor: Reto Monico

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As incursões monárquicas lusas

na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912)


Ficha Técnica

Título: As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense: A

Federação (1911-1912)

Autor: Reto Monico

Coleção: Documentos, 16

Paginação: Luís da Cunha Pinheiro

Imagem da contracapa extraída do Almanaque ilustrado do Jornal O Zé para

1914, p. 184

Centro de Literaturas e Culturas Lusófonas e Europeias, Faculdade de Letras

da Universidade de Lisboa

Instituto Europeu de Ciências da Cultura Padre Manuel Antunes

Biblioteca Rio-Grandense

Lisboa / Rio Grande, 2020

Esta publicação foi financiada por Fundos Nacionais através da FCT – Fundação

para a Ciência e a Tecnologia, I.P. no âmbito do Projecto

«UIDB/00077/2020»

Reto Monico é Doutor em História pela Universidade de Genebra, com a sua

tese Suisse — Portugal: regards croisés (1890-1930), publicada em 2005. É

autor de diversos artigos em edições acadêmico-científicas nos quais analisa

as imagens dadas pela imprensa internacional e pela diplomacia suíça sobre

aspectos e acontecimentos da História contemporânea de Portugal e do Brasil.


Reto Monico

As incursões monárquicas lusas na

imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912)

– 16 –

CLEPUL / Biblioteca Rio-Grandense

Lisboa / Rio Grande

2020



Índice

Apresentação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7

As conspirações monárquicas em Portugal (1911-1912) . . . . 9

A FEDERAÇÃO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 32

O Journal de Genève e as conspirações monárquicas em Portugal

(1911-1912) . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 131

Résumé en français . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 157

Ilustrações a cores . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 161

5



APRESENTAÇÃO

Este livro acerca das conspirações monárquicas em Portugal constitui

um significativo estudo para a construção historiográfica acerca da

formação lusitana. A interpretação histórica acerca do tema ainda é

representativa no contexto português, pois ainda há vários enfoques a

serem analisados e, fundamental, na conjuntura brasileira, na qual o

assunto é praticamente desconhecido. Bem de acordo com as metas

da Coleção Documentos esta pesquisa traz o primeiro e básico passo

do trabalho historiográfico, o levantamento documental.

A introdução serve para uma contextualização do tema em pauta,

estabelecendo o cenário dos acontecimentos, alocando os protagonistas

e desenvolvendo o enredo, permitindo ao leitor um conhecimento a

respeito dos fatores que desencadearam as conspirações monárquicas.

Há também um breve estudo de caso sobre as repercussões de tais

fatos lusos junto ao Journal de Genève, envolvendo também a transcrição

documental. O fulcro desta obra é o levantamento documental

acerca dos reflexos das conspirações monárquicas portuguesas em um

dos mais importantes jornais sul-brasileiros da virada do século XIX

ao XX, A Federação. Um resumo em francês completa esta obra a fim

de ampliar o horizonte linguístico desta coleção.

Publicada em Porto Alegre, a capital da província (depois estado)

do Rio Grande do Sul, porção mais meridional do território brasileiro,

A Federação circulou entre 1884 e 1937. Tal periódico serviu para a divulgação

da propaganda antimonárquica no âmbito sul-rio-grandense

e, com a mudança na forma de governo, em 1889, acompanhou a progressão

dos republicanos no poder, até a afirmação definitiva do grupo

liderado por Júlio de Castilhos que, junto de seu sucesso Borges de

Medeiros, dominou a vida política gaúcha até os anos 1930. A Federação

transformou-se em órgão do partido republicano rio-grandense e


8 Reto Monico

sustentou ferrenhos debates discursivos com os oposicionistas, atuando

diretamente no propagandear das ideias castilhistas e na sustentação

do regime autoritário proposto a partir delas.

Reto Monico é um pesquisador exemplar e constitui a figura clássica

do historiador em suas inter-relações com as fontes históricas. É

incansável na garimpagem de documentos e um expert nas pesquisas

que se utilizam da imprensa periódica. Nesse sentido, entre outros, já

publicou os livros Mataram o Rei! — O Regicídio na Imprensa Internacional,

República em Portugal! — O 5 de Outubro visto pela imprensa internacional,

Nas Bocas do Mundo — O 25 de Abril e o PREC na Imprensa

Internacional, Desventuras de um imperador sem trono — a gênese da

república brasileira no olhar da imprensa satírica europeia, O Regicídio

português nas páginas da imprensa rio-grandina, República no Brasil!?. . .

— Os comentários dos jornais europeus e Brasil, 1964 — ecos do golpe

no mundo, além de vários artigos e ensaios. Nesta publicação proporciona

aos leitores uma abordagem sobre a intentona monarquista

no alvorecer da forma republicana em Portugal, e, de acordo com os

objetivos da Coleção Documentos, oferece um importante manancial de

fontes, do qual poderão advir novas pesquisas.

Francisco das Neves Alves

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As conspirações monárquicas em

Portugal (1911-1912) 1

A revolução republicana de 1910 marca o fim da monarquia dos Bragança,

cujo último rei, D. Manuel II, deixa Portugal a 5 de outubro para

um exílio definitivo em terras inglesas. No entanto, é preciso sublinhar

que se trata, essencialmente, de uma revolução urbana, circunscrita à

região da Grande Lisboa 2 . O resto do país faz a mudança de regime,

como escreveu João Chagas, “por telégrafo”. Nessa altura, Portugal é

um país maioritariamente agrícola, com uma classe operária muito reduzida.

O centro e a força do republicanismo encontra-se na capital e,

em menor medida, na cidade do Porto 3 . O resto do país é conservador

e profundamente católico.

1 Quero agradecer à minha mulher Clara e ao Francisco Matta pela atenta leitura

desta introdução e do artigo sobre o Journal de Genève.

Abreviaturas: GNR (Guarda Nacional Republicana); I.P. (Ilustração Portuguesa); PRP

(Partido Republicano Português).

2 “A proclamação da República em 1910 surge como um fenómeno estranho e

bizarro, que apanha as capitais da Europa desprevenidas. O 5 de outubro foi um

movimento da capital, alargando-se no máximo a um arco de pequena dimensão

em seu torno, onde se inclui Almada e Loures, que com muita boa vontade se pode

prolongar até Setúbal e Alpiarça”. TELO, António José, “Sidónio Pais — A chegada

do Século XX”, in TEIXEIRA, Nuno Severiano & PINTO, António Costa. A Primeira

República Portuguesa. Entre o Liberalismo e o Autoritarismo. Lisboa: Colibri, 1999,

p. 12.

3 “A 20 km de Lisboa e a 10 km do Porto os republicanos rareavam. A 50 km só

se encontravam por acaso”. VALENTE, Vasco Pulido. A “República Velha” (1901-1917).

Lisboa: Gradiva, 1997, p. 11.


10 Reto Monico

Figura 1: A 16 de janeiro, a Ilustração portuguesa publica quatro fotografias do

“empastelamento da imprensa monárquica”, ocorrido no domingo 8. O jornalista

escreve que “uma grande multidão invadiu as redações” destes três diários porque

“atacavam o Governo da República”.

O Governo Provisório começa a adoptar medidas logo depois da

tomada de posse, nomeadamente no sentido de descristianizar a vida

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 11

política: podemos mencionar a expulsão das ordens religiosas e a

confiscação dos bens do clero regular (8 de outubro), a abolição do

juramento religioso (18 de outubro), a proibição do ensino religioso na

escola primária (22 de outubro), a abolição dos dias feriados e das festas

religiosas (28 de outubro), a lei do divórcio (3 de novembro). Estes

decretos, apoiados pelo povo republicano lisboeta, suscitam inevitavelmente,

a médio e a longo prazo, uma reação dos meios monárquicos e

clericais, num país onde 80 % da população vive no campo. Os acontecimentos

dos primeiros meses de 1911, como o assalto, em janeiro,

às redações de três jornais monárquicos (Liberal, Correio da Manhã

e Diário Ilustrado) e, em abril, a Lei da Separação entre o Estado e

a Igreja reforçam as convicções antirrepublicanas dos partidários do

Antigo regime.

Num ambiente internacional pouco favorável, os novos dirigentes

de Lisboa têm de enfrentar várias dificuldades nomeadamente a agitação

grevista 4 , o problema religioso e a conspiração monárquica, tema

deste livro.

* * * * *

Os “primeiros boatos de conspiração monárquica” 5 surgem na viragem

do ano. No entanto, como sublinha Miguel Dias Santos, no início

este perigo é mais “uma construção propagandística do republicanismo

para defesa do regime” 6 e para justificar uma política intransigente,

mas, a partir da primavera, esta ameaça torna-se mais séria para a jovem

república, com conspirações detetadas em Lamego, Viseu, Aveiro,

Coimbra, Guarda, Castelo Branco e Lisboa 7 . Em junho, descobre-se um

“vasto plano contrarrevolucionário no Algarve com ligações” 8 a Lisboa.

4 Há 59 greves nos últimos três meses de 1910 e 89 no ano seguinte.

5 SANTOS, Miguel Dias. A Contra-Revolução na I República (1910-1919). Coimbra,

Imprensa da Universidade de Coimbra, 2010, p. 90. Esta tese de doutoramento está

disponível em formato pdf: https://estudogeral.sib.uc.pt/bitstream/10316/12380/3/Migu

elSantos_tese.pdf.

6 Ibid., p. 98-99.

7 Ibid, p. 105.

8 Ibid, p. 106.

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12 Reto Monico

A 29, F. da Silva-Passos, que visita a Galiza em abril, publica um

artigo sobre a ameaça vinda de Espanha 9 que dá uma imagem do que

se pensa, na Lisboa republicana da altura, do perigo constituído pelos

conspiradores realistas:

Eu continuo a crer que o perigo é iminente. E é preciso preparar

sem demora a defesa da República, cuja vida é a da mesma

Pátria abençoada.

Os traidores não descansam e é o próprio indiferentismo de

muitos que em parte lhes alimenta a audácia criminosa. [. . . ]

O jornalista conclui, enviando um apelo ao novo Legislativo que

tem a obrigação de tomar urgentemente medidas para defender Portugal:

Se me fora dado assento na Assembleia Nacional, a minha voz

repetiria, constante e enérgica:

— O primeiro dever, o imediato dever, é o combate do perigo

que ante nós se alevanta.

Por seu lado, nota Raul Brandão nas suas Memórias:

1 DE JULHO

Animação desusada ontem em Lisboa. Grupos pela Baixa em

frente aos placards dos jornais. A sensibilidade da cidade chegou

ao auge. Gente oferece-se para partir para a fronteira, onde

toda a hora se espera a incursão de Couceiro. Hoje corre que

Couceiro está em Vinhais. 10

É preciso lembrar que, a seguir à revolução republicana, uma parte

dos monárquicos aderem ao novo regime, mas começa uma emigração,

nomeadamente na Galiza, sobretudo a partir de janeiro de 1911 e

depois da Lei de Separação e da campanha eleitoral para as eleições

9 “Pátria e Liberdade. À fronteira! Armas no braço, iluminemos os espíritos

incultos e preparemos a defesa da Pátria”, A Capital, 29 de junho de 1911. Em julho,

a conspiração de Couceiro faz manchete várias vezes no quotidiano lisboeta.

10 BRANDÃO, Raul. Memórias, T. II. Lisboa: Relógio d’Água, 1999 [1 a ed., 1925],

p. 122.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 13

à Assembleia Constituinte de final de maio. Na província espanhola

reúnem-se padres, jesuítas, antigos franquistas, filhos de boas famílias,

desertores do Exército, miguelistas e, também “muitos aventureiros” 11

Estes monárquicos encontram um chefe em Paiva Couceiro, que sai do

país em março 12 .

Figura 2: a 3 de julho de 1911, a Ilustração Portuguesa publica uma longa

reportagem sobre o “País dos conspiradores”. Aqui o Hotel Roma de Ourense, onde

esteve hospedado Paiva Couceiro.

O ex-governador de Angola é um dos pouco oficiais que defende

o regime dos Bragança durante a Revolução republicana. Logo depois

do 5 de outubro, o próprio Couceiro declara, num documento entregue

ao Governo Provisório, que reconhece as “instituições que o povo

reconhecer” 13 . Ao mesmo tempo pede a demissão do Exército, mas só

obtém uma licença. Fiel à tradição, recusa todas as ofertas que lhe são

feitas, tal como, a 14 de outubro, a nomeação para presidir a comissão

“encarregada de estudar a colonização de Benguela” 14 . Em março,

depois de ter apresentado a Correia Barreto, ministro da Guerra, uma

11 Ibid., p. 98.

12 Cf. Infra, A Federação, 19 de abril de 1911; Journal de Genève, 22 de abril de 1911.

13 COIMBRA, Artur Ferreira. Paiva Couceiro e a Contra-Revolução Monárquica.

Braga: Universidade do Minho, 2000, p. 89. (Tese de mestrado em História das

Instituições e da Cultura Moderna e Contemporânea)

14 BRANDÃO, Fernando de Castro. A I República Portuguesa — Uma Cronologia.

Lisboa: Livros Horizonte, 1991, p. 11.

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14 Reto Monico

petição exigindo um referendo nacional para que o povo possa votar,

graças a eleições livres, sobre o tipo de regime que quer para Portugal,

monarquia ou república, deixa o país, para evitar de ser capturado.

Figura 3: Paiva Couceiro (1861-1944) numa fotografia publicada pela Ilustração

Portuguesa a 20 de maio de 1907, quando foi nomeado governador interino de

Angola.

Esta fuga de Couceiro para Vigo tem consequências negativas para

a contrarrevolução porque a obriga a mudar de estratégia. O movimento

tem, nos primeiros meses, um caráter interno e militar. Com a

presença dos emigrantes monárquicos no noroeste de Espanha, uma

parte da energia dos contrarrevolucionários é consagrada à organização

destas tropas de Couceiro, sem esquecer as dificuldades de ligação

entre as tropas internas e as externas 15 .

Em terras espanholas, os adversários do novo regime preparam

uma incursão beneficiando da tolerância das autoridades locais do

país vizinho que fecham os olhos e muitas vezes não obedecem às

ordens de Madrid. Têm apoios na Corte, na Igreja, nos carlistas, na

aristocracia local 16 . O ministro espanhol em Lisboa, o marquês de

Villalobar, está claramente do lado dos conspiradores realistas e tem

um papel central na organização da primeira incursão de outubro de

15 SANTOS, Miguel Dias. Ob. cit., p. 96-97.

16 “Mas a conspiração da Galiza foi sobretudo possível devido às condições favoráveis

que os realistas encontraram no terreno das operações, isto é, na própria

Galiza. Ali tiveram a proteção dos habitantes e o beneplácito das autoridades, sob

os auspícios do alto caciquismo”. GÓMEZ, Hipólito de la Torre. Conspiração contra

Portugal. Lisboa: Livros Horizonte, 1978, p. 206.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 15

1911 17 .

No entanto, este “exército realista” nunca poderá constituir uma séria

ameaça, sem uma revolta militar em Portugal com um levantamento

popular. Ingenuamente, Paiva Couceiro conta com uma subversão das

províncias do Norte e das Beiras, dirigidas pelos caciques e pelo clero

e com a revolta de alguns regimentos militares no Norte. Considera-se

como uma espécie de “Messias” libertador, estímulo exterior para o

povo se revoltar contra o regime republicano de Lisboa 18 .

Figura 4: “A República contra o Paladino”. Em Santa Apolónia, o regimento de

caçadores 5 parte para o Norte. [I.P., 26 de junho de 1911]

Temos de acrescentar as dificuldades de organização, de comunicação

entre a Galiza e Portugal, os problemas financeiros e a falta de um

exército e de armamento: a maioria dos “soldados” era constituída por

civis e eclesiásticos. Alguns exercícios são feitos com paus nos quartos

ou nos corredores das casas, na ausência de espaço e de armas. Entre

estes “soldados” havia camponeses e criados aliciados pela promessas

de ganhar dinheiro. Um combatente preso diz que a causa princi-

17 “Villalobar estava perfeitamente informado dos projetos monárquicos. Podia ser

considerado, com toda a razão, um verdadeiro agente dos conspiradores”. Ibid., p.

204.

18 SANTOS, Miguel Dias. Ob. cit., p. 115.

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16 Reto Monico

pal foi “ganhar a peseta, comer e beber, levar boa vida” 19 . Comparar

este “exército” com o movimento carlista em Espanha que tem uma

formação teórica e prática de guerrilha, é suficiente para demonstrar

a extrema fraqueza das tropas de Couceiro. Por conseguinte, para a

República, o perigo é interno.

Figura 5: “A República prepara-se para a luta”. Embarque de material de guerra

para a divisão do Norte na estação de Santa Apolónia. [I.P., 10 de julho de 1911]

O regime, que no início parece negligenciar o perigo monárquico

não fica de braços cruzados 20 e reage ao nível diplomático através dos

seus representantes em Londres e Madrid e, também, dos representantes

consulares na Galiza, apoiados pelos republicanos espanhóis desta

província 21 . Com o objetivo de vigiar a fronteira norte, são tomadas

várias medidas a nível militar 22 : o Exército envia tropas para Bragança,

Vila Real e Lamego, e mobiliza “alguns efetivos navais” 23 e em julho

chama os reservistas em parte desmobilizados, com a exceção de duas

19 Ibid., p. 117.

20 Cf., Infra, A Federação, 3 e 8 de agosto de 1911.

21 É graças à colaboração entre espiões portugueses e republicanos espanhóis que

é apreendido, em junho de 1911, o barco alemão Gemma que contém 144 caixas com

4 mil armas, 8 peças de artilharia Krupp e 1 milhão de cartuchos. Ibid., p. 107. Cf.,

Infra, A Federação, 17, 23 e 26 de junho de 1911, 3 e 5 de agosto de 1911.

22 Cf., Infra, A Federação, 26 de setembro e 3 de outubro de 1911.

23 GÓMEZ, Hipólito de la Torre. Ob. cit., p. 63.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 17

divisões no Porto e em Vila Real que ficam “em pé de guerra.” 24 . Nessa

altura, os carbonários entram também em ação 25 .

Os republicanos portugueses infiltram também as tropas couceiristas

e organizam um serviço de espionagem dos dois lados da fronteira.

Estes espiões civis, ligados às organizações secretas, instalam-se na

província espanhola. Bernardino Machado, ministro dos Negócios Estrangeiros

até agosto, declarará dois meses mais tarde no Parlamento:

“eu tinha [. . . ] organizado um serviço de vigilância, mesmo além da

fronteira” 26 .

Figura 6: Em Orense, republicanos espanhóis vigiam os vagões apreendidos que

contêm armas e munições para os conspiradores.

* * * * *

O plano da contrarrevolução, apoiado por D. Manuel, prevê a tomada

da Cidade Invicta na última madrugada do mês de setembro,

com um regimento de cavalaria, um de infantaria, com peças de artilharia

e centenas de populares chefiados por religiosos e antigos chefes

monárquicos. No mesmo dia, está programada a entrada em Portugal

do Paladino a partir da Galiza. Este projeto monárquico conta também

com sublevações de quartéis e de populações a norte do Mondego,

24 SANTOS, Miguel Dias. Ob. cit., p. 107.

25 Segundo Hipólito de la Torre Gómez, em junho, há cerca de 2000 destes

voluntários civis na zona fronteiriça, às ordens do Grão mestre Luz de Almeida que

se instala em Chaves.

26 Ibid., p. 64.

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18 Reto Monico

graças ao trabalho de caciques e de padres. A força naval prevista, não

chega a formar-se. Com efeito, a aquisição de dois navios na Alemanha,

em Hamburgo, por parte dos conspiradores é anulada depois da

intervenção do Governo de Londres 27 .

A insurreição no Porto a 30 de setembro — primeira parte do

plano — é rapidamente controlada pelos republicanos. Já no dia 29,

corriam boatos de uma contrarrevolução. Os republicanos portuenses

reagem rapidamente: os carbonários controlam os centros nevrálgicos

da conspiração, a multidão sai à rua, o Centro Católico é invadido, há

várias prisões, o Palácio de Cristal ocupado por reacionários, é atacado

pelos carbonários e pela GNR. Os dois quartéis não se mexem. A

conspiração morre à nascença deixando centenas de prisioneiros nas

mãos republicanas. Fora do Porto, há só manifestações episódicas.

Figura 7: à direita, Luz de Almeida (1867-1939), o chefe da Carbonaria fala com o

capitão de Caçadores 3 que enfrentou as tropas de Couceiro em Vinhais. [Capa da

Ilustração Portuguesa de 23 de outubro de 1911]

27 SANTOS, Miguel Dias. Ob. cit., p. 121.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 19

Apesar disso, o exército factício de Couceiro, atravessa, com atraso,

a fronteira a 5 de outubro, com 950 homens, dos quais só 240 têm armas,

muitos com pistolas, a maioria com armas de guerra ferrugentas

e velhas. A coluna parte com destino a Bragança. Por engano, entram

por Vinhais, proclamam a monarquia mas, depois de um confronto

com os republicanos, em que recuam estrategicamente, Paiva Couceiro

decide retirar-se por falta de munições e pela incapacidade de enfrentar

as forças que o Governo de Lisboa enviará. Há, no entanto,

ainda um pequeno confronto com uma força de cavalaria vinda de

Bragança. O Paladino fica porém perto da fronteira à espera de uma

revolta popular que nunca ocorrerá e de novas armas que também

nunca chegarão 28 .

Um oficial dos carabineros espanhóis descreve o que resta das

tropas do Paladino 29 :

A sua gente continua a abandoná-lo [a Couceiro], levando o

armamento e munições. Dos 1200 homens aliciados não lhe

restam mais de 400 a 500. Andam andrajosos e famintos, tendo

sofrido deveras com as últimas chuvas, por não terem com que

se mudar. Em 9, levantaram o acampamento de Pinheiro e seguem

a pé, fazendo conduzir o pouco armamento que dispõem,

pela fronteira portuguesa, em direção a Santachão por Seixo

onde passaram em 10. [. . . ] Doutras informações, concluía-se

que os trânsfugas couceiristas vendiam o seu armamento ao

desbarato, indicação de necessidade. Em Pinheiro, diziam que

pareciam pobres da porta.

Esta “pueril incursão de Couceiro” 30 fracassa por falta de meios, de

apoio popular (as sublevações filo-monárquicas nos distritos do Porto,

Chaves, Bragança e Castelo Branco são inconsistentes), por causa da

divisão dos próprios monárquicos 31 , mas também porque o Governo de

28 Cf., Infra, A Federação, 6, 7, 9, 10, 11 13 de outubro e 22 de novembro de 1911;

Journal de Genève, 11 de outubro de 1911.

29 SANTOS, Miguel Dias. Ob. cit., p. 129.

30 VALENTE, Vasco Pulido. Ob. cit., p. 29.

31 “[Esta incursão] provou que mesmo os monárquicos não se bateriam pela monarquia

de 1910 e que não tinham ideia porque monarquia se bater”. Ibid.

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20 Reto Monico

Lisboa, como vimos, está em alerta e toma medidas preventivas, com

a presença de forças de vigilância na fronteira luso-espanhola sem

esquecer todo o trabalho dos diplomatas portugueses, particularmente

em Espanha e em Londres.

Figura 8: O regimento de Caçadores 3 entra em Sapião, aldeia do distrito de Vila

Real [I.P., 30 de outubro de 1911]

Apesar de não ter alcançado nenhum dos seus objetivos, a atividade

contrarrevolucionária tem uma forte influência na vida pública

em Portugal: aprofunda o clima de ódio e de suspeição, faz aumentar

a atividade dos grupos revolucionários, tais como os batalhões de

voluntários que são uma espécie de polícia paralela e divide o campo

republicano. O ministro da Guerra do I Governo Constitucional, o

general Pimenta de Castro, acusado de não ter tomado as medidas

necessárias, demite-se a 8 de outubro.

As numerosas prisões 32 , a criação do Tribunal de exceção das Trinas

33 e os vários processos contra conspiradores 34 , os excessos do radicalismo

republicano, o zelo na procura dos couceiristas, o afastamento

de funcionários considerados hostis, provocam uma forte animosidade

antirrepublicana. Este clima de violência não poupa os republicanos

32 Cf., Infra, A Federação, 3 de agosto, 11 de setembro, 3, 4, 14 de outubro, 9 de

novembro de 1911; 30 de julho, 2 de agosto de 1912.

33 Cf., Infra, A Federação, 18 e 22 de novembro de 1911.

34 Cf., Infra, A Federação, 11, 25 de janeiro, 22 de março, 16 de abril, 22 de junho,

29 de julho, 9, 14 de agosto, 16 de outubro, 25 de novembro de 1912.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 21

moderados: a 20 de outubro de 1911, o tribuno republicano António

José de Almeida, ministro do Interior do Governo Provisório, é sovado

pelos carbonários no centro da capital 35 .

Figuras 9 e 10: “Tumultos contra os conspiradores”. Em frente do Tribunal da Boa

Hora, o carro celular cercado pela multidão que o queria destruir. O mesmo carro

depois de ter sido apedrejado e esburacado. [I.P., 3 de junho de 1912] 36

35 Raul Brandão escreve no Tomo II das suas Memórias, na página 141: “Já o

quiseram matar. Ontem (20 de Out.) a multidão assaltou-o no Rossio aos gritos de

mata! mata!. Um homem de face patibular dizia ao meu lado — Dá-se um tiro na

cabeça.” Cf., Infra, A Federação, 21 de outubro de 1911.

36 Cf. Infra, A Federação, 22 de junho de 1912.

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22 Reto Monico

Figura 11: Ladeados por soldados, estes conspiradores marcham de Paço d’Arcos

para Caxias. [I.P., 23 de outubro de 1911]

* * * * *

Este enorme e previsível fracasso não desmoraliza as forças realistas

que começam imediatamente a preparar a incursão seguinte,

também chefiada por Couceiro, apesar deste não ter boas relações

com D. Manuel. É neste período que os monárquicos portugueses

tentam chegar, também sob a pressão de Afonso XIII e com o forte

contributo do incontornável marquês de Villalobar, a uma espécie de

acordo entre manuelistas e miguelistas, com o intuito de ultrapassarem

as suas divisões, as quais só os podem prejudicar na luta para a

restauração do antigo regime.

As negociações que se realizam em Londres são difíceis. O principal

pomo da discórdia é que D. Miguel não quer renunciar aos seus

direitos dinásticos como o exigem os partidários do último rei de Portugal.

Chega-se ao “pacto” de Dover de 30 de janeiro de 1912, que

é, na realidade, uma troca de cartas ente os dois primos. Segundo

Miguel Dias Santos, trata-se de um “equívoco” porque, por um lado,

D. Miguel só quer um acordo para atacar a República sem abdicar dos

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A Federação (1911-1912) 23

seus direitos dinásticos, e, pelo outro lado, D. Miguel fica indignado

porque o primo não renuncia ao trono 37 .

É nessa altura que o movimento, contrariamente ao de 1911, assume

como objetivo explícito repor D. Manuel no trono que perdera

no outono de 1910. O comité de Londres chefia este movimento restaurador

e é também na capital britânica que Luís de Magalhães redige

um “Esboço de um plano político para a restauração da Monarquia” 38

que prevê três fases, a primeira das quais nos interessa neste estudo:

a luta militar contra a República e a tomada do poder.

Nos primeiros meses de 1912, a luta radical do regime de Lisboa

contra o movimento operário e contra a Igreja parece legitimar

o movimento restaurador e justificar a luta armada dos conspiradores

monárquico-clericais. Tal como aconteceu em 1911, estes preparam

uma revolta interior com vários comités, nomeadamente em Lisboa,

no Porto, em Viseu, Braga, Coimbra e Leiria, e contando com o apoio

de alguns regimentos. Estes comités aliciam pessoas, contactam oficiais,

compram armas, imprimem manifestos e panfletos. Todos deverão

atuar no momento da entrada em Portugal do exército do Paladino.

Este, no país vizinho, prepara a segunda invasão. No que diz

respeito ao armamento, há alguns contratempos, com a confiscação

nos meses de abril e maio de duas remessas de armas na Galiza 39

e, no mês seguinte, em Zeebrugge, na Bélgica o aprisionamento do

vapor Voss com 200 homens e armas para as forças realistas 40 . No

entanto, Couceiro compra duas metralhadoras na Alemanha e armas

em Espanha graças sobretudo ao contrabando e ao precioso auxílio

dos carlistas locais. Em finais de maio, este parte para Madrid com

o objectivo “de realizar uma operação definitiva que pusesse os seus

homens em condições de entrar em Portugal bem apetrechados” 41 .

37 SANTOS, Miguel Dias. Ob. cit., p. 137. No entanto, na altura, a informação

divulgada é que se trata de um acordo político.

38 Ibid., p. 138.

39 Cf. Infra, A Federação, 23 de maio de 1912.

40 COIMBRA, Artur Ferreira. Ob. cit., p. 107-108. SANTOS, Miguel Dias, ob. cit., p.

151-153. Cf. Infra, A Federação, 18 de junho de 1912.

41

GÓMEZ, Hipólito de la Torre. Ob. cit., p. 129. Este historiador explica em

pormenor como as armas compradas em Barcelona ou em Madrid são transportadas

até à Galiza.

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24 Reto Monico

Os meses que separam as duas incursões não são de total repouso

para os “paivantes” que devem contar, sobretudo a partir de fevereiro

de 1912 com a hostilidade dos republicanos locais e dos carbonários. A

missão destes últimos é “chamar a atenção das autoridades e do Governo

Espanhol sobre a presença dos emigrados realistas” 42 e de provar

que eles têm como objetivo preparar um segundo assalto contra Portugal.

A tensão aumenta de tal modo que, nos finais de maio, por pressão

de José Relvas, ministro luso na capital espanhola 43 , Madrid ordena a

expulsão dos ditos portugueses da província de Ourense, ordem que,

no entanto, nunca será aplicada. Mas as palavras do diplomata português

não deixam qualquer dúvida quanto às responsabilidades do

Executivo de Afonso XIII:

A situação da Espanha era então deplorável. O Governo espanhol

conduzira-se com singular negligência, muitas vezes

surdo em presença das mais evidentes revelações da incúria,

ou mesmo da traição, das suas autoridades da Galiza. Das fábricas

de armas tinham saído armamento e munições, contra as

disposições expressas das Reais Ordens, que só concediam cedências

de armas quando precedidas de licença dos Ministérios

da Guerra e do Reino. 44

Hipólito de la Torres Gómez, especialista das relações luso-espanholas,

pensa todavia que o Governo de Canalejas não foi, na prática,

tão favorável aos refugiados monárquicos como se pensava em Lisboa.

A sua ação não facilitou os planos do Paladino:

Ninguém podia negar que receberam proteção e apoio, mas

era evidente, ao mesmo tempo, que se tinham dificultado muito

consideravelmente as suas manobras, apreendendo-se importantes

contrabandos de armas, ordenando-se o seu internamento

em várias ocasiões e, finalmente, fazendo-se vigiar a fronteira

por forças do exército. [. . . ]

Não há dúvida de que todos os esforços para manter o país

42 Ibid., p. 127-128.

43 RELVAS, José. Memórias políticas. Vol. 2, Lisboa: Terra Livre, 1978, p. 50.

44 Ibid., p. 51. Cf. Infra, A Federação, 22 de junho de 1912.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 25

no respeito à República se revelaram insuficientes para eliminar

completamente a proteção que se dispensava aos seus inimigos.

Serviriam contudo para neutralizá-la. [. . . ]

Os emigrados monárquicos moviam-se consequentemente em

terreno bastante mais escorregadio do que supunham os republicanos.

E isso era devido precisamente a uma absoluta falta

de unanimidade na opinião pública e nos meios políticos espanhóis.

45 * * * * *

Figura 12: Em Vila Verde da Raia, os republicanos voltam a içar a bandeira nacional

depois de ter repelido o ataque da coluna de Sousa Dias. [I.P., 22 de julho de 1912]

A segunda incursão couceirista 46 é dividida em três colunas. A

primeira, comandada pelo Paladino e da qual fazem parte Jorge Camacho

e João de Almeida, dirige-se a Chaves, com pouco menos de 500

homens. Depois de um combate de várias horas no dia 8 de julho,

tem de se retirar com pesadas baixas (30 mortos e 150 feridos). A segunda,

com 190 homens comandados pelo capitão Sousa Dias, afetada

pelo atraso, ataca Vila Verde da Raia a 7, tomando a Alfândega. No

entanto, a bandeira monárquica não fica muito tempo no local, porque

a Guarda Fiscal com a ajuda da Artilharia e da Cavalaria de Chaves

45 GÓMEZ, Hipólito de la Torre. Ob. cit., p. 210-211.

46 Cf. Infra, A Federação, 8, 10, 11, 13, 15, 17 e 20 de julho, 4 de setembro de 1912;

Journal de Genève, 24 de julho de 1912.

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26 Reto Monico

provoca a fuga dos conspiradores, impedindo a união com o grupo

de Couceiro. Finalmente, a coluna de Sepúlvedra, com menos de 150

homens, ataca Valença na noite de 6 para 7. Chega a ocupar a estação

ferroviária, o posto da guarda fiscal e a cortar as linhas telegráficas,

mas, depois do contra-ataque da guarnição local, da qual resultam 15

mortos, tem de atravessar o rio Minho em direção a Galiza.

Figura 13: O miguelista D. João de Almeida (1866-1950), um dos chefes da

conspiração é feito prisioneiro em Chaves. [Capa da Ilustração Portuguesa de 22 de

julho de 1912]

Como em outubro de 1911, este segundo assalto contra a jovem

república fracassa redondamente. O país fica quase imóvel. De facto,

os vários comités do interior, receando a derrota, decidem não avançar

com o levantamento geral, mas não chegam a avisar o Paladino. Há

alguns levantamentos: em Amarante, Barcelos e Fafe estes são quase

imediatamente controlados pelas forças republicanas; em Celorico de

Basto o povo em parte armado restaura a monarquia e nomeia um

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 27

administrador do concelho; em Évora e Belas as conjuras monárquicas

são só fogos de palha. É em Cabeceira de Basto que acontecem os

confrontos mais graves com a morte do administrador republicano.

Instigado por religiosos e antigos caciques monárquicos, o povo restaura

a monarquia, corta viadutos, bloqueia a estrada com árvores.

Mesmo nesta localidade a revolta é de pouca dura. Um dos chefes, o

padre Domingos Pereira, que tinha a reputação de guerrilheiro feroz

e destemido, foge à aproximação de uma dezena de cavaleiros republicanos

47 . Este episódio coloca então um ponto final a este segundo

ataque vindo da Galiza.

Figura 14: Armas apreendidas às tropas de Couceiro em Chaves e letreiro dos

cartuchos comprados pelos conspiradores em Toledo. [I.P., 22 de julho de 1912]

O historiador americano Douglas Wheeler resume perfeitamente

a importância destas duas incursões couceiristas na política portuguesa

48 :

Gastou-se muito tempo e energia para contrariar as conspirações

que tentavam derrubar a República. O Parlamento, cedendo

às exigências da crise monárquica, aprovou uma série de duras

leis de “exceção” em julho de 1912, que introduziram uma maior

censura à imprensa e novas formas de processo criminal. O

Governo ordenou inúmeras prisões, julgamentos e detenções de

conspiradores monárquicos, reais ou imaginários; em breve, as

cadeias portuguesas ficaram cheias de suspeitos, muito deles

inocentes ou, pelo menos, inofensivos. A imprensa, o Parlamento

e muitos republicanos das cidades ficaram cada vez mais

47 SANTOS, Miguel Dias. Ob. cit., pp. 157-158.

48 WHEELER, DOUGLAS. História política de Portugal (1910-1926). Lisboa: Publicações

Europa-América, 1978, p. 108.

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28 Reto Monico

alarmados e, enquanto a maioria da população monárquica em

Portugal estava inativa, sem querer se envolver em conspirações

ou pegar em armas e arriscar a vida e os membros [sic!] para

restaurar D. Manuel e o seu sistema desacreditado, uma minoria

ativista fazia levantar muito medo e muita recriminação.

Na política parlamentar, as notícias ou mesmo os boatos de

conspirações e de atividades monárquicas ultrapassaram os moderados

[sic!] e favoreciam os apoios radicais do PRP de Afonso

Costa. O medo de uma insurreição armada fixara-se nas cabeças

dos patriotas republicanos mais excitáveis [sic!] e aumentaram

a inimizade contra a Espanha e contra os espanhóis, como era

já tendência bem estabelecida entre os portugueses. As atividades

monárquicas, reais ou imaginárias, minaram os esforços

dos moderados para o estabelecimento de senso político, calma

e justiça. [. . . ] As condições de vida nas prisões e o tratamento

dos presos já eram alvo, em 1912, de muitas críticas da imprensa

e dos observadores estrangeiros [. . . ].

Depois deste segundo desastre, as relações luso-espanholas que, na

primavera do mesmo ano, estiveram quase à beira da ruptura, seguem

caminhos mais pacíficos. Madrid demite o governador de Pontevedra,

transfere o de Ourense para outro distrito e ordena o internamento dos

conspiradores lusos em Cuenca e Teruel. Além disso, prendem “alguns

chefes monárquicos e muitos conspiradores que tinham tomado parte

no ataque de Valença” 49 . Em setembro, graças à proposta do Brasil

apoiada por Londres, os dois países assinam uma convenção. O ponto

principal é a saída dos conspiradores monárquicos portugueses da Península

durante pelo menos três anos, rumo ao maior país da América

do sul 50 . Além disso, Espanha e Portugal comprometem-se em não

apoiar conspirações contra qualquer dos dois estados 51 .

49 RELVAS, José. Ob. cit., p. 57-58. Cf. Infra, A Federação, 22 de julho de 1912.

50 Cf. Infra, A Federação, 5 e 14 de setembro, 2, 15 e 16 de outubro de 1912; Journal

de Genève, 31 de julho de 1912.

51 O ministro espanhol em Lisboa, que tanto fez em favor da causa monárquica,

será transferido só em 1913, depois de muitos protestos do governo português.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 29

Figura 15: “Os realistas portugueses passam do Tejo”. Quatro fotografias do

Tucuman que leva 63 conspiradores para o Brasil. [I.P., 16 de setembro de 1912]

As causas desta segunda derrota são comparáveis às da primeira

tentativa couceirista: o país não se mexeu 52 ; não houve “uma campa-

52 Rui Ramos pensa que “o que derrotou Couceiro não foi a “imobilidade”, mas a

mobilidade nacional. Talvez os camponeses das aldeias do Norte estivessem fartos

da perseguição aos padres e desagradados com a nova lei de recrutamento militar.

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30 Reto Monico

nha ideológica de propaganda”, mas grandes carências estruturais; o

próprio Paladino deu prova de grande ingenuidade; muitos oficiais não

cumpriram a promessa de se revoltarem enquanto outros foram transferidos

pelo ministro; houve falta de unidade, de fé e de disciplina por

parte dos monárquicos. Obviamente, não podemos subestimar a mobilização

das forças republicanas, das organizações ligadas à carbonária

e das tropas no terreno.

* * * * *

As razões do fracasso das duas incursões de outubro de 1911 e

de julho de 1912 invocadas por Raul Brandão no 3 o volume das suas

Memórias, publicado vinte anos depois dos acontecimentos, sintetiza,

na nossa opinião, o essencial desta problemática:

Couceiro contou sempre com o país, supôs que o país, inteiramente

monárquico, se levantasse como um homem à primeira

tentativa de incursão. Toda a gente lho dizia, toda a gente chamava

por ele. Estava tudo pronto. Era só ele parecer. Um

núcleo de apoio — e a sublevação geral. Mas cada um, lá no

fundo, encolheu-se, esperava que os outros se arriscassem e

comprometessem. Quem pesou o egoísmo? Quem contou com

o terror? O 5 de outubro repetir-se-ia para a monarquia, com a

mesma facilidade com que se fez para a república? Melhor: o

momento não pode ser mais favorável, com a questão religiosa.

E, por último, insistiam sempre, asseveram sempre, teimavam

sempre neste ponto, que era e é ainda para toda a gente uma

verdade indiscutível: — o país é monárquico.

Mas o país é, na realidade, monárquico? Se o país é monárquico,

porque falham todas as tentativas de incursão? E porque

falham da mesma forma todas as tentativas cá de dentro, até a

[. . . ] Mas entre 1910 e 1914, a única coisa que verdadeiramente lhes interessou não

foi defender o pároco, mas emigrar. Nesses anos, saíram de Portugal, rumo ao Brasil,

à volta de 300 000 pessoas, o equivalente a 10 % da população dos distritos a norte

de Coimbra”. RAMOS, Rui. A Segunda Fundação. Lisboa: Editorial Estampa, 1995, p.

157.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 31

última da Traulitânia, com o Norte sublevado? 53 Se o país fosse

monárquico, a república já não existia. Bastava um sopro para

a derrubar.

É que o país não é monárquico. Há uma minoria monárquica,

capaz de sofrer, como há gente de Lisboa e do Porto republicana,

disposta a todos os sacrifícios. A grande massa inerte adapta-se

a todos os regimes — a D. Miguel, rei absoluto, ou a D. Manuel,

rei constitucional, à república com Deus ou à república com o

diabo — molda-se a todas as aventuras que triunfem. Pior, meu

Deus, pior! O país é egoísta, e a gente viva de Lisboa e Porto,

capaz de morrer nas ruas, essa é inteiramente republicana 54 .

Efetivamente, na altura, os monárquicos e os republicanos constituem

uma minoria. A maioria da população é apática e indiferente à

política.

53 Brandão refere-se à Monarquia do Norte que dura de 19 de janeiro a 13 de

fevereiro de 1919.

54 BRANDÃO, Raul. Memórias, T. III, Lisboa: Relógio d’Água, 2000 [1ª ed. 1933],

p. 57.

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A FEDERAÇÃO

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 1

Uma conspiração importante

Rio, 2 — O ministro português, sr. António Gomes, conferenciou, ontem,

reservadamente com o chefe de polícia.

Este, tendo recebido importante e documentada comunicação de que

os portugueses aqui residentes, monarquistas ardorosos, já constituídos em

associação política de reação, tramavam contra a vida dos republicanos seus

patrícios, não só dos residentes nesta capital, como também dos que figuram

à frente do governo de Portugal, abriu um inquérito sobre o caso.

Além disso o dr. Belisário Távora resolveu tomar desde já certas providências,

começando por proibir a exibição da bandeira monárquica portuguesa,

tenha ela embora as iniciais indicativas da existência da sociedade que a

árvore [sic!] como estandarte ou como símbolo.

A conspiração dos monarquistas portugueses tinha ramificações nos Estados.

Aqui estava ela sob os auspícios da Liga Monárquica Dom Manuel II,

presidida pelo comendador Joaquim Maria Freire, proprietário da loja Moinho

de Ouro.

A conspiração foi descoberta por um republicano que se introduziu na

Liga, assistindo às sessões e captando a confiança dos diretores e depois

ficando na posse de todo o fio da meada e dos livros que a ela se referiam.

Esse republicano foi à polícia comunicar o fato.

Seu nome é Francisco Narciso, natural de Lisboa.

1 A Federação, 2 de março de 1911, p. 4.


As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 33

Narciso fez parte do grupo de organizadores da revolução em Lisboa, a

28 de janeiro de 1908.

Perseguido pela monarquia, emigrou para Inglaterra, donde veio para o

Brasil, como empregado de bordo do destroyer Rio Grande do Sul.

Aqui empregou-se no comércio, sem fazer parte do Grémio Republicano.

Sabendo haver algo de extraordinário na liga, nela se inscreveu com o fim

de agir convenientemente, assinando a seguinte fórmula que era por todos os

sócios assinada.

“Por livre e espontânea vontade e no pleno uso das minhas faculdades,

juro cumprir as determinações que me impuser o complot da contrarrevolução,

prometendo guardar absoluto segredo e levar a efeito a missão de que

me incumbir, sob pena de responder quando a tal falte”.

Havia ramificações da conspiração em Paris, Vigo e fronteira espanhola.

A revolução começaria pelos regimentos aquartelados em Chaves e Braga.

Os revolucionários, antes, esperariam que os ministros saíssem da reunião

do conselho e os assassinariam em plena rua.

Já seguiram para Lisboa, para os preparativos, três indivíduos subvencionados

pelo complot organizador.

Foi o bacharel Artur Vasconcelos de Veiga Faria, empregado do museu

comercial, que seguiu, a bordo do Aragon, com destino a Paris, para conferenciar

com o sr. Homem Cristo.

Depois irá a Londres levar as suas credenciais ao rei d. Manuel, marquês

general João Franco, conde Fonseca Vasconcelos Porto, Campos Henrique, etc.

A Liga obteve muito dinheiro por intermédio do comendador Artur Leite

Vasconcelos e João Silva Lisboa, capitalistas; Aquilino Lopes, industrial; comendador

Joaquim Costa e Santos Carvalho, proprietário da Fundição Indígena

Consta que o conde de Avelar também está envolvido na conspiração.

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 2

Rio, 9 — Le Temps, de Paris, publica uma carta do conselheiro João

Franco desmentindo, indignado, sua qualquer participação no complot monárquico,

descoberto no Rio de Janeiro.

2 A Federação, 9 de março de 1911, p. 6.

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34 Reto Monico

Afirma solenemente o conselheiro que não empregará o menor esforço

para voltar à vida política.

[. . . ]

A polícia prendeu a bordo do paquete Aragon o indivíduo Vasconcelos da

Veiga, pretenso agente dos conspiradores monarquistas no Rio.

Foi preso e interrogado.

Foi recolhido à prisão do Limoeiro, onde está incomunicável.

Consta que nas malas aprendidas pela polícia encontraram-se papéis de

grande importância.

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 3

Rio, 11 — Em Lisboa, o ministro do exterior de Portugal, dr. Bernardino

Machado, conversando com alguns jornalistas, declarou que o complot

descoberto pela polícia desta capital não tinha importância alguma, tendo o

governo provisório entregue o caso à justiça, como crime comum.

Foi preso e recolhido à prisão, em Lisboa, o padre Leite Amorim, redator

do jornal A Palavra

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 4

Rio, 20 — [. . . ] Perante as autoridades competentes, em Lisboa, têm sido

interrogados muitos indivíduos presos recentemente como conspiradores.

Pelas suas declarações, todos procediam por instigação do padre Avelino

Figueiredo, que se acha refugiado na Espanha.

O ministro da guerra do governo provisório mandou prender também

quatro militares que estavam envolvidos na conspiração.

O governo está disposto a manter a ordem custe o que custar.

3 A Federação, 11 de março de 1911, p. 6.

4 A Federação, 27 de março de 1911, p. 1.

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A Federação (1911-1912) 35

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 5

Rio, 17 — O chefe da Polícia, dr. Belisário Távora, mandou intimar o

conde de Avelar para prestar depoimento sobre a falhada conspiração portuguesa,

em que aquele titular é acusado de ser o chefe de um complot para

assassinar o ministro de Portugal nesta cidade. (. . . )

Os jornais ridicularizam o chefe da polícia por esse motivo.

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 6

Rio, 19 — Foi descoberta na cidade do Porto uma conspiração monárquica,

sendo presos como nela envolvidos o professor Fortunato Almeida, o

farmacêutico Pompeu Moreira, o comerciante António Maria, diversos policiais,

estudantes e três padres..

[. . . ]

Rio, 20 — Os conspiradores presos no Limoeiro tentaram sublevar-se,

sendo completamente dominados.

O governo provisório decretou depois a deportação desses presos para a

África.

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 7

Rio, 13 — Continuam a ser recebidas em Paris notícias pouco tranquilizadoras

sobre a situação em Portugal.

No Porto, foram presas dezenas de pessoas acusadas do crime de conspiração.

Algumas foram recolhidas a bordo do Adamastor

Muitas casas foram revistadas.

5 A Federação, 17 de maio de 1911, p. 4.

6 A Federação, 20 de maio de 1911, p. 2 e 4.

7 A Federação, 23 de maio de 1911, p. 6.

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36 Reto Monico

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 8

Rio, 17 — Em Lisboa foram presos e postos incomunicáveis dois indivíduos,

suspeitos de conspirarem contra o regime político. [. . . ]

A folha portuguesa Mundo noticiou que, por ocasião das festas de Ourense,

foi apreendida grande quantidade de revólvers e material de guerra.

Segundo as últimas informações, os conspiradores estão concentrados

nas proximidades de Lindoro Portela [. . . ]

Foi recebido de Madrid o seguinte telegrama:

“Os vagões apreendidos em Ourense com armas destinadas ao conspiradores

portugueses iam consignados a José Casar, residente nas proximidades

daquela cidade.

Continham eles peças de artilharia, carabinas e onze caixas de munições.

O vapor Gemma, procedente de Hamburgo, desembarcou segunda-feira

passada, na Vila Garcia, volumes do peso de 350 toneladas, contendo armamento.

Esses volumes foram ali transportados para os vagões e despachados para

Ourense e Torres Vedras.

Foi uma denúncia particular que determinou a intervenção das autoridades.

Consta que quatro outros vagões com armas e munições passaram à

fronteira.

O governo ordenou a prisão do capitão Paiva Couceiro e do jornalista

Álvaro Pinheiro Chagas, os quais desapareceram.

O vapor alemão Von Pluto, chegado de Vigo, procedente da Vila Garcia, foi

visitado pelas autoridades que lhe examinaram a carga, entre a qual constava

vir contrabando de armas de guerra.

Consta aqui que os conspiradores têm recebido auxílio de dinheiro de

portugueses residentes no Brasil.”

8 A Federação, 17 de junho de 1911, p. 4.

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A Federação (1911-1912) 37

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 9

Rio, 18 — [. . . ] Foram presos no Porto mais indivíduos acusados do

crime de conspiração contra a República portuguesa.

A polícia de Lisboa está de posse de toda a trama dos complots organizados

no sul de Portugal.

Alguns chefes foram presos e outros, entre os quais Mário Chagas, fugiram.

Fracassou, por completo, a tentativa de contrarrevolução.

O plano dos organizadores do movimento do sul de Portugal era espalhar

o terror pelas populações, promovendo desordens, provocando insubordinações

dos regimentos e outras corporações armadas.

As providências tomadas pelo governo inutilizam qualquer tentativa da

parte dos monárquicos.

Entre os conspiradores presos na capital está o conde de Armil.

Está perfeitamente averiguado que os conspiradores, na sua maioria, são

antigos policiais, ex-soldados da extinta Guarda Municipal.

Eram eles inspirados pelo padre Avelino de Figueiredo e Dr. Abel Campos.

Entre os conspiradores havia também muitos agentes de sociedades católicas

e grande número de franquistas.

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 10

Rio, 23 — Foram interrogados em Lisboa vários conspiradores que estão

recolhidos à prisão do Limoeiro.

Noticiam de Madrid que os armamentos apreendidos em Ourense e destinados

aos monarquistas portugueses constavam de 1400 granadas, 1100 carabinas

e cinco peças de artilharia montada, além de três vagões de ignorado

conteúdo.

9 A Federação, 19 de junho de 1911, p. 1.

10 A Federação, 23 de junho de 1911, p. 1.

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38 Reto Monico

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 11

Rio, 26 — O Jornal do Comércio mandou que o seu correspondente em

Paris fosse a Portugal donde remeteu para Paris suas impressões, dali enviadas

para esta capital, telegraficamente, sobre a situação de Portugal.

Eis o telegrama que o Jornal do Comércio publicou hoje:

“Encontrei esta cidade em perfeita tranquilidade.

Não consta que em qualquer ponto do País se estejam dando ou se

tenham dado recentemente perturbações da ordem.

Liquidou-se em absoluto fiasco a conspiração na fronteira promovida por

alguns descontentes, que aliciaram bandoleiros espanhóis, afim de tentarem

uma invasão pelo Gerês.

Já deve ter aí chegado, por outras vias, a notícia da apreensão feita em

Ourense (Espanha) de alguns vagões contendo armamento destinados aos

conspiradores.

Este desastres dos revolucionários coincidiu com as medidas tomadas

pelo governo português.

E a proclamação da república pela assembleia constituinte fez com que

aumentasse as simpatias pelo novo regime a confiança que nele depositam.

Tenho procurado informar-me com pessoas pertencentes a diversas camadas

sociais.

Todas me dizem que é impossível tomar atualmente a sério qualquer

tentativa de reclamação.

A própria agitação clerical diminui consideravelmente.

Muitos párocos declaram aceitar o que está estabelecido em lei sobre a

separação da igreja e do Estado.

Outros protestam, mas moderadamente.

Só uma região, da Beira, parece ter-se tornado um reduto dos reacionários.

A opinião geral é que, se a Constituinte aproveitando a lua de mel da República,

votar uma constituição liberal, o norte de Portugal seguirá o exemplo

de Lisboa, embora sem manifestações exuberantes ou demagógicas.

Tal é o entender dos numerosos banqueiros, industriais e comerciantes

com quem tenho conversado durante a minha estada nesta cidade.

Daqui sigo com destino a Braga e a Viana do Castelo.

Para governador civil desta última cidade acaba de ser nomeado o padre

Pires Gil”.

11 A Federação, 26 de junho de 1911, p. 4.

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A Federação (1911-1912) 39

Noticiam de Madrid que, anteontem à tarde, entrou no porto o Província

Corunha. Sob o comando de Corcubion, para abastecer de carvão o vapor

alemão Gemma, que inspirou certas desconfianças ao diretor da alfândega

local sr. Cabrinety.

O vapor trazia, em seu manifesto, um carregamento de máquinas de

consignação.

Efetuadas buscas a bordo, encontraram 200 caixas contendo carabinas

Mannlicher, vinte caixas com correames e 400 com cartuchos.

O mesmo navio Gemma descarregou em Vila García armamentos depois

de apreendidos.

O capitão do vapor Corcubion tentou opor-se ao reconhecimento da carga.

Esta resistência foi, porém, vencida pelo sr. Cabrinety, que chamou em

seu auxílio a força dos carabineiros.

Foram seladas as escotilhas do vapor e postado aí alguns carabineiros de

sentinela.

O capitão do Gemma quis zarpar imediatamente, depois da entrada do

carvão necessário, mas o diretor da alfândega declarou-lhe que o vapor ficava

detido até segunda ordem.

Supõe-se que o plano do comandante do navio fosse desembarcar as

armas em qualquer ponto da costa.

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 12

A atual situação da República em Portugal

Rio, 28 — O Jornal do Comércio publicou o seguinte telegrama enviado

pelo correspondente especial que mandou a Portugal, afim de estudar a

situação política naquela República:

“Cheguei à cidade de Braga num comboio especial que trouxe os excursionistas

afim de assistir à festas de S. João.

A época não era própria para falar em política ou sondar sequer o espírito

público, afim de poder avaliar quais as suas tendências.

Os lavradores só pareciam preocupar-se com o tempo; pois temiam a

chuva que ameaçava e que viria transtornar-lhes aqueles festejos.

No dia que cheguei e nos anteriores, haviam afluído à cidade de Braga

em comboios, diligências, cavalos, etc., cerca de 60 000 forasteiros que vim

12 A Federação, 29 de junho de 1911, p. 2.

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40 Reto Monico

encontrar dançando, cantando, ostentando seus trajes característicos, o que

dava à festa um tom pitoresco e agradável e nos quais se notava a predominância

das cores verdes e encarnada, que são as prediletas da novel

República.

Todos neste distrito, tanto quanto até agora pude avaliar, estão muito

contentes com o novo regime.

Os habitantes de Braga ainda mais satisfeitos pareciam, pois devido à

conspiração que abortou, veio para a cidade mais um regimento como reforço

para guarnição local.

No meio de tanta festa, já desistira de obter as informações de que

precisava, quando afinal consegui ouvir um padre.

O teatro da nossa entrevista foi artístico, o coro da célebre Catedral de

Braga, cuja construção — reza a tradição — foi iniciada por Afonso Henriques

antes de 1112.

Foi uma longa conversa, mas resumida pode se condensar no seguinte.

Meu entrevistado declarou-se simpático às novas instituições.

Disse que nessa simpatia acompanhava a maior parte da sua classe.

Achava aceitável a lei de separação da igreja e do Estado.

Claramente declarou que os maiores oposicionistas eram os bispos.

Muitos párocos havia desejosos de aceitar a pensão a seu favor estipulada

por aquela medida.

Repetiu: mas a pressão e ameaças exercidas pelos bispos não permitia

aos párocos externarem livremente o seu pensamento.

Era sua convicção, entretanto, que os próprios elementos mais reacionários

acabariam por amoldar-se ao novo estado de coisas. [. . . ]”

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 13

Rio, 3 — Foi apreendido em Lisboa um caixote contendo pistolas e

marcado como contendo ovos.

Foram presos cinco indivíduos suspeitos.

Continua o movimento de tropas ao norte de Portugal. [. . . ]

Correu na cidade de Madrid, ontem à tarde, o boato que no Porto havia

sido travado sério combate entre as forças republicanas e elementos monárquicos,

havendo do lado dos republicanos 27 mortes e muitos feridos.

13 A Federação, 3 de julho de 1911, p. 4.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 41

Até à noite não houve confirmação do boato.

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 14

Rio, 22 — Consta que o capitão Paiva Couceiro está ativando os preparativos

na fronteira portuguesa, para invadir o país à frente dos reacionários.

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 15

Rio, 6 — Dizem de Lisboa que foi descoberta uma nova conspiração no

vale do Minho, estando nela envolvidos o capitão Martins Lima e o major

Souto Maior, que fugiram para a Espanha.

Parece que o plano desses conspiradores era exterminar, ao chegar ao

Porto, o comboio que procedia de Lisboa, onde, acompanhado por uma força

do exército, vinha preso o conde de Santa Eulália, por ter escrito contra a

República.

Crónicas de Lisboa

Para A Federação

27 de julho de 1911

A comédia da Conspirata 16

Vou ocupar-me hoje exclusivamente, conforme prometi, da tão decantada

conspiração, tramada com o tresloucado intuito da restauração monárquica

em Portugal.

Eu vou tratar do fato, a sério, porque, segundo vejo dos jornais daí, que

acabo de receber, os telegramas publicados deverão ter produzido desagradável

impressão, sobressaltando o espírito público, especialmente daqueles que

mantém estreitas relações comerciais com este país.

14 A Federação, 7 de julho de 1911, p. 4.

15 A Federação, 22 de julho de 1911, p. 4.

16 A Federação, 3 de agosto de 1911, p. 5 e 8 de agosto, p. 5.

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42 Reto Monico

São meros boatos alarmantes, perversos, recheados de falsidades, revelando

a baixeza de sentimentos de quem os transmite em primeira mão, do

estrangeiro, ou, quiçá, adubados em segunda ou terceira mão, por quem os

recebe, acrescentando ao conto mais um ponto. . .

Se há mais um tempo não tenho tratado largamente do assunto, é porque

reputava tão fútil que, quer o governo, quer a imprensa, não lhe tem ligado a

mais insignificante importância.

Narram os acontecimentos, ridiculizando-os como merecem.

Todavia, é mister destruir por completo estas artimanhas, que só visam

perturbar as relações internacionais de Portugal.

Passo a historiar fielmente os últimos sucessos, tais quais se hão desenrolado,

para que todos aí convençam-se de que nada há a recear que faça

periclitar a estabilidade da República.

Deixarei os comentários para o fim.

Segundo relata a imprensa desta cidade, a polícia descobriu todo o plano

da contrarrevolução, pondo a bom recato os principais figurantes que são,

na fronteira de Espanha, o ex-capitão de artilharia Henrique Paiva Couceiro,

Mário e Álvaro Pinheiro Chagas, filhos do saudoso escritor Manuel Pinheiro

Chagas e, ao que consta, o celebérrimo ex-conselheiro João Franco, auxiliado

por alguns carlistas galegos; em Portugal — o novíssimo conde de Armil, o

padre Avelino de Figueiredo, ex-mestre de cerimónias da Sé, um tal Motta

Cardoso, os médicos sem clientes, Carlos Garcia e Abel Gomes, o ilustre dr.

José Lourenço, adelo da calçada de Santo André, e por fim algumas damas,

todos desta cidade.

Em vários pontos do interior, também existiam (e é muito provável que

ainda existam) uns conspirante pulhas, sem classificação social.

Toda esta tropa fandanga, escusado será dizer, anda a soldo dos jesuítas,

que são os que pagam o pato, derramando ouro a mancheias para fazerem

vingar os seus malévolos desígnios.

Eis como O Século de 18 do corrente pormenoriza essa chinfrinada, essa

tramoia, ou melhor — essa comédia da conspirata, cujos autores e atores

estão já dançando na corda bamba:

“Entre as hostes couceirescas e jesuíticas, acampadas além fronteiras,

reina a maior das desmoralizações, a mais completa das desordens, por

motivo do fracasso com a última tentativa guerreira para a restauração da

monarquia em Portugal. Paiva Couceiro, ou, melhor, o Henrique, como familiarmente

o tratam os da seita, deve estar a estas horas desalentado, se já,

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 43

para recobrar forças, não foi procurar delegado fiel de Gonzaga Cabral, a que

se confessou e pediu uma larga indulgência para a suas asneiras e tolices. É

que outro nome não pode dar-se a esse tétrico e mal alinhavado plano que a

polícia descobriu, e pelo qual se verifica que a tropa fandanga que rodeia o

desnorteado cabo de guerra é tudo gentinha saída de antigos colos, meninos

educados em Campolide, ex-polícias e ex-municipais, e um batalhão de infelizes,

de mandriões e de desqualificados, capaz de encher uma colónia penal

da nossa África.

Ao princípio, o lugar-tenente dos conspirantes, em Lisboa, era o seráfico

padre Avelino de Figueiredo, ex-mestre de cerimónias da Sé, atualmente detido

na cadeia do Limoeiro, tendo como subalternos os idiotas que lhe foram

fazer companhia e mais aquele interessante adelo da calçada de Santo André,

de nome José Lourenço, o famoso orador da Liga Monárquica, inimigo irreconciliável

da gramática e do bom senso. Liquidada em águas de bacalhau

esta troupe, relegados para o canto os seus membros, como ineptos, parvos

e pobres de espírito, Henrique, o grande Henrique, lá de longe, mesmo correndo

à Galiza, como o lendário capitão fantasma, ordenou nova organização

revolucionária, e, ajudado pelo seu mestre de ordem, pelo talentoso Álvaro

Chagas, tesoureiro do comité, tão bem preparou as coisas que o resultado foi

o melhor possível, como vai ver-se.

Montadas três ramificações do complot, em Lisboa, Coimbra e Faro, quem

tomou, na capital, o encargo de substituir o padre Avelino foi um médico franquista,

sem clientes, reacionário ferrenho, chamado Carlos Garcia, residente

em Belém, e que, desde logo, se deu ao cuidado de andar a aliciar os polícias

daquela localidade, dando-lhes 7$500 réis adiantados e ficando com 2$500

réis para si, de comissão, pois que a quantia indicada era a de 10$00 réis.

Eram seus ajudantes o ex-cabo 114 e os ex-guardas da polícia cívica 346 e

1551, que estão presos. As troupes de Faro e de Coimbra, que tinham também

o mesmo encargo de aliciar gente, deram cedo em droga, porque, descobertos

dentro em pouco os seus membros, foram presos e mandados imediatamente

pôr a bom recato.

Além disso, várias damas pertencentes às famílias dos conjurados andavam

por casas particulares estabelecendo o terror, inventando os mais

disparatados boatos, que chegavam até ao saque, enquanto outros agentes

da jesuitada, com muito dinheiro, se entretinham fomentando greves, preparando

insubordinações nos quartéis, com o pretexto no mau estado do rancho.

Este trabalho de toupeira, rastejante, infame e vil, se não deu inteiramente

o resultado que se esperava, conseguiu, no entanto, que o desassossego se

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44 Reto Monico

estabelecesse por vezes e que os conspirantes tivessem conseguido levar para

Espanha uns 250 indivíduos sem ocupação, incapazes, no momento oportuno,

de mexerem um pé em serviço da defunta monarquia, pois que o que

a muitos fez sair do seu país foi apenas a ideia de que poderiam comer à

tripa forra, algibeira quente e cama fofa.

É nisso que se andava, quando, há dias, num carro elétrico, o dr. Abel

de Campos, que foi médico da extinta guarda municipal, encontrando um

indivíduo republicano, que lhe pareceu ser o dr. Carlos Garcia, o chamou

de parte, dizendo-lhe que o Paiva Couceiro o encarregava de um novo aliciamento

de 200 homens e pedindo-lhe que estivesse, no dia imediato, na

avenida da Liberdade, sentado junto do coreto, porque ali lhe iria falar, sobre

o assunto, um tal Mota Cardoso.

Efetivamente, no dia indicado, pelas 10 horas da manhã, o Mota Cardoso,

que é presidente da Juventude Católica de Coimbra, apareceu no local indicado,

seguido, à distância, pelo dr. Abel de Campos, que se deixou ficar a

alguns metros, observando a cena de vista, apareceu e deu voz de prisão ao

Mota Cardoso e a Abel de Campos, os quais, bem como o Carlos Garcia, já

se encontram, como O Século noticiou, presos e bem presos.

Depois, soube-se que a chefia do movimento fora entregue a Mário Pinheiro

Chagas, irmão de Álvaro, tesoureiro, o qual, vendo as barbas do vizinho

a arder, entendeu, por bem, ir para junto do irmão, safando-se de Lisboa,

tendo feito, ontem, outro tanto um indivíduo altamente cotado a cuja prisão

se julgava importantíssima para o caso.

Quanto ao complot no Algarve, também se sabe já que o chefe desse

ramo era o 2 o tenente Alberto Soares, antigo ajudante de Azevedo Coutinho,

ao qual já estava prometido o lugar de governador civil de Faro, no caso do

movimento vingar. Eram seus auxiliares, o estudante da Politécnica Tomás

Maria da Câmara, filho do falecido escritor D. João da Câmara; António Augusto

da Cunha, empregado no consulado de Cuba; Rodrigo Madeira Barrada,

soldado estudante do Curso Superior de Letras; o tenente de cavalaria Jorge

Cabedo e o agrónomo Figueiredo de Melo.

Toda esta gente, assim como Joaquim Correia Serrano, António da Silva

Roquete e Carlos Teixeira, empregados nos serviços fluviais de Setúbal, e que

para o Algarve foram na companhia do António Augusto Cunha, já se encontram

também presos, tendo sucedido outro tanto a um tal Armando Francisco

Ramos, que era o encarregado de ir levar dinheiro ao Entroncamento.

A maior parte dos presos foram antigos alunos dos colégios jesuítas de

Campolide e de S. Fiel.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 45

Como, a substituir o Mário Pinheiro Chagas, fugido há vinte dias, tivesse

ficado com a chefia do complot o comerciante de Lisboa Luís de Almada, a

polícia também lhe deitou a mão seguindo ontem para tribunal, cartório do

escrivão Borges, o ferro-velho António Botelho do Amaral, morador na rua

das Atafonas, 5, 1 o , acusado de conspirar contra a República, tendo-lhe sido

apreendidas duas bandeiras do antigo regime e um quadro alegórico com

uma coroa real. O preso recolheu, sem fiança, à cadeia do Limoeiro, depois

de ter negado a acusação e de haver dito que fora sempre republicano.

— Deu entrada no governo civil, ontem, o ex-soldado 48 da extinta

guarda municipal, João António, preso no quartel dos Paulistas pelo 2 a sargento

Lopes, quando ali andava aliciando praças da guarda republicana e

conspirando contra a República.

— Às 6 horas da tarde, foi preso Manuel de Sousa Pinto, o Caveirinha que

foi empregado da Companhia do Gás, de onde saiu por umas gatunices que

ali praticou, o emérito burlão de criadas de servir, cuja crónica aqui temos

narrado e que tanto se notabilizou no tempo da monarquia, exercendo o vergonhoso

papel de denunciante e bufo ao serviço da polícia. O caveirinha foi

detido à saída do Jardim Botânico, depois de ter andado pelas imediações da

Escola Politécnica, tentando aliar estudantes e os operários de uma tipografia

estabelecida nas proximidades. No momento da prisão, muito povo que se

juntou quis agredir o preso, o qual recolheu, incomunicável, ao calabouço

n. 4 do governo civil.

Às ordens do administrador do conselho de Oeiras, foi ontem também

preso na sua casa situada na estrada da Amadora, o conde de Armil, filho

do lavrador D. Luís do Rego, e um dos mais modernos titulares feitos pelo

ex-rei D. Manuel. O conde de Armil chegou ao governo civil às 4 horas da

tarde, e aí, na casa da guarda, o cabo Valente esteve-lhe tirando o cadastro,

seguindo depois para seção judiciária, onde ficou detido. É acusado de andar,

na Amadora, aliciando gente para a conspiração monárquica, tendo já feito

convite a António Ferreira, proprietário da mercearia Lisbonense; António José

Lopes, industrial, e um empregado deste, os quais se encontram já presos na

cadeia de Oeiras. O conde de Armil foi visitado no governo civil por duas

senhoras e três indivíduos de sua família.

À noite, foram presos e enviados para o governo civil, onde ficaram

incomunicáveis Alfredo Lamas, ex-administrador do extinto Jornal da Noite;

Júlio Guilherme Garcia Alagarim e um indivíduo de apelido La Roche, 2 o

oficial da Caixa Geral de Depósitos, presos quando saíam da casa do primeiro.

Também foi preso à saída de um armeiro, na rua Augusta, o coadjutor da

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46 Reto Monico

freguesia da Pena, e outro padre, os quais, depois de terem sido ouvidos pelo

capitão sr. Câmara Pestana, foram restituídos à liberdade.

Sabemos de fonte segura ser falsa a notícia que correu de que vários oficiais

da guarda fiscal tinham ido pedir ao sr. Ministro da guerra para levantar

a suspensão imposta ao capitão António de Almeida Leitão e fazer terminar

a sindicância a que se está procedendo contra os seus atos. Sabemos, ao

contrário, que os sindicantes já apuraram grandes irregularidades cometidas

pelo mencionado oficial, verificando-se por muitos dos seus atos os desafetos

que nutria pelas novas instituições, chegando o seu ódio pela República

ao ponto de perseguir todas as praças indicadas como republicanas. Igualmente

foram suspensos, por iguais delitos, um sargento da mesma guarda e

o tenente Costa Pereira, subordinado do aludido capitão.”

Ora aí está como o O Século noticia, com o ridículo que merece, a pilheria

da contrarrevolução

Mas. . . há mais ainda a aduzir.

Há o aprisionamento de armas e munições que o vapor alemão Gamma

conduziu para o reacionários.

De há muito que o governo provisório via com maus olhos a proteção

escandalosa que o sr. Canalejas, chefe do gabinete espanhol, dispensava ou

parecia dispensar aos emigrados portugueses na Galiza: militarizavam-se e

exercitavam-se, burlescamente, blasonando alto e bom som uma invasão pela

fronteira de Portugal, que eles projetavam levar a efeito no dia 17 do corrente,

afim de impedir a proclamação da República pela Assembleia Nacional

Constituinte.

Conquanto o governo nada tivesse a temer nesse sentido, porque havia

providenciado para uma repressão imediata e enérgica, guarnecendo devidamente

as fronteiras, contudo indignou-se contra essa criminosa indiferença e

o ilustre sr. Dr. Bernardino Machado, ministro de estrangeiros, fez ver ao sr.

Canalejas a necessidade de serem imediatamente internados os conspiradores

portugueses, a bem da paz, da ordem e da tranquilidade públicas, entre os

dois países, ficarem perfeitamente asseguradas.

O sr. Canalejas despertou, então, de sua letargia e decidiu-se a dar

cumprimento à reclamação do ministro de Portugal.

Houve desde logo uma debandada medonha!

O chefe Couceiro, depois de escoicear a valer, revoltado com essa perseguição

movida contra ele e sua gente, desapareceu, constando achar-se oculto

a bordo do referido vapor alemão, condutor da preciosa carga, apreendida.

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A Federação (1911-1912) 47

Eis como se deu essa apreensão, para a qual, seja dito em abono da

verdade, muito cooperou o valioso auxílio dos republicanos espanhóis e a

atividade das autoridades consulares portuguesas naquela nação.

Tem a palavra o correspondente de O Século em Ourense, Espanha, que

detalhadamente narra esse fracasso da conspirata:

“Quando aqui em Pontevedra as autoridades, com a intervenção de alguns

republicanos, apreenderam os vagões que conduziam armamento para

os conspiradores às ordens de Paiva Couceiro, disse-se, e alguns jornais espanhóis

o afirmaram, que o contrabando tinha sido desembarcado em Villagarcía

de bordo do vapor alemão Gemma. Apesar disso, umas breves declarações

do comandante desse vapor bastaram para que livremente, ele pudesse levantar

ferro e seguir rumo desconhecido, sem que a menor vigilância no mar

o impedisse duma nova tentativa de desembarque.

E foi assim que, durante todos estes dias, o Gemma cruzou nas costa

da Galiza, esperando ordens e ensejo favorável para alijar a comprometedora

carga.

Ontem, sobre o pretexto de que necessitava meter a bordo mantimento

e água, o Gemma entrou em Curcubión, pequeno porto situado do próximo

cabo Finisterra, sem dúvida na intenção de desembarcar o contrabando e,

naturalmente, porque o seu comandante confiava em que ali, como em Villagarcía,

as autoridades teriam para com ela a mesma excessiva benevolência.

Enganou-se, porém, o comandante do Gemma. O sr. Cabrinety, chefe

da Alfândega de Curcubión, sabendo as suspeitas que recaíam sobre aquele

vapor, apressou-se a cumprir o seu dever. Fez-se conduzir a bordo e exigiu

do comandante os respetivos documentos. Estes, perfeitamente em ordem,

diziam que o carregamento era composto de pertences de máquinas, porém, o

sr. Cabrinety, apesar dos protestos do comandante, quis verificar o conteúdo

de uma das caixas, que, em grande quantidade, estavam empilhadas no

convés por certo, para facilitar um desembarque rápido.

A primeira caixa que os guardas da Alfândega abriram continha espingardas

alemãs e umas outras que em seguida foram examinadas, estavam

cheias de cartuchos e correame. O sr. Cabrinety não levou mais longe as

suas investigações, ordenando imediatamente que fossem selados os porões

do Gemma e todas as caixas que se encontravam no convés.

Entretanto, o comandante e os marinheiros do vapor eram submetidos a

um interrogatório, de que as autoridades apuraram que em Finisterra tinham

desembarcado dois indivíduos, que a bordo eram tratados com toda a deferênwww.lusosofia.net


48 Reto Monico

cia, e os guardas tomavam conta do vapor, impedindo que os outros tripulantes

desembarcassem.

A notícia da apreensão do vapor contrabandista causou aqui e em Curcubión

a natural satisfação que todos os bons liberais e republicanos têm ao ver

o fracasso dos conspiradores portugueses e seus aliados reacionários espanhóis.

Apesar da confiança que em Curcubión todos depositam na honradez

do sr. Cabrinety, os republicanos, porque se guarda extraordinária reserva sobre

tudo o que se relaciona com a apreensão do Gemma e porque há pessoas

que dizem não ter importância o caso, afirmando mesmo que a bordo não se

encontravam armas, estabeleceram um serviço especial de vigilância em toda

a praia, para que os carabineiros sejam imediatamente avisados de qualquer

manobra suspeita.

Na Alfândega, atendendo à gravidade do caso, negam-se a fornecer informações.

Não obstante, ouvi dizer que o carregamento do Gemma, classificado

como máquinas elétricas, vinha consignado a um ferrenho clerical da Galiza.

Em Curcubión, devia ficar armazenado alguns dias, esperando que terminasse

a excitação que o caso de Villagarcía provocou, para depois ser conduzido

em camiões automóveis até lugar seguro.

Dos indivíduos desembarcados em Finisterra e que se supõe sejam Paiva

Couceiro e Álvaro Chagas, nada se sabe ainda. A guarda civil procura-os ativamente;

porém, luta contra a falta de informações. Os camponeses, como se

estivessem de acordo, dizem todos que não deram pela presença de nenhum

forasteiro, o que faz suspeita que lhes tenham sido distribuído dinheiro. Sabe-

-se apenas que nas proximidades de Finisterra foi notada a presença de vários

automóveis.

A todas as autoridades das povoações próximas foi dada ordem para que,

imediatamente, avisem da presença de qualquer indivíduo suspeito; porém

aqui julga-se que, dada a prodigalidade dos conspiradores e a proteção que

lhe tem sido dispensada, essas medidas não darão resultado.

Quanto aos conspiradores portugueses, continuam a não ser incomodados

pelas autoridades, que, pelo contrário, os tratam com toda a deferência.

Os republicanos, porém, conservam-se vigilantes, procurando andar ao corrente

de todos os seus manejos. Há dias, constando que num convento desta

cidade estava um carro com armas, os republicanos vigiaram todas as noites

e, por certo, o carro não sairia dali sem que fosse completamente revistado.

Esta vigilância e as diligências feitas pelas autoridades consulares de

Portugal indignam os conspiradores portugueses e os reacionários galegos,

que, se é verdade que não sofram, como eram natural e justo, a perquisição

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A Federação (1911-1912) 49

das autoridades, veem, pouco a pouco, fracassar todos os seus planos imbecis

e idiotas.”

Aí está a que se reduzem, até hoje, a conspiração e os torpes manejos

dessa pandilha de traidores à Pátria, já como tais considerados, por que,

sem sincero adeptos à sua causa e sem coragem para um socorrimento qualquer

dentro do país, fogem para o estrangeiro, aliciando lá mercenários para

perturbar somente a boa harmonia entre duas nações amigas.

Não o conseguirão, porém.

A grande maioria do povo espanhol é contrário ao movimento que eles

tentam operar, sem distinção de partidos e de classes, reprova-o ostensivamente;

e a numerosa colónia, aqui residente, terá recebido da população de

Lisboa inequívocas provas de apreço e de simpatia que lhe hão sido tributadas

pela sua correção, elevada estima e lealdade, demonstrada eloquentemente

em todas as solenidades levadas a efeito pelo grande advento da República

Portuguesa.

Ainda ontem foi prestada uma expressiva homenagem à honrada colónia

espanhola aqui domiciliada e levada a efeito no Coliseu pela grupo Pró-Pátria.

Esta festa esteve deveras imponente, atingindo, por vezes, ao auge do

entusiasmo.

O fim dela era prestar um tributo de reconhecimento pela forma alevantada

e digna como fez sentir o seu desagrado perante a complacência das

autoridades da fronteira do país vizinho para com os portugueses que ali

se encontram conspirando contra o atual regime político, e bem assim pelo

empenho por ela manifestado de que o governo da sua nação apresentasse a

reconhecer a República portuguesa.

Presidiu a solenidade o dr. Magalhães Lima, estando presentes o dr.

Manuel Arriaga, Machado Santos, dr. Eusébio Leão, governador civil de Lisboa

e outros republicanos ilustres, que fizeram uso da palavra.

O respeitável democrata Magalhães Lima, dirigindo-se à colónia espanhola,

no vibrante discurso que proferiu, terminou com esta peroração que

provocou os mais ruidosos aplausos da assistência:

“Espanhóis, meus irmãos e meus amigos: dizei os vossos compatriotas

que em Portugal reina a ordem, a disciplina e a cordialidade: dizei-lhes que as

liberdades públicas estão por toda aparte asseguradas; que a República, una e

indivisível, está firmemente consolidada e que nada a poderá derrubar, nem

as restaurações ridículas, nem as perturbações internas, impossíveis, nem os

manejos na fronteira, de vis traidores, que são a desonra do nome português;

dizei-lhes que o povo português, generoso, grande, heroico, pela sua bravura

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50 Reto Monico

indomável, pela sua disciplina e pela sua intrepidez, se impõe à consideração

dos povos.

Viva a fraternidade dos povos! Viva a República.”

(Conclusão) 17

Como que correspondendo a esta bela festa de confraternidade e solidariedade,

El Liberal, de Madrid, conceituadíssimo órgão de publicidade,

estampava no mesmo dia sob o título “Uma Vergonha”, um artigo que assim

termina, conforme telegrama transmitido ao ministro de estrangeiros:

“Não concedemos maior importância a tais conspirantes e consideramo-

-los pitorescos e ridículos em alto grau. Ao que parece, já não se norteiam

no propósito de restaurar a monarquia de D. Manuel ou de colocar D. Miguel

no trono de Portugal. Propõem-se coroar rei dos portugueses o duque de

Abruzos. De qualquer maneira, porém, trata-se de em complot político ou

de um negócio escuro e não se pode tolerar nem mais um escândalo tão

afrontoso.

Nada disso aconteceria se há dois meses se se tivessem detido ou expulsado

de Espanha Paiva Couceiro e Pinheiro Chagas, que, sem o menor

escrúpulo, se têm movido e manobrado publicamente em Vigo, Tui, Pontevedra,

Ourense, Verin, Santiago e Corunha. Confiamos em que terminará agora

a farsa na qual, se não existe para Portugal um sério perigo, há para Espanha

uma qualificado vilipêndio.

Mas se a farsa continuar, iremos nós próprios à fronteira, às províncias

galegas, para denunciar ante o público, não os emigrados que ali se encontram,

mas sim os que os auxiliam e protegem.”

E, se além de tudo isto, ainda for necessário a palavra oficial do governo

para assegurar que a República Portuguesa está perfeitamente consolidada,

aí vai um trecho do discurso proferido também ontem na patriótica festa

republicana, ao descerrar-se a lápide comemorativa do hospital de sangue

na Rotunda da Avenida da Liberdade e à inauguração dos retratos dos drs.

Teófilo Braga, Miguel Bombarda e Bernardino Machado na Cantina do Coração

de Jesus.

Disse o sr. Ministro de estrangeiros:

“[. . . ] Há pouco ainda ao descerrar a lápide do hospital de sangue,

lembrei-me de que, no dia glorioso da revolução, quando os nossos adversários

vinham depor as suas armas, o povo generoso da capital os saudava,

17 A última parte desta “Crónicas de Lisboa” é publicada a 8 de agosto.

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A Federação (1911-1912) 51

querendo dessa maneira significar-lhes que eles cumpriam o seu dever. Porque

a verdade é que, então como hoje, defender a República é defender

Portugal e os vosso filhos.

Ele, que não tem rancores para ninguém e que se esforça sempre por ser

generoso, não pode perdoar, — deve dizê-lo naquele momento — aos que

hoje levantam armas contra a República. E, tanto mais que esses dementados,

que são, indubitavelmente, criminosos, só estão pretendendo perturbar a

nação, como estão ainda lançando dificuldades nas nossas relações internacionais.

Traidores à pátria.

Mas seja quem for, ninguém pode triunfar — certamente — contra a

gloriosa bandeira republicana, que hoje não cobre só o partido que a arvorou,

mas toda a pátria portuguesa. Quem poderá, realmente, impor-se hoje, à

nós, republicanos, que sempre pugnámos pela moralidade e pela justiça, uma

bandeira que sempre condenámos porque representava um regime intolerável.

Ninguém. E deve declarar que os inimigos da República têm de se tratados

como inimigos criminosos da pátria portuguesa. Foi em nome do

patriotismo que em Portugal se fez a República. Só ela pode dar ao nosso

povo a esperança de um porvir glorioso. Pela revolução de 5 de outubro todos

tínhamos de arriscar a vida, embora a maioria da nação tivesse de perdê-la

para salvar o futuro.

Alexandre Herculano, o grande historiador, disse num momento de desânimo;

“Isto dá vontade de morrer.” Ele, orador, vendo a República, dirá

também, que dá vontade de morrer para salvar a pátria. E hoje não há forças

que possam esmagar esta legítima aspiração nacional. É preciso, porém, que

o povo, exército e armada estejam unidos e mantenham a maior coesão.

Persuado-me que, depois de tudo quanto aí fica dito, nada mais será

preciso acrescentar para que os espíritos timoratos se tranquilizem, quanto a

uma possível restauração monárquica em Portugal.

Nem possível, nem provável: Todos e qualquer movimento nesse sentido

seria prontamente sufocado.”

Agora, uns ligeiros comentários:

Nas nações cujo regime político ha passado por uma radical transformação,

existe e existirá sempre certo número de indivíduos que, privados das

regalias e privilégios que usufruíam, das propinas que saboreavam, enfim, —

deposto dos lugares acomodadiços que as decadentes instituições lhes proporcionaram

à farta, não se podem de maneira alguma conformar com a

nova ordem de coisas contrarias à vida folgada e milagrosa que levaram.

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52 Reto Monico

Se os eternos descontentes, os pessimistas, os incontentáveis, que se votam

a um ostracismo voluntário, odiando tudo quanto possa trazer a grandeza

e felicidade da Pátria, embora reconheçam intimamente que a essa grandeza e

felicidade deveriam sacrificar as suas desmedidas senão criminosas ambições.

Temos disto patente exemplo na França e aí mesmo no Brasil.

É uma lei fatal a que país algum deixará de ficar sujeito.

Portugal não poderia de modo algum escapar a ela. Tem como adversários

intransigentes e rancorosos do novo regime uns quantos pseudopatriotas,

uma nova espécie de sebastianistas, que, por muito tempo ainda, alimentarão

a doce esperança de restauração monarquista, não fazendo questão de que

o rei seja D. Manuel ou D. Miguel de Bragança, ou mesmo um príncipe

estrangeiro — o duque dos Abruzos. O essencial é que seja um homem

qualquer da estirpe real, de sangue ágil, que tome conta do trono e ponha

em frangalhos a honra, a riqueza e as glórias nacionais!

São bem conhecidos os seus intuitos. . . E, como ódio velho não cansa,

terá Portugal a importuná-lo por largos anos esses piolhos-ladros para cujo

extermínio bastará apenas alguns vidros de pomada mercurial. . .

E no entanto, esses pruridos de contrarrevolução poderiam desaparecer

em pouco tempo se fosse aplicada a lei marcial, cujas penas eles dizem

para aí haverem sofrido. . . mas que o próprio governo ignora quem as haja

aplicado.

Nem fuzilamento, nem deportações e nem violência digna de censura há

por aqui a consignar.

O governo tem sido de uma tolerância única!

Apenas recolhe à sombra no Limoeiro ou em qualquer outra casa de bom

abrigo, os pândegos que sentem muito calor no lombo, que têm muito sangue

na guelra ou anda com o miolo mole. . .

Os desta espécie, mais avisado andaria o governo se fizesse recolhê-los

. . . ao hospício de Rilhafoles. [. . . ]

Firmino José Rodrigues 18

18 A 19 de abril, por motivos de saúde, este militar parte de Porto Alegre para o

Rio, onde embarca para a Europa. Regressará ao Rio Grande do Sul em setembro

do mesmo ano. Além destes dois artigos sobre a conspiração monárquica, envia seis

“Crónicas de Lisboa” entre maio e julho, publicadas a 30 de junho, a 7 e 8 de julho,

a 1, 13 e 22 de setembro. As últimas três falam da Constituição portuguesa de 1911. A

5 de outubro de 1911 escreve um artigo muito elogioso acerca do primeiro aniversario

da proclamação da República em Lisboa.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 53

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 19

Rio, 9 — Chegam telegramas de Lisboa noticiando que o governo português

determinou a partida de alguns regimentos para o norte do país.

Continuam ali as prisões de conspiradores contra a República.

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 20

A situação de Portugal

Rio, 30 — Noticiam de Londres que o Daily Express diz que se estão

efetuando ali fortes seguros contra a revolução monárquica em Portugal.

Acrescentam que as autoridades portuguesas, nos últimos dois meses,

tiveram provas que estava em ação uma ativíssima conspiração monárquica

portuguesa, mantida em escala muito vasta por forma a desbancar todos os

obstáculos que se lhe opusessem.

Muitos partidários do rei D. Manuel vieram para Londres, onde se centralizava

a maior atividade do movimento.

Pelo seu lado, muitos rapazes ingleses, sequiosos de aventuras, incorporavam-se

às fileiras realistas.

Ao movimento, estavam ligadas muitas pessoas de notoriedade, sendo que

os que principalmente auxiliavam eram monarquistas residentes em Berlim,

os quais em julho remeteram para a Inglaterra 500 000 libras.

O ex-capitão Paiva Couceiro era o organizador de todo o plano da campanha,

a cargo das tropas da fronteira.

Há apenas dois meses, diz o Daily Express que os preparativos realistas

se tornaram formidáveis.

Consta que o capitão Paiva Couceiro dispões de 70 000 homens bem

armados.

Estão sendo engajados a preços inconcebíveis muitos outros mercenários.

Afirma-se que senhoras espanholas disfarçadas em leiteiros ajudam o

recrutamento e o contrabando de armas.

Muitas outras têm sido enviadas para Hamburgo e muitas também para

Inglaterra.

19 A Federação, 9 de agosto de 1911, p. 4

20 A Federação, 30 de agosto de 1911, p. 4.

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54 Reto Monico

[. . . ]

A importância do contrabando pode bem avaliar-se pela quantidade de

armas sequestradas no Orange e Pontevedra em julho.

Convém acrescentar que em julho descarregaram, furtivamente, em Villa

Garcia, cinco vagões com armamentos.

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 21

Rio, 4 — [. . . ]

Em Lisboa, foram recebidos telegramas de Braga, noticiando que ali se

deu um fato de insubordinação militar, de caráter realista.

E o caso que muitos soldados do 11 o regimento de infantaria se sublevaram,

abandonando o quartel e foram calorosamente aclamados por um

grande número de realistas da localidade.

A situação adquiriu tal gravidade que foi necessário chamar o 18 o regimento

de infantaria, o qual cercou os amotinados e conseguiu, afinal, prendê-

-los.

À noite, em meio de grande excitação, o 11 o regimento de infantaria foi

transferido de Braga para Setúbal.

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 22

Rebentou a guerra franco-alemã?

Invasão monarquista em Portugal

Rio, 6 — Despachos vindos de Lisboa noticiam que telegramas expedidos

de Lamego anunciam que naquela cidade correm, desde manhã, insistentes

boatos de que os conspiradores atravessaram a fronteira na altura da vila de

Chaves e que já se acham dentro do território português.

O regimento de infantaria da guarnição de Lamego está de prevenção,

pronto para marchar, à primeira ordem, contra os invasores.

Esses boatos ainda não tiveram confirmação, mas ainda que sejam verdadeiros,

a vitória das tropas republicanas está absolutamente assegurada.

21 A Federação, 4 de setembro de 1911, p. 2.

22 A Federação, 6 de setembro de 1911, p. 2.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 55

O governo já tomou todas as medidas necessárias para impedir a invasão

dos conspiradores.

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 23

Rio, 10 — Em Lisboa, o sargento Figueiredo e diversos empregados das

estradas de ferro foram presos por se ter averiguado que faziam parte de uma

conspiração monarquista que a polícia agora investiga.

Figueiredo e os demais presos conversavam em uma esquina da rua Santa

Apolónia.

Quando a polícia se aproximou do sargento, este destruiu uma carta que

um dos cúmplices acabava de entregar-lhe.

A polícia conseguiu reconstituir os fragmentos da carta, os quais indicavam

claramente a existência de uma conspiração.

Crónicas de Lisboa

Para A Federação

28 de julho de 1911

A Constituição portuguesa 24

(Conclusão)

[. . . ] E os conspiradores?

Que é feito deles?

Por aqui ignora-se que rumo tomaram

Parece que, com a morte da pobre D. Maria Pia, o diabo os carregou para

as sombreias regiões do Averno.

Todo Portugal goza de plena paz e nas suas fronteiras nem sobra de

couceirista aparece.

O governo deu-se ao trabalho de chamar às armas os reservistas, que

acudiram em massa; e, ao destacá-los para as fronteiras, afugentou por tal

23 A Federação, 11 de setembro de 1911, p. 1.

24 A Federação, 26 de setembro de 1911, p. 1. Este é a última parte da análise sobre

a Constituição de 1911.

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56 Reto Monico

modo essa corja de idiotas, que os guapos rapazes tiveram o desgosto de volver

já a seus lares sem poderem trazer uma orelha sequer, do mais audacioso

conspirador.

Sumiram-se!

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 25

Rio, 1 o — Noticiam de Lisboa que em Braga têm havido algumas prisões.

As forças continuam de prontidão.

A ordem, porém, é completa.

Figueiredo Franco, Figueiredo Faria e Ângelo Coutinho, todos da vila do

Conde, foram presos na Vila Nova de Famalicão, envolvidos em paredes.

Foi preso o abade Gôndara, a quem o povo tentou libertar atacando a

escolta que o prendeu.

Os soldados resistiram.

Os populares foram, afinal, dispersados a tiro.

A estrada de ferro do norte continua rigorosamente vigiada.

Em um quintal de uma casa da cidade do Porto, onde foi preso José de

Barros, apreendeu a polícia grande quantidade de balas de dinamite.

Nos motins de Vila Nova de Gaia muitos policiais estão implicados.

Foram encontradas em abandono 19 carabinas Mauser e muitas balas.

Em Santo Tirso, onde o movimento foi dirigido pelos padres, foi hoje

detido o conde de Restelo.

O governo já conseguiu averiguar que a tentativa de revolução que manifestou-se

no Porto tinha ramificações nas paredes de Guimarães, Fafe, Santo

Tirso e Passos Ferreira.

Em todas essas povoações, a ordem está perfeitamente restabelecida.

As tropas continuam efetuando numerosas prisões, principalmente no

Porto.

Em vários pontos do Porto e povoações que entravam no movimento foi

apreendida grande quantidade de material de que se iam servir os revolucionários.

No Porto, os populares assaltaram uma livraria católica e despedaçaram

uma vitrine onde estava exposto o retrato de D. Manuel, tendo por baixo a

legenda: O bom filho à sua casa voltará.

25 A Federação, 3 de outubro de 1911, p. 1.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 57

Um incêndio destruiu o círculo católico.

Uma notícia oficial declarara que, por estarem comprometidos no movimento

revolucionários, foram presos cento e quarenta e quatro paisanos, dois

majores reformados, dois capitães, quatro sargentos e três cadetes.

O governo toma rigorosas medidas no sentido de impedir a fuga dos

restantes indivíduos comprometidos no movimento abortado.

Foi assaltada uma casa onde a polícia realizou a prisão de sete indivíduos

que mantinham relações com chefes do movimento que deveria iniciar-se no

Porto e outros pontos do norte.

Na mesma casa, foram apreendidas umas poucas bandeiras e algumas

armas.

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 26

Rio, 3 — Dizem de Lisboa que descobriu-se um atentado que teria por

fim destruir a ponte dos caminhos de ferro entre Fratel e Rodam.

Desse ponto foram cortados os fios telegráficos.

Por ali perto encontraram-se algumas bombas de dinamite e estopins.

As autoridades procuram ativamente os criminosos.

O desembarque dos indivíduos presos no Porto e a sua passagem para

as fortalezas de Lisboa provocaram certas manifestações, mais ou menos

violentas, que a polícia não pude evitar completamente.

A população vociferava, principalmente contra os padres, alguns dos quais

obrigou a beijar a bandeira nacional e dar vivas à República.

A maioria dos presos compõe-se de operários.

Os presos do Limoeiro estão revoltados, porque não querem estar dentro

da mesma cadeia em que se acha o ladrão e assassino “Manuelinho”, que,

ainda anteontem, esfaqueou um dos seus companheiro de cela [. . . ]

26 A Federação, 4 de outubro de 1911, p. 1.

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58 Reto Monico

Data memorável 27

[. . . ]

É preciso estar-se lá, como nós estivemos, para partilhar-se emotivamente

do frenesi patriótico daquele povo e admirar-se quão intenso é o seu júbilo,

por demais comunicativo, ardoroso, sempre pronto a bater-se pela sua querida

República e por ela derramar seu sangue generoso!

Forjiquem os sanhudos reacionários quantos telegramas quiserem, com o

perverso intuito de perturbarem as relações comerciais da gloriosa terra em

que viram a luz; mantenham eles e seus comparsas de saias por muito tempo

esses pruridos de restauração monárquica.. . .

Tudo será em vão.

Portugal, forte pelo heroísmo da sua raça, grande pelo civismo de seus

filhos leais e dedicados varonil ainda como nos tempos de outrora, esmagará

facilmente a hidra reacionária que atentar contra a consolidação do novo

regime e vier perturbar o progresso e a felicidade da nação, ora reabilitada

no conceito de todas as potências do mundo. [. . . ]

Firmino J. Rodrigues

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 28

Rio, 4 — [. . . ] Os emigrados portugueses em Vigo afirmam que o ex-

-capitão Paiva Couceiro conseguiu levantar em favor da monarquia a vila de

Chaves e a cifdade de Braga.

Espera que o comandante das forças realistas consiga recrutar trinta mil

homens.

27 A Federação, 5 de outubro de 1911, p. 1. No primeiro aniversário da proclamação

da república em Lisboa, o editorial do quotidiano de Porto Alegre é dedicado à jovem

república irmã. Também na mesma primeira página, Firmino José Rodrigues escreve

um texto onde incensa a república portuguesa, fazendo referência aos conspiradores

monárquicos.

28 A Federação, 6 de outubro de 1911, p. 1 e 2.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 59

Paiva Couceiro, segundo os emigrados, estabelecerá o seu quartel general

na cidade do Porto que será declarada capital da monarquia.

Alguns desses emigrados acrescentam que estão na fronteira da Galiza,

desde La Guardia até Aiamonte, dois mil portugueses armados e preparados

para entrar em Portugal ao primeiro aviso.

Entre os supostos chefes das tropas invasoras figura o ex-capitão do

exército português Homem Cristo, pai.

Os mesmos informantes afirmam que nos recentes sucessos do Porto

ficaram gravemente feridos vinte e seis paisanos.

O conspirador Homem Cristo filho está atualmente em Vigo.

Rio, 5 — Desde o dia 1º até agora chegam notícias sobre o movimento

restaurador de Portugal, as quais não inspiram confiança, porque são contraditórias

entre si.

Cada partido diz aquilo que lhe convém.

Das capitais estrangeiras, nos últimos dias, têm chegado notícias de uma

verdadeira conflagração em Portugal.

As que vêm de Lisboa, porém, são melhores, falam de tranquilidade, etc.

O Jornal do Comércio publica, hoje, o seguinte telegrama do seu correspondente

em Londres:

“D. Manuel de Bragança, que estava passando uma temporada em Penrith,

no castelo de Lowther, com hóspede de lord Lonsdale, regressou inesperadamente

a Londres, à meia noite de ontem.

A informação que circula em rodas de monarquistas portugueses, nesta

capital, é que todo o norte de Portugal, com exceção do Porto, está virtualmente

em poder dos restauradores, os quais já ocuparam Chaves, Guimarães,

Barra [sic!] e Bragança.

D. Manuel II, apenas chegado a Richmond, onde se acha situado o Centro

Monarquista, esteve em constante comunicação com os seus partidários.

Informações vinda de França confirmam que as províncias do Minho e

Trás-os-Montes já proclamaram D. Manuel como o rei de Portugal.

Um íntimo do ex-monarca, conversando hoje comigo, disse-me que essas

províncias, contados os efetivos militares que os guarnecem, compreendem

6.000 monarquistas.

Em Richmond é convicção geral que os camponeses favorecem a monarquia.

Espera-se que o movimento restaurador encontre a máxima resistência

na cidade de Lisboa e do Porto, mas sabe-se que mesmo aí lavra, entre o

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60 Reto Monico

exército, um grande descontentamento que se comunica às classes comerciais,

que vivem desde há muito em uma situação deplorável.

O ex-rei D. Manuel não irá imediatamente a Portugal, segundo se presume

das declarações do meu informante de hoje. Quando, porém, o país

estiver pronto para recebê-lo, acrescentou, o rei estará ao serviço dos seus

partidários.

Segundo outras comunicações, D. Manuel tem assistido, desde ontem, a

importantes conferências entre chefes monarquistas.

As recentes prisões efetuadas em consequência do movimento do Porto,

explicam-na os realistas como um hábil estratagema dos seus correligionários,

cujo objetivo, fazendo-se prender, è ser enviado para bordo dos navios de

guerra, para ali porem em ação os seus planos.

Entretanto, devo dizer, para manter neste assunto meu propósito de inteira

imparcialidade, que as casas da City que têm negócios com a praça do

Porto receberam informações de que o movimento realista que ali estalou

há dias não teve a mínima importância. Tão tranquilas se mostram essas

casas, que nem sequer se dão ao incómodo de segurar contra os riscos de

um movimento armado as mercadorias que despacham com aquele destino.”

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 29

—————

A invasão em Portugal

Rio, 6 — Comunicam de Badajoz para Madrid saber-se naquela cidade

que o capitão Paiva Couceiro está distribuindo pela povoações de norte de

Portugal um manifesto declarando que se propõe a assumir provisoriamente

o governo, de corporação com uma junta governista que, oportunamente,

será criada.

O governo provisório, segundo diz o referido manifesto, não fará nenhuma

reforma; fará leis e somente tomará as medidas que julgar convenientes para

restabelecer o regime monárquico em Portugal.

De Santiago de Compostela também informa que o estado-maior das

tropas turcas [??] realistas já entrou em Portugal e foi admiravelmente recebido

pelas populações rurais.

29 A Federação, 7 de outubro de 1911, p. 1.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 61

Compõe-se esse estado-maior dos ex-capitães Paiva Couceiro, Raul Camacho,

Homem Cristo pai e conselheiro José Azevedo Castelo Branco.

Acompanha o estado-maior, como adido, o príncipe Francisco José de

Bragança.

Em Santiago também se sabe que as forças monarquistas invadiram Portugal

pelo norte, entrando por Bragança.

A primeira força que passou a fronteira foi uma secção de cavalaria sob

o comando do capitão Almeida.

As forças foram divididas em duas colunas de dois mil homens cada uma

delas.

Está comandada a primeira pelo capitão Paiva Couceiro e a segunda pelo

ex-capitão Camacho.

A coluna de Paiva Couceiro é formada de infantaria e cavalaria e doze

peça de artilharia.

A segunda compõe-se de forças de infantaria e alguma de cavalaria,

quatro canhões de campanha e várias metralhadoras.

Parece que a maior parte dos soldados da primeira comuna são reservistas

e desertores do exército português.

Durante muitos dias todas essas forças estiveram na cidade de Zamora,

onde tinham armamentos escondidos.

No decorrer deste tempo, os oficiais compraram grande quantidade de

cavalos, não só na cidade, como nas povoações dos arredores.

As tropas realistas, segundo informações autorizadas, estão exercitadas e

armadas como qualquer exército regular.

Quando a coluna de Paiva Couceiro entrou em Bragança, a população

recebeu delirantes manifestações de regozijo.

Paiva Couceiro foi entusiasticamente aclamado por toda a guarnição da

cidade, composta dos corpos de infantaria 10, cavalaria 6, e que se juntou

aos realistas sem que se tivesse disparado nem sequer um tiro.

Em Chaves entrou a coluna do ex-capitão Camacho.

A guarnição rendeu-se imediatamente, com exceção de um regimento

que ainda tentou resistir às tropas invasoras.

Trocados, porém, os primeiros tiros todos os soldados, desobedecendo às

ordens superiores, se passaram para os monárquicos.

O povo concorreu também bastante para que esse regimento fizesse causa

comum com os realistas.

Poucos soldados que não quiseram aderir à causa monárquica foram

presos e desarmados.

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62 Reto Monico

Segundo se diz, a guarnição de Vila Chaves constava de três mil homens

de todas as armas.

Há que afirme que Paiva Couceiro se encontra já na cidade de Braga.

[. . . ]

Noticiam de Londres que o Daily Mail publica telegramas de Vigo que as

forças monarquistas invadiram três pontos do território português.

O capitão Paiva Couceiro, à frente de 2.000 homens, entrou em Bragança,

cuja população recebeu com grande contentamento a bandeira monárquica

alvorada nos edifícios públicos da cidade.

O capitão Camacho, com 1.800 homens e quatro canhões, entrou em

Chaves, cuja guarnição é composta de 3.000 homens que lhe aderiram em

massa.

A maioria do exército sulista, compõe-se de reservistas, estudantes, padres

e filhos de famílias pobres.

Os capitães Machado e Homem Cristo comandam cada qual sua coluna

invasora.

Consta que alguns oficias que em Chaves e Bragança tentaram organizar

a resistência foram fuzilados.

[. . . ]

Comunicam de Badajoz para Londres que na cidade portuguesa de Guimarães

se deu grande luta entre os monárquicos e republicanos.

As tropas da guarnição da cidade dividiram-se pelos dois partidos assumindo

então o conflito um caráter de verdadeiro combate.

Afinal os monarquistas triunfaram proclamando rei D. Manuel de Bragança.

Telegramas da mesma procedência dizem que perto do Porto os carbonários

incendiaram a casa de um padre de nome Mayer.

Em casa, uma sua filha foi barbaramente espancada.

Dizem que ainda em Badajoz dois regimentos da cidade do Porto se

amotinaram e que em Viana do Castelo foi proclamada a monarquia.

[. . . ]

Os jornais de Paris continuam a publicar notícias sobre a invasão de

Portugal.

A legação portuguesa continua a desmentir tais notícias dizendo que a

obra dos monarquistas é para armar o efeito.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 63

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 30

—————

Ainda a invasão em Portugal

Rio, 7 (Recebido às 5 horas e 30 da tarde) — Comunicam de Paris que o

jornal Le Temps, em notícia de última hora, enviada pelo seu correspondente

em S. Sebastián narra o seguinte:

“Foi visto em uma carruagem de estrada de ferro Sud-Espress, o ex-rei

Manuel disfarçado, com o bonê enterrado até os olhos.

O ex-monarca ia acompanhado por oito portugueses, que com ele se

dirigiram para a cidade do Porto.

Parece que faz parte do grupo o ex-infante D. Afonso.”

O correspondente do mesmo jornal em Irún confirma esta notícia.

Entretanto, no banquete realizado ainda ontem em Paris e comemorativo

ao aniversário da República, o dr. Magalhães Lima afirmava que esta seria

eterna em Portugal.

Dizem de Lisboa que o governo telegrafou para todas as legações desmentindo

que o norte de Portugal tenha caído em poder dos monarquistas.

Aquelo governo diz no mesmo telegrama que tais notícias não passam de

pura fantasia.

[. . . ]

Noticiam de Paris que Homem Cristo filho telegrafou de Tui ao Intransigeant,

dizendo que mil monarquistas comandados pelo capitão Paiva Couceiro,

João de Almeida e por seu pai, compreendendo cavalaria, infantaria e artilharia,

proclamaram a monarquia em Braga, no meio do maior júbilo e

entusiasmo.

Diz mais: “Separei-me ontem das tropas e vim aqui para telegrafar dando

notícias, pois os fios telegráficos portugueses estão cortados.”

O Jornal do Comércio recebeu, na madrugada de hoje, o seguinte telegrama

de Londres:

“Os acontecimentos de Portugal ocupam lugar preponderante nos jornais

que serão publicados amanhã.

Telegramas de Lisboa anunciam que 700 realistas, às ordens dos capitães

Cobra e Camacho ocuparam França, Carregosa, Espinhozelo, Paço do Soutelo

e Parâmio.

Havia, além disso, 3.000 concentrados em diversos lugares, que já se

uniram àqueles.

30 A Federação, 9 de outubro de 1911, p. 1 e 2.

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64 Reto Monico

Também há uma força monarquista em Vinhas [sic!].

As forças republicanas que ali estavam reforçaram Chaves.

Os monarquistas que estão em Vinhais esperam a coluna do capitão Paiva

Couceiro que vem por Verim.

O aviso 5 de Outubro partiu em missão urgente com destino ignorado.

Ontem à meia noite, inesperadamente, os oficiais do aviso tiveram ordem

de seguir para bordo.

É oficial a notícia da invasão realista em Vinhais.

Ela se limita, porém, aos lugarejos citados, onde tem havido alguns encontros,

com poucas baixas.

Os telégrafos nos lugares onde tinham sido cortados foram reparados.

O governo dispõe de 8.000 homens na fronteira, com elementos suficientes

para restabelecer a ordem.

De Aveiro seguiu um regimento para o Porto e outro com destino a

Bragança.

De Lisboa partiu com igual destino uma companhia de metralhadoras.

No Porto está ancorado um transporte com tropas, que desembarcarão

ou não como for necessário.

A notícia da entrada dos monarquista em Chaves e Guimarães está desmentida.

Para Bragança segue o ministro das obras públicas.

Com igual destino seguem também oficiais superiores do estado-maior.”

[. . . ]

O jornal Liberté, de Paris, diz que os monarquistas portugueses compraram

um dreadnought de 16.000 toneladas, tripulado por marinheiros portugueses,

e outro couraçado de menos importância, os quais se acham prontos

para entrar em ação quando preciso.

Telegramas de Badajoz anunciam que em combate perto do Porto os

realistas perderam vinte homens.

À meia noite de ontem, houve outro combate em Bragança entre as forças

realistas, ao mando do ex-capitão Paiva Couceiro e as tropas do governo.

Os monarquistas foram finalmente rechaçados. Do lado dos republicanos,

houve a morte de um soldado.

Outros telegramas anunciam que uma força de 700 realistas, a mando do

ex-capitão Camacho, ocupou as povoações de França, Pedregosa, Espinhozelo,

Paço do Soutelo e Parâmio.

Juntaram-se a essa força 2.000 homens, vindo de todos os pontos das

montanhas vizinhas.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 65

Deram naquelas localidades pequenas escaramuças.

Foi restabelecido o telégrafo para Bragança, cortado na véspera.

Enviaram-se forças das guarnições de Vila Real, Porto, Aveiro para reforçar

Vinhais, onde as operações são difíceis, por se prestar o distrito à luta de

guerrilhas.

O Sud-Express continua a conduzir daí para a fronteira monarquistas

portugueses.

[. . . ]

Rio, 8 — Dizem de Paris que as notícias vinda de Portugal até agora

pouco adiantam às que já foram divulgadas.

Sabe-se que o ex-rei D. Manuel continua em Londres.

Entretanto, respondendo ao correspondente do Matin em Lisboa, o presidente

do conselho de ministros João Chagas, confessou que — efetivamente

— o ex-capitão Paiva Couceiro invadiu, com 2.500 homens armados de fuzis

e revólvers o distrito de Bragança. O governo deixá-los-á avançar, para melhor

impedir que, na retirada, eles invadam a Espanha. Entretanto, na vila de

Macedo, por exemplo, a própria população os forçou a retirar-se. Todas as

medidas militares estão tomadas de moda a não ser necessário desguarnecer

nenhum ponto importante. Também nas aldeias vizinhas a Castelo Branco, os

conspiradores vindos da Espanha penetraram à noite, sublevando populares

apoiados por antigos monarquistas influente dessas localidades. Bastarão, porém,

alguns destacamentos para restabelecer a ordem e prender os cabecilhas

do movimento — concluiu Chagas.

Dizem mais de Paris que, naquela capital, o maior interesse acerca dos

acontecimentos reside em saber quem elevarão os realistas ao trono, si porventura

forem bem sucedidos na contrarrevolução que agora iniciaram.

As opiniões são geralmente em favor de d. José de Bragança, que com os

seus dois irmãos, está tomando parte nas operações.

A legação de Portugal em Paris declara ter recebido informação fidedigna

de que a invasão foi rechaçada.

Telegramas de Badajoz anunciam que o ex-capitão Paiva Couceiro entrou

em Vinhais com uma bandeira branca, trazendo no centro a Cruz de Malta,

à frente de um forte estado-maior.

As forças inimigas, que se calcula encontrar-se-ão na Torre de Dona

Chama (Concelho de Mirandela, a 23 quilómetros da estação do mesmo

nome), ferirão aí uma batalha decisiva.

O governo anunciou nas cidades e vilas do norte que apenas ali ocorram

distúrbios ou haja prenúncios de desordem, fará cercar as residências de

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66 Reto Monico

todos os reacionários.

Telegramas de Lisboa anunciam que de Chaves partiram tropas com destino

a Vinhais e Bragança.

A Chaves já chegaram tropas republicanas com um avultado efetivo.

Os telégrafos voltaram a funcionar estão restabelecidas as comunicações

entre Porto e Bragança.

Em todos os lugarejos onde se produziram pequenos distúrbios, já se

acha restabelecida a ordem.

O cônsul de Espanha no Porto visitou o governador da cidade e manifestou-lhe

o desejo de auxiliar as autoridades em prol da manutenção da ordem.

Afirmou o mesmo representante espanhol ao governador que não havia

funcionário algum no consulado interessado na política nacional portuguesa.

E concluiu manifestando o desejo de ver fortalecidas as relações de amizade

entre a população do Porto e o seu país.

[. . . ]

Rio Grande, 9 — O Centro Republicano Português festejou com grande

entusiasmo o desmentido sobre a restauração monárquica em Portugal.

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 31

Rio, 9 (recebido hoje pela manhã) [. . . ]

Noticiam de Lisboa que o capitão Paiva Couceiro que, com 1 200 homens

tomou a vila de Vinhais, ao norte da província de Trás-os-Montes, perto da

fronteira, fez arriar a bandeira nacional da fachada do edifício da câmara

municipal e arvorar em seu lugar a bandeira azul e branca.

As forças destacadas em Chaves, ocupando a vila, substituíram imediatamente

as bandeiras.

Os conspiradores batidos e perseguidos fogem para Espanha.

Em numerosas povoações daquela região se fizeram manifestações republicanas

de simpatia ao atual governo.

Consta ter o governo seguras informações que o infante d. Afonso, Azeredo

Coutinho e Mário Pinheiro Chagas se acham em Galiza.

31 A Federação, 10 de outubro de 1911, p. 1 e 2.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 67

Idênticas diligências se procede ainda em Braga.

[. . . ]

O bispo de Portalegre recomendou expressamente aos párocos da sua

diocese, que se não metessem em movimento contra as instituições republicanas.

[. . . ]

Referem de Lisboa que as últimas notícias recebidas de Vinhais asseguram

que as forças realistas que foram batidas pelas tropas republicanas se

compunham de quatrocentos homens bem armado e muitos outros munidos

de carabinas antigas e ainda outros de revólvers e pistolas.

Os conspiradores foram enfrentados por um destacamento de sessenta

praças, que estava em Vinhais e que sustentou o fogo contra os invasores por

espaço de uma hora.

Os monárquicos atacavam energicamente os soldados republicanos; porém,

sabendo eles que se aproximavam da vila algumas forças legais, fugiram

e se concentraram no monte da Cova, nas proximidades da referida vila.

De Bragança já seguiram para Vinhais alguns reforços de infantaria e

varias metralhadoras.

Do Porto partiram também para Bragança quatrocentos marinheiros.

No combate que os republicanos travaram com os invasores, nas proximidades

da aldeia de Moimenta da Raia, a oito quilómetros para norte de

Vinhais, houve algumas perdas de lado a lado.

O ex-infante d. Afonso passou em Irún, em direção a Medina. [. . . ]

Pelotas, 10 — [. . . ]

Domingo, à noite, os salões do Grémio Republicano Português estiveram

repletos de pessoas gradas, tocando a banda de música União.

Foram erguidos vivas às Repúblicas do Brasil e Portugal, havendo muita

alegria pelas notícias favoráveis à República.

Rio, 10 — Não há nenhuma notícia interessante vinda de Lisboa sobre a

revolução monarquista.

Continuam ali as prisões dos conspiradores e as deserções das forças

realistas sempre perseguidas pelas republicanas, que tentam cercá-las.

No Tejo, vários navios permanecem de prevenção.

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68 Reto Monico

VÁRIAS 32

[. . . ]

O cônsul de Portugal, dr. Sampaio Garrido, recebeu, hoje o seguinte

telegrama: “Rio, 9 — Ordem completa todo país. Tentativas sublevação

frustradas. Seguiram forças envolver bando fugitivo, mas proibidas combater

junto fronteira. Ontem, último dia festas, iluminou toda Lisboa. Grande

multidão rua. Espetáculo gala Coliseu. Presidente delirantemente aclamado.

— Fidalgo, secretário da legação.”

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 33

[. . . ]

Rio, 11 — Referem de Lisboa que o governo tem recebido constantes

notícias da derrota dos monárquicos em todos os pontos onde se acham.

Os carbonários assaltaram o convento de São Paulo, destruindo tudo.

O governo tem na fronteira 5.000 homens.

VÁRIAS 34

[. . . ]

O nosso amigo Firmino José Rodrigues antes de regressar da Europa

providenciou para que a Federação continuasse a publicar crónicas de Lisboa,

deixando naquela cidade quem o substituísse.

Ontem recebemos a primeira dessas novas missivas, que publicaremos

depois de amanhã, e na qual já se prenunciam, conquanto vagamente, os

acontecimentos que os telegramas nos têm, quiçá exageradamente, noticiado,

com relação às invasões pelas fronteiras de Portugal.

O atual correspondente da Federação que usa o pseudónimo Danton é

um intelectual bem cotado na imprensa portuguesa, extreme de paixões partidárias

e perfeitamente a par do que se passa pelas altas regiões políticas de

Portugal

32 A Federação, 10 de outubro de 1911, p. 3.

33 A Federação, 11 de outubro de 1911, p. 4.

34 A Federação, 11 de outubro de 1911, p. 4.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 69

Ficará, portanto, esta folha devidamente habilitada a orientar, quinzenalmente,

os seus leitores do que, de real, ocorrer naquele país.

Crónicas de Lisboa

(Para A Federação) 35

14 de setembro de 1911

Ao encetar estas despretensiosas crónicas para o jornal A Federação,

cumpre-me pedir aos naturais da florescente República Brasileira e aos meus

compatriotas residentes nesse hospitaleiro país me revelem qualquer falta

involuntária, que porventura possa cometer.

Dito isto, entremos no assunto.

* * *

Depois de eleito o presidente da República, o dr. Manoel de Arriaga,

figura prestigiosa do partido democrático, onde milita há longos anos e a que

tem prestado relevantíssimos serviços, a ponto de por ele ter sacrificado os

seus interesses, — o governo provisório, como lhe cumpria, pediu a demissão

e foi substituído por um gabinete presidido pelo sr. João Chagas, onde se

encontram também individualidades de alto valor.

O governo provisório da República Portuguesa arcou com imensas responsabilidades:

encontrou no seu caminho atritos que nem de longe se podem

imaginar; e, se não os venceu — porque para tal serviço seriam precisos os

sete trabalhos de Hércules — mereceu contudo a maior benemerência do

país, pelos seus esforços e boa vontade. Para lhe continuar a obra, é preciso,

porém, ter agora vontade enérgica e pulso de ferro, o que esperamos se

encontrará no atual gabinete.

Pela demasiada brandura com que foram tratados diversos indivíduos

conhecidos pelas suas ideias reacionárias, se criaram grandes estorvos à República,

que hoje se vê a braços com as dificuldades que esses indivíduos lhe

estão criando lá fora. Levados por uma falsa orientação e servindo de joguete

aos que desta terra foram banidos para pôr-se cobro a tantas delapidações, a

tantas misérias e vergonhas, que faziam com que no estrangeiro fosse arrastado

pela lama o nome de Portugal, lá andam esses famosos conspiradores

pelas terras espanholas próximo da fronteira, ameaçando este mundo e o

35 A Federação, 13 de outubro de 1911, p. 1.

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70 Reto Monico

outro com as suas quixotescas arremetidas, não se atrevendo a entrar em

Portugal, porque sabem a sorte que os espera ao passarem a fronteira.

Esses renegados da pátria, filhos que cospem na face da mãe que sempre

os tratou com carinho e amor, só merecem o desprezo dos verdadeiros patriotas,

porque têm gravado nas faces, com um ferro em brasa, o vergonhoso

estigma de traidores.

Efetivamente, os desgraçados vêm-se entre dois fogos: — de um lado, os

que lhes fornecem dinheiro para essa campanha vergonhosa incitam-nos a

cumprirem o que prometeram, sob pena de serem alcunhados de homens de

má fé: de outro — aqueles contra quem querem combater esperam-nos ao

primeiro impulso.

Se numa invasão estrangeira todos se levantam como um só homem para

defender a pátria, com muito mais razão se erguerão todos os portugueses

amantes da sua terra para expulsarem dela os que mercadejam a honra e a

dignidade do país que lhes foi berço.

A esses infelizes, que receberam os trinta dinheiros, como Judas, resta

ainda o recurso a que se socorreu o discípulo traidor — enforcarem-se, que

por isso não virá mal ao mundo.

Mas nada disto sucederia, não teria havido tanto gasto de dinheiro, nem

tanto dispêndio das forças vivas da nação, se se tivessem conservado esses

homens guardados a bom recato numa prisão do Estado. Desse modo não

andariam eles agora maculando lá por fora o nosso país com a sua baba

peçonhenta.

Um deles, que só tratava de nos desacreditar, foi expulso de Madrid; mas

já está em Roma despejando contra todos todo o fel que lhe vai na alma

rancorosa.

Felizmente, os portugueses que se encontram nessa terra têm acudido em

defesa do seu país, desmentindo as calúnias e confundindo os caluniadores.

Nas prisões é que eles deviam estar, como criminosos que são.

“Quem o seu inimigo poupa, nas mãos lhe morre.”

* * *

O partido republicano, como é natural, dividiu-se agora em diferentes

fações, mas todas elas concordaram em dar o seu apoio ao atual ministério.

E assim deve ser.

A ora ainda é de luta e todos se devem dar as mãos para mostrarem que

estão unidos no mesmo ideal — o bem da pátria.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 71

A República Portuguesa está consolidada, não baqueia agora, nem baqueará

nunca! Mas. . . é preciso que todos conjuguem os seus esforços para

que ela seja sólida e douradora. Aos embates vis desses que a pretendem

desequilibrar, correspondamos nós com o impulso valente dos nosso braços e

dos nossos corações, para que esses míseros fiquem esmagados debaixo das

rodas do seu carro triunfante. . .

Só assim mostraremos que somos dignos do sistema político que nos

rege, que nos corre nas veias o sangue generoso daqueles que deslumbraram

o mundo com o alto valor dos seus feitos gloriosos.

* * *

A República Portuguesa foi ultimamente reconhecida por mais onze nações,

a saber: Inglaterra, Áustria, Alemanha, Itália, Espanha, Holanda, Bélgica,

Noruega, Dinamarca, Japão e Suécia. Está portanto reconhecida por todas as

nações do mundo.

Foi uma derrocada para os conspiradores, que viram perdidas as suas

esperanças da anunciada invasão em terras portuguesas.

O Brasil, a grande nação nossa irmã, a quem nos ligam os mais íntimos

laços de entranhado afeto, deve regozijar-se com as nossas alegrias, como tem

chorado com as nossas dores. Por isso, nesta hora de júbilo nacional, que o

nosso grito patriótico vá também repercutir além dos mares, nas longínquas

plagas onde se encontram tantos milhares de patrícios nossos.

Viva a República Portuguesa!

Danton

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 36

[. . . ]

Rio, 13 — Referem de Lisboa que, entre os presos políticos vindos do

Porto figuram sete padres e o conde de Restelo.

Os jornais franceses consideram fracassada a revolução realista.

36 A Federação, 13 de outubro de 1911, p. 4.

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72 Reto Monico

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 37

Rio, 14 — [. . . ]

Dizem de Lisboa que em Penafiel foi dada uma busca na casa de Rosa

Pinto Magalhães, onde foram encontrados documentos bastante comprometedores.

Rosa foi detida para averiguações. [. . . ]

Rio, 13 — [. . . ]

Consta em Lisboa que João Chagas rompeu absolutamente com os carbonários,

dispensando o apoio de Machado dos Santos e outros chefes de mais

ou menos prestígio.

O governo português continua mandando forças para o norte, ao encalço

dos realistas.

O cruzador São Rafael parte para o norte.

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 38

Revolução na China

O SÍTIO EM PORTUGAL

[. . . ]

Bagé, 17 [. . . ]

Noticiam de Lisboa que as autoridades espanholas expulsaram de Terrosa

a coluna de Paiva Couceiro.

Este ex-capitão do exército e impenitente inimigo da República, tem sido

de uma admirável tenacidade na sua reação armada.

Consta que os realistas avançam para a fronteira do Minho, afim de

intentar uma nova incursão.

Na Câmara dos Deputados, por ocasião da discussão do projeto que

autoriza o governo a decretar o estado de sítio na capital, conforme pedido

do Presidente Arriaga, o deputado Afonso Costa disse que o movimento contra

o regime republicano fora obra dos clericais.

Propôs, por esse motivo, que o governo fosse autorizado a confiscar os

bens de todos os conspiradores reconhecidos.

37 A Federação, 14 de outubro de 1911, p. 4.

38 A Federação, 17 de outubro de 1911, p. 4.

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A Federação (1911-1912) 73

Nas rodas republicanas há grande animosidade contra o clero, cuja situação

se agrava em vista da invasão armada.

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 39

———

Despacho coletivo. Promoções na pasta da guerra

———

A câmara portuguesa e os conspiradores

Rio, 19 — Referem de Lisboa que foram expulsos de Braga os padres do

Seminário Conciliar.

Os conspiradores mantém as respetivas posições na fronteira da Espanha.

Consta que o ex-capitão Paiva Couceiro avança lentamente pelo Vale do

Minho, contando com o apoio das posições locais.

A câmara portuguesa, por 59 votos contra 53, rejeitou o projeto apresentado

pelo deputado Afonso Costa, determinando que os conspiradores

fossem julgados pelos tribunais comuns, e aprovou a moção mandando que

eles sejam julgados por tribunais especiais.

É ignorado o fim que tiveram os marinheiros que seguiram para a fronteira

espanhola.

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 40

Rio, 20 — Referem de Lisboa que, depois de aprovado pela câmara, o

senado aprovou o projeto governamental contra os conspiradores.

Consta em Londres que as forças de Paiva Couceiro tomaram Montalegre,

onde fizeram entrada triunfal, derrotando os republicanos.

Até agora foram presos em Portugal 2000 conspiradores.

39 A Federação, 19 de outubro de 1911, p. 4.

40 A Federação, 20 de outubro de 1911, p. 4.

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74 Reto Monico

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 41

Rio, 21 — Noticiam de Lisboa que foram recolhidos à Penitenciária trinta

e cinco conspiradores.

Comunicam de Verim que foram presos trinta e sete conspiradores, entre

os quais os príncipes de Bragança, filhos de D. Miguel.

Os vendedores de jornais continuam em parede.

Consta que o gabinete ministerial pedirá brevemente de missão, cedendo

lugar à oposição.

O ex-ministro do governo provisório, António José de Almeida, passava

pelo Rossio quando foi vaiado e quase agredido pela multidão.

A guarda republicana interveio em sua defesa.

Para impressionar o indígena 42

[. . . ]

Mentira como terra tem corrido, nestes últimos tempos, a respeito da

instabilidade da república portuguesa, ameaçada de vir abaixo com uma

saraivada reacionária.

O sossego, porém, é completo, entregue ao próprio povo, liberal e republicano,

a guarda e polícia da comunidade sempre pronto, sempre vigilante!

Há pouco, à noite, constou ao chefe da polícia de Lisboa que três indivíduos,

dois militares e um paisano, tinham entrado dando vivas à monarquia

e a Paiva Couceiro. O fato, depois de averiguado, não tinha importância

absolutamente nenhuma. Tratava-se apenas de três pândegos, que um jantar

nas hortas tinha elevado a uma alegria fora do natural. Para saber do que

se tratava, houve ordem para que o chauffeur, em qualquer parte onde fosse

visto, fosse preso e conduzido ao comando da polícia. Pois foram inúmeras

as vezes que o levaram lá. Em toda a parte onde era encontrado, deitava-lhe

a mão. Vejam como as notícias circulam e como é avultado o número das

pessoas que, voluntariamente, auxiliam a polícia.

Outro caso, também flagrante: Tendo dado ordem para serem detido dois

indivíduos de boina, que, ao que se dizia, estavam em Lisboa em missão

de conspiradores, foram presos dois homens quaisquer, cidadãos pacíficos,

41 A Federação, 21 de outubro de 1911, p. 4.

42 A Federação, 9 de novembro de 1911, p. 3.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 75

que estavam num café saboreando regaladamente um chocolate e que nada

tinham com os conspirantes. . .

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 43

Rio, 18 — Comunicam de Lisboa que foi instalado no convento das Trinas

o tribunal que julgará os conspiradores envolvidos nos últimos acontecimentos.

[. . . ]

Rio Grande, 18 — [. . . ]

O Grémio Republicano Português, tendo sido agredido por membros da

Liga portuguesa, dará queixa a autoridade.

A Liga já constituiu advogado.

Cartas de Lisboa

(Para A Federação) 44

Não param os reacionários nas suas tentativas de conspiração para o

restabelecimento da monarquia. Em 30 de setembro poderia dar-se no Porto

um movimento contra a República que realmente estava bem preparado. Mas

as autoridades foram prevenidas com antecedência e essa tentativa abortou,

como tem sucedido a todas as outras desses lunáticos que pretendem a volta

de um regime de escândalos e adiamentos que nos envergonhava à face da

Europa.

O que mais admira é dar-se um tal caso no Porto, a segunda cidade do

reino [sic!] que tem sido sempre considerada o baluarte das liberdades pátrias.

O Porto de onde partiu a primeira tentativa para a implantação da República

em Portugal, tornado agora esse foco de conspiradores! Cumpre-lhe lavar essa

nódoa expulsando do seu seio os que assim lhe envergonharam as briosas e

43 A Federação, 18 de novembro de 1911, p. 4.

44 A Federação, 22 de novembro de 1911, p. 1 (artigo sem data, enviado por volta

de 25 de outubro).

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76 Reto Monico

heroicas tradições. Entre os conspiradores havia militares, polícias, empregados

do caminho de ferro e sacerdotes; estes principalmente têm empregado

todos os seus esforços para derrubar as nossas instituições, servindo-se das

armas poderosas que possuem para aliciar consciências.

É preciso que se dê um exemplo frisante para acabar de uma vez para

sempre com tal estado de coisas. O país não pode estar à mercê de um

bando de faciosos que, esquecendo-se de todas as noções de dignidade e

do patriotismo, pretendeu voltar aos tempos ominosos da monarquia. Está

provado que só o sistema republicano pode salvar o país dos erros e das

vergonhas a que o levaram tantos anos de torpezas e de delapidações; pois

quem foi verdadeiramente português deve pôr de parte as suas opiniões

erróneas e trabalhar para o futuro das pátria, que é o futuro de todos nós.

Os piores surdos são os que não querem ouvir.

A tentativa tinha-se estendido a outras terras do norte: dizem que Paredes,

Guimarães, Fafe, Santo Tirso, Paços de Ferreira e Felgueira. Em Santo

Tirso, chegou a proclamar-se a monarquia e arvorou-se a bandeira azul e

branca nos paços do conselho. Mas bastou uma força de quinze praças, que

ali estavam destacadas, para fazer fugir os entusiásticos defensores do antigo

ideal.

Pobre regime que tem adeptos destes.

Mas afinal, segundo notícias oficiais, esses senhores não pararam com

as suas tentativas. Conseguiram passar a fronteira em número de mil e

duzentos, entraram em Vinhais e queriam apoderar-se de Bragança, onde

julgavam contar com elementos a seu favor. Chegaram até a fazer propostas

de rendição ao capitão Andrade a quem julgavam intimidar com isso. Mas

o valente militar recusou nobremente essas propostas e pouco depois os

alucinados tornaram a refugiar-se perto da fronteira.

Parece que o governo espanhol tomou agora essa questão a sério e está

dando providências.

Já não é sem tempo.

* * *

Reuniram-se as cortes [sic!], para tratar da maneira porque hão de ser

julgados os traidores que desejam a ruína e a desgraça do seu país. O

governo vai tomar medidas de severa repressão. Não haverá compaixão nem

clemência para eles.

É realmente preciso que se empregue a maior energia, para evitar falsas

tentativas de rebelião. A República precisa de se conservar sólida e firme. Tem

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A Federação (1911-1912) 77

já pelo seu lado o consenso unânime das nações e não há de ser uma corte de

dementados que poderá entravar-lhe a marcha no caminho do progresso e do

rejuvenescimento desta querida pátria, que chegou ao último extremo devido

aos esbanjamentos e às delapidações dos que se diziam servos dedicados da

monarquia.

* * *

As festas do aniversário da República Portuguesa, realizada no dia 5 de

outubro em todo o país, revestiram um brilhantismo e um entusiasmo deveras

excecionais. Em Lisboa, principalmente, foram um delírio. Houve parada

militar, festejos oficiais, um cortejo cívico em que se fizeram representar

todas as classes ativas do país; enfim, demonstraram exuberantemente que o

ideal republicano está enraizado no coração de todos os portugueses.

O presidente da República, o venerando dr. Manoel de Arriaga, recebeu

de toda a parte cartas e telegramas de felicitações em número incalculável.

Por mais que digam os que pretendem ressuscitar o regime nefasto da

corrupção e dos adiantamento, a República está firme e inabalável no coração

de todos os verdadeiros portugueses.

* * *

Para se tratar da questão do julgamento e da pena que devia aplicar-se

aos conspiradores, reuniram-se extraordinariamente as cortes [Sic!]. Depois de

muita discussões, decidiu-se afinal que lhes fosse aplicada uma multa sobre

a fortuna que possuam no valor de dez por certo. Uma prisão não lhes dava

o castigo merecido, a multa é mais eficaz porque lhes faz sentir nas algibeiras

o efeito do seu péssimo procedimento.

Parece agora pelas últimas notícias, que estão de todo desanimados. Mas,

ainda assim nunca fiando. Toda a cautela é pouca com tal classe de gente.

Parece também que o governo espanhol não é culpado dos manejos que

eles têm feito e que essa culpa deve atribuir-se às autoridades dos sítios onde

eles permanecem. Nestas questões, portanto, nunca se devem fazer juízos

temerários.

Danton

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78 Reto Monico

NOTÍCIAS DE PORTUGAL 45

Lisboa, 8 de dezembro de 1911

[. . . ]

Numa sala do antigo convento das Trinas constituiu-se o tribunal para o

julgamento dos conspiradores contra a república. O primeiro a ser julgado foi

Joaquim Augusto de Almeida, acusado de entregar ao capitão de artilharia 3,

Crespo Frazão, cartas de Paiva Couceiro, chamando-o à revolta.

É condenado a sete anos de prisão maior celular, seguidos de dez de

degredo, ou na alternativa, a vinte anos de degredo em possessão de primeira

classe.

A sentencia foi bem recebida.

O segundo, Maximiano Canavarro, soldado da guarda fiscal, é absolvido

plenamente. O terceiro, António Martins, é igualmente absolvido, e o quarto,

Joaquim Pinto Rodrigues, soldado da guarda republicana do Porto, é condenado

em seis anos de prisão maior celular, seguidos de dez de degredo, na

alternativa de vinte anos de degredo, custa e selos do processo e 10$000 réis

para o defensor.

O padre Adriano Coelho da Silva, que estava preso com o conspirador

no Forte do Alto do Duque, bebeu por engano uma porção de formol que ali

estava para fazer lavagens, e disso lhe resultou a morte. Já tinha ordem para

ser posto em liberdade, por nada se provar contra ele.

* * *

Segundo consta as hostes de Paiva Couceiro encontram-se perto de Jerez;

os peões, devem andar por quatrocentos. Mas não consta que pensem, por

agora, em invadir o nosso território. Ainda não nasceu o peru de Natal que

eles hão de vir saborear no Porto ou em Lisboa.

A propósito convém lembrar a todos os nosso amigos que no Brasil

residem, que todas as notícias e boatos terroristas com respeito às vitórias

de Paiva Couceiro são absolutamente falsas. Filhos degenerados da pátria

portuguesa, aventureiros sem consciência e sem escrúpulos, a quem todos

os meios servem para conseguir os seus fins, são os que se atrevem a forjar

esses boatos alarmantes. Não se fiem, pois, os nossos amigos, em tais atoardas

e creiam que a República Portuguesa, embora lute com dificuldades, como

45 A Federação, 11 de janeiro de 1912, ano XXIX, p. 1.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 79

sucede a todas as instituições com pouco tempo de existência, criou raízes

neste país e há de acabar por vencer todas as dificuldades que se apresentam.

Esses boateiros só merecem, pois, o desprezo das criaturas honestas.

Danton

NOTÍCIAS DE PORTUGAL 46

Para A Federação

Lisboa, 30 de dezembro de 1911

[. . . ]

Os conspiradores, que o vulgo denomina paivantes, lá andam ainda perto

da fronteira, mas completamente descoroçoados, por não terem podido vir a

Lisboa comer o peru de Natal. A temperatura frigidíssima que ali domina,

tem contribuído, de mais a mais, para lhes arrefecer os ânimos.

Do forte do alto do Duque, evadiu-se um preso por essa culpa; iludindo

algumas praças de infantaria 2, ali destacadas, conseguiu vestir-se a militar e

assim conseguiu sair da prisão.

Procede-se a um inquérito a respeito dessa fuga. O preso nunca mais foi

visto.

Da cadeia do Aljube, no Porto, também fugiram cinco conspiradores; são

eles os padres Sebastião Pinto da Rocha e Manuel Martins de Sá Pereira,

Alberto Ferreira, João Spergueira da Rocha Páres [sic!] e Álvaro Pinho Campos.

Cortaram algumas grades de uma janela, ataram uma corda aos ferros da

grade não cortada e desceram para o lado da cerca de Santa Clara até ao

telhado da repartição da polícia sanitária. Depois, passaram ao convento e

dali saíram, de madrugada, pela porta da igreja, a dois e dois.

A polícia mandou logo telegramas para fronteira e para diversas partes

do país, pedindo a captura dos fugitivos.

No tribunal das Tunas [sic!] foram julgados mais dez conspiradores, sendo

um condenado e nove absolvidos. Parece que neste caso tem havido denúncias

por motivo de vinganças pessoais, o que deve ser castigado com todo

46 A Federação, 25 de janeiro de 1912, p. 1.

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80 Reto Monico

rigor. Quem usa de tais processos, acusando pessoas que estão absolutamente

inocentes, merece a mais severa punição.

A lei é igual para todos.

O caso agora vai tomando proporções teatrais. Há dias o príncipe Xavier

de Parma fez anunciar, por cartazes afixados nas esquinas das ruas, que

fará brevemente no castelo de Schwarzenau, onde reside, uma conferência,

acompanhada de projeções luminosa, acerca da frustrada conspiração de

Paiva Couceiro em Portugal, tentativa em que esse príncipe também tomou

parte.

Deve ser curiosa essa lanterna mágica. Pena é não ser ainda vivo o bom

do La Fontaine.

Danton

NOTÍCIAS DE PORTUGAL 47

Lisboa, 18 de fevereiro de 1912

Têm continuado os julgamentos dos conspiradores no Tribunal das Trinas.

Quase todos têm sido absolvidos. Apenas ultimamente um deles, Joaquim

Luiz de Carvalho Pinheiro, cidadão do Brasil, naturalizado português, foi

condenado em vinte e dois meses de prisão correcional, igual tempo de

multa a 200 réis por dia, custos e selos de processo e 10$000 réis em proveito

do defensor oficioso.

Parece que estes nossos amigos continuam a mexer-se com intenções

hostis a Portugal. Correm boatos de que um barco ao seu serviço projeta

desembarcar na Galiza uma certa quantidade de armamento para eles, por

isso na fronteira exerce-se a maior vigilância.

Também, no jornal católico francês La Croix, o ex-bispo de Beja d. Sebastião

Leite de Vasconcelos ataca violentamente a República Portuguesa por

causa do castigo aplicado aos bispos, afirmando a sua solidariedade com as

doutrinas por eles expendidas dizendo que os governos estrangeiros apoiam

essa atitude. O órgão clerical faz grandes elogios a D. Sebastião e apoia a sua

resistência às leis do país em que nasceu.

47 A Federação, 22 de março de 1912, p. 1.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 81

Como tudo isto é triste! Filhos de Portugal a insultarem a sua pátria!

NOTÍCIAS DE PORTUGAL 48

Lisboa, 3 de março

(Para A Federação)

Danton

[. . . ]

No dia 21 do passado mês de fevereiro, evadiram-se do forte do Alto do

Duque, que fica próximo de Algés, doze presos que lá se encontravam, acusados

de conspiradores. A proeza parece fantástica, pelas condições em que o

forte se encontra e pela dificuldade que a fuga devia apresentar. Parece que,

de pessoas que os iam visitar, recebiam dinheiro e instruções, dizendo-se até

que tinham assim notícias de Paiva Couceiro e que se lhes recomendava que

não desanimassem, porque brevemente se daria nova incursão em Portugal.

Entre os fugitivos, encontram-se o padre Joaquim Mendes Cardoso e

sacristão Francisco António da Silva, que estavam presos por terem tentado

destruir, por meio de dinamite, a ponte e a trincheira entre as estações

de caminho de ferro de Vila Velha de Rodam e Fratel, afim de impedirem a

comunicação com Castelo Branco; deste modo, não poderia chegar ali a tropa

que o governo enviasse para sufocar a contrarrevolução. Parece que esses

estão agora em Cedillo, uma povoação espanhola defronte de Montalvão,

terra portuguesa.

Também na cadeia da Relação do Porto tentaram fugir uns indivíduos

presos por conspiradores, mas houve denúncia dessa tentativa e a evasão não

se realizou.

Paiva Couceiro promete que em março se hão de passar grandes coisas.

Já que não pude comer um Lisboa o peru do Natal, que era agora a consoada

da Páscoa?

Com respeito às atoardas que se têm propalado lá fora acerca do mau

tratamento em que Portugal se dá aos presos políticos, convém registar que

sir Eduard Grey, ministro dos negócios estrangeiros de Inglaterra, interrogado

na câmara dos comuns a esse respeito, respondeu que não tinha informação

nenhuma que confirmasse as crueldades que se diziam cometidas contra eles.

E acrescentou que, ainda mesmo em caso afirmativo, tratando-se de negócios

48 A Federação, 28 de março de 1912, p. 1.

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82 Reto Monico

internos de outra nação, o governo inglês não pode intervir neles, seja por

que forma for.

Belas palavras que se devem arquivar.

Quando acabará a campanha violenta de insinuações malévolas que os

inimigos de Portugal andam fazendo no estrangeiro? O seu fim bem sabemos,

é desprestigiar a República, mas temos certeza de que ela há de sair vitoriosa

de todas essas calúnias que lhe assacam. O que é preciso é que os homens

políticos se convençam de que todos são portugueses e que se deixem de ódio

e de repudiações. No tempo da monarquia, uniram-se eles para implantar

a República; agora, devem fazer todos os esforços possíveis para que ela se

mantenha. Deixem-se de discussões estéreis e tratem a sério dos interesses

do país. Os republicanos estão agora divididos em três partidos diferentes e

essa divisão não pode trazer nada de bom; deve haver entre nós apenas um

partido em que se filiem todos os filhos de Portugal e que tenha por lema

levantar esta nação aos olhos do mundo e remediar com mão firme e segura

todos os erros que a monarquia nos legou. De outra maneira, nada faremos.

Danton

NOTÍCIAS DE PORTUGAL 49

A última audiência no tribunal das Trinas foi muito movimentada. Julgaram-se

uns conspiradores, que foram absolvidos por falta de provas, e o

público que assistiu à leitura da sentença manifestou-se protestando indignadamente.

Depois, à saída dos advogados e dos jurados, essa mesma gente agrediu

alguns membros do júri e o advogado, Mário Monteiro, contra quem pareciam

mais acirradas as iras populares.

Trocaram-se bengaladas de parte a parte, mas o caso passou-se tão rapidamente

que a guarda republicana do tribunal não pode intervir e portanto

não houve prisão nenhuma.

Terminaram os julgamentos naquele tribunal e o edifício vai ter agora

outra aplicação.

49 A Federação, 16 de abril de 1912, p. 1 (carta sem data, enviada provavelmente

em meados de março).

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 83

Um conspirador que estava preso no forte do Alto do Duque deu há dias

parte de doente e foi mandado para o hospital militar da Estrela. Depois de

curado, deram-lhe alta mas mandaram-no buscar apenas por um soldado do

destacamento do mesmo forte. Parece que o preso teve artes de convencer

o soldado a acompanhá-lo para qualquer parte, porque até hoje não houve

dele novas nem mandados. A polícia procura os fugitivos e enviaram-lhe

telegramas para diversas partes, pedindo para os prenderem.

O sr. Abílio Magro, ex-empregado da polícia e que nela exerceu um elevado

cargo no tempo da monarquia, tem feito num jornal de Lisboa revelações

sensacionais a respeito dos conspiradores, dizendo até que eles são apoiados

por países estrangeiros. O caso é deveras melindroso e por isso esperemos

que a verdade se averigue para falarmos a esse respeito. [. . . ]

Danton

NOTÍCIAS DE PORTUGAL 50

Lisboa, 31 de março

[. . . ]

Uns dos conspiradores que tinha fugido do forte do Alto do Duque já foi

preso; é o serralheiros João de Barros, homem de extraordinária habilidade e

que, segundo parece, foi que armou o plano da fuga e arrombou as portas.

Mas, em compensação, do presídio da Trafaria, fugiram dois, o dr. António

Andrade Freire e o comerciante Roque de Jesus Gonçalves.

Auxiliou-os o guarda Manuel Pires Afonso, que fugiu com eles.

Era seu companheiro na fuga o estudante Gilberto Augusto Velos da Costa,

mas este teve pouca sorte.

O guarda tinha-lhes aberto as portas das celas onde eles se encontravam

e os três, saindo pelos corredores, chegaram próximo de uma janela que

ficava a pouca altura do chão.

Abriram-na e, saltando por ela, chegaram a um barracão onde estão

instaladas as oficinas e a casa de arrecadação; daí passaram ao telhado e

saltaram um varandim de ferro que guarnece o muro de suporte.

Restava-lhes a muralha, muito alta que rodeia o presídio, mas o guarda

Afonso tinha posto aí uma escada de corda.

50 A Federação, 25 de abril de 1912, p. 1.

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84 Reto Monico

Com os dois primeiros fugitivos foi o caso perfeitamente; mas quando o

estudante Gilberto ia a sair a corda partiu-se e ele teve de ficar aí, enquanto

os seus felizes companheiros se retiravam.

Desesperado com o que lhe sucedera, o Gilberto pôs o boné do guarda

Afonso e de manhã dirigiu-se à porta das armas, para sair por ela; a porta,

porém, estava fechada.

Não se dando por vencido, o Gilberto continuou a representar o seu

papel de guarda, mas foi conhecido por um seu colega verdadeiro chamado

Mesquita que o prendeu.

A febre das evasões continua sem ser interrompida. O guarda cívico n. 210

conduzia de Lisboa para o Porto o conspirador Joaquim dos Santos Barbosa

que ia responder naquela cidade. Este teve arte de convencer o polícia e ir

com ele para Espanha e para isso serviram-se do seguinte estratagema: O

polícia fingiu que levava um oficio para a autoridade de Tui, para a entrega

de um espanhol doido que fora preso em Lisboa; esse espanhol era o conspirador,

que representava magnificamente o seu papel, e assim conseguiram

passar a ponte de Valença. Apenas se encontraram em Espanha, voltaram-se

para o guarda da alfandega e cumprimentaram-nos com gestos poucos delicados,

zombando da maneira porque os tinham logrado. E desapareceram

em terras espanholas.

Também na madrugada de domingo 24, fugiram do forte do Alto do

Duque mais cinco presos como conspiradores, indo também com eles um

cabo e um soldado que os guardavam. Isto já vai tomando as proporções de

comédia.

No ministério dos estrangeiros recebeu-se uma comunicação do cônsul

de Portugal em Tui, em que se dizia que os conspiradores contra a República

portuguesa andam por ali num estado miserável e pedindo esmola.

Corria também que Paiva Couceiro, completamente desiludido, ia abandonar

os seus planos de invasão.

Será verdade? Estas notícias são sempre tão contraditórias, que não temos

remédios senão pô-las de remissa.

O caso é que o Heraldo de Verín diz que os famigerados conspiradores

não têm feito ali senão contrair dívidas por toda parte e que até os que ao

princípio os protegeram estão mortos por que eles se retirem o mais depressa

possível.

Danton

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 85

NOTÍCIAS DE PORTUGAL 51

14 de abril

[. . . ]

Um sujeito francês, pândego de bom gosto, com a facilidade e o poder de

imaginação que têm incontestavelmente os seus conterrâneos para fabricar

romances, publicou em alguns jornais parisienses umas notícias estapafúrdias

em que se dizia que os espanhóis se preparavam para invadir Portugal. Está

claro que tão disparatada atoarda só existia de fato no cérebro de quem a

forjou. Além disso, dizia-se que Paiva Couceiro já tinha entrado em terras

portuguesas e que diversas povoações se lhe tinham submetido, estando por

isso a República periclitante. Até o próprio Paiva Couceiro se havia de vir

quando visse a notícia ainda mesmo que não fosse estranho a ela. E esta

mania de inventar boatos vai tomando proporções tais que precisa de ser

severamente corrigida, tomando-se sérias responsabilidades a quem faz correr

mundo notícias inverosímeis que para aí mandam os mal intencionados,

é bom que se saiba que a República portuguesa está sólida e inquebrantável.

Tem sofrido, é claro, e há de sofrer ainda as dificuldades inerentes aos

sistemas que se implantam de novo, mormente dando-se como se deu em

Portugal, o caso de a monarquia deixar exaustos os cofres do tesouro e empenhados

em sucessivos empréstimos os melhores rendimentos do país. Mas

com esforço e boa vontade, esperemos que tudo se há de vencer.

O que ganham estes senhores em inventar mentiras para desacreditar um

país que tem vontade de trabalhar e de progredir? A calúnia é uma arma que

se volta, na maior parte das vezes, contra quem a pratica.

* * *

Decididamente os senhores realistas não deixam de dar que falar. Agora

um jornal da Galiza, afeto a essa gente o Noticeiro de Vigo, traz, assinado

por um português que renega a sua pátria, um artigo em que pede à Europa

civilizada que imponha ao seu país um regime da solidariedade cristã.

Pedir, em nome da solidariedade cristã, a intervenção estrangeira para

derrubar o regime republicano em Portugal é coisa que não se lembrava o

próprio diabo, se ele quisesse, ainda assim, alguma coisa com os cristãos.

Mas lembrou a esse cavaleiro que antes quer ver a mãe pátria perder a sua

autonomia do que deixá-la seguir no caminho da liberdade e do progresso.

51 A Federação, 18 de maio de 1912, p. 1.

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86 Reto Monico

Que tristeza, que profunda tristeza causam essas aberrações!

Danton

NOTÍCIAS DE PORTUGAL 52

(para A Federação)

Lisboa, 28 de abril

[. . . ]

Já se torna enfadonho o falar dos conspiradores, mas o caso que vamos

narrar merece ser contado.

Um sujeito chamado Casimiro Joaquim Cortes, que era escriturário do

juízo apostólico, foi preso em Ovar e remetido para Lisboa. Diz-se que tinha

chegado a Badajoz levando dinheiro que oito dos conspiradores fugidos das

prisões da capital tinham mandado pedir aos chefes da conjurada Badajoz.

Soube que esses indivíduos já lá não estavam e decidiu-se a voltar atrás, pelo

caminho de Portugal.

O cônsul português, sr. Eugénio dos Santos Tavares, sabendo ou desconfiando

do caso, seguiu-o até Elvas e mandou-o então prender, sendo encarregado

de o trazer para Lisboa dois policiais dali. Assim se fez e o preso,

durante o trajeto, tudo era desfazer-se em atenções com os empregados policiais,

para ver se lograva conquistá-los em seu favor. Quando chegaram à

estação de Campolide, o Cortes convenceu os agentes a apearem-se, dizendo-

-lhes que o governo civil ficava perto dali e dirigiu-se com eles para Alcântara.

Aí comeram e beberam à farta dizendo-lhes o preso que era melhor

dormirem naquele sitio porque o governo civil ficava longe e era já muito

tarde; no outro dia se trataria disso.

Aceitando os polícias o que o Cortes lhes propunha, foram para uma hospedaria,

onde este pediu dois quartos; foi então que os homens desconfiando

dele lhe disseram que não dormiriam ali se não ficassem todo no mesmo

quarto.

Originou-se disto uma questão e o dono da casa, para a apaziguar, foi

chamar um polícia. Este abriu os olhos aso guardas elvenses a respeito das

52 A Federação, 23 de maio de 1912, p. 1.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 87

intenções do preso e o Cortes lá foi para o governo civil onde ficou internado

no calabouço.

Saíram-lhe errados os cálculos.

* * *

O cônsul de Portugal em Vigo participou ao nosso governo que na praia

de S. João de Grave tinham sido apreendidos pelas autoridades espanholas

cem caixotes com espingardas Mauser, munições, caixas com correagem e

barrica com pólvora.

Tinham sido desembarcados de um vapor alemão, em três noites a seguir,

e enterrados na areia.

Faziam esse serviço uns homens dali, com a remuneração de vinte e

cinco pesetas em cada noite que trabalhassem. Um deles, porém, queria

ganhar mais e, como não lhe dessem o salário que ele pedia, denunciou às

autoridades o que se passava.

Desenterraram-se os caixotes e encontraram-se então as munições e armamento.

Correram boatos desencontrados; diziam uns que essas armas

eram para auxiliar uma revolução em Espanha, outros que se destinava aos

conspiradores portugueses.

Não se sabe ao certo a verdade do caso. Seja como for, o fato é que

o armamento foi apreendido e que aqueles a quem era destinado ficaram a

fazer cruzes na boca.

Danton

NOTÍCIAS DE PORTUGAL 53

(para A Federação)

Lisboa, 12 de maio

[. . . ]

Esta semana espalharam-se por todo o país os boatos mais aterradores

com respeito à famosa conspiração monárquica, mas afinal ficou tudo na

mesma como dantes. Parece que ainda não será desta vez.

53 A Federação, 14 de junho de 1912, p. 1.

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88 Reto Monico

O que se deu foi uma incursão de uns cinquenta indivíduos que, entrando

pela fronteira do Minho, assaltaram o posto da guarda fiscal de Castro

Laboreiro. Os guardas da alfandega em número de três apenas, calculando

que não podiam fazer-lhes frente, abandonaram o posto, levando as armas

e as munições. Então os intrusos, apanhando-se em terreno conquistado,

deitaram a mão a tudo o que puderam e lá se foram outra vez para Espanha.

Há em Castro Laboreiro um professor de instrução primária, chamado

Matias De Sousa Lobato, republicano posterior ao dia 5 de outubro, que

fazia profissão de fé das suas ideias avançadas e que atualmente era o mais

denodado paladino da República. Pois, segundo se diz, esse professor apenas

teve notícia da incursão, arvorou imediatamente uma bandeira azul e branca.

O governo suspendeu-o do exercício das suas funções; agora, porém, diz-se

que esse fato carece de veracidade.

Também posteriormente, o reverendo dr. Narciso Alves da Cunha tratando

deste fato no senado, atribui a incursão aos contrabandistas, que se têm valido

do nome de conspiradores para praticarem a salvo as suas proezas. Disse ele

que aqueles sujeitos assustaram os soldados do posto fiscal e aproveitaram a

ocasião para passarem contrabando no valor de uns quarenta contos.

Danton

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 54

Bruxelas, 18 — As autoridades judiciárias de Bruges prosseguem ativamente

no inquérito a respeito do vapor Voss, aprisionado, há dias, em

Zeebrugge, por ordem do ministro dos negócios estrangeiros, visto supor-se

que trata-se de um complot dos monarquistas portugueses.

A polícia conhece cerca de 200 portugueses que vivem naquela cidade e

seus arredores e que frequentemente mudam de residência.

Logo que se receba o necessário pedido de Portugal, serão expulsos os

principais suspeitos de conspiração.

As últimas notícias dizem que sábado à noite, suicidaram-se num hotel

da mesma cidade um homem e uma mulher que se tinham inscrito no registo

do mesmo por forma inteligível.

54 A Federação, 18 de junho de 1912, p. 4.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 89

Calcula-se que se trata de conspiradores portugueses que vendo-se perdidos

tomaram aquela resolução.

Há quem assegura que o suicida é o ex-capitão Paiva Couceiro.

Notícias de Portugal 55

(Para A Federação)

Lisboa, 26 de maio

Continua a desdobrar-se a fita animatográfica dos conspiradores. Estão

constantemente dando que falar de si.

Há dias, no lugar de Louso, próximo de Bande, Galiza, estabeleceu-se

conflito, numa feira, entre eles e o povo. No motim houve pancadaria rija,

pedradas e até tiros, ficando feridos trinta portugueses, um deles gravemente,

e muitos espanhóis. O povo assaltou-lhes as casas e obrigou-os a sair daí.

A feira acabou por causa do enorme tumulto.

No dia 14 deste mês, fundeou-se na Corunha o vapor Cabo Não, trazendo

vinte e um rolos de papel, remetidos por Herr Serreger para um tal Juán

Ozores. Como trouxessem marca igual à das caixas que há pouco foram

apreendidas com armamento para os conspiradores portugueses, os carabineiros

desconfiaram do caso. Revistou-se o navio e viu-se que naqueles rolos

vinham trezentas e cinquenta carabinas Mauser e doze mil cartuchos embalados.

Está claro que foi tudo apreendido e os nossos vizinhos espanhóis

ficaram com mais este armamento.

O caso dos conspiradores foi discutido por um deputado no parlamento

espanhol, admoestando o governo pela sua benevolência que podia trazer

complicações graves para as boas relações de amizade que existem entre os

dois povos vizinhos. A Espanha, e na opinião dele, não deve consentir que

no seu território se estejam fazendo manejos comprometedores para o novo

regime português; deve manifestar nesse caso a mais absoluta neutralidade.

Que nunca se possa dizer, embora sem visos de verdade, que o governo

espanhol protege as tentativas dos conspiradores portugueses. Seria isso

deprimente para aquela briosa nação.

Respondeu-lhe o ministro do reino, dizendo que a Espanha nunca protegeu

os conspiradores e que tem o maior respeito pelas instituições republicanas

portuguesas; deu sempre as ordens mais terminantes para que não

55 A Federação, 22 de junho de 1912, p. 1.

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90 Reto Monico

se continham abusos e a prova está no descobrimento que se tem feito das

armas. Além disso, tomaram-se providências para que não haja, por aquele

lado, incursão nenhuma em Portugal.

Essas declarações fizeram bom efeito. Oxalá as autoridades espanholas

das povoações próximas das fronteiras cumpram à risca os seus deveres.

Também circulou o boato do que em Verin os conspiradores tinham

atacado o consulado português, empregando até para isso algumas bombas.

Parece, porém ser infundado. A verdade, segundo se diz, foi ter havido uma

desordem em frente do consulado, sendo efetivamente encontradas bombas

a um dos portugueses.

Com os julgamentos é que se tem dado cenas por vezes violentas. A demasia

da benevolência dos juízes tem provocado a indignação pública. Todos

os réus são absolvidos, por falta de provas, até os próprios que confessaram

as suas intenções. É natural que isso resulte de má instrução dos processos,

que obrigam os juízes e o júri a ser assim benevolentes.

No Porto realizou-se o julgamento de alguns indivíduos implicados na revolta

em que se pretendia assaltar a Serra do Pilar e fazer outras demonstrações

hostis à República. O delegado requereu que se lessem os depoimentos

ou que depusessem todas as testemunhas de acusação. O advogado da defesa

protestou contra isso, saiu de tribunal, acompanhado pelos seus colegas drs.

José de Arnela, Agostinho Rego, António Claro e Amâncio De Alpoim. O juiz

adiou a audiência e nomeou outros advogados para o julgamento seguinte.

O público deu mostras de desagrado e, quando o dr. Alpoim saía para a

rua, foi agredido por alguns indivíduos mais exaltados. Quando os presos

eram conduzidos para a cadeia, deram-se conflitos entre o povo e a guarda

republicana, do que resultou ficarem feridos alguns populares.

No dia seguinte também não se efetuou a audiência, por terem faltados

cinco jurados e o julgamento foi novamente adiado, sabe Deus para quando.

À saída dos presos, que recolhiam novamente à cadeia, tornou-se a haver

gritos e apupos.

No final de todas as audiências, em que, como dissemos, os conspiradores

são unanimemente absolvidos, o povo exprime a sua indignação, gritando

Viva a República! Fora os traidores!

Em Lisboa também houve distúrbios ontem por causa do julgamento dos

monárquicos de Castelo Branco. O tribunal de Boa Hora estava apinhado

de gente que esperava com a maior ansiedade o resultado da audiência.

Depois de uma troca de palavras entre o delegado do ministério público e

o advogado dr. Pinheiro, incidente em que foi preciso intervir o juiz, leramwww.clepul.eu


As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 91

-se as deprecadas das testemunhas de defesa ouvidas em Idanha-a-Nova e

na Costa sobre três réus ausentes. A seguir interrompeu-se a audiência, que

depois foi reaberta, falando o dr. Macedo dos Santos, delegado do procurador

da República, que atacou denodadamente os réus, principalmente os padres

que, no seu entender, tinham as maiores responsabilidades naquele caso.

Respondeu-lhe o advogado da defesa que produziu um discurso mal recebido

pela assembleia. Depois foi adiada a audiência para o dia seguinte.

A meio do discurso do advogado de defesa, interrompeu-se a audiência

por dois minutos, por se ouvir grande barulho fora da sala.

Fora ele provocado pelo aparecimento do advogado dr. Mário Monteiro, a

quem o povo não vê com bons olhos, por ele ter defendido os conspiradores.

Este advogado foi agredido e apupado por alguns indivíduos, que chegaram

a cuspir-lhe na cara.

Lá fora os ânimos estavam exaltadíssimos. Os primeiros réus que saíram

do tribunal, dois padres, foram também apupados, aos gritos de Viva a República!

E Morram os traidores! A custo foram metidos no carro celular que os

devia conduzir ao Limoeiro.

A multidão, correndo, atrás do carro, tentava destruí-lo, para se apoderar

dos conspiradores. Quando o veículo chegava ao largo da Madalena, os

populares atiraram-se a ele com o maior denodo e, depois de mandarem

retirar da almofada o cocheiro e um oficial de diligência que acompanhava

os presos, levantaram o carro no ar e fizeram-no tombar de lado.

Depois tiraram os muares arrancaram a lança. Preparavam-se talvez para

o destruir e exercerem represálias sobre os presos, mas houve uns indivíduos

de ânimo prudente que aconselharam que tal não fizessem, porque isto não

representava a grande força do povo, mas sim um ato de covardia.

Os manifestantes caíram então em si e tornaram a endireitar o carro, sem

que os presos tivessem sofrido senão um grande susto. Apareceu logo a força

armada, que os fez sair do carro, por entre novas manifestações de desagrado

da parte do povo, e os levou escoltados para a cadeia do Limoeiro.

É preciso, é urgentíssimo, que estes fatos se não repitam. Nem demasiada

benevolência, nem exagerado rigor. Vejam-se com o maior cuidado os

processos e faça-se justiça como deve ser, senão poderemos algum dia ter de

relatar alguns lamentáveis excessos.

Danton

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92 Reto Monico

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 56

[. . . ]

Rio, 8 — A legação de Portugal pediu ao Jornal do Comércio a publicação

do seguinte telegrama recebido do governo daquela República:

“Os conspiradores da Galiza, organizaram colunas de ataque às províncias

do Minho e Trás-os-Montes.

A coluna que se dirigiu sobre Valença foi imediatamente batida, fugindo

para a Espanha.

Diz o comandante da guarda civil, que prendeu e desarmou a força acima,

que a coluna que seguia para Chaves foi igualmente forçada a retirar para

aquele país.

A sublevação do Minho e Leiria, provocadas ao mesmo tempo, foram

imediatamente sufocadas e severamente castigadas.

Em Azoia, Celorico, Basto e Fafe reina tranquilidade completa.

Ao sul do país reina o maior entusiasmo patriótico; as forças do exército

e da armada pedem que as deixem seguir contra os conspiradores.

[. . . ]

EXTERIOR

[. . . ]

Madrid, 8 — Telegramas oficiais recebidos pelo governo, hoje pela manhã,

informam que numerosos grupos de emigrados marinheiros portugueses,

armados e uniformizados, comandados por ex-oficiais do exército português,

tiveram, ontem à tarde, repetidos tiroteios, na fronteira, com as forças republicanas

de Portugal.

Adiantam os mesmos telegramas que os monarquistas se apoderaram

da estação da estrada de ferro de Valença fronteira a Tui mantendo fortes

tiroteios com os guardas fiscais da cidade portuguesa.

O sargento comandante do posto fiscal foi ferido por ocasião do ataque,

mas o seu estado não inspira cuidados.

Constava em Tui que os monarquistas haviam interrompido o tráfego da

estrada Valença, que ficou assim isolada.

Também se afirma que os mesmos cortaram os fios telegráficos em vários

pontos.

As forças espanholas aquarteladas em Tui e outras cidades da fronteira

perseguem os conspiradores portugueses a fim de prendê-los.

56 A Federação, 8 de julho de 1912, p. 1 e 2.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 93

Lisboa, 8 — Reuniu-se esta manhã o conselho de ministros com assistência

das altas autoridades militares, sendo discutidas e aprovadas as providências

que devem ser tomadas a fim de sufocar prontamente as tentativas

de invasão feitas pelos monarquistas.

Telegramas recebidos esta manhã informam que a 6 quilómetros ao norte

de Montalegre acampam grandes grupos couceiristas que estão sendo vigiados

por forças republicanas.

O governo português declara que está inteiramente senhor da situação e

que deposita absoluta confiança nas forças militares aquarteladas ao norte do

país, cuja disciplina é completa.

Madrid, 8 — Realizou-se esta manhã uma conferência entre o ministro

do interior e o ministro de Portugal, a respeito dos acontecimentos na

fronteira.

Nela ficou resolvido que o governo espanhol internará imediatamente,

nas províncias e Cuenca e Teruel, os monarquistas portugueses que se acham

na fronteira.

Vigo, 8 — Um grupo de monarquistas portugueses tentou esta noite fazer

voar por meio de dinamite a ponte do caminho de ferro nas proximidades de

Caminha.

Parece que devido à péssima colocação dos engenheiros destruidores os

estragos causados pela explosão são insignificantes, estando assegurado o

tráfego ferroviário.

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 57

[. . . ]

A legação de Portugal recebeu, ontem, o seguinte telegrama do ministro

das relações exteriores daquele país:

“Lisboa, 8 — Na tentativa de incursão Chaves conspiradores completamente

rechaçados vários prisioneiros.

Parlamento votou aclamação saudação exército inabalavelmente identificado

República — Ministro”

[. . . ]

57 A Federação, 10 de julho de 1912, p. 1 e 2.

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94 Reto Monico

Lisboa, 9 — Comunicam de Valença que a ordem está completamente

restabelecida, sendo presos os sargentos Cordona e Gonçalves.

Foram presos em Viana do Castelo os conspiradores Gonçalves Viana,

Passos Viana, Alfredo Azevedo e o ajudante de notário, Marques Silva; Joaquim

Costa Alípio Delduque, António Rodrigues, capitão reformado, Sarreo António

Inocêncio Cardiolos e Boaventura Carvalho.

Os conspiradores conseguiram entrar em Vila Verde depois de cerrado

tiroteio, ficando ferido o capitão Maia Magalhães.

Comunicam da povoação de Valpaços que têm sido vistos muitos bandos

de conspiradores fardados em Celorico e Cabeceira.

[. . . ] Dizem de Valença que os conspiradores, aproveitando-se do nevoeiro,

assaltaram o posto fiscal da estrada de ferro, investindo depois para as

fortificações.

As guarnições destas rechaçou os invasores, que abandonaram as armas

e munições.

Os assaltantes tiveram dois mortos, inclusive o chefe da coluna, sr. Sepulvedra.

Lisboa, 9 — O senado aprovou unanimemente uma moção de saudações

ao exército e armada, em vista da conduta verdadeiramente patriótica que tem

sabido manter.

O governo ordenou a saída do cruzador Almirante Reis, com tripulação

completa e mais 150 praças de desembarque e três metralhadoras.

O aviso 5 de Outubro também prepara-se para sair, parecendo que o

cruzador S. Gabriel, que atualmente se acha nos Açores, também virá a esta

cidade, seguindo depois para o Norte.

Lisboa, 9 — O comandante militar de Chaves telegrafou ao governo

comunicando-lhe que o bando de conspiradores chefiados pelo ex-capitão

do exército Paiva Couceiro surgiu nas proximidades de Montalegre, atacando

depois aquela praça, que opôs tenaz resistência, apesar da pequena guarnição

de que dispunha.

À tarde, os monarquistas, completamente desbaratados, tendo sofrido

inúmeras baixas, fugiram precipitadamente para a Espanha.

Outro bando, comandado pelo ex-capitão Jorge Camacho, também fez

pequena incursão, retirando logo e tentando reentrar no território português

na direção de Cabeceiras de Basto.

Partiram ao seu encontro algumas forças, que o perseguiram incessantemente,

obrigando-o a recuar.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 95

Os monarquistas praticaram, nos povoações por onde passaram, vários

atentados contra pessoas e propriedades, achando-se, por isso, os habitantes

altamente indignados.

Foram chamados ao serviço todos os soldados, do exército, licenciados.

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 58

Lisboa, 11— A câmara encerrou os seus trabalhos.

Está verificado não ser exato que os chefes monarquistas houvessem

espalhado manifesto, conforme se dissera.

Foram encontrados bandos de conspiradores nas proximidades de Cabeceiras

de Basto.

Os conspiradores tentaram apodera-se de Valinho. [. . . ]

Partiram reforços para o norte do país.

Em Cabeceira de Basto, um taverneiro monarquista tentou matar os soldados

republicanos, envenenando o vinho que possuía.

As forças republicanos que tiveram ordem de desalojar os invasores realistas

de Cabeceira de Basto tomaram a cidade.

Os habitantes acham-se refugiados nos montes.

O capitão Paiva Couceiro e outros conspiradores retiraram-se para Bouzé,

para a casa do padre Domingo.

Cabeceira de Basto foi incendiada.

[. . . ]

Berlim, 11 — Fala-se aqui, em rodas bem informadas sobre a política

internacional, que o governo português mostra-se melindrado com o fato de

ter a Espanha consentido que a gente do capitão Paiva Couceiro transpusesse

a fronteira, levando consigo material de guerra, inclusive artilharia, sem ser

de modo nenhum molestado ou detido.

É muito provável, acrescenta-se, que semelhante fato motive enérgica

representação perante o governo de Madrid.

58 A Federação, 11 de julho de 1912, p. 4.

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96 Reto Monico

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 59

Madrid, 13 — Notícias recebidas de vários pontos da fronteira de Portugal,

informam que as autoridades espanholas prenderam ontem numerosos

conspiradores portugueses fugidos da República vizinha, a fim de evitar que

eles voltem a promover agitações e tumultos em Portugal.

Porto, 13 — Partiram para Braga trens especiais conduzindo em quarenta

vagões, importantes destacamentos do exército afim de servirem naquela

guarnição, enquanto durar o estado de sítio.

Nas imediações da estação, aglomerava-se grande multidão que aclamou

com entusiasmo os militares que partiam.

[. . . ]

Lisboa, 13 — O conspirador João de Almeida, preso em Chaves, fez

declarações a um jornalista.

As tropas republicanas encontraram algumas metralhadores e munições

abandonadas pelos rebeldes. [. . . ]

Não se sabe ao certo o paradeiro de Couceiro.

Continuam a partir para Chaves importantes contingentes de tropa.

Regressou o cruzador Almirante Reis.

A colónia espanhola tem feito demonstrações simpáticas às instituições

republicanas.

Os monarquistas que estavam entrincheirados em S. Outelinho retiraram-

-se para Espanha.

Foi preso em Fafe o chefe da rebelião local, Silva Bastos.

As tropas republicanas recolheram metralhadoras e correspondência a-

bandonadas no campo da luta pelos monarquistas.

Quando seguia para Cabeceira o 18 o regimento de infantaria, os soldados

avistaram vários homens empenhados em cortar os fios telegráficos; fizeram

fogo matando uns e ferindo outros.

É completamente ignorado o paradeiro de Jorge Camacho, chefe monarquista,

que tentou, há dias, nova incursão, na fronteira espanhola.

As últimas notícias chegadas das povoações da Praia do Minho e Trás-os-

-Montes, informam que a coluna de Camacho parece estar dispersada.

59 A Federação, 13 de julho de 1912, p. 2.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 97

Ninguém conhece seu paradeiro. [. . . ]

Consta que se acham prontos para nova incursão 300 conspiradores,

estacionados na povoação espanhola de Valverde.

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 60

Lisboa, 13 (recebido ontem) os distritos de Vila Real e Viana do Castelo

foram declarados sob governo militar.

Na serra de Carregueira, próxima a Belas, poucos quilómetros distantes

desta capital, reuniram-se, hoje, pela madrugada, vários indivíduos vindos a

cavalo de pontos diversos.

Segundo as investigações feitas, tais indivíduos tentavam promover distúrbios

de carácter monárquico.

As sentinelas do quartel do grupo de artilharia a cavalo de Queluz descobriram

a reunião, dando imediatamente o alarme.

O destacamento saiu do quartel e galgou a serra, em perseguição dos

conspiradores, os quais, em sua maioria, conseguiram fugir.

Os soldados realizaram as seguinte prisões: Vasco Belmont, conde Fialho,

Augusto Pires e Laurentino Pereira.

Em poder dos conspiradores, foram apreendidas muitas armas.

As autoridades civis deram, pela madrugados, busca em várias casas

suspeitas, encontrando armamento, que foi apreendido. [. . . ]

Portugal, 15 — As forças republicanas mantém-se em vigilância em Cabeceiras

de Basto.

O comandante Faro intimou o povo a depor as armas, sendo restabelecidas

as comunicações telegráficas.

Em Chaves, reina o sossego.

A coluna do ex-capitão Paiva Couceiro internou-se novamente na Espanha.

A parte da população que se mantém fiel ao regime, na freguesia de

Odivelas, obrigou o prior a fugir.

Em Soeiro, foi dada busca à casa do secretário de Homem Cristo.

60 A Federação, 15 de julho de 1912, p. 2.

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98 Reto Monico

Lisboa, 15 — Começou em Chaves o julgamento de João Almeida.

Os jornais desta capital dizem saber, por informação oficial, estar comprovada

a existência, nas proximidades de Chaves, de numerosos cartuchos

detonados pelos conspiradores que atacaram aquela vila.

Estes usaram as balas Dum Dum, calibre seis, cuja aplicação é proibida

por todas as nações no tempo de guerra.

Barcelona, 15 — Um grupo de vinte carlistas percorreu as ruas da cidade

dando vivas à dinastia de Bragança e morras à República Portuguesa.

A polícia dispersou os manifestantes e efetuou três prisões.

Lisboa, 15 — Telegramas aqui recebidos informam que nas freguesias de

Martinho e Anta, distrito de Aveiro, Canavezes e Vila Real, deram-se, ontem,

tumultos de caráter monárquico.

Os destacamentos locais das guardas republicanas restabeleceram a ordem,

fazendo prisões.

Foi descoberto um complot de caráter monárquico em que se achavam

envolvidos os membros do conselho de Braga, os quais foram quase todos

presos.

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 61

[. . . ]

Rio, 16 — [. . . ] O ministro de Portugal recebeu, ontem, o seguinte

telegrama:

“Lisboa. Sossego completo país. Coluna móveis percorrem o norte em

todas as direções, não encontrando rebeldes. Núcleos conspiradores descobertos

Belas e outros pontos. Não tem importância a excitação popular.

Conspiradores acalmando-se. Ligeiros incidentes pessoas em Vasconcelos.

61 A Federação, 16 de julho de 1912, p. 1.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 99

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 62

Madrid, 16 — Os acontecimentos na fronteira portuguesa continuam a

preocupar as atenções, discutindo-se acaloradamente em todos os círculos

políticos a atitude ao gabinete.

Lisboa, 17 — Os conspiradores monárquicos voltaram a Soutelinho,

donde se retiraram depois de acampar na Gironda. Abriram valados e construíram

obras ligeiras de defesa.

Na fronteira, perto de Verin, foi apreendida pelas tropas republicanas

grandes porção de armamento e transportado em três carros.

Em Vilar de Perdizes foi preso um homem que procurava hastear na

frente da Câmara Municipal uma bandeira monárquica.

Populares em Torres Vedras tentaram linchar conspiradores que eram

conduzidos presos para a cadeia da localidade.

Não tem fundamento a notícia da prisão do Conde da Guarda.

O paquete Cabo Verde foi armado em guerra como transporte, para servir

de alojamento aos revolucionários presos por motivo das últimas ocorrências

na fronteira.

Telegramas de Chaves para Madrid informam ter o deputado António

Granjo declarado que os revolucionários portugueses estão reunindo gente

em Pia Ferre, fronteira espanhola.

Outras informações vindas do Norte de Portugal para Lisboa dizem que

o chefe revolucionário Paiva Couceiro continua acampado na fronteira, hesitando

em avançar para o interior, por temer um movimento envolvente das

forças republicanas e sem querer entrar em Espanha, receoso de ser preso.

Acrescentam esses telegramas que em toda a região, nas proximidades da

fronteira, reina absoluto sossego.

Ao chegar, hoje, a Lisboa, um conspirador posto em liberdade sob fiança,

a multidão tentou agredi-lo, impedindo-a de o fazer a cavalaria de polícia,

que dispersou o povo, restabelecendo a ordem.

62 A Federação, 17 de julho de 1912, p. 4.

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100 Reto Monico

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 63

Lisboa, 18 — Dizem de Tui que os chefes realistas fretaram um vapor

para transportá-los ao Brasil.

Em Chaves, foram efetuadas muitas prisões de indivíduos implicados no

complot monárquico.

A administração do caminho de ferro do Minho atrasou o horário dos

trens por prevenção, tendo ordenado precauções na passagem das pontes.

Está assentado que somente as autoridades legais poderão proceder buscas

e efetuar prisões.

Informações obtidas pelo ministro da guerra relatam que carabineiros

espanhóis preveniram as tropas portuguesas da fronteira que Paiva Couceiro

está com gente na povoação espanhola Ginço Lima nas margens do rio Lima.

O transporte Cabo Verde a cujo bordo estão os conspiradores prisioneiros

está sendo vigiado por torpedeiros e avisos Cinco de Outubro.

Os jornais noticiam que João Almeida dirigiu na recente incursão um

manifesto aos correligionários minhotos e transmontanos avisando-os que

Couceiro ia executar o plano de restaurar a monarquia e que eles tinham

o dever de o auxiliarem e seguir a bandeira azul e branca na hora em que

Couceiro a desfraldasse.

[. . . ]

As prisões efetuadas por ocasião das buscas domiciliárias em Sintra não

foram mantidas.

Em Silves, no Algarve, foram presos alguns conspiradores e apreendidas

armas e munições.

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 64

Lisboa, 19 — À vista da atual situação, cessaram as prevenções das forças

armadas.

Nos combates de Chaves, as tropas republicanas gastaram 49 cartuchos.

Em Aveiro, foi preso um monarquista que ali se achava foragido desde a

véspera da incursão.

63 A Federação, 19 de julho de 1912, p. 4.

64 A Federação, 20 de julho de 1912, p. 4.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 101

Dizem de Melgaço que 150 conspiradores que estavam nas povoações

espanholas próximas à fronteira retiraram-se com destino ignorado.

O capitão João de Almeida recusou-se a assinar o auto de investigação

feito pelas autoridades republicanas, exigindo o tratamento de Dom.

Foram incendiadas diversas casas de Lamego, onde a polícia descobriu a

existência de bombas explosivas.

Estão presos três oficiais e detidos alguns sargentos da guarnição de

Braga, sendo ali suspensas as garantias constitucionais.

As autoridades de Braga convidaram os cidadãos aí domiciliados a entregarem,

dentro de 48 horas, as armas e munições explosivas que tiverem em

seu poder.

Londres, 19 — Telegramas de Lisboa dizem que em consequência do

insucesso da invasão realista, o governo espanhol está desarmando os refugiados

portugueses, achando-se dispostos a expulsá-los da Península.

Muito refugiados pediram para serem mandados para o Brasil e outros

para a República Argentina.

O governo espanhol contratou o transporte dos mesmos para América do

Sul, entrando o governo português com a metade das despesas.

Afirma-se que muitos chefes realistas seguirão pelos primeiros vapores.

Vigo, 19 — Os portugueses residentes nesta cidade afirmam que o capitão

Paiva Couceiro acusa, como responsáveis pelo malogro da conspiração

monárquica, vários comités, os quais tinham-se comprometidos a auxilia-lo

e desistiram da tentativa logo que viram a resistência oferecida pelas forças

republicanas.

Acrescentam vários indivíduos que por isso o chefe da conspiração resolveu

emigrar para a República Argentina.

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 65

Madrid, 22 — Telegramas de Tui informam que foram postos em liberdade

os fiadores dos conspiradores monárquicos portugueses presos devido

ao desaparecimento repentino dos realistas afiançados.

65 A Federação, 22 de julho de 1912, p. 4.

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102 Reto Monico

A população de Tui, quando os fiadores saíram da cadeia, fez-lhes carinhosa

recepção de simpatia.

Lisboa, 22 — Comunicaram de Chaves que faleceu no hospital daquela

vila, Ornelas Vasconcelos, ferido e aprisionado em combate.

Informações da mesma procedência dizem estar averiguado que Paiva

Couceiro havia iniciado o combate com 1 300 homens, dando falta de cerca

de 400, além de muitos feridos, quando acampou na fronteira.

Depois da derrota, a coluna invasora dividia-se em dois bando, um de

manuelistas, que faziam acompanhar-se da bandeira azul branca, e outros de

miguelistas, que ostentavam a bandeira branca, do absolutismo.

[. . . ]

Madrid, 22 — Está confirmada a notícia de se encontrar no território

português, nas montanhas próximas à fronteira, Paiva Couceiro. Diz-se em

rodas de portugueses desta cidade que o ex-capitão conserva-se escondido

em Portugal à espera da chegada do emissário que enviou a Londres a comunicar

a d. Manuel e d. Miguel as causas da derrota dos realistas na ultima

tentativa que fizeram para restaurar a monarquia.

Couceiro, acrescenta-se, mandou pedir a Londres instruções precisas sobre

o que deve fazer, como sobre a atitude a manter para com aqueles que

julga responsáveis pelo fracasso da última tentativa realista.

[. . . ]

Madrid, 22 — Nestes últimos dias têm chegado a Madrid, escoltados pelas

força da guarda benemérita, centenares de emigrados portugueses, presos

em vários pontos do território espanhol.

Entre eles, se encontram antigos oficiais do exército, jornalistas, negociantes,

industrialistas e particulares.

Os emigrados declaram estarem firmemente resolvidos a não aceitar qualquer

graça do governo da república portuguesa.

Asseguram que não regressarão a Portugal nem 2 por cento dos portugueses

que abandonaram o país por ocasião da implantação da República.

Iremos para a Alemanha, dizem eles, para a América e até para o Japão,

se não podermos ganhar a vida noutra parte.

Para Portugal, não voltaremos enquanto não for restaurada a monarquia.

Os emigrados foram internados nas províncias de Cuenca, Teruel e Ourense.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 103

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 66

Lisboa, 23 — Telegramas de Braga dizem ser ali esperada com grande

ansiedade a chegada de João Almeida, recentemente preso em Chaves, quando

tentava atacar a vila à frente de uma grupo de conspiradores monárquicos.

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 67

Lisboa, 23 — Telegramas de Braga dizem ser ali esperada com grande

ansiedade a chegada de João Almeida, recentemente preso em Chaves, quando

tentava atacar aquela vila à frente de um grupo de conspiradores monárquicos.

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 68

Madrid, 23 — Os transatlânticos fundeados no porto de Vigo e Coimbra

passaram durante toda a manhã numerosos e prolongados radiogramas,

pedindo confirmação do radiograma do Cabo Ortegal e que anunciava ter

estalado a revolução em Lisboa e na cidade do Porto.

Nenhum dos paquetes recebeu resposta de seus radiogramas.

Somente muito tarde, a Estação de Viziador passou um grande despacho,

afirmando que em Portugal reinava absoluto sossego, estando tudo em plena

paz.

Londres, 23 — Telegramas procedentes de Madrid afirmam que nas

povoações portuguesas e espanholas da fronteira dava-se como verdadeiro o

radiograma do Cabo Ortegal.

Comunicações telegráficas acrescentavam que o capitão Paiva Couceiro

não abandonou a causa da monarquia e nem os partidários licenciados.

66 A Federação, 23 de julho de 1912, p. 4.

67 A Federação, 23 de julho de 1912, p. 4.

68 A Federação, 24 de julho de 1912, p. 4.

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104 Reto Monico

Dizem que Paiva Couceiro obedece ao plano concebido em Londres, que

tinha como fim mudar de tática e esperar a ocasião mais oportuna para

tentar nova incursão.

Madrid, 23 — Realizou-se, hoje, nesta cidade o comício popular promovido

pelos republicanos e socialistas e presidido por Pablo Iglesias. [. . . ]

Logo que o primeiro orador começou o seu discurso, o monárquico português

de nome Silva começou a aparteá-lo insistentemente, provocando constantes

interrupções, de baixo de protesto das pessoas presentes.

No decorrer do comício, sempre que os oradores faziam referências elogiosas

à República Portuguesa e aos seus homens em evidência, o monarquista

português protestava em altos gritos, dirigindo-se em termos descorteses

aos oradores.

Os apartes tornavam-se tão irritantes e a multidão de tal modo irritada,

pela intervenção do importuno, que o presidente teve que obriga-lo a retirar-

-se, afim de evitar conflitos.

Após, os trabalhos prosseguiram tranquilamente.

Lisboa, 23— [. . . ]

Nas populações do norte têm-se realizado as romarias religiosas do costume

com a maior normalidade.

Está anunciado, em Chaves, o julgamento do capitão João de Almeida,

ao serviço da Áustria e que fora preso quando tentava atacar aquela praça, à

frente de uma coluna realista.

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 69

Lisboa, 25 — O dr. Manuel Arriaga, presidente da República, telegrafou

aos comandantes militares das povoações de Chaves, Valença e Cabeceira de

Bastos, saudando as pessoas do exército português pelas provas de alto valor

e lealdade dadas ultimamente.

Calculam-se em 40 contos de réis fortes os prejuízos causados na incursão

de Paiva Couceiro em Vale Zebro.

O ministério atualmente acha-se preocupado com o empréstimo a realizar,

afim de adquirir um cruzador destroyers, quatro submersíveis e dois

contratorpedeiros.

69 A Federação, 25 de julho de 1912, p. 4.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 105

Notícia o Mundo que foi descoberto um complot monárquico no quartel

general da guarda republicana e com ramificações em companhias aquarteladas

em outros pontos do país.

Conforme vários jornais, foram presos três cabos e um soldado, sendo

que este, na ocasião da prisão, guardava cartuchos.

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 70

Madrid, 26 — Um grupo de rapazes, que se supõe partidários do príncipe

D. Jaime de Bourbon, promoveu desordens em frente à legação de Portugal,

vitoriando d. Manuel e a monarquia portuguesa.

Interveio a polícia, que efetuou oito prisões.

Nas rodas políticas corre com insistência que o ministro de Espanha em

Lisboa, marquês de Villalobar, será substituído naquele cargo, em virtude das

manifestações de desagrado de que foi alvo ultimamente.

Lisboa, 26— Ignora-se o paradeiro de Paiva Couceiro.

Os jornais chamam a atenção do governo para a emigração clandestina

que aumenta dia a dia nos portos da Galiza e do norte do país.

Os comandantes das forças expedicionárias que estão no norte telegrafaram

ao presidente da República, dr. Manuel Arriaga, agradecendo as felicitações

que lhes enviou por motivo da tentativa frustrada de invasão couceirista.

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 71

Madrid, 28 — Foram postos em liberdade os oito rapazes que anteontem

faziam uma manifestação de desagrado em frente à legação de Portugal, por

serem partidários do príncipe d. Jaime. [. . . ]

Lisboa, 28 — Telegrafam de Chaves: Os trabalhos do tribunal marcial

reunido para julgar os conspiradores monárquicos recentemente presos, entre

os quais se encontrava João de Almeida, terminou ontem, ao anoitecer.

70 A Federação, 27 de julho de 1912, p. 4.

71 A Federação, 29 de julho de 1912, p. 6.

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106 Reto Monico

O tribunal condenou João Almeida a 6 anos de prisão celular, seguidos

de dez de degredo.

O chefe realista ouviu, com grande serenidade, a leitura da sentença.

Depois foi conduzido para a prisão especial em que se encontrava.

O presidente do tribunal, como é de praxe, terminado o debate, perguntou-lhe

se tinha alguma coisa a alegar em sua defesa.

O capitão Almeida, pondo-se de pé, respondeu com voz firme e seca:

“— Não defendo o meu país fora das leis e do direito das gentes. Não

reconheço como legal. . . ”

O presidente não o deixou terminar a frase, impondo-lhe o silêncio.

Ao mesmo capitão, foram tomados o cavalo, espada, pistola e bastão,

apreendidos no momento em que ele fora preso, como pertencentes ao Estado.

O capitão João de Almeida foi, depois, conduzido em automóvel à presença

do general comandante da divisão militar e daí levado para bordo do

transporte Cabo Verde, que o levará à África.

Em Tui e outros pontos do estrangeiro, continuam emigradas muitas

famílias portuguesas que, por previdência, não querem voltar a Portugal.

Partiram para o Brasil numerosos sacerdotes que ali conspiravam desde

que se proclamou a República.

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 72

Lisboa, 29 — Foram presos como implicados na conspiração de Braga

os maiores Mota Guedes Bourbon, os tenentes Pissarra, Camacho e Lery, o

alferes Santos e cinco sargentos.

Esses presos foram, conjuntamente com d. João de Almeida, conduzidos

em segredo para o Porto, cruzando, em Penafiel, o automóvel que os conduzia

com o do dr. Afonso Costa. [. . . ]

Comunicam de Cabeceira de Basto terem sido ali presos 30 conspiradores,

que estavam ocultos nas proximidades da vila.

No Asilo do Terço, na cidade do Porto, estão sendo alojados os presos

políticos vindos de diversos pontos do norte do país.

Dali deverão eles ser conduzidos para bordo do transporte Cabo Verde

[. . . ]

72 A Federação, 30 de julho de 1912, p. 2.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 107

Madrid, 29 — Interrogado por diversos jornalistas, o presidente do conselho

espanhol Calalejas confirmou a veracidade da notícia de ter o governo

português pedido a expulsão do território espanhol de todos os emigrados

monárquicos portugueses.

Acrescentou que o governo espanhol reputava desumana semelhante providência,

porque a quase totalidade dos realistas portugueses que se encontram

no território espanhol estão em situação muito precária, sem recursos

de nenhuma espécie para se transportarem a outro país.

O governo espanhol resolveu enviar o pedido de Portugal às Câmaras a

fim de que elas resolvam a respeito.

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 73

Lisboa, 31 — O governo espanhol resolveu internar e não expulsar os

monarquistas portugueses refugiados no território de Espanha.

Não os interna nas Canárias, devido ao estado de penúria deles. [. . . ]

Nas proximidades de Carrazeda de Anciães, na província de Trás-os-Montes,

foram descobertas bombas de dinamite, idênticas às empregadas pelos

realistas para destruir a ponte de Cabeceira de Bastos.

Madrid, 31 —Telegrafam de Verin, dizendo que, ontem, no momento em

que partiam para Ourense sete emigrados portugueses, numerosos espanhóis

que se achavam na estação dirigiram-lhes pesados insultos e ergueram vivas

à república portuguesa.

A guarda benemérita interveio e realizou duas prisões.

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 74

Madrid, 1 o — O ministro do interior, dr. Barroso, explicou aos jornalistas

qual o motivo que levou o cônsul de Portugal, em Vigo, a pedir que fosse

revisitada a residência do senador Navarro, em Pontevedra.

73 A Federação, 31 de julho de 1912, p. 4.

74 A Federação, 1 de agosto de 1912, p. 4.

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108 Reto Monico

Constava que o mesmo tinha albergado o conspirador capitão Paiva Couceiro

e que este se achava disfarçado em chauffeur, pois assim acreditavam

várias pessoas daquela localidade.

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 75

Lisboa, 2 — Em Vilar do Monte, próximo de Barcelos, a polícia descobriu

um complot monarquista que era dirigido pelo pároco da localidade.

Como implicados no mesmo foram presos sete lavradores.

Grande número dos realistas emigrados em Galiza partiu para a França e

para o Brasil. [. . . ]

Lisboa, 2 — O tribunal de Cabeceira de Bastos julgou 11 conspiradores

presos na última incursão realista, sendo absolvidos dois e os restantes

condenados.

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 76

Chaves, 3 — O tribunal condenou Álvaro Morais de Almeida a 6 anos

de prisão celular, seguidos de 10 anos de degredo, como conspirador.

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 77

Lisboa, 8 — O tribunal Marcial de Cabeceira de Bastos condenou 20

presos, conspiradores. [. . . ]

A polícia passou hoje, minuciosa busca no Hotel Lawrence, em Sintra, do

qual é proprietária a mãe da jornalista inglesa presa como conspiradora. Nada

foi encontrado que a comprometesse, sendo a acusada posta em liberdade.

75 A Federação, 2 de agosto de 1912, p. 4.

76 A Federação, 3 de agosto de 1912, p. 4.

77 A Federação, 9 de agosto de 1912, p. 3.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 109

Os jornais dizem que o ministro inglês sir Arthur Harding protestou contra

tal busca.

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 78

Rio, 9 — [. . . ] O governo ofereceu aos governos de Espanha e Portugal

receber como imigrantes os indivíduos envolvidos nos últimos movimentos

restauradores neste último país. [. . . ]

Madrid, 10 — O Radical publica um telegrama de Leon, dizendo que

Paiva Couceiro, em companhia de dois amigos, passou por aquela cidade, em

automóvel, em direção às Astúrias.

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 79

Lisboa, 13 — O governo sabe que o capitão Paiva Couceiro acha-se,

atualmente, em Saint Jean com vários emigrados portugueses.

O País diz que o padre Domingos, chefe do bando de conspiradores,

aprisionado nas serras do Minho, declarou que o movimento incursionista

havia fracassado, porque um tenente-coronel e um capitão da guarnição de

Lisboa, que nele se achavam envolvidos, os denunciara ao governo.

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 80

Lisboa, 14 — Os tribunais marciais, atualmente funcionando, têm pronunciado

várias condenações e absolvições.

O tribunal marcial de Braga condenou 15 conspiradores e absolveu 2; o

de Cabeceira de Bastos condenou 6 e absolveu 4.

78 A Federação, 10 de agosto de 1912, p. 2.

79 A Federação, 13 de agosto de 1912, p. 2.

80 A Federação, 14 de agosto de 1912, p. 2.

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110 Reto Monico

Numa escavação feita num prédio desta capital, foram encontrada 4 caixas

contendo, cada uma, 80 balas para carabina Mauser.

De Portugal 81

Por ter sido denunciada pelos carbonários como conspiradora, foi presa

incomunicável a 2 do corrente, em Lisboa, miss Lawrence, que exerce ali as

funções de correspondente do Daily Mail.

Esta folha londrina, sabedora do fato, dirigiu-se ao Foreign Office demonstrando

que a sua correspondente não se envolvia em política portuguesa,

limitando-se apenas a narrar os acontecimentos que se dão e procurando

obter informações tanto de republicanos como de monarquistas.

No mesmo dia 2, foi ordenado ao ministro inglês mr. Harding que

apresentasse ao governo português uma reclamação exigindo a liberdade de

miss Lawrence.

Logo que a reclamação foi apresentada, o governo português mandou pôr

em liberdade a jornalista inglesa.

O Daily Mail disse que o principal motivo da prisão da sua correspondente

foi o ter ela recusado transmitir notícias inverídicas que lhe eram

ministradas pelo governo português.

Na casa da residência de miss Lawrence foi dada rigorosa busca. Nada

foi encontrado de suspeito.

Como, porém, fosse dada ao governo outra denúncia, foi a correspondente

da folha londrina novamente presa e internada no Aljube, depois de

cumpridas as formalidades legais exigidas por sr. Harding, ministro inglês.

Miss Lawrence, apesar de estrangeira, está sujeita ao regime dos presos

ordinários por ser acusada de conspirar contra a República.

Ela e os seus delatores têm sido acareados no arsenal do exército.

Consta que miss Lawrence constituiu advogado para, depois de ser posta

em liberdade, reclamar uma grande indeminização do governo português pela

violência de que foi vítima, sendo presa e acusada como conspiradora.

Foi presa em Lisboa, a 4 do corrente, a sra. D. Ludovina Ruas, que tinha

convidado um republicano conhecido para entrar na contrarrevolução que

se estava preparando, fazendo-lhe igualmente importantes revelações sobre a

81 A Federação, 17 de agosto de 1912, p. 1.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 111

conspiração, cujo plano lhe traçou, e citando os nomes das principais pessoas

implicadas nesse movimento contra o regime.

Segundo parece, a revolução devia rebentar em Lisboa no dia 9 do mês

passado, sendo pensamento dos conspiradores prender todos os membros do

governos e do parlamento.

Coroada de êxito que fosse esta tentativa, seria avisado o capitão Paiva

Couceiro, para invadir o país pela fronteira do norte, juntamente com as suas

forças, as quais marchariam sobre Lisboa.

Têm sido presos em Viana, Bragança e outros pontos de Portugal muito

sacerdotes que depois da última incursão, regressaram ao país munidos de

salvo-condutos além de promessa de nada lhes acontecer.

Chegaram a 3 do andante, em Vigo, cerca de cem conspiradores monárquicos

portugueses procedentes de diversos pontos, que entraram em negociações

para fretar um vapor que os conduza a América do Sul, sem fazer

escalas pelos pontos de Portugal.

O governo vai fazer um regulamento disciplinar para todas as repartições

do Estado, de modo a evitar que os funcionários públicos conspirem como

se tem verificado.

O conspirador português Joaquim de Sousa, que comandou um grupo de

monarquistas no ataque de Valença, foi condenado pelo Tribunal Marcial de

Braga a 4 anos de prisão celular, seguidos de 8 de degredo e na alternativa a

20 anos de deportação para África.

Um redator da Época, de Madrid, tendo entrevistado um cavaleiro português,

que exerceu altos cargo políticos em Portugal, mas que presentemente

não se acha envolvido na contrarrevolução, vivendo afastado das lutas políticas,

soube:

Que o centro da contrarrevolução achava-se mesmo em Lisboa, sendo

dirigido pelo chefe do Estado Maior do exército republicano.

Que este, na véspera de rebentar a conspiração, quando tudo se achava

disposto para o movimento, faltou aos seus compromissos, chegando até

impedir que se iniciasse o movimento entre as forças do seu comando.

Que ignora-se se foi por medo ou se foi comprado pelo governo.

Referindo-se ao capitão Paiva Couceiro, disse que o seu valor chega à

temeridade, mas não tem condições de organizador.

O entrevistado acredita que muito em breve os elementos monárquicos

tenham a guiá-los um chefe militar de muito maior graduação, que facilitará o

alistamento de muitos chefes que se recusaram obedecer a um oficial inferior.

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112 Reto Monico

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 82

Madrid, 17 — O ministro Canalejas recebeu hoje a visita do governador

de Cuenca que lhe fez entrega de um exemplar do último manifesto

do capitão Paiva Couceiro, dirigido pelo correio, aos emigrados portugueses

internados naquela província.

No referido manifesto, Couceiro comunica aos seus partidários que se

acha profundamente desalentado em virtude dos últimos acontecimentos,

declarando que está absolutamente convencido da nenhuma eficácia de qualquer

movimento contra a República e que, em vista disto, está resolvido em

resignar à chefia do movimento, a fim de dedicar-se exclusivamente ao trabalho,

devendo advertir aos companheiros que vai restituir o dinheiro, que

ainda lhe resta, às pessoas que o enviaram.

O governador de Cuenca disse ao ministro Canalejas que o manifesto de

Paiva Couceiro tem provocado acaloradas discussões entre os emigrados, afirmando

uns que o mesmo é apócrifo, acreditando outros na sua autenticidade,

visto o considerarem absolutamente de acordo com o caráter do signatário.

Badajoz, 17 — Viajantes aqui chegados contam que no momento em

que 800 portugueses se preparavam para tomar o trem na gare do Rossio,

em Lisboa, para assistirem às festas que se realizarão nesta cidade, apareceu

ali grande número de carbonários que arrancaram os bilhetes das mãos dos

passageiros, rasgando-os dizendo em altas vozes que “o português que for a

Espanha não é patriota e não tem vergonha”.

Diante de exclamações desta natureza e devido a atitude dos carbonários,

os passageiros desistiram da viagem. [. . . ]

Lisboa, 19 — O monarquista João Almeida, que se acha preso, apresenta-

-se extremamente abatido.

Foi ele inscrito na penitenciaria com os números 4.191/279.

Ao entrar na cela disse aos seus companheiros chorando: Adeus senhores,

não nos tornaremos a ver.

O padre Barroso, ao desembarcar nesta cidade, no meio dos conspiradores,

provocou hilaridade das pessoas presentes por mal poder andar, divido à

excessiva gordura, a ponto de não encontrar roupa que lhe servisse, tendo de

mandar fazer trajo especial.

82 A Federação, 19 de agosto de 1912, p. 2 e 3.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 113

Na penitenciária de Coimbra foram internados vinte condenados políticos,

implicados no complot Azoia.

O tribunal nacional de Cabeceira de Bastos proferiu, hoje, nove condenações

e uma absolvição.

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 83

Lisboa, 24 — Foi hoje interrogado na penitenciária o monarquista João

Almeida acerca da sua ida, há tempos, à Vilamoura, no Alentejo, onde teve

uma entrevista com o ex-deputado progressista Rabasco, que se provou agora

estar implicado na última conspiração contra as instituições.

Notícias de Portugal 84

(Para A Federação)

Lisboa, 4 de agosto de 1912

Depois da última incursão, em que as nossas tropas, na heroica epopeia

de Chaves, derrotaram completamente os fortes realistas, parece que os conspiradores

se convenceram de todo de que eram irrealizáveis os seus desejos

de implantarem novamente monarquia em território português. Está provado

até à evidência que o país é essencialmente republicano e que não pode

consentir de forma nenhuma a volta de um regime que por tantos séculos o

oprimiu e esmagou.

Os nossos briosos soldados mostraram brilhantemente o seu amor à causa

da República defendendo com pasmosa valentia o solo sagrado da pátria da

invasão premeditada por esses filhos degenerados de Portugal que, para conseguirem

os seus intentos, não hesitavam em pôr nas mãos dos estrangeiros a

vida e a honra do seu país. À deslealdade de uns correspondeu, de um modo

digno e valoroso, a hombridade de outros, em cujos peitos abriga, cheio de

calor e luz, o amor sacratíssimo da pátria e o exemplo dos seus maiores que

assombraram o mundo com tantos prodígios de valor e de heroicidade.

83 A Federação, 24 de agosto de 1912, p. 2.

84 A Federação, 4 de setembro de 1912, p. 1.

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114 Reto Monico

Portugal não pode agora recuar. Conquistou a sua carta de alforria e

os grilhões que deitou por terra nunca mais lhe podem manietar os pulsos;

é livre e independente; quem faz derruir num momento, sem sangue nem

morticínios, o trono onde se sentaram tantos opressores do povo, há de

conservar ilesa a liberdade que conquistou a não consentirá que venham

empanar-lhe o brilho esplêndido da aurora que hoje ilumina o seu límpido

horizonte.

Esses homens desleais à sua terra tiveram incontestavelmente o auxílio do

governo espanhol para as suas arremetidas quixotescas, embora ele pretenda

negar. O seu armamento provinha de fábricas de Espanha, como se viu

nos despojos que eles deixaram na sua retirada apressadíssima diante das

forças leais à República. Mas esse auxílio não representa a vontade do povo

espanhol; é apenas a imposição dos nossos inimigos, imposição a que o

ministro provavelmente se curvou; o resto do país, os homens de Espanha que

são rasgadamente liberais, protestam contra o procedimento desse governo,

que é uma violação flagrante do direito da gente, e tem dado a Portugal mais

evidentes provas de consideração e de simpatia. A colónia espanhola tem-

-se posto ao nosso lado, quer dizer ao lado da razão e da justiça, e verbera

acremente o decidido auxílio, a escandalosa proteção que em terras da Galiza

se concedeu aos conspiradores portugueses.

Noutros países também tem encontrado eco a voz vibrante que clama

contra tão grande injustiça e afinal a Espanha resolveu-se a mandar retirar

da fronteira os que pretendiam semear em Portugal a guerra civil, cobrir de

sangue e de luto a terra que os viu nascer, a terra que para todos é mãe

carinhosa e que eles renegaram, sem o mais leve assomo de pejo.

Está consolidada a República. Podemos orgulhar-nos do nosso exército.

Esse sim que é verdadeiramente português.

Para julgar os conspiradores que têm sido presos ultimamente, formaram-

-se tribunais marciais. A extraordinária benevolência com que os tribunais

civis trataram há tempo os réus apresentados como conspiradores, pondo-os

em liberdade para irem novamente engrossar as hostes de Paiva Couceiro, é

agora substituída pela severa retidão, pela rigorosa justiça. Todos têm sido

condenados no máximo da pena, porque a lei não admite exceções. Oxalá

isto sirva de exemplo a esses desvairados, para que não tornem a meter-se

em aventuras arriscadas e ruinosas.

Os nossos soldados não podiam deixar de vencer. Homens cheios de lealdade

e de fé, animados com a nobre e generosa ideia de defender a sua terra

de uma invasão iníqua, haviam sempre de sobrepor-se a estes mercenários

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 115

que defendiam unicamente o ideal do dinheiro, que por uns míseros tostões,

abandonaram a pátria e a família, tornando-se num bando de guerrilheiros a

que ninguém dá quartel. Quantos deles estarão agora sinceramente arrependidos

do passo errado que deram! É nesse o seu maior castigo; o remorso de

terem atraiçoado a sua pátria persegue-os de dia e de noite e não lhes deixa

um instante de sossego.

Míseros!

A Espanha mandou internar os realistas em Cuenca e Teruel. Quer isso

dizer que, se puderem tornarão a aproximar-se da fronteira e entrarão novamente

em Portugal.

Dessa creio eu que os livraremos nós. Para gracejo já basta, ainda assim,

gracejo que custou algumas vidas. A Espanha não os expulsa do seu território,

porque acha isso um ato de desumanidade. Ficam-lhe muito bem esses

sentimentos. Humanitário era deixá-los entrar em Portugal à mão armada e

levarem tudo a ferro e fogo diante de si. Isso sim, que tocava as raias da

humanidade.

Belos sentimentos de alguns de nuestros hermanos.

Longe de nós a depreciar a Espanha, que não é responsável pelo que

fazem meia dúzia dos seus filhos. Já frisámos que nesse nobre país, temos

amigos, e amigos sinceros.

Ainda há pouco, esteve entre nós o ilustre deputado espanhol d. Rodrigo

Soriano, que na Galiza nos defendeu valentemente, opondo-se às manobras

dos conspiradores e censurando, com todo o ardor da sua alma generosa,

a proteção que o governo espanhol lhes dispensou. Por isso, foi recebido

na capital com uma das maiores ovações que temos presenteado e que o

comoveu de uma maneira extraordinária.

O nosso povo, extremamente bom e sensível, é sempre justo para com os

que sabem compreender as leis da honra e da lealdade; o povo português é,

sem dúvida, um povo único no mundo.

No Porto também, D. Rodrigo Soriano recebeu as maiores demonstrações

de simpatia.

* * *

Os reacionários inimigos de Portugal escrevem, nos seus órgãos de imprensa

espanhola, coisas terríveis a respeito do nosso país. Segundo eles, as

prisões são aos montes e até tem havido fuzilamentos. Valha-me Deus!

Mas o caso é que a calúnia sempre deixa rastro e pode haver quem

acredite nessas notícias insidiosas. Um jornal do país vizinho, porém, a

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116 Reto Monico

España Livre, desmente esses aleives e faz-nos a devida justiça. Ainda bem.

Aqui não se praticam crueldades; a pena de morte foi abolida em Portugal há

muitos anos e felizmente essa nódoa nunca mais nos tornará a manchar. Nós

não temos a sombra de Ferrer a cobrir de negro as páginas da nossa história.

* * *

Uma senhora inglesa, correspondente do jornal Daily Mail, miss Alce

Laurence Orans, filha do dono do Hotel Laurence, em Sintra, foi presa como

estando envolvida no último movimento monárquico e recolheu à cadeia do

Aljube. Dizia-se que em casa dela se realizavam reuniões em que se tratava

da restauração da monarquia.

Depois de demorada conferência entre o ministro da Inglaterra, o nosso

ministro dos estrangeiros e o chefe do estado maior da primeira divisão, esta

senhora foi removida para sua casa, ficando aí incomunicável e com guarda

à vista.

Uma folha de grande cotação no nosso meio jornalístico censura este

determinação, dizendo que o Aljube ainda não abriu sucursais em parte

nenhuma e que não deve haver exceções em caso de qualquer delito.

Damos-lhe toda a razão.

* * *

E Paiva Couceiro? Que é feito do grande paladino da monarquia, do chefe

de todas estas conspirações?

Dizem uns que foi a Londres dar conta a d. Manuel e a d. Miguel do

mau resultado de todos os seus planos; outros dizem que está em Espanha;

outros ainda que encontra escondido em Portugal. Esta última versão não

nos parece que seja verdadeira.

O certo é que alguns dos conspiradores, segundo se diz, vão embarcar

para o Brasil. Que se deem por lá muito bem e que não façam dano.

Danton

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A Federação (1911-1912) 117

OS EMIGRADOS PORTUGUESES 85

VÁRIAS ENTREVISTAS

Da Imprensa, de 23 de agosto:

Falam-nos quatro emigrados; três padres e um escrivão

O sr. Joaquim Freire, presidente da Liga Monárquica D. Manuel II, importante

comerciante desta praça, é um distinto elemento da colónia portuguesa

desta capital. Recebeu-nos com a sua peculiar bondade:

– Os clérigos deves estar à noite lá na sede da Liga, e, com prazer, farei

a apresentação que deseja.

– Obrigado!

Às 7 1 / 2 horas da noite, pois, estávamos na Liga, àquela hora cheia de

sócios, que, no grande salão, faziam grupo aqui e ali, a palestrar com alegria.

À entrada do sr. Joaquim Freire, houve um movimento de carinhoso respeito.

Depois, cada sócio, que chegava, púnhamos atenção no comprimento

que entre os ligados monárquicos é feito, com as seguintes palavras: — Saúde

e monarquia! E palavras pronunciadas com um acento de sincera fé.

Poucos minutos após, entravam alguns dos emigrados portugueses, entre

os quais monsenhor Paulo Antunes, abade de Ermesinde, na cidade do Porto;

padre José António Correia, abade de Ganfei, no Minho; padre Luís António

Pereira, pároco da freguesia de Beirão, concelho de Valença, e Miguel Pereira

Batista, escrivão-notário de Castro Daire, em Viseu.

A nossa ligeira palestra começa-mola pelo primeiro, que fala com graça

inteligente, irradiando simpatia dos gestos:

— Não podíamos tocar em portos portugueses. Embarcámos em Vigo,

para Cádis, a 5 deste mês e, de Cádis, para o Brasil, no vapor Satrustegui,

levando 14 dias de viagem e só tocando em Tenerife. Os emigrados, na sua

quase totalidade, se dirigiam de Cuenca a Cádis, de onde partiram connosco.

Chegámos hoje.

— Porque deixou Portugal?

— Tangido pelas atrozes perseguições dos republicanos, com os carbonários

à frente, busquei terras em Espanha, perfeitamente persuadido, como

ainda hoje estou, de voltar para a minha Pátria. Fui aguardar que o tufão

moral que desencadeia sobre o meu país passasse.

— Passasse como?

85 A Federação, 5 de setembro de 1912, p. 1.

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118 Reto Monico

— De qualquer forma; pela vitória da contrarrevolução ou pela volta da

paz, do critério, dos sentimentos de humanidade, nos seus dominantes de

agora.

— Então, crê ou acreditava na vitória da? . . .

— . . . Atravessei a Serra do Jerez caminhando sempre pelos montes, afastando-me

das estradas frequentadas e conhecidas. Em todas as localidades

que chegava, em todas as freguesias, era muito bem acolhido pela população.

— Não são republicanos?. . .

— Os campónios e os montezinhos odeiam a República; homens, mulheres,

crianças abominam a Carbonária. Nessas freguesias, apenas o regedor e

mais dúzia de empregados públicos são republicanos.

— Sim?

— É o que lhe digo. Fiz a travessia a pé, temendo cair nas garras das

feras republicanas. Entre Santo Tirso e Vila do Conde, encontrei-me com um

meu compadre. Saudámo-nos e fomos cada um para o seu lado. Foi um

encontro que me deixou lembrança, porque o sinto como um adeus!

— E chegado a Espanha, reverendo?

— Passei oito dias desentumecendo as pernas, inchadas de tanto andar.

Depois visitei amigos, dirigindo-me para Tui a reunir-me a patrícios. Passámos

uma vida vagueando por aqueles montes e aldeias em contato com

montanheses e agricultores. Aos montanheses e agricultores, proprietários

daquelas regiões, tínhamos que nos apresentar e dar a conhecer, para não

nos julgarem republicanos ou carbonários, porque, a estes eles absolutamente

não acolhem.

— E a última incursão de Couceiro?

— A última incursão de Couceiro foi mal sucedida, porque falharam,

desencontraram os elementos internos, agindo sem harmonia.

— Porquê?

— Porque houve traições; porque Couceiro foi traído.

— E o reverendo ficará aqui no Brasil?

— Esta é uma terra bem fadada; hospitaleira, maravilhosa, nova, generosa,

que nos fala ao coração. Desejaríamos. . . Mas, o nosso desejo supremo é

voltar para Portugal, porque lá ficou a maior parte do nosso coração. Logo

que na minha pátria haja ordem, dignidade, caráter, a gente estará lá.

— E a sua vida aqui?

— Pergunto-me a mi mesmo: é uma interrogação

O segundo falou-nos:

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 119

— À meia noite de 6 para 7 do mês passado, os homens da coluna do

capitão Vítor Sepulveda, cento e vinte cinco válido, passara de Espanha para

Portugal atravessando, em barcos, o rio Minho, e armando-se no lado de cá.

Armados, marcharam para Valença que é uma vila e uma praça forte, a fim

de ataca-la e tomá-la. Às 4 horas da manhã de 7, cercaram Valença, tomando

logo a estação ferroviária e a ponte internacional e iniciando intenso ataque,

que foi sustentado até às horas da manhã, quando cessou o fogo. Foi um

combate violento de parte. As tropas republicanas muito bem entrincheiradas,

armadas de fuzis e metralhadoras, resistiram com vantagem. Era uma

força mais numerosa, mais bem armada e estava estrategicamente mais bem

colocada. Às 9 da manhã, o capitão Sepúlveda, vendo que os seus comandados

se expunham muito com uma valentia louca, e considerando o perigo

de um grande desastre, já que não podia tomar a praça totalmente, ordenou

a retirada. Fez portanto a retirada depois de perder três homens, para Tui,

onde a coluna foi desarmada pela guarda civil espanhola que a dispersou.

— E o senhor, que fazia?

— Eu foi o guia da coluna.

O terceiro contou-nos: Também eu fui guia da sub-coluna do capitão

Vítor Sepúlveda, do Estado Maior de Paiva Couceiro, comandada pelo sargento

Damião. Dirigimo-nos para o sul de Valença, onde fizemos guarda às portas

da Coroada. Éramos vinte e cinco homens. À 9 horas da manhã, do dia 7, do

mês passado, depois do ataque a praça, recebíamos ordem de retirada para

Segadães, donde passamos para a Espanha, sendo desarmados.

E é só. . .

O quarto, sr. Miguel Pereira Batista Castro, assim nos narrou:

— Vim para o Brasil à minha custa. A 30 de setembro, fui a Montes,

depois de haver levantado o Concelho de Castro Daire, onde sou escrivão

notário.

E fez pausa.

— Então?

— Ora então!. . . Principiemos pelo começo, disse com franqueza; Havia

um “complot” monárquico no meu círculo, que é todo lamego. Esse “complot”

era presidido pelo meu amigo dr. Rufino César Osório, advogado. Este, por

sua vez, se entendia com o major Vieira de Castro, do Estado-Maior da Coluna

de Paiva Couceiro. No dia 30 de setembro, tive ordem do dr. Rufino, nos

termos que havíamos combinado para levantar o Concelho. Os termos são os

deste telegrama.

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120 Reto Monico

E tirou duma carteira um papel amarelo, fórmula de telegrama, lendo-nos:

— É amanhã o dia da caçada. Não falte. Rufino.

Leu e continuou: De posse do telegrama, saí a agir, despachei gente para

a cercania e mandei que os sinos tocassem a rebate. Daí a poucas horas,

900 homens armados cercavam a vila. Era o meu pessoal. Recebendo a

notícia que o meu povo estava a postos, ordenei a quatro companheiros que

fossem depor e prender as autoridades. Mal o fazia, quando recebo do dr.

Rufino este outro telegrama: “Aguarde nova comunicação. Rufino.” Era de

desesperar! Estava eu com os 900 homens prontos, reunidos. Que havia de

fazer? Refleti. Passados os primeiros minutos, resolvi mandar dispersar toda

aquela boa, corajosa gente. Meti-me em casa. À noite desse dia, uma garotada

republicana saiu à rua a fazer berraria numa zaragata dos mil diabos, a gritar,

mate-se! Enforque-se! Esfole-se! E tanto fez que eu perdi a tramontana:

armei-me e sair à rua. A garotada emudeceu. Sabendo, ao depois, da vinda

de forças republicanas, tomei um carro e dirigi-me a caminhoa a Lamego. À

certa altura, passei pela tropa carbonária, que ia cantando: “A Vassourinha”

Fui ter com o dr Rufino. O homem estava apoquentadíssimo. Voltei a seguir

para a minha freguesia até à época em que, fugindo à sanha canibalesca dos

republicanos, embarquei para Elvas, de Elvas fui a Badajoz. De Badajoz a

Vigo, de Vigo a Tui, donde finalmente, na Espanha, em Cadiz, parti para o

Brasil. Eis a minha rápida história.

SERVIÇO TELEGRÁFICO D’ “A FEDERAÇÃO” 86

Lisboa, 14 — De acordo com as negociações feitas entre os governos de

Espanha e Portugal, serão expulsos do território espanhol os chefes da última

conspiração monárquica.

Naquelas negociações, entre outra, ficaram estabelecidas as seguintes

cláusulas:

Serão julgados pelos tribunais espanhóis todos os emigrados que estiverem

debaixo da alçada das leis espanholas; ficam proibidos de regressarem à

Espanha todos os emigrados que em julho último conspiraram contra Portugal;

esta proibição é extensiva aos emigrados que aceitaram o oferecimento do

Brasil de pagar-lhes a passagem, a fim de que os mesmos saiam da Espanha,

bem como a todos os emigrados que procurarem refúgio noutras nações.

86 A Federação, 14 de setembro de 1912, p. 4.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 121

A redação de tal convenção é de caráter permanente e é recíproco, a fim

de impedir futuras conspirações.

Notícias de Portugal 87

(Para A Federação)

Lisboa, 1 de setembro de 1912

No domingo 19, à hora e meia da tarde, efetuou-se no Coliseu da rua

da Palma a sessão solene em hora dos três heróis de Chaves, o mestre de

clarins, António de Azevedo, e os dois soldados que prenderam d. João de

Almeida. O dr. Alexandre Braga não pude comparecer. A sessão decorreu

sempre no meio do mais vivo entusiasmo. À noite houve também em sua

honra uma récita no teatro Avenida. No fim do espetáculo, António Azevedo,

acompanhado pelos seus camaradas, apareceu no proscénio empunhando a

bandeira portuguesa. A orquestra executou repetidas vezes o hino nacional e

o entusiasmo tocou então às raias do delírio.

Na praça do Campo Pequeno, onde assistiram à tourada, num camarote

de primeira ordem, primorosamente enfeitado, também receberam vibrantes

ovações do público que enchia o vasto recinto.

Os artistas tauromáquicos ofereceram-lhes sortes no decurso do espetáculo.

Iam acompanhados por um filho de António de Azevedo, rapaz de

muito valor.

[. . . ]

Paiva Couceiro dirigiu, há dias, aos seus partidários, um manifesto aconselhando-os

a que esperassem os acontecimentos e se retirassem da luta, visto

que Portugal parecia aceitar de boa vontade o novo regime, prontos, porém,

a intervir, se esse regime não satisfizesse depois em absoluto os desejos do

país. Esse manifesto termina assim:

“E entretanto, consciência nobre, fronte erguida e fé no futuro!”

Flores de retórica.

La Lanterne, jornal parisiense, a propósito desse manifesto, diz que, efetivamente,

se deve considerar impossível a restauração monárquica em Portugal.

Diz mais que o ex-rei d. Manuel passou por Paris sem ninguém dar por

ele. Este fato, e os dos repetidos desastres dos partidários da realeza, provam

de modo bem claro que a ideia monarquista se dissipa de vez na Europa.

87 A Federação, 2 de outubro de 1912, p. 1.

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122 Reto Monico

* * *

Continuam a ser condenados severamente os realistas a quem se encontra

culpa formada. Os que se prova estarem inocentes são imediatamente

restituídos à liberdade.

Também embarcaram já muitos com destino ao Brasil.

Parece que a famosa conspiração está a dar a alma ao seu espalhafatoso

criador.

Os clericais de Vigo estão furiosos contra o governo espanhol por ele ter

mandado retirar dali os emigrados realistas, e dizem que esse governo se tem

posto às ordens dos carbonários portugueses. O Vaticano também descarrega

as suas iras contra os padres que aceitaram as pensões da República.

É o estertor da agonia.

Danton

Notícias de Portugal 88

(Para A Federação)

Lisboa, 15 de setembro de 1912

Têm continuado a embarcar, com destino ao Brasil, muitos emigrantes

realistas. Como os navios tocaram em Lisboa, a sua passagem despertou

grande curiosidade, acorrendo muita gente em barcos com a ideia de ver

esses desvairados.

Lá estavam eles, no convés do navio, fitando a nossa linda Lisboa e tendo,

por certo, nas almas, a saudade e o arrependimento do seu ato de loucura.

Os navios foram sempre vigiados pela guarda fiscal e a polícia do porto

teve, por vezes, de intervir pelo fato dos emigrantes desrespeitarem a bandeira

que estava arvorada em um dos mastros do navio.

No desembarque dos presos que vêm fora de Lisboa tem havido sempre

cenas desagradáveis por parte do povo, que os enche de apupos e até

pretende agredi-los.

88 A Federação, 15 de outubro de 1912, p. 1 e 2.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 123

Os militares a custo conseguem salvar esses presos da ira popular.

O conde de Penela, emigrado político, publicou um artigo violentíssimo

no Jornal de Notícias, do Porto.

Nesse artigo, diz da gente da Galiza o que Mafona não disse do toucinho.

O governo espanhol processou-os, sendo parte do processo o inspetor de

polícia de Vigo.

No dia 14 do corrente, foi entregue aos tribunais marciais o processo

relativo ao cavalheiro tauromáquico José Casemiro de Almeida.

Depois de visto pelo promotor da justiça, passará para o juiz auditor.

A assembleia geral do Grémio Republicano Português do Rio de Janeiro

pediu ao dr. Bernardino Machado, ministro ali, que servisse de intermediário

para a representação que o Grémio quer fazer apresentar ao governo português

pedindo a comutação das penas de degredo ou de penitenciária aos

condenados políticos.

Estamos de acordo com respeito à generosidade e clemência que devem

existir para todos os que prevaricaram, mas o que é também certo é que quem

o inimigo poupa nas mãos dele morre e, se não fora a extrema brandura com

que o governo provisório tratou os monárquicos nos primeiros tempos da

República, não teriam as coisas chegado ao tristíssimo estado em que as

vemos.

A doutrina de Cristo, quando dizia que quem recebe uma bofetada na

face direita devia logo oferecer a esquerda, pode ser muito bela em teoria,

mas, na prática, não nos agrada de forma nenhuma. Puro idealismo.

Infelizmente, por mais que os homens de coração se empenham na cruzada

benemérita de fazer com que a humanidade, em vez de se digladiar

sempre, se dê fraternalmente as mãos, em comunhão recíproca de afetos e

de sentimentos, a paz universal é ainda um sonho difícil de realizar, por que

vemos todas as nações armarem-se até aos dentes, na previsão de prováveis

colisões.

Os grandes povos pretendem absorver os pequenos a força vence o direito

e o momento em que todos os que povoam a terra se liguem num estreito

abraço parece-nos vir ainda a grande, a enorme distância.

Em todo o caso, a semente está lançada à terra e felizes os que lhe

colherem os ótimos frutos.

* * *

Devido a bem conduzidos trabalhos diplomáticos, chegou-se finalmente

a um acordo entre Portugal e Espanha. Felicitamos, por isso, os dois países,

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124 Reto Monico

entre os quais devem sempre existir as melhores relações de amizade.

Os agitadores da opinião pública, os que pretendem, com os seus trabalhos

de sapa, inutilizar todos os grandes esforços e fazer gorar as mais

belas intenções ficaram desta vez mal. E hão de convencer-se de que nada

farão com os seus manejos astuciosos, com as suas manobras ardilosas; serão

fatalmente aniquilados e o triunfo há de pertencer aos que trabalham

denodadamente pela vitória das causas nobre e justas.

O governo espanhol, reconhecendo a justiça e a lealdade dos pedidos

do gabinete português, concordou com ele na expulsão dos chefes principais

fautores da conspiração; como o governo brasileiro se oferecesse, espontânea

e generosamente, para receber no seu território os emigrados portugueses, o

de Portugal pediu então aos espanhol que impedisse a volta ao seu território,

num prazo de três anos, de todos que tivessem conspirado em Espanha até

o passado mês de julho. O governo espanhol satisfez esse pedido e o acordo

entre os dois países, no tocante à questão dos conspiradores, realizou-se nas

bases seguintes:

1 o A expulsão de Espanha de todos os chefes e fautores da conspiração;

2 o Julgamento de todos os implicados que estejam sujeitos às sanções das

leis penais espanholas;

3 o Interdição de regressarem ao território de Espanha, durante três anos,

a todos os que, tendo conspirado em Espanha, até julho último, contra o

regime estabelecido em Portugal, aceitaram o oferecimento do governo da

República Brasileira, retirando para o Brasil, sendo essa interdição extensiva a

todos os que saírem para outras nações.

4 a redação de uma convenção de caráter permanente e recíproco, para

impedir futuras conspirações.

Ambos os governos, de parte a parte, mostraram os melhores desejos de

firma o mais lealmente possível as relações de cordialidade e de afeto entre

os dois povos vizinhos.

E a esses esforços se deveu o acordo ultimamente publicado e que resultou

honrosíssimo para ambos.

O ministro português em Espanha, sr. José Relvas, que foi infatigável nestes

trabalhos, retirou-se depois para Portugal, por se encontrar muito doente,

tendo para isso alcançado previamente licença. Mas, depois de restabelecido,

o que desejamos seja o mais breve possível, é natural que volte para Madrid,

continuando a representar ali honrosamente o seus país.

O ministro de Espanha em Lisboa, sr. Marquês de Villalobos, também

alcançou licença por algum tempo, para fazer uma viagem, mas depois torna

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 125

a vir ocupar o seu lugar em Lisboa, onde é muito estimado pelas suas altas

qualidades de cavalheiro e de diplomata.

Mais uma vez, a montanha deu à luz um ratinho.

E, contra o que se disse, neste assunto não houve nenhuma intervenção

estranha. O boato que a esse respeito se propalou é redondamente falso. Só

às boas intenções se deveu o resultado favorável da questão.

[. . . ]

La Época diz não acreditar que o governo do sr. Canalejas tenha consentido

nos termos do tratado, sem que Portugal, por sua parte, se comprometesse

a impedir que os republicanos espanhóis venham a conspirar em

território português. Pede que se observe o direito nacional, mas intende que

os espanhóis não devem enfeudar a sua ação ao serviço de Portugal.

O ministro do interior do governo de Espanha, sendo interrogado a respeito

do suposto acordo entre Espanha e Portugal, acerca dos conspiradores

portugueses, respondeu que não tinha conhecimento desse acordo, porque

em nenhum conselho de ministros tinham tratado dele.

Sabia apenas ter havido conferências relativas à expulsão dos conspiradores

entre os srs. José Relvas, Canalejas e Garcia Prieto, quando da incursão

couceirista em Portugal, mas essas conferências deram-no por terminadas há

dias.

Seja como for e digam o que disserem os que pretendem pôr entraves ao

bom andamento dos negócios portugueses, o que é hoje um fato indiscutível

é que a conspiração monárquica está morta de todos e que Portugal pode

agora caminhar desassombradamente, trabalhando, de lama e coração para o

seu futuro engrandecimento.

[. . . ]

Danton

Correspondência do Rio 89

[. . . ]

O Estado de São Paulo publicou a seguinte notícia:

“Os acontecimentos políticos que se desenrolam em Portugal após o advento

da República e que ainda agora perturbam a marcha regular dos negó-

89 A Federação, 16 de outubro de 1912, p. 2.

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126 Reto Monico

cios públicos daquele país, têm determinado uma crescente imigração para a

América do Sul, para o Brasil principalmente.

Entre os que escolheram o nosso país para desenvolver a sua atividade

acham-se três filhos do grande romancista Eça de Queirós.

Dois deles serviram nas hostes de Paiva Couceiro, os srs. José Maria Eça

de Queirós, de 23 anos de idade, e António Eça de Queirós, de 22, alferes de

cavalaria.

O outro filho do autor das Cidades e as serras é o sr. Alberto Eça de

Queirós conta 21 anos e era estudante de agronomia, cujo curso estava prestes

a completar.

Todos se acham em S. Paulo, sendo que os dois primeiros encontraram

colocação no comércio desta capital e o último numa fazenda do interior do

Estado.

Dando esta notícia, cremos ter dado uma novidade interessante aos nossos

leitores, sobretudo aos admiradores do fulgurante escritor, que no Brasil

são em número elevadíssimo.

Afinal, o nosso país pode dizer-se que foi escolhido para ponto de destino

de uma família privilegiada como a de Eça de Queirós.

Este jamais pode realizar o seu sonho de vir ao Brasil, mas o seu espírito

interessou-se sempre pela nossa cultura e pela nossa civilização.

Seus filhos, que pelo lado materno são bisnetos do conde de Resende, vieram

agora, pela força do destino, pisar terras que seu avô perlustrou quando

aqui desempenhava as funções de vice-rei.”

Notícias de Portugal 90

(Para A Federação)

Lisboa, 13 de outubro de 1912

D. Manuel, o rei destronado de Portugal, não deixa de abrigar o sonho

dourado de tornar a cingir a coroa.

Ultimamente publicou ele, no jornal francês Le Gaulois, um manifesto em

que declara solene e formalmente, de uma vez para sempre, que não renuncia

à esperança de que se dê a restauração monárquica e dos que apesar dos

revezes que Paiva Couceiro sofreu nas suas tentativas de implantar outra

90 A Federação, 12 de novembro de 1912, p. 1 e 2.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 127

vez em Portugal o antigo regime, a honra está salva e o princípio político

permanece intacto.

Já nos vai lembrando este cegarrega o Cansado chá que ferve com esta a

sétima vez, do nosso Nicolau Torrentino.

Em suma . . . de esperanças vive o homem até que morre.

[. . . ]

O julgamento dos acusados da conjuração da Serra da Carregueira, depois

de grande demora, devido às muitas testemunhas que tinham de depor, teve

afinal o desenlace.

Francisco Melo da Costa, d. Vasco da Câmara, Laurentino Ferreira e

d. José de Mascarenhas foram condenados em seis anos de prisão maior

celular, seguidos de dez de degredo, ou na alternativa em vinte de degredo

em possessão de primeira classe; o Peres, que não teve as atenuantes que

militava em favor dos seus companheiros, foi condenado em pena igual, com

a agravante de ser cumprido o degredo em possessão de segunda classe.

Mais outros acusados de conspiradores foram também condenados.

Alguns dos presos políticos implicados na conspiração do Algarve e que

estão presos no Limoeiro dirigiram num jornal uma carta ao governador civil

de Faro, dizendo-se vítimas de vinganças que se exerceram contra eles.

Aquela autoridade, encontrando-se agora em Lisboa, foi à cadeia ouvir

pessoalmente os presos, com o intuito de verificar se eles efetivamente têm

razão e providenciar para que se faça justiça.

Em Celorico de Basto uns indivíduos presos como conspiradores e postos

em liberdade por falta de provas, vão processar os autores das denúncias que

foram dadas contra eles, para castigarem os que, por inimizado pessoal, os

fizeram sofrer uns dias de cativeiro.

A ser verdade, todo o rigor da lei é pouco para os miseráveis que denunciam

falsamente um indivíduo, pelos simples fato de estarem indispostos

com ele.

* * *

Paiva Couceiro botou outra vez manifesto; agora é dirigido aos membros

da colónia portuguesa no Brasil que ficaram sem o seu rico dinheiro.

Defende-se conforme pode.

Coitadito!

Danton

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128 Reto Monico

Notícias de Portugal 91

(Para A Federação)

Lisboa, 27 de outubro de 1912

[. . . ]

Têm continuado os julgamentos dos conspiradores, sem demasiada importância.

Poucos foram postos em liberdade.

Ainda assim, sem querermos, por forma alguma, intervir na ação da

justiça, achamos que essa tem sido um pouco morosa.

Em nossa opinião devia andar-se mais depressa com os julgamentos,

porque, como se tem visto, neste caso têm aparecido inocentes. Ora tem

encerrado numa prisão, meses e meses, quem não praticou crime algum,

que foi preso simplesmente por suspeita ou por denúncia que pode às vezes

obedecer aos instintos ruins de quem o fez, é simplesmente desumano.

Sejamos justos e razoáveis.

Quem paga a esses infelizes inocentes os vexames e os incómodos que

uma injusta prisão lhes causou?

Quem os remunera dos prejuízos pecuniários que sofreram, das lágrimas

que as famílias derramaram por se verem privadas do afeto e do auxílio

material dos seus chefes? Ninguém. Quando muito, pede-se-lhes desculpa do

engano da justiça.

Ora isto, num regime de liberdade, num regime que com tantos esforços

se implantou para acabar com todos os erros e com todas as anomalias de

uma situação anacrónica, não pode, nem deve existir.

Que os dignos magistrados, embora com sacrifício, deem mais rápido andamento

e os inocentes voltarão a alcançar a liberdade que tão injustamente

lhes foi tirada.

Procuremos, com toda as nossas forças, fazer com que nem a mais leve

sombra venha empanar o brilho triunfante da República.

A restauração monárquica é um sonho que já se dissipou.

Embora uns dementados andem ainda pelo estrangeiro empregando toda

a espécie de meios para a conseguir, tudo isso será baldado.

Em Paris, um ex-deputado nacionalista, ferrenho reacionário, e filho do

célebre Homem Cristo, com quem o governo provisório da República foi tão

clemente e generoso, publicaram um apelo a todos os católicos europeus,

pedindo-lhes o seu auxílio contra a República Portuguesa.

91 A Federação, 25 de novembro de 1912, p. 1.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 129

É mais um arranco de moribundo que se debate nas vascas da agonia.

Os ingénuos que viram o seu dinheiro malbaratado por Paiva Couceiro

e pelos seus acólitos não tornarão certamente a dá-lo de mão beijada, para

uma empresa de resultados problemáticos.

* * *

O capitão João de Almeida, que, como dissemos, ainda está em Londres e

não se apresentou em Lisboa no prazo marcado para se defender e justificar

das acusações que lhe são imputadas como tendo auxiliado Paiva Couceiro

nas suas tentativas contra a República Portuguesa, foi já considerado como

desertor e deve ser julgado a revelia.

Triste situação de um oficial que, no fim de tudo, tinha uma brilhante

folha de serviços feitos ao seu país !

[. . . ]

Danton

Notícias de Portugal 92

(Para A Federação)

Lisboa, 10 de novembro de 1912

O jornal L’Univers, órgão ultraclerical, publicou, em tiragem especial, um

extrato da Revista Antimaçónica; nesse documento, ataca-se vivamente Paiva

Couceiro, o triste herói da conspiração monárquica, pela forma por que dirigiu

a contrarrevolução; diz-se que ele aderiu às instituições republicanas e que

as incursões que fez em Portugal não passaram de farsas e traições.

Arde-lhes agora? Tenham paciência . . . Não provassem do guisado sem

verem primeiro se tinha muita pimenta.

Aí tem o comandante dos conspiradores o belo resultado que tirou em

pretender atacar a sua pátria. Podia ser um excelente servidor da República

e afinal o que é agora? Um sujeito a quem acusam de traidor.

Onde elas se fazem é que se pagam.

92 A Federação, 6 de dezembro de 1912, p. 1.

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130 Reto Monico

* * *

Já foi preso na Guarda o célebre padre José António da Silva Álvaro, que

desde o mês de julho andava fugido pelas serras da Beira, sem ser possível

encontra-lo. Foi ele que deitou a bomba de dinamite no túnel do Salgueiral,

perto do Luso, quando ia a passar um comboio. Foi auxiliado neste belo

feito pelo padre Abel Paulo, de Tiezol, que logo a seguir fugiu para o Brasil.

Espera-se que lhe deem o devido destino.

Realmente este sacerdote exemplar é digno de uma boa recompensa.

[. . . ]

Danton

Notícias de Portugal 93

(Para A Federação)

Lisboa, 25 de novembro de 1912

[. . . ]

Teve doloroso eco em Portugal a notícia do assassínio de Canalejas, presidente

do gabinete espanhol.

Apesar de se dizer por aí, não sabemos se com visos de verdade, que

ele protegera abertamente os conspiradores nas suas tentativas de incursão,

a sua morte causou sincero desgosto, porque não realidade era um homem

de valor e a Espanha perde um estadista de rijo pulso.

A História o julgará.

* * *

Saiu do Limoeiro, completamente livre, o ex-polícia António Ribas, que

fora condenado como conspirador e que, depois de estar na Penitenciária,

tinha sido indultado pelo sr. Presidente da República.

Danton

93 A Federação, 23 de dezembro de 1912, p. 1.

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O Journal de Genève e as

conspirações monárquicas em

Portugal (1911-1912)

Durante várias décadas, o Journal de Genève é, com a Gazette de Lausanne

e o Neue Zürcher Zeitung 1 , um dos três quotidianos de referência

na imprensa suíça. Fundado em 1826, este jornal liberal conservador

publica regularmente artigos e comentários sobre a política internacional,

quase sempre na primeira página. Em outubro de 1910, por

exemplo, escreve sete editoriais sobre Portugal.

Neste texto, vamos analisar os comentários que o diário liberal

dedica à situação na jovem república portuguesa em 1911 e 1912 e,

nomeadamente os que se debruçam sobre a ameaça contrarrevolucionária.

* * * * *

No início do ano, três meses depois da proclamação da República,

Albert Bonnard 2 analisa as dificuldades que enfrenta a jovem república.

O redator sublinha a dificuldade para um jornalista de descobrir a verdade,

entre os comunicados tranquilizadores das legações portuguesas

na Europa e os vários despachos telegráficos. Cita a seguir o Kölnische

Zeitung:

1 Tiragem em 1913: Journal de Genève (1826-1998) 8 200 exemplares; Gazette de

Lausanne (1798-1991), 11 000; Neue Zürcher Zeitung (fundado em 1780), 25 000.

2 BONNARD, Albert, “Que se passe-t-il au Portugal?”, Journal de Genève, 8 de

janeiro de 1911. Albert Bonnard (1858-1917) é redator da Gazette de Lausanne de 1882

a 1909 e do Journal de Genève de 1910 até à sua morte.


132 Reto Monico

Desde a proclamação da República, [. . . ] uma nova indústria

tem muito sucesso em Lisboa, a das notícias falsas. Saem de

todos os lados. Algumas vezes, trata-se de uma tentativa de

revolução de conspiradores chamados Carbonários; outras vezes,

é a candidatura ao trono de um príncipe alemão, outras vezes

ainda, é um ultimato inglês que fere o coração dos patriotas

[. . . ]

Por conseguinte, as várias redações jornalísticas têm de ter muito

cuidado com os telegramas que chegam da capital portuguesa e que

anunciam uma “restauração monárquica” ou uma “crise de anarquia”.

Bonnard critica o Governo Provisório por este ainda não ter marcado

a data das eleições, por legislar demasiado e por intervir no

funcionamento da justiça, afastando de Lisboa os juízes que absolveram

João Franco 3 . O analista suíço, visivelmente desiludido com os

dirigentes republicanos portugueses, realça também a falta de disciplina

no Exército. Isso deve-se, na sua opinião, ao facto dos militares

terem tido um papel importante na origem da revolução: “Quando

começam a desfazer governos, isso torna-se um hábito”.

O jornalista volta a analisar, a 19 do mesmo mês, a situação

político-social portuguesa, muito agitada, sobretudo por causa das numerosas

greves, nomeadamente dos trabalhadores dos caminhos de

ferro, do gás e da companhia da eletricidade 4 . Esta instabilidade pode

favorecer os monárquicos, sublinha o redator do quotidiano liberal, não

dos apoiantes do último rei exilado na Inglaterra, que parece “ter aceite

o seu destino”, mas do ramo absolutista, exilado na Áustria. Trata-se

de D. Miguel de Bragança, primo de D. Manuel II, que faz “declarações

quase liberais” à imprensa. De qualquer forma, conclui Bonnard,

não se sabe ao certo onde ele está porque as notícias publicadas na

imprensa são contraditórias.

Uma semana depois, o correspondente do Journal de Genève na

capital do império austro-húngaro envia um longo artigo publicado no

3 BONNARD, Albert, “Que se passe-t-il au Portugal ?”, Journal de Genève, 8 de

janeiro de 1911.

4 BONNARD, Albert,“Les cheminots portugais e dom Miguel” [Os trabalhadores

ferroviários portugueses e dom Miguel], Journal de Genève, 19 de janeiro de 1911.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 133

espaço reservado ao editorial, no qual fala do Duque de Bragança 5 .

Segundo o jornalista, D. Miguel, que mora a 70 quilómetros de Viena,

não vai “criar dificuldades ao Governo republicano português”, embora,

no fundo, esteja à espera que o país o chame. Nesta eventualidade,

preparou um programa que apresentou recentemente num artigo do

jornal de referência vienense Neue Freie Presse.

Para corroborar a sua opinião acerca da falta de interesse pela coroa

portuguesa por parte do herdeiro do ramo absolutista dos Bragança,

o autor, no final do artigo, cita a opinião duma “pessoa que conhece

bem D. Miguel”:

Ultimamente, o duque envelheceu muito 6 . Quando diz que não

tem a ambição de subir ao trono, temos de acreditar na sua

palavra. Está muito feliz em Seebenstein, rodeado pela família,

e penso que ele não sente a necessidade de mudar de vida. Se

mantém a sua pretensão ao trono, é sobretudo para salvaguardar,

em prol dos seus filhos, os direitos da sua família.

O redator do Journal de Genève debruça-se de novo sobre a situação

portuguesa em abril. Critica sem rodeios o Executivo de Lisboa

“que acaba de proclamar, por decreto, como o Sr. Stolypine” a lei

de separação entre o Estado e a Igreja e que ainda não convocou as

eleições 7 . Citando o jornalista do Frankfurter Zeitung ele nota como o

ambiente favorável à República do outono de 1910, transformou-se em

“decepção e descontentamento”, os quais, no Norte, podem favorecer

“um movimento monárquico”.

Como sabemos, Paiva Couceiro chega à Galiza no início da primavera,

depois de ter escrito ao Governo Provisório. Bonnard analisa esta

carta do “chefe realista” na segunda parte do editorial, lamentando

a censura das autoridades de Lisboa que proibiram a sua publicação

pela imprensa. Para o jornalista genebrino, um regime forte e sólido

não precisa de limitar a liberdade de imprensa. Esta medida pode

só ter uma consequência: dar mais importância e “ressonância a este

5 F.D.B., “Le Duc Miguel de Bragance”, Journal de Genève, 27 de janeiro de 1911.

6 D. Miguel de Bragança nasceu a 19 de setembro de 1853.

7 BONNARD, Albert, “Contre-révolution possible”, Journal de Genève, 22 de abril

de 1911.

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134 Reto Monico

manifesto” e não contribui para consolidar a confiança no regime. O

jornalista suíço reproduz a seguir uma tradução do texto do Paladino,

que analisa com uma certa simpatia:

O capitão Couceiro desenvolve um programa de reconciliação

e de liberdade, demonstrando que, mesmo se a monarquia for

restaurada, o programa de renovação que é a honra e a razão

do partido republicano, pode ser realizado na sua totalidade.

Bonnard refere para terminar que há “conspirações que são denunciadas

por todo o lado”. Na opinião do correspondente alemão já

citado, “dentro de poucas semanas” vai haver “uma tentativa de contrarrevolução”

que pode ter alguma possibilidade de sucesso porque

“os monárquicos têm muito dinheiro”.

Em junho, Georges Wagnière sintetiza os primeiros meses da nova

república 8 . Menos crítico que o seu redator, o diretor do diário de Genebra,

embora deplore o atraso na convocação das eleições, finalmente

realizadas a 28 de maio, admira a “devorante atividade” legislativa do

Executivo de Lisboa. Não contesta as dificuldades e as inevitáveis decepções,

mas, na sua opinião, a república não podia contentar toda

gente e “dar imediatamente o que a monarquia não conseguiu oferecer”,

nomeadamente, “trabalho e dinheiro” para todos:

Esta formidável obra legislativa, que teria sido feita em dez anos

por qualquer Parlamento, foi realizada em poucos meses pelo

Governo português. Na verdade, trata-se unicamente de decretos

provisórios que, para se tornarem leis, deverão ser ratificados

pela assembleia nacional. Porém, em geral, demonstram inteligência

política e intenções generosas.

No entanto, o futuro ministro suíço em Roma não poupa o Governo

de Lisboa cuja atuação nem sempre foi conforme aos princípios republicanos.

Wagnière desaprova a supressão da imprensa monárquica,

8 WAGNIÈRE, Georges, “Huit mois de République”, Journal de Genève, 23 de juin

de 1911. Georges Wagnière (1862-1948) é redator do Journal de Genève de 1908 a

1910 e diretor de 1910 a 1918, antes de ser nomeado ministro suíço em Roma, onde

permanece até 1935.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 135

lamenta a censura e o controle do telégrafo e, por fim, acusa as novas

autoridades de terem utilizado, nas eleições para a Assembleia constituinte,

“métodos de pressão governamental”, tal como fazia a antiga

monarquia

Quanto à dinastia derrotada em outubro, o diretor do diário liberal

pensa que esta não vai ser reposta nem a curto, nem a médio prazo:

A primeira condição da realeza é um rei, e o jovem Manuel

não tem decididamente nada do que é necessário para exercer

este papel: é uma sorte inesperada para a República. Todavia,

para que se possa estabelecer e durar, sem deixar que o povo

deseje ou lamente um outro regime, é preciso que esta assegure

um verdadeiro progresso, que dê ao poder mais virtude e mais

luzes.

* * * * *

Em outubro, durante a primeira incursão couceirista, o quotidiano

liberal continua a ter a consciência das dificuldades de saber o que

acontece no Norte de Portugal, porque chegam “informações diametralmente

contraditórias” 9 : por um lado, os despachos tranquilizadores

do Ministério dos Negócios Estrangeiros de Lisboa, por outro lado, os

despachos do lado monárquico, que gritam vitória. Afinal, interroga-se

o articulista genebrino, “em que é que devemos acreditar?” A resposta

é prudente: Couceiro ultrapassou a fronteira, mas desconhece-se ainda

o resultado desta incursão realista. No entanto, dois dias depois, já não

há margem para dúvidas. O pequeno título que resume, na segunda

página, dois despachos de Lisboa e um do Porto é sem apelo: “O

falhanço dos realistas portugueses”.

É novamente Georges Wagnière que analisa os recentes acontecimentos

no norte do país no seu editorial publicado no dia seguinte 10 .

O diretor do jornal não tem ainda todas as informações sobre o desenrolar

da expedição das tropas de Couceiro, mas pensa que o “exercito

realista foi derrotado”. Alguns dirigentes monárquicos encontram-se

9 “L’équipée du capitaine Couceiro” Journal de Genève, 8 de outubro de 1911.

10 WAGNIÈRE, Georges. “L’incursion royaliste au Portugal”, Journal de Genève, 11 de

outubro de 1911.

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136 Reto Monico

perto da fronteira norte de Portugal, mas o último rei, que não parece

ter muita vontade de reconquistar a coroa “pela força” não saiu da Inglaterra.

Wagnière expõe o que ele considera como um grande ponto

fraco dos monárquicos portugueses:

Têm dois reis, mas nenhum deles usufrui de prestígio e de

autoridade. Dom Miguel é um desconhecido e Dom Manuel, que

não consegue esquecer a visão dos espectros ensanguentados

do pai e do irmão massacrados nas ruas de Lisboa, provou com

a sua atitude que preferia ir à caça à perdiz em vez de tomar o

risco de acabar da mesma maneira.

Porém, segundo o diretor do jornal, Couceiro poderá organizar

outra expedição desde a Galiza. Apesar de todos os erros cometidos

pelos antigos dirigentes, “o regime republicano não parece ter raízes

muitos profundas no país” e as medidas repressivas tomadas pelo

Governo de Lisboa provam que o Executivo lisboeta não dá mostras

de ter uma grande autoconfiança. Com um povo totalmente apático e

“indiferente”, conclui o editorialista genebrino, não se pode excluir um

golpe de tipo militar.

* * * * *

Em 1912, o correspondente do jornal em Berna entrevista Guerra

Junqueiro, ministro de Portugal na Suíça de 1911 a 1914. Como todos os

diplomatas portugueses no estrangeiro, o autor de Os Simples desmente

todas as informações que falam de anarquia e de graves desordens no

país e exclui qualquer possibilidade de restauração monárquica. Evidentemente,

afirma o poeta, há ainda muita coisa para fazer, mas não

existe qualquer hipótese que os Bragança voltem ao poder. O regime

é sólido e não serão nem os monárquicos, nem os socialistas, nem

uma intervenção estrangeira que irão provocar a queda da república 11 .

Quando o jornalista pergunta a sua opinião relativamente à reconciliação

entre os dois primos D. Miguel e D. Manuel, Guerra Junqueiro

afirma sarcasticamente:

11 “La situation au Portugal”, Journal de Genève, 3 de fevereiro de 1912.

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A Federação (1911-1912) 137

É um fantasma que se une a uma sombra, à sombra de uma

sombra. Não é essa reconciliação que vai pôr em perigo a República.

Repito, tenho uma fé inabalável no futuro da República.

O povo republicano português quer viver e viverá!

O diário liberal volta a debruçar-se sobre Portugal em julho de 1912,

para comentar a segunda incursão organizada pelo Paladino a partir da

vizinha Espanha. A 11, na primeira página, este resume os despachos

vindos de Portugal e de Espanha sobre os confrontos militares entre

republicanos e conspiradores. No dia seguinte, na segunda página, ao

resumir os despachos enviados da capital portuguesa utiliza o mesmo

título que escolheu a 10 de outubro de 1911: “O falhanço dos realistas

portugueses”.

São dois os editoriais que o Journal de Genève consagra a este inevitável

fiasco dos conspiradores monárquicos. A 24 de julho, Albert

Bonnard 12 sublinha que todos os despachos filo-monárquicos eram falsos,

que o Governo conseguiu “esmagar os bandos” de Couceiro e que

nada parece ameaçar o novo regime. O redator do jornal expõe as

varias razões que estão na origem da derrota monárquica.

Couceiro, que parece ser “valente, decidido e íntegro”, tem falta de

discernimento e de julgamento:

O plano dele era irrealizável ou foi mal executado. Couceiro

tinha em tudo e por tudo 700 homens. Deslocou este escasso

batalhão em pequenos bandos que se puseram em marcha um

depois do outro. Foram completamente esmagados pelas tropas

republicanas. As revoltas que tinham de rebentar ao mesmo

tempo no Centro e no Sul do país não ocorreram na hora marcada

e morreram à nascença.

Os monárquicos não estão unidos. Além disso, o povo não reagiu

aos apelos deles e a ajuda do clero foi insignificante, realça o redator

do quotidiano de Genebra. Agora, Couceiro, que se queixa de ter

sido traído “pelos amigos da monarquia”, “irá a Londres para referir a

12 BONNARD, Albert,“ L’insurrection royaliste au Portugal”, Journal de Genève, 24

de julho de 1912.

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138 Reto Monico

D. Manuel” os resultados da sua ação. O jornalista suíço espera vivamente

que o Paladino renuncie a este tipo de “iniciativa aparentemente

inútil”.

Bonnard volta a bater na mesma tecla: a jovem república está

em dificuldade e as medidas do Governo não contribuem para dar

uma boa imagem no estrangeiro. Além disso, os republicanos estão

divididos entre moderados e radicais.

No final deste artigo e no editorial publicado uma semana depois 13 ,

Bonnard avalia o papel da Espanha nesta duas incursões couceiristas

de outubro de 1911 e de julho do ano seguinte. A 24 de julho, ataca

sem rodeios a atitude do Executivo de Madrid, que receia um “contágio

republicano”, e das autoridades locais:

As autoridades da Galiza, demasiado tolerantes, não demonstram

qualquer eficácia e deixam que os refugiados portugueses

se organizem e, em seguida, passem e voltem a passar a fronteira.

Isto é, evidentemente, contrário ao direito dos povos.

O ministro português dos Negócios estrangeiros protestou com o

seu colega Garcia Preto, mas sem grandes resultados, lamenta o editorialista,

segundo o qual a Espanha ajuda “clandestinamente” Couceiro

e talvez “lhe forneça armas”. Lisboa queixa-se, mas os protestos não

podem ir além de uma campanha de imprensa porque a Espanha é

militarmente muito mais poderosa que o seu vizinho.

Uma semana depois, Bonnard ataca novamente, e de uma maneira

ainda mais feroz, o Executivo de Afonso XIII:

Não há dúvida que o gabinete de Madrid favoreceu o movimento

insurrecional dos realistas portugueses. Já por duas vezes, no

outono passado e no verão, os bandos de Paiva Couceiro conseguiram

ostensivamente armar-se e organizar-se na Galiza e, à

hora prevista, atravessaram a fronteira para levar a guerra civil

para o país vizinho. Depois da derrota, efetuaram uma retirada

segura em território espanhol, onde os soldados do [português]

não os podiam perseguir. Os rebeldes tinham armas e munições

fornecidas pelas fábricas da monarquia espanhola.

13 BONNARD, Albert,“ Espagne et Portugal”, Journal de Genève, 31 de julho de 1912.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 139

Canalejas 14 , que ajudou Couceiro a combater os republicanos espanhóis,

tenta desculpar-se, incriminando os carlistas, acrescenta o

jornalista. Agora, na opinião de Bonnard, a única solução, depois de

uma negociação diplomática entre os dois Gs, é que cada país ibérico

respeite o regime do outro. É o que vai acontecer em setembro, com a

já mencionada convenção entre Espanha e Portugal: os conspiradores

são forçados a emigrarem para o Brasil e os dois países comprometem-

-se a não ajudar qualquer tentativa de destabilização do país vizinho.

Esta mudança de atitude do Governo de Afonso XIII prova que “a

causa da monarquia portuguesa está praticamente perdida”, conclui o

redator do Journal de Genève que realça, por um lado, o fim das “lutas

intestinas” no campo republicano português e, por outro lado, a falta

de unidade, de convicção e de força dos seus inimigos:

O ex-rei Manuel está a fazer um cruzeiro ao longo da costa norueguesa.

Pessoas importantes do campo monárquico criticam

os bandos de Couceiro e pretendem que eram feitas de aventureiros

famélicos que só queriam tomar posse das importantes

quantias de dinheiro reunidas no Brasil em favor da causa monárquica.

Um provérbio italiano diz: “Quando uma árvore cai,

toda a gente se precipita para cortar a madeira”.

* * * * *

O diretor e o redator do periódico helvético analisam com uma

relativa lucidez a evolução da situação política em Portugal. Não tendo

nenhum correspondente nem em Lisboa, nem no Porto, constroem

os seus comentários baseando-se nos despachos e nas reportagens

publicadas em jornais europeus.

Eles conseguem acompanhar estas tentativas dos conspiradores

portugueses, enquadrando-as no contexto regional e internacional, nomeadamente

no que diz respeito à atitude do Governo espanhol. Neutros

nos seus editoriais, Bonnard e Wagnière tomam em conta as dificuldades

e os erros do novo regime, mas são igualmente perspicazes

quando analisam as possibilidades de um regresso dos Bragança.

14 José Canalejas (1854-1912) é presidente do governo de Espanha de 9 fevereiro de

1910 a 12 de novembro de 1912, quando é assassinado em frente duma livraria em

pleno centro de Madrid.

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140 Reto Monico

Os dois jornalistas genebrinos não podem deixar de sublinhar a

fraqueza dos rebeldes monárquicos: divididos entre D. Manuel e D. Miguel,

mal organizados, mal armados, poucos decididos, sem um verdadeiro

chefe e com pouquíssima fé no sucesso da causa.

Muito duros, como acabámos de ver, são os ataques do Journal

de Genève contra a atitude do Executivo de Madrid, acusado, sem

meios termos, de ter ajudado Couceiro nas suas tentativas de levar

a guerra civil para Portugal. Sem dúvida, esta opinião é devida à

atitude legalista de respeito das leis internacionais, sistematicamente

promovida por este diário de referência. Talvez Guerra Junqueiro, o

ministro português em Berna, que mantém uma excelente relação com

a imprensa liberal e radical helvética, tenha tido uma certa influência

em acentuar esta ingerência do Governo espanhol.

É notável que, a mais do que 1500 km de distância, um jornal

de uma nação neutra se possa interessar com tanta precisão por um

acontecimento de um país que tem pouquíssimas relações com a Suíça:

em 1911, vivem só cerca de 150 portugueses em terras helvéticas, os

intercâmbios comerciais e culturais são insignificantes, poucos suíços

moram em Portugal. No nosso entender, além da indiscutível qualidade

deste jornalismo no início do século passado, isso tem de ser

relacionado com o facto de Portugal ser, na altura, com a França e a

Suíça, uma das raríssimas repúblicas num continente dominado pelos

regimes monárquicos.

* * * * *

O Journal de Genève nunca mais seguirá as peripécias da causa

monárquica portuguesa como o faz em 1911 e 1912. A Monarquia do

Norte 15 , que dura quatro semanas, não terá direito a nenhum comentário.

No início de 1919, dois meses depois do fim da Grande Guerra é

a situação na Alemanha, as várias revoluções e o início da Conferência

da paz em Paris que monopolizam a atenção do quotidiano liberal. Por

enquanto, Portugal fica relativamente esquecido.

15 A Monarquia do Norte é proclamada no Porto a 19 de janeiro de 1919.

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Que se passe-t-il au Portugal ? 1

De toute évidence, la lune rousse apparaît au ciel de la république portugaise.

Ses débuts avaient été trop simples. L’ère des difficultés devait venir ;

elle est là. Les communiqués rassurants que les ministres accrédités par le

gouvernement provisoire dans les capitales de l’Europe inondent les journaux

doivent être accueillis avec réserve. Ils nous faisaient accroire que les bruits

fâcheux circulant un peu partout étaient de simples manœuvres de bourse,

et qu’on chercherait vainement sous les cieux dynastiques mieux étayée sur

l’affection et la reconnaissance de son peuple que celle des Cobourg Bragance.

Cela posé, on doit également se tenir en garde contre les dépêches

qui nous donnent tantôt une restauration monarchique, tantôt une crise

d’anarchie comme imminente. “Depuis que la république est proclamée, écrit

le correspondant portugais de la Gazette de Cologne, une nouvelle industrie

prospère à Lisbonne, celle des fausses nouvelles. Il en sort de tout les huis.

Tantôt c’est une tentative de révolution de conspirateurs appelés carbonarios,

tantôt la candidature au trône d’un prince allemand, tantôt un ultimatum

anglais qui bouleverse le cœur des patriotes ; tantôt ce sont d’autres histoires

encore, répandues avec zèle par des malveillants et bues évidemment par

les badauds. Il est clair, que dans une telle situation, le régime ne peut pas

avancer. Le commerce est stagnant et dans le public, se fait jour un sentiment

d’insécurité qui gagne sans cesse des cercles plus étendus. Un travail

d’Hercule attend le correspondant étranger qui, dans ces conditions, tente de

séparer le bon grain de l’ivraie, car il n’y a pas un jour qu’on ne lui raconte

des méfaits effroyables du gouvernement, d’une part, des conspirateurs royalistes

pleines de dangers et de mystères, de l’autre. Dans ces histoires, il y a

souvent une parcelle de vérité, mais si menue qu’elle ne vaut pas une goutte

d’encre. Il fallait briser cette industrie. Le gouvernement vient de rendre dans

ce but une loi, qu’on tient ici pour nécessaire et qui peut rendre des services

si les autorités qui sont chargées l’appliquent avec tact et adresse.”

Le même correspondant donne encore ces détails caractéristiques : “Dans

les classes dirigeantes, surtout chez les dames, règne une forte excitation

contre la nouvelle loi. Les femmes portugaises n’ont pas la moindre notion

1 Journal de Genève, 8 janvier 1911, p. 1.


142 Reto Monico

de politique, mais elles se croient appelées à intervenir. Déblatérer contre

la révolution est le thème principal au thé de cinq heures. Les maris de

ces dames, en grande partie, mangent le pain de ce détestable régime, mais

ils se font un plaisir d’aborder dans le même sens. Et l’on peut savourer

journellement le curieux spectacle de hauts dignitaires du régime qui ont

trahi le roi au premier coup de canon pour passer dans le camp rouge et qui

aujourd’hui maudissent la république. Ces gens n’ont pas assez de sentiment

d’honneur pour se taire, comme ils n’ont pas eu le courage moral de prendre

leur retraite quand la monarchie a été renversée para leur faute.” Et le

journaliste allemand explique ainsi et approuve les lois d’exception que M.

Braga et ses collègues sont amenés à rendre dans cette situation difficile.

Il paraît également certain que la discipline est fortement atteinte dans

l’armée. C’est pour la république portugaise un vice originel qu’à sa naissance

les soldats lui aient servi d’accoucheur. Quand ils commencent à défaire

les gouvernements, ça devient une habitude. L’histoire de l’empire romain

s’est sans cesse répétée et la péninsule ibérique en peut raconter long à cet

égard. Ayant appris à disposer du pouvoir et à découdre même des rois,

l’armée prétend qu’on lui obéisse, plutôt qu’elle n’entend obéir. Les lettres

de Lisbonne racontent que les officiers ne peuvent plus faire façon de leurs

hommes, qui ont même secoué la gêne de se lever et de les saluer quand

ils passent. Le gouvernement a cru prudent d’éloigner trois croiseurs qui

mouillaient dans l’embouchure du Tage et il n’est pas sans inquiétude du côté

de certains régiments.

Mais, imperturbable, il continue à légiférer. Il vient d’instituer le mariage

civil et de régler de façon nouvelle la légitimation des enfants nés hors mariage.

Il va mettre en vigueur les lois sur le repos hebdomadaire ; l’assistance

publique ; la protection de l’enfance et de la maternité ; l’abolition de la

prostitution ; l’instruction primaire avec établissement d’écoles de deux en

deux kilomètres. Il promet même une loi instituant la représentation proportionnelle.

Mais les élections générales ne sont toujours pas fixées.

D’autre part, le gouvernement provisoire a pris une mesure qui n’est pas

de nature à accroître la confiance qu’on avait mise en lui.

Nous avons parlé des poursuites dirigées contre M. João Franco. On avait

immédiatement fait savoir à la presse européenne que les ministres n’y étaient

pour rien : ils ne voulaient pas de représailles et n’aspiraient qu’à l’apaisement

et à l’oubli du passé. Le plaignant, le vicomte de Ribeira Brava, ancien député

avait maille à partir avec le dictateur de 1907 et il agissait pour son compte.

Or les juges compétents ont rendu une ordonnance de non-lieu en faveur de

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A Federação (1911-1912) 143

M. Franco. Ils ont considéré qu’une amnistie avait été promulguée, effaçant

tous les actes de son administration, et que les Chambres de la monarchie,

compétentes à cet égard d’après la constitution, avaient de plus refusé de

voir rien dans ses actes qui fût passible de la justice. Et cette décision paraît

fondée en droit.

Mais le gouvernement changeant tout à coup d’attitude, sans gêne de

donner un démenti à ses propres assertions, que nous avions, pour notre

part, enregistrées de confiance, vient de prendre une mesure pour le moins

choquante, bien qu’elle tende, s’il fallait en croire, “à assurer l’indépendance

de la magistrature”. Les juges de Lisbonne, qui ont mis João Franco hors de

cause, sont, par mesure disciplinaire transférés à la cour d’appel de Goa, dans

les Indes portugaises, et un second décret porte de trois à cinq les membres

de ce tribunal exotiques pour que les disgraciés y trouvent place. L’un de

ces magistrat, le docteur Abreu 2 , fut, par une singulière rencontre, le seul

juge qui refusa d’appliquer, en 1907, les lois dictatoriales de M. Franco. À

cette époque, les républicains le couvrirent d’éloges, tandis que le gouvernement

royal l’envoyait aux Açores ; maintenant, ils le couvrent d’invectives et

l’expédient à Goa. Il apprendra quelle est la logique des partis et ce qu’il en

coûte d’appliquer la loi sans se soucier de plaire au pouvoir.

Le gouvernement provisoire n’a fait en cela que suivre des exemples

nombreux donnés ailleurs dans les périodes de crise politique. Mais justement

parce qu’on avait loué partout son propos de respecter la loi, parce qu’on avait

célébré la générosité dont il s’inspirait vis-à-vis des vaincus et le souci de tout

le peuple de réduire autant que possible les cataclysmes qui accompagnes les

révolutions et les haines qui les suivent, la mesure prise contre les juges de

Lisbonne “pour assurer l’indépendance de la magistrature” a causé en Europe

une déception.

Alb. B. 3

2 Abel de Matos Abreu (1849-1931) arrive à Goa le 1 er mai 1911. Il n’y restera que

six semaines.

3 Albert Bonnard (1858-1917) est rédacteur de la Gazette de Lausanne de 1882 à

1909 et du Journal de Genève de 1910 jusqu’à son décès.

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144 Reto Monico

Contre-révolution possible 4

Une dépêche nous fournit l’analyse de la loi séparant l’Église de l’État que

le gouvernement provisoire de la République portugaise vient de proclamer,

par ukase, à l’instar de M. Stolypine. Au bout de six mois, les élections

générales ne sont pas encore fixées, et les hommes qui se sont chargés

eux-mêmes de gouverner le Portugal ne semblent point pressés d’obtenir la

sanction de ce suffrage populaire au nom duquel ils ont renversé la dynastie.

Auraient-ils de bonnes raisons pour cela ? Le correspondant de la Gazette

de Frankfort à Lisbonne, très favorable pourtant au nouveau régime, note des

symptômes de désaffection.

Lorsque, raconte-t-il, quinze jours après la proclamation de la République,

j’ai parcouru le Portugal du sud à l’extrême nord pour me faire une

opinion sûre du sentiment public vis-à-vis de la révolution, j’ai trouvé partout

une attente bienveillante. Même les catégories de personnes dont le régime

républicain devait amoindrir l’influence se montraient satisfaites d’avoir vu

tomber la royauté, sûres que les affaires publiques ne pouvaient pas aller plus

mal que dans les dernières années. L’accueil favorable que trouvait le nouveau

gouvernement se liait à des conjonctures économiques heureuses : deux

moissons si belles qu’aucune importation de céréales étaient nécessaires ; le

traité de commerce récemment conclu avec l’Allemagne facilitait la vente des

vins et des denrées coloniales, le caoutchouc surtout, atteignaient de hauts

prix sur le marché du monde. À cela se joignait l’attitude des puissances, qui

ne manifestaient point une trop grande douleur pour la chute d’une monarchie

pourrie. Tout présageait à la jeune république une existence calme et

heureuse.

Cette lune de miel a fait place à la lune rousse. Le Dr Machado, ministre

des affaires étrangères, reçoit tous les huit jours les correspondants de la

presse étrangère et leur peint la situation en rose. Les légations portugaises

multiplient les dépêches et les communiqués optimistes. Mais les faits font

une figure assez différente. La déception et le mécontentement grandissent.

Dans les provinces du nord, un mouvement monarchiste est en cours. Le

gouvernement y a envoyé le croiseur Adamastor et, avec une rigueur extrême,

il poursuit tout journal qui donne des indications à ce sujet. Les partisans

de la monarchie ressortent des tours où ils étaient cachés. Qu’une mutinerie

se soit produite à l’Arsenal, ce n’est plus niable. Des rassemblements ont

4 Journal de Genève, 22 avril 1911, p. 1.

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A Federação (1911-1912) 145

été signalés à Vigo, sur le territoire espagnol. Là s’est rendu un certain

Paiva Couceiro, un des rares officiers qui ont ouvertement combattu pour la

dynastie en octobre dernier. Les événements font de lui un chef royaliste. Il

a écrit au gouvernement provisoire une sorte de lettre ouverte, que celui-ci

a interdit aux journaux de reproduire sous peine de suppression immédiate.

Cette précaution a, comme il arrive, doublé l’importance et le retentissement

de ce manifeste, dont il vaut la peine de traduire quelques passages. Il dit :

En se prolongeant, la dictature ne s’est pas bornée à trancher

les questions urgentes et l’intérêt général ; elle s’est livrée à des

expériences sociales et a fait aux groupes révolutionnaires des

concessions pas toujours raisonnables et prudentes, s’écartant

de la voie tracée à un pouvoir qui manque encore de la considération

nationale. Elle a ainsi épuisé le crédit de bienveillance

ouvert d’abord par toute la population à la République portugaise.

. . Tandis que celle-ci a conservé jusqu’ici, pour des motifs

d’ordre international, la faveur des gouvernements français et

anglais, elle éprouve l’hostilité de l’Espagne et de l’empire allemand.

La première s’inquiète que s’établissent à sa frontière

des institutions différentes des siennes ; le second voudrait obtenir

le partage des colonies portugaises tel qu’il a été prévu par

une ancienne convention anglo-allemande. Ces deux adversaires

sont à l’œuvre et ni les visées de la monarchie espagnole, ni

la forte pression exercée par l’Allemagne sur l’Angleterre peuvent

être ignorées du gouvernement provisoire.

La perspective qui s’offre en ce moment est celle de la discorde

et des luttes fratricides à l’intérieur, tandis que l’étranger

nous menace d’exploitation et de démembrement. Où est le

salut ? Seulement dans l’union de tous les Portugais et le sacrifice

à ce but de toutes les convictions individuelles et de tous

les amours-propres. Une contre-révolution se prépare. Le gouvernement

provisoire, qui a provoqué ce mouvement, devrait

remettre le pouvoir à quelqu’un d’assez forts pour se maintenir

de façon durable. Il ne devrait rendre aucune loi et aucune réforme.

Il devrait assurer l’ordre, restaurer les libertés publiques

et ordonner aussitôt des élections non influencées par lui, en

d’autres termes, il devrait rendre au peuple l’autorité qui appartient

au peuple. Si, une fois réunie, l’Assemblée nationale estime

que, dans les circonstances internationales actuelles, une conswww.lusosofia.net


146 Reto Monico

titution monarchique est préférable, le parti républicain devrait

donner une fois de plus la preuve de son désintéressement en

abaissant le drapeau de ces prédilections politiques devant les

exigences toutes puissantes de la sécurité et de l’indépendance

nationales.

Le capitaine Couceiro développe un programme de réconciliation et de

liberté, montrant que, même si la monarchie est restaurée, le programme

de rénovation qui est l’honneur et la raison du parti républicain, peut être

complètement réalisé. Il veut aussi l’assainissement des mœurs publiques et

non le retour aux abus du passé. Et il conclut ainsi :

Sans autre autorité que l’exactitude des faits que mon appel invoque,

sans autre mandat que la conviction de servir les intérêts

du pays, j’ose soumettre ces propositions au gouvernement provisoire

de la république, en un moment, dont personne ne peut

contester l’importance décisive. Il se décidera d’après son patriotisme

indiscuté et sa connaissance précise de la situation. . .

En interdisant la publication de cet appel, les hommes qui gouvernent le

Portugal n’ont pas accru la confiance qu’inspire la solidité du régime nouveau.

Partout des conspirations sont dénoncées. Le ministère a ordonné aux autorités

provinciales de sévir avec énergie contre quiconque se prononcerait en

faveur de la monarchie. Un pouvoir sûr de sa force n’a pas besoin de brider la

presse à l’intérieur et il ne retarde pas, indéfiniment, l’appel au peuple dont il

se réclame. Le correspondant de la Gazette de Francfort dit exprimer l’opinion

courante autour de lui en faisant prévoir à bref délai, “dans quelques semaines”,

dit-il, une tentative de contre-révolution, dont les chances ne seraient

pas nulles, les monarchistes ayant à leur disposition beaucoup d’argent.

Ainsi parle un correspondant jusqu’ici très porté vers la République. Les

faits diront s’il voit juste.

Alb. B.

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A Federação (1911-1912) 147

L’incursion royaliste au Portugal 5

L’autre jour, à la douane de la gare d’Irun, un journaliste a reconnu, au

nombre des voyageurs, quelques personnages marquants du parti royaliste

portugais et parmi eux il a cru distinguer le roi Manuel en personne qui avait

abaissé sur les yeux la visière de sa casquette dans l’espoir de passer inaperçu.

La nouvelle, télégraphiée partout, a fait naître toutes sortes de suppositions.

On voyait déjà le jeune roi détrôné rentrant dans ses États à la tête d’une

armée et regagnant sa couronne à la pointe de son épée.

Mais le journaliste d’Irun s’était trompé. Le roi Manuel n’a quitté sa

retraite de Richmond que pour aller chasser la perdrix dans quelques châteaux

d’Angleterre. Il n’a pas passé le détroit. Il revendique toujours sa couronne,

mais il ne paraît nullement disposé à monter à cheval et à tirer l’épée pour

la reconquérir de force.

D’autres princes se trouvent à cette heure à la frontière de Portugal dans

l’attente des événements. C’est tout d’abord D. Afonso, duc de Porto, oncle

du roi Manuel, qui représente ici les intérêts de son neveu. Ce sont ensuite

les princes de la branche rivale des Bragance, qui n’a jamais cessé, depuis

1836, de revendiquer ses droits au trône du Portugal et que l’Europe avait

complètement oubliée quand les événements l’ont remise au premier plan.

Le chef de cette famille est le duc Michel de Bragance, qui habite Vienne et

ce sont ses fils, le prince Michel qui, depuis son mariage avec une Américaine,

porte le titre de duc de Viseu, et le prince François-Joseph, qui participent à

l’équipée royaliste. L’aîné a 33 ans, le second 32. Ils sont accompagnés de leur

cousin, le prince Xavier de Parme, de la maison des Bourbon, qui est devenu,

par le mariage de sa sœur, le beau-frère de l’archiduc Charles-François-Joseph,

futur héritier du trône d’Autriche.

Entre les deux branches de la maison de Portugal aucune réconciliation

n’est intervenue et cet antagonisme crée, en ce moment, une situation des

plus originales. Les royalistes armés qui ont passé la frontière portugaise

combattent avant tout contre la République et pour le principe monarchique :

le choix du souverain viendra plus tard. Le chef des troupes royalistes, le

capitaine Paiva Couceiro, a expliqué lui-même la situation par ces paroles :

“Si je renverse le régime républicains, j’établirai une dictature militaire et une

fois les esprits calmés, je convoquerai les Cortès, qui décideront entre dom

Manuel et dom Miguel.” C’est très clair.

5 Journal de Genève, 11 octobre 1911, p. 1.

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La situation au Portugal 7 Berne, 1 er février 1912

148 Reto Monico

Ce qui l’est moins, c’est la façon dont les opérations ont procédé. D’après

les dernières nouvelles, les royalistes parmi lesquels se trouvaient les deux

fils de dom Miguel, ont concentré leurs forces sur territoire espagnol dans la

province de Zamora, et ont envahi le territoire portugais en trois colonnes.

De Lisbonne, on nous informe qu’ils ont été dispersés par les troupes du gouvernement

et que leur échec est complet. Cependant, des dépêches signalent

des mouvements en faveur de la royauté, à Salgueirais et dans les montagnes

de Suajo, district de Viana do Castelo, ce qui indiquerait que les royalistes

auraient pénétré à l’intérieur.

Un correspondant du Times écrit que si les royalistes triomphent dans les

premières rencontres rien ne leur résistera, les garnisons l’une après l’autre se

rallieront, la boule de neige roulera vers Lisbonne en grossissant sans cesse.

En revanche, si l’armée royaliste est battue au début, le mouvement s’arrête.

C’est bien cette dernière solution qui nous paraît la plus probable. Les

royalistes ont contre eux un argument très grave : ils ont deux rois, mais

aucun ne jouit de prestige et l’autorité. Dom Miguel est inconnu et Dom Manuel,

qui garde devant les yeux les spectres sanglants de son père et de son

frère aîné massacrés dans les rues de Lisbonne, a prouvé par toute son attitude

qu’il préférait chasser la perdrix plutôt que de risquer un sort semblable.

Cependant l’entreprise de Couceiro peut recommencer. Malgré les fautes du

roi Carlos, l’impéritie de Manuel et les mérites des hommes qui gouvernent la

jeune république, le régime républicain ne paraît pas avoir encore des racines

très profondes dans le pays. La majorité de la nation reste indifférente et son

apathie rend possible les coups de mains hardis. Les mesures prises par le

gouvernement qui convoque le Congrès en session extraordinaire, afin de se

faire donner les moyens nécessaires de juger rapidement les conspirateurs,

montre qu’il n’est pas entièrement rassuré. – G. W. 6

Les dépêches alarmantes concernant la situation au Portugal qui sont

parvenues en Suisse dans la matinée de jeudi m’ont engagé à me renseigner

6 Georges Wagnière (1862-1948) est rédacteur do Journal de Genève de 1908 à 1910

et directeur de 1910 a 1918, avant d’être nommé ministre suisse à Rome, où il restera

jusqu’en 1935.

7 Journal de Genève, 3 février 1912, p. 1.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 149

auprès de la légation du Portugal à Berne sur ce qu’il pouvait y avoir de fondé

dans ces bruits. Le distingué ministre de la république portugaise en Suisse,

M. Guerra Junqueiro, a reçu avec la plus grande amabilité le représentant do

Journal de Genève et m’a fait en substance les déclarations suivantes.

Comme je viens de le télégraphier à votre honorable journal,

les nouvelles qui me sont parvenues ce matin même de Lisbonne

me permettent de contester absolument les informations

alarmistes qui sont envoyées d’Espagne au Journal, de Paris, un

organe qui a dès le début été hostile à la République portugaise.

La tranquillité règne à Lisbonne et dans tout le pays, sauf un

peu d’excitation qui subsistent encore à la suite des troubles

récents. Les grèves sont presque entièrement terminées. Quant

à la conduite de l’armée, de la marine, de la police civile, de la

garde républicaine, dont on a incriminé bien à tort l’infidélité,

elle a été admirable de discipline et de dévouement à la République.

Vous pouvez donc démentir de la façon la plus absolue toutes

les nouvelles représentant le Portugal comme étant en proie

à l’anarchie, tout particulièrement les informations fantaisistes

visant les interventions étrangères. Ces informations tendancieuses

ont déjà souvent été lancées. Chaque fois l’événement

leur a donné tort.

Sans aucun doute les grèves ont été encouragées par les réactionnaires

et les monarchistes. L’enquête qui vient d’être faite, et

au sujet de laquelle le gouvernement vient de publier un rapport

précis, a prouvé que les agents et domestiques de plusieurs réactionnaires

notoires, mêlé à des anarchistes, avaient constitué des

bandes armées qui parcouraient les campagnes et excitaient les

travailleurs. Ce sont eux qui ont préparé la marche sur Evora en

disant aux campagnards qu’ils pourraient mettre la ville à sac,

car l’armée était avec eux. Mais les émeutiers furent rapidement

chassés de la ville par la cavalerie et, aussitôt qu’ils virent qu’on

les avait trompés sur l’attitude de l’armée, ils se sont retournés

contre les instigateurs de l’émeute.

En ce moment, la ville, aussi bien que la campagne environnante,

est calme. Les travailleurs ont repris leurs occupations

et tout indique que les manœuvres des agitateurs ont complètement

échoué.

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150 Reto Monico

Comme je demandais à M. Guerra Junqueiro s’il croyait à une restauration

possible de la monarchie au Portugal, mon interlocuteur me répondit :

Cette restauration est impossible, croyez-le bien, elle ne se fera

pas. La monarchie a commis trop de fautes dans notre pays. Le

mouvement irrésistible qui l’a renversée était moral plus encore

que politique. Les puissances étrangères s’en sont bien rendu

compte. On a la preuve que la monarchie avait appelé, avant la

révolution l’intervention étrangère à son aide. Ce fut en vain.

Sans doute notre république n’est pas encore parfaite. Elle a

encore beaucoup à faire, beaucoup à organiser. Elle a été faite

par le peuple et par une élite d’idéalistes, de moralistes, qui ont

interprété admirablement le sentiment populaire. Mais le travail

d’organisation durera plusieurs générations. Ce n’est pas du jour

au lendemain qu’il sera achevé.

En attendant qu’il soit terminé, il y aura encore des poussées

en sens divers, des périodes de trouble. Quand on décante le

bon vin, il faut quelque temps jusqu’à ce qu’il soit entièrement

clair et que la lie se soit déposée au fond de la bouteille. De

même dans le parti républicain portugais, comme ailleurs, il y

a des tendances diverses, des nuances différentes. Mais toutes

les divergences s’effacent et tous les groupes sont unanimes dès

qu’il s’agit de l’existence, du salut de la République.

Quand au socialisme, il n’est pas un danger chez nous. Le Portugal

est un pays essentiellement agricole, qui a peu de grandes

industries. Le parti socialiste, qui est d’ailleurs tout à fait républicain,

y est donc peu nombreux. Ce n’est pas le socialisme ou

l’anarchie qui provoqueront jamais la chute de la République ou

une intervention étrangère.

Pour terminer notre entretien, je mentionnai à M. Guerra Junqueiro la

dépêche annonçant la réconciliation de l’ex-roi Manuel avec son cousin Don

Miguel de Bragance. Le ministre de la République me répondit en souriant :

C’est un fantôme qui s’unit à un ombre, à l’ombre d’une ombre.

Ce n’est pas cette réconciliation qui mettra la République en

péril. Je vous le répète, j’ai une foi inébranlable dans l’avenir

de la République. Le peuple républicain portugais veut vivre et

vivra !

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 151

Telles furent les déclarations rassurées de mon éminent interlocuteur.

L’insurrection royaliste au Portugal 8

Maintes fois déjà les dépêches annonçant un grand mouvement royaliste

propre à mettre en échec la république portugaise se sont révélées complètement

fausses. Les partisans du roi Manuel disposent de télégraphistes

complaisants, en Espagne surtout. Hier encore ils nous informaient que la

révolution monarchiste triomphait dans les deux grandes villes, à Lisbonne et

à Porto. Aujourd’hui on peut être certain du contraire : le gouvernement a

écrasé les bandes dans le nord et ailleurs, il ne s’est rien produit qui menace,

pour le moment, le régime actuel.

Ce n’est pas que tout marche à souhait. Les débuts sont difficiles. Ceux

de la république portugaise n’échappent pas à cette loi. Elle souffre surtout

des divisions et de l’inexpérience de ses partisans. Depuis sept mois, un

gouvernement constitutionnel régulier fonctionne et M. Arriaga est président

de la république. Il en est déjà à son troisième ministère. L’actuel date du

milieu de juin. Il a pour chef M. Duarte Leite et a remplacé le cabinet de

M. Vasconcelos, qui a garde, dans la nouvelle combinaison, le portefeuille des

affaires étrangères. Comme formation politique ils diffèrent à peine. Tous

deux sont, ainsi qu’on disait jadis en France, de concentration républicaine.

Dans le cabinet Vasconcelos siégeaient trois modérés et trois radicaux ; dans

le cabinet Duarte Leite siègent trois radicaux et trois modérés. Le chef de

l’un, comme le chef de l’autre, sont des modérés, qui, le cas échéant, ont

départagé les voix contres les mesures hardies et révolutionnaires. Les motifs

du dernier changement paraissent d’ordre tout personnel, et, si on en discerne

mal les avantages, les inconvénients pour le crédit du nouveau régime et la

confiance qu’il inspire à l’étranger, sont évidents.

Que la République ne soit pas encore assurée du lendemain, c’est ce que

démontrent assez les mesures prises pour la défendre par son gouvernement.

Les méthodes à employer dans ce but sont même ce qui divise les partis.

Les modérés, suivant leur tempérament, répugnent aux mesures trop rudes,

inclinent vers la tolérance et les amnisties, plaident qu’il faut rallier par la

8 Journal de Genève, 24 juillet 1912.

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152 Reto Monico

douceur les champions impénitents de la monarchie. Les radicaux, au contraire,

sont pour les actes énergiques et veulent faire trembler les ennemis de

l’ordre républicain.

À deux reprises déjà, au mois d’octobre dernier et dans les premiers jours

de juillet, le même capitaine Paiva Couceiro a franchi la frontière à la tête de

bandes insurgées. On le représente comme un chef brave, résolu et intègre ; il

s’est distingué dans diverses guerres coloniales, a presque seul combattu pour

son roi lors de la révolution du 5 octobre 1910 et ferraille encore pour lui par

fidélité et par conviction monarchistes. Mais, s’il ne manque pas d’audace, il

ne paraît para juger très sainement de ce qui est possible.

Son plan était irréalisable ou a été fort mal exécuté. Couceiro possédait

en tout et pour tout sept cents hommes. Il a disloqué ce maigre bataillon en

petites bandes qui ne se sont mises en marche que l’une après l’autre et ont

été écrasées en détail par les troupes de la république. Des mouvements qui

devaient éclater en même temps au centre et au sud du Portugal ne se sont

pas produits à l’heure dite et ont fait long feu. Paiva Couceiro était déjà rentré

dans l’hospitalière Galice espagnole quand quelques jeunes gens de Lisbonne

sont montés à cheval pour déployer dans la campagne le drapeau blanc du

roi Manuel ; un quart d’heure après, sans qu’un coup de feu eût été tiré, ils

étaient cueillis par la cavalerie régulière et conduits dans la forteresse de la

capitale.

L’action royaliste a donc manqué de toute unité. Ses chefs croyaient qu’à

paraître, dans le nord tout au moins, pour se grossir du clergé et du peuple

des campagnes. L’aide des curés et des moines a été illusoire et les paysans

n’ont pas quitté leurs champs, abandonnant les royalistes qui voulaient faire

leur bonheur.

Paiva Couceiro a licencié ceux qui restaient de ses partisans et brisé son

épée. Il se plaint de ce que les amis de la monarchie n’ont pas tenu leurs

promesses. Il affirme, pour ne pas manquer à la tradition invariable de toutes

les guerres civiles et autres, que ses adversaires ont tirés des balles dum dum.

Et il ira sous peu à Londres rendre compte au roi Manuel de son équipée.

Il faut espérer qu’elle sera la dernière et qu’il renoncera désormais à une

entreprise apparemment sans espoir.

Ce ne sera pas la faute de l’Espagne. La tolérance avec laquelle les autorités

de la Galice laissent, sans intervenir efficacement, les réfugiés portugais

s’organiser, puis passer et repasser la frontière, est, de toute évidence, contraire

au droit des gens. M. Vasconcelos, le ministre portugais des affaires

étrangères, a publié dans les journaux une protestation détaillée, dont on s’est

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A Federação (1911-1912) 153

offusqué très fort à Madrid. Il a déjà, sans succès et à diverses reprises, réclamé

auprès de M. Garcia Prieto. Celui-ci avait répondu évasivement et laissé

faire. Il ne restait au ministère portugais qu’à protester auprès des cabinets

étrangers et dans l’opinion publique. En Espagne, le gouvernement redoute

la contagion républicaine et serait heureux que le roi Manuel recouvrât son

trône. C’est pour cela qu’il favorise sous main Couceiro, s’il ne lui fournit pas

les armes. On s’en plaint très vivement à Lisbonne. Une guerre de presse est

engagée. Les relations entre les deux pays ibériques s’aigrissent. Il ne faut pas

craindre un éclat. La disproportion des forces et trop grande pour que le Portugal

sorte des protestations verbales. D’autre part, le trône d’Alphonse XIII

n’est point assez solide, il se sent trop menacé par les poussées révolutionnaire

et républicaine pour risquer une rupture avec le Portugal à seul fin d’y

soutenir une dynastie justement déchue et décriée, avec laquelle il paraîtrait

se solidariser.

Alb. B.

Espagne et Portugal 9

Il n’est pas douteux que le cabinet de Madrid a favorisé le mouvement

insurrectionnel des royalistes portugais. À deux reprises déjà, l’automne dernier

et cet été, les bandes de Paiva Couceiro se sont ostensiblement armées et

organisées en Galice, puis, l’heure venue, ont franchi la frontière pour porter

la guerre civile dans le pays voisin. Aussitôt battue, elles ont trouvé sur territoire

espagnol une retraite sûre, où les soldats du gouvernement ne pouvaient

pas les poursuivre. Les insurgés étaient porteurs d’armes et de munitions

provenant des fabriques royales espagnoles. De tels procédés étaient de la

part du cabinet de Madrid une violation flagrante du droit international et

il ne faut pas s’étonner que M. Vasconcelos, ministre portugais des affaires

étrangères, s’en plaigne très haut.

Si les insurgés avaient eu le dessus, le gouvernement espagnol se féliciterait

en public de l’aide qu’il leur a fournie et invoquerait ses titres à leur

reconnaissance. Mais ils ont été piteusement mis en déroute, et M. Canalejas

9 Journal de Genève, 31 juillet 1912.

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154 Reto Monico

n’a plus qu’à les désavouer et à s’excuser de son mieux le secours direct et

indirect qu’ils ont reçu des autorités royales.

Il a imaginé d’incriminer les carlistes, dont on n’avait plus ouï parler

depuis les grandes manifestations en faveur des moines. Ce sont eux et non

pas le gouvernement qui sympathisaient avec les royalistes portugais. C’est le

chef carliste Varguez [de] Mella qui a lui-même embarqué à Bilbao des armes

pour les insurgés.

M. Canalejas a retourné adroitement son char. Il avait favorisé Couceiro

pour porter un coup à la propagande républicaine dans son propre pays.

Maintenant il s’efforce d’obtenir que le cabinet de Lisbonne ne lui rende

pas la monnaie de sa pièce en secondant les adversaires de la dynastie

espagnole. L’officieux Diario accuse les républicains portugais de connivence

avec les républicains espagnols et se plaint amèrement des attaques dirigées

contre la monarchie voisine. À la longue, celle-ci ne pourra tolérer qu’on en

use de la sorte avec elle. On n’évitera un grave conflit que par un respect

scrupuleux des institutions républicaines en Portugal, de la part de l’Espagne,

des institutions monarchistes en Espagne, de la part du Portugal. C’est une

invite qui a sûrement trouvé son expression dans les entretiens diplomatiques.

Le cabinet de Madrid s’engagerait à ne plus rien faire en faveur des royalistes

portugais ; celui de Lisbonne, par réciprocité, promettrait de ne fournir aucun

appui aux républicains espagnols.

Est-ce pour entrer dans cette voie qu’à Lisbonne une grande réunion publique

d’Espagnols qui habitent la capitale portugaise, convoquée pour protester

contre l’appui de Madrid à Couceiro, a été ajournée par ordre de la police,

c’est-à-dire, en fait, interdite à la demande du ministre d’Alphonse XIII ?

En même temps, de l’autre côté de la frontière, on a arrêté et conduit à

Madrid de nombreux réfugiés royalistes portugais. On a cessé de ménager

les organisateurs de la récente insurrection, au nombre desquels on a même

compris un écrivain de mérite, M. Homem Cristo, qui n’a rien fait de mal, mais

qu’on accuse de complicité morale. Le Portugal demandait même l’expulsion

de tous les réfugiés et leur internement aux Canaries. À Madrid, on se refuse

pourtant d’aller si loin.

Le changement à vue de cabinet espagnol donne à penser que la cause

de la monarchie portugaise est bien perdue. Tous les partis républicains se

sont ressaisis et ont mis un terme à leurs luttes intestines. Les socialistes eux

mêmes ont renoncé pour un temps à leur propagande et à leurs grèves pour

ne pas susciter des difficultés au gouvernement républicain. L’ex-roi Manuel

fait une croisière le long des côtes norvégiennes. Des royalistes de marque

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A Federação (1911-1912) 155

désavouent les bandes de Couceiro et prétendent qu’elles étaient composées

d’aventuriers faméliques désireux de faire main basse sur les sommes importantes

recueillis au Brésil pour la cause dynastique. “Sur l’arbre tombé, dit un

proverbe italien, chacun se précipite pour couper du bois”.

Peut-être aussi, l’état intérieur de l’Espagne n’est-il pas pour inspirer une

grande confiance aux ministres d’Alphonse XIII. Depuis quelques jours, les

lettres et les dépêches de Barcelone signalent une grande agitation dans la

remuante cité. Le moment n’est pas venu de provoquer les républicains.

A Lisbonne, l’hostilité populaire contre l’Espagne a pour contrecoup un

grand enthousiasme pour la France qui est, à propos du Maroc, en conflit

avec sa voisine du sud. Les ennemis de nos ennemis sont nos amis. Partout

où le ministre de France au Portugal se montre, on l’accueille aux cris de :

“Vive la République française ! Vivent nos amis !”

Alb. B.

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Résumé en français

Après la victoire républicaine d’octobre 1910, certains monarchistes

adhèrent au nouveau régime. D’autres restent dans l’expectative. C’est

seulement après la mise à sac, en janvier 1911, des sièges de trois journaux

monarchistes que commence l’émigration vers la Galice, où l’on

retrouve d’anciens franquistes, des prêtres, des fils de bonne famille,

des jésuites, des déserteurs, des aventuriers. Ces émigrés royalistes portugais

trouvent un chef avec l’arrivée en terres espagnoles, au début du

printemps, du capitaine Paiva Couceiro 1 . En bénéficiant de complicités

au niveau local, notamment des carlistes, et de la bienveillance des

autorités de Madrid, ces conspirateurs organisent deux incursions dont

l’objectif est de restaurer la monarchie.

La première a lieu en octobre 1911. Le plan de cette contre-révolution

prévoit la prise de Porto le 30 septembre par des militaires

rebelles (un régiment de cavalerie, un d’infanterie) et des gens du

peuple conduits par des religieux et d’anciens chefs monarchistes. En

même temps, le Paladin doit entrer au Portugal à la tête d’une armée

de rebelles à partir de la Galice.

En réalité, cette tentative échoue complètement. D’une part, l’insurrection

de Porto est facilement matée par les républicains ; d’autre part,

l’“armée” de Couceiro, composée de 950 hommes peu entraînés dont

seulement 240 possèdent une arme, occupe une petite localité, mais

doit rapidement rebrousser chemin et franchir la frontière. L’échec est

total par faute de moyens, d’appui populaire (il n’y pratiquement pas

de soulèvements à l’intérieur du pays), à cause aussi des mesures de

vigilance prises par les autorités de Lisbonne et par les carbonários.

1 Cet ancien gouverneur de l’Angola est l’un des rares officiers qui a défendu le

trône des Bragance pendant la révolution républicaine.


158 Reto Monico

En outre, il faut tenir compte du travail des diplomates portugais,

notamment en Espagne et à Londres, ainsi que de l’aide fournie par

les républicains espagnols 2 . Notons enfin que les officiers de l’armée

portugaise qui avaient promis leur soutien aux royalistes n’ont pas

bougé. En d’autres termes, Paiva Couceiro se trouve bien seul et doit

battre en retraite.

Même si elle n’atteint pas ses objectifs, cette activité contre-révolutionnaire

empoisonne la vie politique au Portugal, en creusant les

clivages entre les modérés et les radicaux, en faisant augmenter le climat

de haine et de suspicion. Cette chasse aux sorcières contre les

conspirateurs, la création d’un tribunal d’exception, les nombreuses arrestations,

les jugements contre les suspects, les licenciements de fonctionnaires

considérés comme hostiles au régime, l’activité des groupes

radicaux comme les bataillons de volontaires, exacerbe l’animosité antirépublicaine.

Par ailleurs, ce climat de violence ne contribue pas à

donner une bonne image de la République en Europe.

Nullement découragées par cette cuisante déconvenue, les forces

réfugiées en Galice commencent aussitôt à préparer une nouvelle incursion.

Les monarchistes essaient de trouver une ébauche d’accord

entre les partisans de D. Manuel (le dernier roi) et ceux de D. Miguel,

dernier descendant la branche absolutiste qui vit en Autriche. Ce que

l’on a appelé le Pacte de Dover du 30 janvier 1912 est une équivoque,

car il s’agit d’un échange de lettres entre les deux cousins. Le roi déchu

le 5 octobre est indigné parce que D. Miguel ne renonce pas au trône.

Celui-ci veut uniquement un accord pour attaquer la République.

C’est à ce moment-là que ce mouvement définit clairement son

objectif : remettre D. Manuel II sur le trône. Pour cela, il faut renverser

le nouveau régime en place à Lisbonne. Il paraît évident que

sans une révolte à l’intérieur du pays et l’appui d’une partie de l’armée,

une nouvelle invasion ne pourrait pas à elle seule remporter un succès

militaire. Des comités sont constitués dans différentes villes et, en

même temps, en Galice les conspirateurs préparent une nouvelle incursion.

Dans la province espagnole, les monarchistes portugais doivent

2 C’est grâce à la collaboration entre espions portugais et républicains espagnols

qu’est appréhendé, en juin, le navire allemand Gemma qui transporte des armes et

des munitions destinées aux monarchistes portugais.

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As incursões monárquicas lusas na imprensa sul-rio-grandense:

A Federação (1911-1912) 159

faire face à l’hostilité des républicains locaux et des carbonários ainsi

qu’aux difficultés de se procurer des armes et des munitions. Paiva

Couceiro part fin mai à Madrid afin d’acheter le matériel nécessaires à

ses troupes.

La deuxième incursion a lieu entre le 6 et le 8 juillet 1912. Les

rebelles entrent divisés en trois colonnes, mais ils sont repoussés par

les forces gouvernementales. Le seul combat vraiment sérieux a lieu à

Chaves 3 la journée du 8 juillet. Les pertes royalistes sont lourdes : 30

hommes et 150 blessés. En même temps — et c’est un fait essentiel —

les différents comités à l’intérieur du pays décident à la dernière heure

de ne pas bouger, sans en informer le capitaine Couceiro. Les quelques

rares soulèvements ne sont que des feux de paille. C’est à Cabeceira

de Basto, dans le district de Braga, qu’ont lieu les événements les

plus graves : on assiste à de violentes confrontations, avec la mort

d’un administrateur républicain. Cependant, le père Domingos Pereira,

un des chefs de cette brève restauration monarchique et qui avait la

réputation d’être un combattant courageux et féroce, prend la fuite à

la vue d’une dizaine de cavaliers.

Ces agissements en Galice mettent à dure épreuve les relations

entre les deux pays ibériques, Lisbonne accusant Madrid de fermer les

yeux sur les activités des conspirateurs. Après ce deuxième échec, le

gouvernement de Canalejas réagit enfin, en destituant le gouverneur

de Pontevedra, en internant les conspirateurs portugais et en arrêtant

quelques chefs monarchistes. En septembre 1912, grâce à la proposition

du Brésil, le Portugal et l’Espagne signent une convention dont le

point principal est le départ, pour une période de trois ans, de ces

monarchistes pour le plus grand pays d’Amérique du Sud. En outre,

les deux pays ibériques s’engagent à ne pas appuyer des tentatives

visant à déstabiliser l’État voisin.

Les causes de cette deuxième défaite des troupes de Paiva Couceiro

sont comparables à celles du premier désastre au début octobre

1911 : manque d’organisation, de foi, de discipline et d’unité du mouvement

; beaucoup d’officiers, notamment au Nord, n’ont pas tenu leur

promesse et n’ont pas agi contre le régime ; le peuple n’a pas bougé

3 A Lisbonne, on trouve un “Avenida defensores de Chaves”.

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160 Reto Monico

et a surtout choisi l’émigration 4 . À ces explications, il faut naturellement

ajouter la mobilisation des troupes gouvernementales et des

organisations secrètes.

* * * * *

Le corpus principal de ce livre est constitué par la retranscription

des articles que le quotidien républicain A Federação, fondé en 1884 à

Porto Alegre, écrit sur la conspiration monarchique au Portugal en 1911

et 1912. Outre les dépêches télégraphiques, on y trouve les chroniques

envoyées de Lisbonne d’abord par Firmino José Rodrigues, qui séjourne

à Lisbonne de mai à septembre 1911. Ensuite, c’est un journaliste

portugais 5 , contacté par le premier qui fait parvenir des nouvelles du

Portugal. Le quotidien brésilien peut ainsi continuer à suivre ce qui

se passe dans la jeune république lusitanienne, et ceci jusqu’au début

de 1913 Aussi bien dans les “Crónicas de Lisboa” que dans les “Notícias

de Portugal”, nous avons choisi tous les commentaires que ces deux

auteurs écrivent au sujet de cette conspiration monarchique, tant à

l’intérieur du pays qu’en Galice.

Dans la dernière partie de cet ouvrage, pour fournir au lecteur des

éléments d’analyse comparative, nous avons voulu étudier le point de

vue du Journal de Genève face à cette conspiration cléricalo-monarchiste.

En 1911 et 1912, contrairement au quotidien républicain de Porto

Alegre, le journal libéral romand y consacre quelques éditoriaux 6 rédigés

par Albert Bonnard et par Georges Wagnière, qui en sont respectivement

le rédacteur et le directeur pendant cette période. Nous avons

également retranscrit cinq de ces analyses, ainsi qu’une interview de

Guerra Junqueiro, le ministre du Portugal à Berne. Pendant trois années,

le poète-diplomate a déployé de nombreux efforts pour défendre

le nouveau régime installé à Lisbonne depuis octobre 1910 7 .

4 Durant ces années, environ 300 000 personnes émigrent au Brésil, ce qui

correspond à 10 % de la population au nord de Coimbra. RAMOS, Rui. A Segunda

Fundação. Lisboa: Editorial Estampa, 1995, p. 157.

5 Ce journaliste utilise le pseudonyme de Danton.

6 En octobre 1910 déjà, le Journal de Genève avait commenté la situation portugaise

à de nombreuses reprises, notamment avec sept éditoriaux.

7 Cf. MONICO, Reto. Suisse-Portugal : regards croisés (1890-1930). Genève : SHAG,

2005, pp. 371-387.

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Ilustrações a cores 1

1

Um agradecimento especial ao professor António Ventura, que disponibilizou

os postais, e à Hemeroteca Municipal de Lisboa, que digitalizou as caricaturas do

semanário satírico O Zé.


Figura 16 e 17: À esquerda, o homem representa Portugal e a mulher a

República. À direita, os dois padres estão a pagar aos três combatentes.

Estes julgam que é apenas para fazerem pirraças à República, mas quando os

empurram para irem combater, têm medo e recusam. Paiva Couceiro observa

a cena, mas não intervém. [1911]


Figura 18: «O desânimo nas hostes de Napoleão Couceiro» [1911]

Derrotados, Paiva Couceiro, Homem Cristo e a pequena tropa de conspiradores

têm de voltar para a Galiza.

Figura 19: «O burro leva as cascas (ou o lixo)» [1911]

Ao lado do cão Manuel II, o sacerdote (talvez o padre Lourenço de Matos,

antigo diretor de O Portugal) instiga o burro Paiva Couceiro que não quer

avançar. Este transporta alguns monárquicos.


Figura 20: Um padre em Orense, com o Paiva Couceiro ao lado, fala com

José Canalejas:

« De Madrid: — ¿Que me diz?!. . . Derrotados!?

De Orense: — E escorraçados. . .

De Madrid: — Então. . . desarme-os. . .

De Orense: — Bate certo! Quem os arma, que os desarme!!! » [1911]

O autor deste postal quer mostrar que tanto a Igreja local quanto o governo

central de Madrid querem livrar-se da responsabilidade de ter apoiado os

conspiradores monárquicos lusos.


Figura 21: «PAIVA QUIXOTE, herói da mais triste figura

Hoje como então e então como hoje: fanfarrão, qual o outro que, barafustando,

disse ao mar; “Si no fuera por causar daño a la navegación, te bebería

de un trago. . . ”

Mas. . . estão verdes. . .

(Já o inolvidável Artista o conhecia)» [1912]

Este postal é inspirado de uma caricatura do “inolvidável Artista” Rafael Bordalo

Pinheiro, publicada na Paródia a 10 de dezembro de 1902, e da fábula

de La Fontaine «A raposa e as uvas».


Figura 22: «UM SONHO» [1911]

Portugal e a jovem República não devem estar preocupados: o regresso do

antigo monarca parece pouco provável.


Figura 23: «Heróis de Chaves: António de Azevedo, Francisco Pinheiro e

Albino Adriano» [1912]


Figura 24: «NA FRONTEIRA: Como eles por lá conspiram» [1912]

O autor deste postal ilustrado representa a falta de entusiasmo do burro

Couceiro, instigado por um padre, e ridiculiza as pobres tropas couceiristas


Figura 25: «As hostes de Napoleão Couceiro» [1912]

Tal como na figura 18, Rocha Vieira ilustra a fraqueza militar dos conspiradores

monárquicos portugueses.


Figura 26: «ENTRADA DE NAPOLEÃO. . . COUCEIRO

— Entra. . . filho, entra. Senão a República acaba por se consolidar e tu

perdes esta excelente ocasião. . . » [1912]

A Igreja portuguesa, representada aqui por um bispo (talvez o cardeal patriarca

de Lisboa António Mendes Bello), incita o Paladino a entrar o mais

depressa possível em Portugal, para derrubar a odiada República anticlerical.


Figura 27: «CONDENADOS POLÍTICOS pelo tribunal marcial de Lisboa»

Estes seis presos políticos monárquicos são fotografados na cadeia do Limoeiro

a 24 de julho de 1913.


Figura 28: «Haja vergonha! Haja juízo! É preciso prudência!

Como uns verdadeiros rufias, atacam à naifada sem respeito pelos perigos

presentes e futuros, esquecendo-se dos deveres que têm para com

a infeliz república que tanto precisa de cuidados.» [O Zé, 5 de setembro

de 1911]

Os conflitos entre as várias fações republicanas e as greves enfraquecem o

novo regime. O Presidente Arriaga (com a bandeira) fica muito preocupado,

enquanto, à direita, um bispo, Paiva Couceiro, Manuel II e D. Amélia parecem

visivelmente satisfeitos.


Figura 29: «A ordem de despejo

A manada corajosa resiste a ondem batendo com os calcanhares. . . no sítio

próprio.»

[O Zé, 19 de setembro de 1911]

O Zé não tem dificuldades em repelir o ataque com um balde de água fria. À

direita das tropas monárquicas, D. Manuel; à esquerda, de bigode e com uma

espada, Paiva Couceiro.


Figura 30: «Tem que entrar por força!

O Zé – Ora essa! Pode entrar à vontadinha, isto é vosso, não façam

cerimónia!» [O ZÉ, 17 de outubro de 1911]

Um religioso «chicoteia» Paiva Couceiro (que tem uma vassoura) e o «macaco

Manuel» para que invadam Portugal. O Zé não parece muito preocupado.

Neste dia, toda a gente já sabe que a primeira tentativa monárquica fracassou

por completo.


Figura 31: «LARGA O OSSO!. . .

Democracia espanhola: — Ora põe aí as armas, tratante!» [O Zé, 21 de

maio de 1912]

Um traficante de armas alemão é denunciado pelos democratas (republicanos)

espanhóis.


Figura 32: «CABEÇA DE PORCO. . . OU CHISPE

O Zé propõe que se abra uma subscrição nacional, para se erguer uma

estátua ao benemérito da pátria que nos apresente isto ao natural.»

A 15 de julho de 1912, o semanário O Zé publica um retrato pouco elogioso

de Paiva Couceiro que é considerado como um porco.


Figura 33: «O CIVISMO DE D. CANALEJAS Caramba ! Que ahora no hay

aqui paivante ninguno!. . . » [O Zé, 15 de julho de 1912]

Esta caricatura denuncia a hipocrisia do chefe do governo espanhol.


Figura 34: «Sempre amigos!. . .

Queres mais armas?. . . toma e deixa lá o resto por nossa conta!» [O Zé,

23 de julho de 1912]

Para o semanário satírico, não há dúvidas: Canalejas e Afonso XIII (à esquerda)

fornecem armas a Paiva Couceiro.


Figura 35: «INABALÁVEL!

Enquanto for defendida assim, nenhum destes camafeus lhe cravará os

dentes!» [O Zé, 23 de julho de 1912]

Nem a monarquia espanhola (à esquerda), nem os monárquicos portugueses

vão poder vencer a o exército e os voluntários portugueses.


Figura 36: «ANDA CÁ, NHÓ-NHÓ !

Ah patifes! Tu voltas para lá, mas não hás-de ir gabar-te para as feiras

das bestas!» [O Zé, 23 de julho de 1912]

Um soldado português trata Canalejas e o rei espanhol de «patifes», e dá um

pontapé no Paladino, aconselhando-o a nunca mais regressar a Portugal.


Figura 37: «DOIS VALENTES. . .

— Então, Paiva?! Parece impossível!. . . Abandonares o teu posto. . .

— Pó. . . pó. . . pó de vó. . . vóssa. . . Ma. . . ma. . . ges. . . ta. . . e crer

que. . . que. . . não foi por. . . fal. . . fal. . . ta . . . de cu. . . cu. . . cu. . . ragem!»

[O Zé, 30 de julho de 1912]

O semanário lisboeta ridiculiza tanto o ex-monarca como o chefe da conspiração

falhada.


Figura 38: «JUSTA HOMENAGEM

O Zé saúda em Rodrigo Soriano e em Pablo Iglesias, que tão airosamente

defendem os créditos da nossa República, uma Espanha nova, bela e

livre de preconceitos. Viva a democracia espanhola!» [O Zé, 30 de julho

de 1912]

Homenagem ao dirigente republicano espanhol Rodrigo Soriano (1868?-1944)

e a Pablo Iglesias (1850-1922) fundador do PSOE (Partido Socialista Obrero

Español).


Figura 39: «POSIÇÃO CRÍTICA

A Espanha reacionária: — Ai! Ai! Por amor de Deus, não carregues mais,

que me fazes cair!. . . » [O Zé, 30 de julho de 1912]

O periódico satírico sobrestima a força do republicanismo espanhol e prevê

uma queda da monarquia nos país vizinho a curto prazo.


Figura 40: «O clarim de Chaves

O Zé presta a sua homenagem ao valoroso contramestre de charanga de

cavalaria 6, que no combate de Chaves, varreu quase um regimento de

paivantes à coronhada, provando assim que ainda há portugueses.»

A 6 de agosto de 1912, também O Zé presta homenagem ao contramestre

Francisco Pinheiro.


Figura 41: «SEMPRE FOI HUMANO. . .

De cá: — Então, seu Canalejas! Não se resolve a pôr esses meninos a

andar?

De lá: — Qual história! São a carne da minha carne! Eu cá, sempre fui

muito humanitário. . . para comigo!. . . » [O Zé, 6 de agosto de 1912]

O primeiro-ministro Duarte Leite (à esquerda) e Augusto e Vasconcelos pedem

ao chefe do governo de Madrid para que expulse os conspiradores monárquicos

do seu país, mas Canalejas (que tem Couceiro e Homem Cristo ao colo)

faz ouvidos de mercador.


Figura 42: «HERÓI DE PAPELÃO (disse um jornal estrangeiro que D. Manuel,

assim que Chaves estivesse tomada, tomaria a frente das tropas monárquicas.)

D. Manuel: (a tremer) — Á frente?!. . . Estás com pressa!. . . Eu, atrás, já

não vou lá muito seguro. . . » [O Zé, 13 de agosto de 1912]

Mais uma caricatura que estigmatiza a falta de coragem do último rei de

Portugal.


Figura 43: «DUAS IRMÃS

A República Portuguesa: — És a minha verdadeira irmã, apesar de haver

velhacos que não gostam lá muito disso.» [O Zé, 20 de agosto de 1912]

Zangados e deprimidos, José Canalejas e D. Afonso XIII olham para as duas

repúblicas lusófonas.



DIRECTORIA

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PRESIDENTE: FRANCISCO DAS NEVES ALVES

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DIRETOR DE ACERVO: MAURO PÓVOAS

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