Boletim BioPESB 2013 - Edição 11.pdf
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CulturaPuris Ano 3, n°11 - Pág 2<br />
Indíos Puris - conheça a história desse valente povo que habitava<br />
a Serra dos Arrepiados<br />
Para a produção das matérias<br />
sobre os índios Puris,<br />
o <strong>Boletim</strong> <strong>BioPESB</strong> contou<br />
com a importante colaboração<br />
do historiador e<br />
doutorando da Universidade<br />
Federal Fluminense<br />
Marcelo Sant’ Ana Lemos.<br />
Viajantes naturalistas<br />
europeus que percorreram<br />
a zona da mata mineira<br />
por volta do século XIX<br />
relataram a predominância<br />
de diferentes povos<br />
indígenas, sendo os mais<br />
frequentes na região, os<br />
Coroados, Coropós e Puris.<br />
Esses indígenas tinham<br />
agricultura, mas também<br />
praticavam caça, pesca<br />
e coleta. Eram povos de<br />
grande mobilidade pelo<br />
território - particularmente<br />
os Puris.<br />
Os Puris não se diferenciavam<br />
em relação às<br />
demais tribos no que diz<br />
respeito à divisão das<br />
tarefas, pois cabiam aos<br />
homens as obrigações ligadas<br />
à caça e a guerra,<br />
por isso eram eles responsáveis<br />
pela fabricação<br />
das armas, enquanto as<br />
mulheres se preocupavam<br />
com as colheitas e tudo o<br />
que estava ligado às coisas<br />
da casa. Não existia<br />
a prática monogâmica<br />
entre eles, podendo o índio<br />
escolher mais de uma<br />
companheira desde que<br />
pudesse garantir o sustento<br />
de sua família, que normalmente<br />
não ultrapassava<br />
quatro filhos.<br />
Durante o século XIX,<br />
um dos fatores que contri-<br />
Ilustração dos Índios Puris.<br />
buiu para a maior sobrevivência<br />
dos Puris em relação<br />
aos demais grupos foi<br />
o fato de se organizarem<br />
em pequenos grupos e aldeias,<br />
garantindo a esta<br />
população maiores possibilidades<br />
de mobilidade,<br />
fuga e dificuldade de ser<br />
aldeada pelos outros povos<br />
da região.<br />
O fato de os Puris terem<br />
sido mais abundantes<br />
implica, atualmente, uma<br />
associação entre o próprio<br />
significado do vocábulo<br />
“Puri” com uma possível<br />
ancestralidade indígena.<br />
É comum nesta região uma<br />
pessoa que tenha um biótipo<br />
comumente associado<br />
com índio ser logo identificada<br />
como sendo um<br />
possível descendente de<br />
Puri. Já na língua dos Coroados,<br />
Puris poderia ser<br />
traduzido como “homens<br />
ousados”; isso porque esses<br />
índios invadiam, de<br />
surpresa, as aldeias dos<br />
inimigos durante a ausência<br />
dos homens, ateando<br />
fogo a tudo e saqueando<br />
o que vissem pela frente. É<br />
interessante ressaltar que<br />
os Puris também chamavam<br />
os Coroados de Puris,<br />
não havendo diferença na<br />
forma como eles se autodenominavam.<br />
A partir do ano de<br />
1500, em consequência<br />
da chegada dos portugueses<br />
e a prática escravista,<br />
os Puris se viram<br />
forçados a se acuar pelo<br />
interior do Brasil. Em uma<br />
dessas imersões chegaram<br />
à região da Serra do<br />
Brigadeiro, um dos seus<br />
últimos redutos, sendo encurralados<br />
pelos europeus<br />
e por algumas tribos indígenas,<br />
dominantes do<br />
Vale do Rio Doce. A única<br />
opção de sobrevivência<br />
foi mesmo se adaptar às<br />
matas fechadas e ao frio<br />
da Serra dos Arrepiados.<br />
Na região localizada<br />
entre as bacias dos rios<br />
Doce, Paraíba do Sul e<br />
Casca, a qual hoje corresponde<br />
o município de<br />
Araponga, os índios Puris<br />
predominavam até meados<br />
do século XIX. Com o<br />
passar dos tempos, grande<br />
parte da cultura desse<br />
povo começou a ser<br />
destruída por meio de<br />
massacres de aldeias, envenenamento<br />
de grupos,<br />
transmissão criminosa de<br />
varíola, entre outras formais<br />
violentas.<br />
Até o final do século<br />
XIX, os Puris mantinham<br />
boa parte de sua cultura<br />
e costumes, alguns destes<br />
ainda preservados por<br />
famílias que possuem descendência<br />
indígena. Os<br />
Índios Puris são lembrados<br />
até hoje através de suas<br />
heranças culturais, podendo-se<br />
destacar a Dança<br />
de Caboclo, uma das mais<br />
importantes manifestações<br />
folclóricas da região da<br />
Serra do Brigadeiro.<br />
Raquel Santos, Isaac Konig,<br />
Bárbara Dias<br />
Reprodução<br />
CulturaPuris<br />
Quem eram os Puris?<br />
Ao que tudo indica, a<br />
nação indígena da etnia<br />
Puri chegou à Serra do<br />
Brigadeiro em meados de<br />
1500. Vindos do litoral do<br />
Rio de Janeiro e do Espírito<br />
Santo, sua região de<br />
origem, que tiveram de<br />
deixar para se protegerem<br />
dos portugueses que<br />
estavam colonizando seus<br />
espaços. As regiões serranas<br />
do interior do Brasil,<br />
foram por algum tempo<br />
um bom refúgio para a<br />
população indígena.<br />
Os Puris viviam da caça<br />
na mata, da coleta de frutos<br />
e eram tidos como excelentes<br />
pescadores. Os<br />
instrumentos usados para<br />
a caça eram simples: flecha<br />
e bodoque, porém<br />
operados com muita habilidade.<br />
Eles tinham preferência<br />
por usar pedras<br />
ao invés de setas quando<br />
caçavam. Para servirem<br />
as refeições usavam cuias<br />
e cabaças.<br />
Eles gostavam de pintar<br />
o corpo para se enfeitarem,<br />
reproduzindo imagens<br />
de serpentes, aves<br />
e formas geométricas da<br />
natureza. Geralmente casavam<br />
muito jovens, logo<br />
ao atingir a puberdade, e<br />
ao contrário de muitas culturas<br />
os casamentos não<br />
eram arranjados, levando-se<br />
em conta a afeição.<br />
O artesanato era usado<br />
para fabricar instrumentos<br />
úteis no dia a dia,<br />
como colheres, potes de<br />
argila e moringas para<br />
armazenar água que<br />
eram feitos de argila ou<br />
barro cozido. Fibras vegetais<br />
como taioba e embira<br />
eram empregadas para<br />
confeccionar as cordas.<br />
Infelizmente existem<br />
poucos registros e documentos<br />
que ajudem a contar<br />
com fidelidade o período<br />
que os Puris viveram<br />
<strong>Boletim</strong> Biopesb<br />
Redação: Alunos do PET- Bioquímica da UFV (Bárbara<br />
Dias, Bruno Paes, Fernanda Araújo, Flávia Bagno,<br />
Isaac Konig, Joana Marchiori, Lethícia Ribeiro, Luciana<br />
Fernandes, Paulo Alves, Raquel Santos, Thaís Martins,<br />
Valdeir Moreira).<br />
Projeto Gráfico : Thamara Pereira<br />
Diagramação: Marcela Barbosa<br />
Revisão: Lethícia Ribeiro<br />
www.biopesb.ufv.br<br />
Senhor Dauá, descendente de Puris que vive em Araponga,<br />
dedicando parte de seu tempo para contar às crianças histórias<br />
e tradições indígenas, bem como ensiná-las sua língua.<br />
em nossa região, mas ainda<br />
vivem no território da<br />
Serra do Brigadeiro pessoas<br />
descendentes dessa<br />
etnia, como o senhor Jurandi<br />
e a dona Redomilha,<br />
que podem narrar as histórias<br />
que ouviram de seus<br />
pais e avós sobre os costumes<br />
de seus antepassados.<br />
Além disso, alguns museus<br />
guardam um pouco da história<br />
dos indígenas, como<br />
o Arquivo Histórico Municipal<br />
de Resende no Rio de<br />
Janeiro e o Museu Histórico<br />
de Rio Pomba em Minas<br />
Gerais.<br />
Raquel Santos, Isaac Konig,<br />
Bárbara Dias<br />
Editor-Chefe: João Paulo Viana Leite<br />
Telefone: (31) 3899-3044<br />
E-mail: biopesbufv@gmail.com<br />
Endereço: Departamento de Bioquímica e Biologia<br />
Molecular - UFV<br />
CEP 36570-000, Viçosa - MG - Brasil<br />
Tiragem: 1.000 exemplares<br />
Apoio: Pró-Reitoria de Extensão e Cultura (PIBEX)-UFV<br />
Apoio: Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em<br />
Interações Planta-Praga<br />
Arquivo pessoal<br />
Ano 3, n°11 - Pág 3<br />
Editorial<br />
Aproveitando o ensejo<br />
da comemoração dos<br />
17 anos do Parque Estadual<br />
da Serra do Brigadeiro,<br />
o <strong>Boletim</strong> <strong>BioPESB</strong><br />
buscou retratar nesta<br />
edição a rica história<br />
de resistência dos povos<br />
indígenas Puris que<br />
habitavam a região da<br />
Serra dos Arrepiados,<br />
hoje conhecido como<br />
“Serra do Brigadeiro”,<br />
e da luta compartilhada<br />
por diferentes personagens,<br />
para proteger<br />
a cultura e o meio ambiente<br />
local. Símbolo de<br />
preservação da Mata<br />
Atlântica de Minas Gerais,<br />
a criação do PESB<br />
constituiu um importante<br />
instrumento para frear<br />
o desmatamento de um<br />
dos principais resquício<br />
desse bioma no planeta,<br />
estabelecendo uma importante<br />
reserva para<br />
convivência de várias<br />
espécies de plantas e<br />
animais ainda ameaçados<br />
de extinção. Nesta<br />
região, habitada por<br />
gente guerreira, vários<br />
descendentes dos Puris,<br />
e também por pessoas<br />
que encontraram no território<br />
motivação para<br />
cuidar do planeta, depara-se<br />
atualmente com<br />
novos desafios para a<br />
resistência, tendo como<br />
ameaça vilões representados<br />
por projetos imobiliários<br />
que conseguem<br />
estranhamente equacionar<br />
paz individual com<br />
destruição ambiental;<br />
avanço de mineradoras<br />
e, muitas das vezes, a<br />
inoperância de órgãos<br />
públicos.<br />
João Paulo Viana<br />
Editor Chefe