Boletim BioPESB 2013 - Edição 11.pdf
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CulturaPuris Ano 3, n°11 - Pág 4 CulturaPuris<br />
Ano 3, n°11 - Pág 5<br />
Encontro com a aldeia Puris: relato de um naturalista<br />
do séculoXIX<br />
Em 1836 o médico e naturalista francês Raymundo Henrique de Genettes visitou a Serra<br />
do Brigadeiro e escreveu em seu diário como foi sua aproximação com os Puris. Confira o relato<br />
de Raymundo:<br />
XI - Uma caçada de onça<br />
“20 de dezembro (1836)<br />
Chegamos pelas onze da manhã ao pé da Serra do Brigadeiro e encontramos de<br />
imprevisto um rancho de índios Puris. É para mim uma boa fortuna. O rancho consta de<br />
50 a 60 famílias formando um total de 120 a 130 pessoas.<br />
O cacique fala português e nos diz que a tribo negocia com gente de Itapemirim e<br />
litoral. Deve ser assim, porque nossa visita não os altera. Apeamos e somente as crianças<br />
consideram-nos com curiosidade e ficam cheias de espanto.<br />
Tomei meu vocabulário Coropó e me esforço para que me entendam. Noto logo que<br />
eles ignoram e apenas algumas palavras são comuns nas duas línguas. Principio a<br />
compreender que há para os ínidos uma língua geral e que as outras, Coropó, puri,<br />
chipotó, botocuda, neakeamuks, etc. São dialetos mais ou menos afastados da língua geral.<br />
Em boa hora encontramos estes índios, que mediante promessa de uma recompensa<br />
prometia nos levar para a origem do Itabapuano.<br />
Ao amanhecer do dia seguinte, tomo por um trilho mal seguido, levando minha<br />
espingarda de boa fábrica francesa e entro no mato. Apenas tinha caminhado quinhentos<br />
a seiscentos passos, encontro um magnífico animal. Agita sua cauda com suas malhas<br />
pretas e amarelas brilhando como seda à luz que coa entre as folhagens e nos primeiros<br />
raios de sol da manhã. A visão me enche de prazer, o animal caminha lentamente e sigo,<br />
mas o acho tão belo que não quero atirar.<br />
Caminho assim uns duzentos passos. Nunca vi uma onça, mas pela semelhança do<br />
animal presente com as descrições que li dos naturalistas, reconheço que tenho diante de<br />
mim um representante da raça tão prejudicial aos fazendeiros. Volto para trás e ao<br />
chegar no rancho, conto minha aventura. Os índios compreendem e, logo, dez a doze<br />
caçadores partem em demanda do animal.<br />
A poucos passos, os índios reconhecem sobre as folhas úmidas da floresta o seu rastro,<br />
que eles me fazem notar. Em vão procuro, mas nada vejo. À medida, porém que<br />
avançamos, noto que os índios seguem mais cauteloso, olhando para cima. Não<br />
compreendo o seu manejo.<br />
Em poucos segundos, ouvi o sibilar da flecha do caçador e um rugido agudo e dolorido<br />
nos fez reconhecer que a onça tinha sido ferida gravemente. O animal apenas mudou de<br />
posição. Os índios todos entretidos com a caçada, não mais se lembraram de mim e<br />
mudaram de lugar, deixando-me a descoberto. Até o momento, nada observo de notável. É<br />
o mesmo pássaro pousado sobre um ramo.<br />
Duas flechas partiram a um tempo e ferem novamente a onça que se atira no chão ,<br />
como um gato que cai. Depois de duas ou três voltas circulares, acompanhados de um<br />
rosnar surdo que parece sir da terra, encolhe-se e, de um salto vigoroso, se atira ao<br />
caçador índio mais próximo. Este a espera a recebe com uma espécie de lança, cuja ponta<br />
é feita de um osso muito pontudo e duro.<br />
A lança penetra profundamente no peito do valente animal, que pelo seu peso faz<br />
baixar a arma. Neste momento, e com incrível rapidez, o chefe se precipita com uma faca<br />
feita de pau-ferro e mata finalmente a magnífica onça.”<br />
*O relato de Raymundo Genettes foi publicado no livro Brasil Chinês (Wanke, Luis Ernesto & Wanke,<br />
Marcos Luiz. Curitiba: Ed. Lewi, 2009) e nos foi repassado gentilmente por Marcelo Lemos, a quem a equipe<br />
do <strong>Boletim</strong> agradece por ter disponibilizado informações para a confecção das matérias sobre os Puris.<br />
O nome completo brasileiro foi Raymundo Henrique des Genettes, e o de origem<br />
francesa, François Henry Trigant des Genettes. Este francês, naturalizado<br />
brasileiro, conhecido como Dr. Francisco ou Padre Henriques, além de ter se dedicado<br />
a cuidar da saúde de cidadãos brasileiros como médico, atuou também<br />
como naturalista. Levantou as bases geológicas de Minas Gerais e do Planalto<br />
Central, mediu pela primeira vez a altura do Pico da Bandeira, descobriu minas<br />
de ouro e jazidas de diamantes. Como político ativo, teve participação nas revoluções<br />
francesas de 1830 e na mineira de 1842.<br />
Reprodução<br />
Reprodução<br />
De Arrepiados a Brigadeiro: Passado e Presente do PESB<br />
Por volta de 1800, enviado<br />
pelo Governo Provincial,<br />
em uma de suas<br />
expedições, Brigadeiro<br />
Bacelar apareceu na Serra<br />
dos Arrepiados. A Serra<br />
fria nas partes altas<br />
era habitada pelos índios<br />
Puris, que costumavam<br />
usar adereços ou coques<br />
no cabelo. Tanto o modo<br />
como arranjavam os cabelos<br />
quanto os arrepios dos<br />
índios por causa do frio<br />
poderiam explicar o nome<br />
original do lugar. Mas dar<br />
nome por causa de índio<br />
não agradava muito aos<br />
que davam nome aos lugares.<br />
Mudaram logo<br />
para Serra do Brigadeiro<br />
em homenagem ao tal<br />
Bacelar. Contam que por<br />
causa desse mesmo Bacelar,<br />
o antigo Rio Guarus<br />
passou a se chamar Rio<br />
Glória.<br />
De uma forma<br />
ou de outra,<br />
apesar da mania<br />
desse Brigadeiro<br />
mudar o nome<br />
das coisas, hoje a<br />
Serra está entre<br />
as áreas prioritárias<br />
para a conservação<br />
da biodiversidade e<br />
tem um papel significativo<br />
para o desenvolvimento<br />
sustentável na Zona<br />
da Mata, conciliando fins<br />
científicos, educativos,<br />
ecoturísticos e ainda contribuindo<br />
para o processo<br />
de integração das comunidades<br />
do entorno.<br />
O Parque foi criado em<br />
1996 a partir de um processo<br />
histórico envolvendo<br />
diferentes organizações e<br />
tem o objetivo de resguardar<br />
o considerável fragmento<br />
de Mata Atlântica<br />
da região.<br />
A atividade turística em<br />
seu território tem importância<br />
não apenas pela<br />
geração de renda, mas<br />
também pelo potencial de<br />
conscientização ambiental.<br />
O número de visitantes<br />
do Parque vem subindo e,<br />
segundo dados da Sede<br />
do PESB, varia em torno<br />
de 4900 pessoas por ano.<br />
Dentre as opções turísticas<br />
que o PESB e seu entorno<br />
oferecem, o Pico do Boné,<br />
localizado na zona rural<br />
de Araponga, foi apontado<br />
como o lugar mais frequentado<br />
pelos turistas,<br />
seguido das Cachoeiras<br />
da Laje e a do Pio. Atualmente<br />
também é crescente<br />
a procura pela visitação à<br />
sede do Parque, e em outros<br />
pontos por praticantes<br />
de esportes radicais e cavalgada.<br />
Com relação aos fins<br />
educacionais e científicos,<br />
vale ressaltar que pesquisadores<br />
de importantes<br />
centros de ensino e pesquisa,<br />
como UFV, UFMG<br />
e Instituto Jardim Botânico<br />
do Rio de Janeiro utilizam<br />
as áreas do PESB para o<br />
desenvolvimento de aulas<br />
de campo e pesquisas.<br />
Dentre as áreas mais pesquisadas<br />
no PESB estão a<br />
botânica, avifauna, ecoturismo,<br />
farmacologia e entomologia.<br />
Nesta edição trazemos<br />
um encarte com uma<br />
linha do tempo que mostra<br />
como foi a conquista do<br />
que é hoje o nosso Parque.<br />
Por toda essa luta e por<br />
toda a importância socioambiental<br />
dessa região,<br />
entende-se a necessidade<br />
de preservação do PESB.<br />
Lethícia Ribeiro, Thaís Martins e<br />
Flávia Bagno<br />
Reprodução