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Sapeca 35

Misto de sapo e perereca Nº 35 – Abril/2022 – Editor: Tonico Soares e-mail: ajaimesoares@hotmail.com

Misto de sapo e perereca
Nº 35 – Abril/2022 – Editor: Tonico Soares
e-mail: ajaimesoares@hotmail.com

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tha, Millôr, Fortuna e de uma grande equipe de colaboradores solidários que o

jornal continuou circulando, durante os dois meses em que a equipe esteve presa.

Os militares, se quisessem, poderiam impedir que o Pasquim continuasse

circulando. Mas a popularidade do jornal era tamanha que eles decidiram não

passar recibo. Preferiram sufocar o jornal aos poucos, com censura rigorosa para

diminuir a tiragem e afastar anunciantes.

“A gripe” pegou todo mundo

Como a imprensa estava sob rigorosa censura, as prisões não puderam ser

noticiadas. Por isso, o sumiço repentino da turma ficou conhecido, entre os amigos,

como “a gripe”. Haroldo conta que foi Chico Buarque que criou essa expressão,

em carta que foi publicada no jornal: “Eu queria abraçar vocês, mas não tinha

ninguém aqui. Deve ser por causa da gripe. Ninguém segura essa gripe. Assim

mesmo, estimo melhoras”.

– Os principais articulistas e humoristas no xilindró. Redação desbaratada.

E aconteceu a maior mobilização de solidariedade de intelectuais já vista. Antonio

Callado, Rubem Braga, Rubem Fonseca, Glauber Rocha, Hugo Carvana,

Paulo Mendes Campos, Carlos Heitor Cony, Noel Nutels e muitos outros, cortesmente,

muniram o jornal com suas colaborações durante os dois meses de prisão.

A pièce de résistance nesse momento foi Martha Alencar, chefe de redação,

que mobilizou toda a turma.

Mocotó indigesto

Parece que tudo estava escrito para dar errado naquele ano de 1970. Jaguar,

que não tinha sido preso nos primeiros dias, por estar fora do Rio, fez uma

montagem com o quadro Independência ou morte, de Pedro Américo, no Pasquim

número 71, da semana anterior. Ele substituiu o famoso brado da versão

oficial por “Eu quero mocotó”, em um balãozinho que saía da boca de D. Pedro

I. A frase foi extraída de uma música de Jorge Ben, que ainda não era Benjor. Na

época, mocotó era uma gíria para pernas femininas bonitas.

A música já tinha dado problema dias antes das prisões, no V Festival Internacional

da Canção, no Maracanãzinho. Ela foi cantada pelo maestro Erlon

Chaves, com uma coreografia em que ele, negro, beijava algumas jovens louras

com roupas colantes, cor da pele. Isso há 50 anos, tempo de muito mais racismo

e conservadorismo do que atualmente. A mídia conservadora caiu de pau. O maestro

teve que depor na Polícia Federal e ficou 30 dias proibido de trabalhar.

Nesse clima, a charge-montagem do Jaguar enfureceu ainda mais os militares,

que já estavam com o Pasquim na alça de mira desde sua criação, no ano anterior.

Em entrevista ao Jornal da ABI de maio de 2009 Jaguar conta que ao saber

que estava sendo procurado pela polícia em princípio pensou em não se entregar:

– Eu tava viajando, na minha casa de pescador lá em Arraial do Cabo.

Quando voltei, me aconselharam. “Se esconda Jaguar, tá todo mundo preso!”.

Pra você ver como o Brasil é surrealista, eu fiquei na casa do sujeito que era um

dos mais reacionários: Flávio Cavalcanti. Ele me escondeu! Ninguém iria procurar

um “subversivo” na casa do Flávio Cavalcanti! (risos) E tinha uma outra subversiva

comigo, que era uma maravilha de companhia, a Leila Diniz. Eu ficava o

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