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CRÓNICA

A Turquia

e os direitos

das mulheres

V CARLOS ESPERANÇA

A Turquia abandonou

ontem 1 a Convenção de

Istambul, um tratado

pan-europeu para prevenir

a violência contra as

mulheres, assinado por 45

países há dez anos. Foi a

mais cruel notícia contra

as mulheres turcas, e ter-

-se-á esgotado nos noticiários

do dia.

A saída, anunciada no jornal oficial do

Estado, foi tomada por decreto do PR

Erdogan, que assinou o mesmo tratado

enquanto primeiro-ministro, em

2011.

Fora dos EUA, as Forças Armadas são

as mais numerosas dos países da Nato,

e as mais poderosas, depois do RU.

São o instrumento das ambições do

proto califa, nostálgico de seis séculos

do Império Otomano. O ditador já

encarcerou ou fez desaparecer os oficiais

defensores da laicidade, após um

suspeito golpe de Estado cuja repressão

foi fulminante contra militares e…

juízes.

A Turquia estava entre o grupo de 14

Estados pioneiros, que assinaram a

Convenção do Conselho da Europa

1 20.03.2021

sobre a prevenção e combate à violência

contra as mulheres e à violência

doméstica, ironicamente em Istambul,

em maio de 2011. O país eurasiático,

nunca pôs em prática a convenção,

e foi o primeiro Estado a abandoná-la,

depois de ter sido o primeiro a ratificá-la.

Erdogan declarou em agosto de 2020

que se retiraria do acordo “se o povo

o quisesse” e anunciou a intenção de

criar um tratado próprio, o que provocou

protestos em massa em várias

cidades de todo o país no ano passado,

certamente com desgosto de Maomé.

Grupos islâmicos conservadores pressionaram

o AKP para a retirada, considerando

que alguns artigos têm um

impacto negativo “na estrutura familiar”

e vão contra os “valores nacionais”

(leia-se, “patologia corânica”).

Alegam que promove a homossexualidade,

utilizando o termo “orientação

sexual”, e ataca os valores familiares,

descrevendo as relações de “pessoas

que vivem juntas” sem especificar se

são casadas. Para o Islão os direitos

individuais não existem, são atributo

do que o fascismo islâmico designa

por decadência ocidental. A Turquia

registou 284 assassinatos sexistas de

mulheres em 2020, segundo estimativa

de Bianet, a ONG que há uma década,

na ausência de números oficiais,

tem vindo a compilar estes casos.

É irrelevante que no próprio AKP, o

partido islâmico criado por Erdogan

em 2000, haja vozes discordantes. O

Islão não é uma religião, é uma patologia.

Nutre o nacionalismo turco que

sonha com o regresso ao domínio do

sudeste europeu, da Ásia Ocidental e

do Norte de África, que vigorou de finais

do séc. XIII até ao fim da I Grande

Guerra.

Erdogan é um ditador islâmico a quem

as democracias passaram alvará de democrata

e permitiram a ambição que

o levou ao envolvimento político no

Médio Oriente, Norte de África, Cáucaso

do Sul, Balcãs e, num desafio à

Grécia, ao Mediterrâneo. É o prenúncio

do expansionismo que devora o

déspota, impelido pelo Corão, depois

de exterminar os curdos e despertar a

unificação do Islão num califado sob

a sua égide.

Entre a demência da fé, que discrimina

as mulheres e as torna objeto e propriedade

dos homens, deve impor-se

o humanismo, o respeito pela igualdade

dos sexos e a defesa dos direitos

humanos.

Não me exijam respeito pelos absurdos

de uma religião que envenena os

crentes e quer obrigar o mundo a ajoelhar-se

virado para Meca. Qualquer

ideologia política, religiosa ou filosófica

que considere a mulher inferior

ao homem, é uma ideologia perversa

que urge reprimir, enquanto houver

tempo.

Lusitano de Zurique -Maio 2021 | www.cldz.eu

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